Página 1 de 317 APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5046512-94.2016.4.04.7000/PR RELATOR APELANTE ADVOGADO APELANTE APELANTE ADVOGADO APELANTE ADVOGADO APELANTE ADVOGADO APELANTE ADVOGADO APELADO APELADO ADVOGADO APELADO ADVOGADO APELADO ADVOGADO APELADO ADVOGADO : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : JOÃO PEDRO GEBRAN NETO LUIZ INACIO LULA DA SILVA CRISTIANO ZANIN MARTINS MANOEL CAETANO FERREIRA FILHO ANA PAOLA HIROMI ITO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL AGENOR FRANKLIN MAGALHAES MEDEIROS LEANDRO ALTÉRIO FALAVIGNA LUIS CARLOS DIAS TORRES JOSE ADELMARIO PINHEIRO FILHO BRUNO HARTKOFF ROCHA RODRIGO NASCIMENTO DALL'ACQUA JOSE LUIS MENDES DE OLIVEIRA LIMA ANA CAROLINA DE OLIVEIRA PIOVESANA MARIA FRANCISCA DOS SANTOS ACCIOLY VERONICA CARVALHO RAHAL PAULO TARCISO OKAMOTTO FERNANDO AUGUSTO HENRIQUES FERNANDES Vinícius Ferrari de Andrade Anderson Bezerra Lopes REINALDO SANTOS DE ALMEIDA JÚNIOR CARLOS EDUARDO MOTA FERRAZ PETROLEO BRASILEIRO S A PETROBRAS René Ariel Dotti Alexandre Knopfholz OS MESMOS FABIO HORI YONAMINE SYLVIA MARIA URQUIZA FERNANDES DEBORA NOBOA PIMENTEL CAROLINA FONTI GUSTAVO DE CASTRO TURBIANI GUILHERME LOBO MARCHIONI ISABELLA LEAL PARDINI VICTOR FERREIRA ARICHIELLO MARISA LETICIA LULA DA SILVA CRISTIANO ZANIN MARTINS JOSE ROBERTO BATOCHIO GUILHERME OCTAVIO BATOCHIO PAULO ROBERTO VALENTE GORDILHO LUIZ HENRIQUE DE CASTRO MARQUES FILHO ROBERTO MOREIRA FERREIRA ALEXANDRE DAIUTO LEAO NOAL https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 2 de 317 : SYLAS KOK RIBEIRO : PEDRO HENRIQUE MENEZES QUEIROZ : NATALIA BALBINO DA SILVA VOTO 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS Versam os presentes autos sobre recursos interpostos contra sentença proferida em um dos processos relacionados à denominada 'Operação Lava-Jato', cuja pretensão acusatória foi julgada parcialmente procedente para condenar AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS, por um crime de corrupção ativa do art. 333 do CP, pelo pagamento de vantagem indevida a agentes do Partido dos Trabalhadores, em decorrência do contrato do Consórcio CONEST/RNEST com a Petrobras; JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, por um crime de corrupção ativa e por um crime de lavagem de dinheiro do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/98, envolvendo a ocultação e dissimulação do apartamento 164-A; e LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, por um crime de corrupção passiva do art. 317 do CP e por um crime de lavagem de dinheiro do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/98, envolvendo a ocultação ou dissimulação da titularidade do apartamento 164-A, assim como o beneficiário das reformas realizadas. Foram absolvidos PAULO ROBERTO VALENTE GORDILHO, FÁBIO HORI YONAMINE e ROBERTO MOREIRA FERREIRA da imputação do crime de lavagem de dinheiro envolvendo o pagamento de reformas, a ocultação e dissimulação da titularidade do apartamento 164-A, triplex, e do beneficiário das reformas realizadas; assim como LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e PAULO TARCISO OKAMOTTO da imputação de lavagem de dinheiro envolvendo o armazenamento do acervo presidencial. As corrupções ativa e passiva, além da lavagem de dinheiro, foram assim resumidas na sentença: 1. Trata-se de denúncia formulada pelo MPF pela prática de crimes de corrupção (arts. 317 e 333 do CP) e de lavagem de dinheiro, por diversas vezes, (art. 1º, caput, inciso V, da Lei n.º 9.613/1998), no âmbito da assim denominada Operação Lavajato, contra os acusados acima nominados (evento 1). 2. A denúncia tem por base os inquéritos 5035204-61.2016.4.04.7000/PR, 500659738.2016.4.04.7000/PR, 5003496-90.2016.4.04.7000/PR e 5049557-14.2013.404.7000/PR, e processos conexos, entre eles os processos 5006617-29.2016.4.04.7000/PR, 500740106.2016.4.04.7000/PR, 5006205-98.2016.4.04.7000/PR, 5061744-83.2015.4.04.7000/PR, 5005896-77.2016.4.04.7000/PR e 5073475-13.2014.404.7000/PR. Todos esses processos, em decorrência das virtudes do sistema de processo eletrônico da Quarta Região Federal, estão disponíveis e acessíveis às partes deste feito e estiveram à disposição para consulta da Defesa desde pelo menos o oferecimento da denúncia, sendo a eles ainda feita ampla referência no curso da ação penal. Todos os documentos neles constantes instruem, portanto, os autos da presente ação penal. 3. Em síntese, segundo a denúncia, no âmbito das investigações da assim denominada Operação Lavajato, foram colhidas provas de que empresas fornecedoras da Petróleo Brasileiro S/A - Petrobrás pagariam, de forma sistemática, vantagem indevida a dirigentes da estatal. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 3 de 317 4. Surgiram, porém, elementos probatórios de que o caso transcende a corrupção - e lavagem decorrente - de agentes da Petrobrás, servindo o esquema criminoso para também corromper agentes políticos e financiar, com recursos provenientes do crime, partidos políticos. 5. Aos agentes políticos cabia dar sustentação à nomeação e à permanência nos cargos da Petrobrás dos referidos Diretores. Para tanto, recebiam remuneração periódica. 6. A presente ação penal tem por objeto uma fração desses crimes do esquema criminoso da Petrobras. 7. Alega o Ministério Público Federal que o ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva teria participado conscientemente do esquema criminoso, inclusive tendo ciência de que os Diretores da Petrobrás utilizavam seus cargos para recebimento de vantagem indevida em favor de agentes políticos e partidos políticos. 8. Por outro lado, o Grupo OAS, Presidido pelo acusado JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, também conhecido por Léo Pinheiro, seria um dos grupos empresariais que teriam pago sistematicamente vantagem indevida em contratos da Petrobrás a agentes públicos e a agentes ou partidos políticos. 9. Estima o MPF que o total pago em propinas pelo Grupo OAS decorrente das contratações dele pela Petrobrás, especificamente no Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, alcance R$ 87.624.971,26, correspondente a 3% sobre a parte correspondente da Construtora OAS nos empreendimentos referidos. 10. Parte desses valores, cerca de 1%, teriam sido destinados especificamente a agentes políticos do Partido dos Trabalhadores e teriam integrado uma espécie de conta corrente geral de propinas entre o Grupo OAS e agentes do Partido dos Trabalhadores. 11. Destes valores, R$ 3.738.738,00 teriam sido destinados especificamente ao exPresidente Luiz Inácio Lula da Silva. 12. Os valores teriam sido corporificados na disponibilização ao ex-Presidente do apartamento 164-A, triplex, do Condomínio Solaris, de matrícula 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP, sem que houvesse pagamento do preço correspondente. Para ser mais exato, o ex-Presidente, quando o empreendimento imobiliário estava com a BANCOOP - Cooperativa Habitacional dos Bancários, teria pago por um apartamento simples, nº 141-A, cerca de R$ 209.119,73, mas o Grupo OAS disponibilizou a ele, ainda em 2009, o apartamento 164-A, triplex, sem que fosse cobrada a diferença de preço. Posteriormente, em 2014, o apartamento teria sofrido reformas e benfeitorias a cargo do Grupo OAS para atender ao ex-Presidente, sem que houvesse igualmente pagamento de preço. Estima o MPF os valores da vantagem indevida em cerca de R$ 2.424.991,00, assim discriminada, R$ 1.147.770,00 correspondente à diferença entre o valor pago e o preço do apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em reformas e na aquisição de bens para o apartamento. 13. Na mesma linha, alega que o Grupo OAS teria concedido ao ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada no pagamento das despesas, de R$ 1.313.747,00, havidas no armazenamento entre 2011 e 2016 de bens de sua propriedade ou recebidos como presentes durante o mandato presidencial. 14. Em ambos os casos, teriam sido adotados estratagemas subreptícios para ocultar as transações. 15. O repasse do apartamento e as reformas, assim como o pagamento das despesas de armazenamento, representariam vantagem indevida em um acerto de corrupção e os estratagemas subreptícios utilizados para esse repasse e pagamento constituiriam crime de lavagem de dinheiro. 16. Luiz Inácio Lula da Silva responderia por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 17. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, Presidente do Grupo OAS ao tempo dos fatos, responderia por corrupção ativa e lavagem de dinheiro. 18. Agenor Franklin Magalhães Medeiros, Diretor da Construtora OAS, responderia por corrupção ativa. 19. Fábio Hori Yonamine, Presidente, Paulo Roberto Valente Gordilho, Diretor de Engenharia e Técnica, e Roberto Moreira Ferreira, Diretor Regional de Incorporação, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 4 de 317 todos da OAS Empreendimentos, por lavagem de dinheiro relacionada exclusivamente ao repasse do imóvel. 20. Paulo Tarciso Okamoto, Presidente do Instituto Lula, por lavagem de dinheiro relacionada exclusivamente ao pagamento das despesas de armazenamento. 21. Marisa Letícia Lula da Silva foi originariamente denunciada, mas faleceu no curso do processo, sendo declarada a extinção de punibilidade (evento 527 e 624). Contra a sentença, insurgiram-se o Ministério Público Federal, os réus condenados e o réu absolvido PAULO TARCISO OKAMOTTO, objetivando, este último, a modificação do fundamento da absolvição. Apesar de desnecessário, vale ressaltar que o presente voto foi dividido em diferentes partes para fins de sistematização e buscando maior clareza e precisão. Evidentemente que sua leitura há de ser feita por inteiro, não em tiras, vez que dispensável - o quanto possível - repetir-se argumentações, exames de provas e transcrições. 2. DAS PRELIMINARES 2.1. Incompetência do Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR A incompetência do Juízo da 13ª Vara Federal é invocada com as seguintes argumentações: (a) usurpação de competência do Supremo Tribunal Federal, porque, na origem, eram investigadas condutas relacionadas a José Mohamed Janene no curso do mandato de Deputado Federal; (b) ausência de vínculo entre os contratos da Petrobras e o custeio da construção, reforma e decoração do triplex pela Construtora OAS, e o armazenamento do acervo presidencial (contrato Granero); (c) incompetência territorial para apuração dos crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro; (d) incompetência para julgar crimes contra sociedade de economia mista. A questão foi examinada nos itens 153 a 169 da sentença: 153. As Defesas questionaram a competência deste Juízo. 154. Ocorre que as mesmas questões já foram refutadas no julgamento das exceções de incompetência apresentadas pelas partes (exceções 5051562-04.2016.4.04.7000/PR e 5053657-07.2016.4.04.7000/PR, com cópia no evento 570). 155. Remetem-se aos fundamentos daquelas decisões. 156. Muito sinteticamente, destaquem-se alguns pontos. 157. A competência é da Justiça Federal. 158. Segundo a denúncia, vantagens indevidas acertadas em contratos da Petrobrás com o Grupo OAS teriam sido direcionadas ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em razão de seu cargo. 159. Não importa que a Petrobrás seja sociedade de economia mista quando as propinas, segundo a acusação, eram direcionadas a agente público federal. 160. Fosse ainda Luiz Inácio Lula da Silva Presidente da República a competência seria do Egrégio Supremo Tribunal Federal. 161. Não mais ele exercendo o mandato, a competência passa a ser da Justiça Federal, pois, como objeto da denúncia, tem-se corrupção de agente público federal. 162. Por outro lado, o crime teria sido praticado, segundo a denúncia, no âmbito do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, no qual contratos da Petrobrás com suas principais fornecedoras, como a Construtora OAS, geravam vantagem indevida que eram repartidos entre agentes da Petrobrás e agentes e partidos políticos. 163. O esquema criminoso também envolveria ajustes fraudulentos de licitações entre as fornecedoras da Petrobrás. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 5 de 317 164. Há todo um contexto e que já foi reconhecido pelo Tribunal de Apelação e pelos Tribunais Superiores de que esses casos são conexos e demandam análise conjunta, por um mesmo Juízo, sob risco de dispersão da prova. 165. Ilustrativamente, o Egrégio Supremo Tribunal Federal tem sistematicamente enviado para este Juízo processos desmembrados ou provas colhidas relativas a este mesmo esquema criminoso. Para ficar em um só exemplo, cite-se a ação penal proposta contra o ex-Deputado Federal Eduardo Cosentino da Cunha no Inquérito 4146 e que, após a cassação do mandato, foi remetida a este Juízo, onde tomou o nº 505160623.2016.404.7000/PR. 166. Por outro lado, este Juízo tornou-se prevento para estes casos pois a investigação iniciou-se a partir de crime de lavagem de dinheiro consumado em Londrina/PR e que, supervenientemente, foi objeto da ação penal 5047229-77.2014.404.7000/PR (copia da sentença no evento 847). 167. Destaque-se ainda a conexão estreita da presente ação penal com os crimes que foram objeto da ação penal 5083376-05.2014.404.7000/PR na qual foram condenados por corrupção e lavagem de dinheiro os dirigentes da OAS JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e Agenor Franklin Magalhães Medeiros pelo pagamento de vantagem indevida e ocultação e dissimulação dela ao Diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa em contratos do Consórcio CONPAR e do Consócio RNEST/CONEST (cópia da sentença no evento 847). Segundo a denúncia, essa mesma contratação e os mesmos acertos de propina teriam gerado créditos que teriam beneficiado o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sendo, portanto, a conexão ainda mais estreita do que a verificada em relação aos demais casos abrangidos na denominada Operação Lavajato. 168. Não tem relevância, para competência, os questionamentos das Defesas de Luiz Inácio Lula da Silva e de Paulo Tarciso Okamoto de que os crimes não teriam ocorrido ou não estariam relacionados ao esquema criminoso que vitimou a Petrobrás. Na definição da competência, não cabe análise de mérito, mas somente dos termos da imputação. 169. Portanto, a competência é da Justiça Federal, pela existência de crimes federais, e especificamente deste Juízo pela prevenção e pela conexão e continência entre os processos que têm por objeto o esquema criminoso que vitimou a Petrobrás investigado no âmbito da assim denominada Operação Lavajato, entre eles a referida ação penal 5083376-05.2014.404.7000/PR, mas também outras em andamento. Não merece reparos a decisão no ponto. A questão foi amplamente examinada nas Exceções de Incompetência Criminal nºs 5051562-04.2016.4.04.7000/PR e 5053657-07.2016.4.04.7000/PR, pelo juízo de origem, nas seguintes tintas: Exceções de incompetência 5051562-04.2016.4.04.7000/PR e 505365707.2016.4.04.7000/PR 1. Trata-se de exceções de incompetência interpostas pelas Defesas do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Paulo Tarciso Okamotto em relação à ação penal 504651294.2016.4.04.7000/PR e reunidas para julgamento conjunto. Alegam em síntese: a) que os fatos narrados na denúncia ocorreram em São Paulo/SP; b) que não se pretende questionar a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba para os crimes apurados na Operação Lavajato (Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva), mas que os fatos narrados na denúncia não têm relação com eventuais crimes havidos na Petrobrás; c) que a Petróleo Brasileiro S/A - Petrobrás é sociedade de economia mista e crimes contra ela cometidos são de competência da Justiça Estadual; d) que no inquérito 2006.7000018662-8 que deu origem à investigação houve usurpação de competência do Supremo Tribunal Federal pois se investigava o Deputado Federal José Janene e os fatos teriam ocorrido em São Paulo; e) que foram colhidas provas ilícitas no início da investigação de José Janene, consistente em interceptação de diálogo entre advogado e cliente; f) que não há conexão entre os crimes e que a maioria dos fatos criminosos na Operação Lavajato ocorreu em São Paulo. Ouvido, o MPF manifestou-se pela improcedência das exceções. Decido em conjunto. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 6 de 317 2. A exceção de incompetência presta-se à discussão, por óbvio, da competência. A ressalva é relevante pois a exceção apresentada pela Defesa de Paulo Okamoto veicula, um tanto quanto confusamente, uma série de questões, como alegações de ilicitudes de provas, invalidades de prisões ou de diligências probatórias, que não têm qualquer relação com competência. Essas questões devem ser apresentadas pela Defesa, se for o caso, na ação penal e não na exceção de incompetência. Não serão, portanto, aqui tratadas. Transcreve-se, por oportuno, a síntese da denúncia formulada na ação penal 504651294.2016.4.04.7000/PR que foi efetuada na decisão de recebimento (evento 28): 'A denúncia tem por base os inquéritos 5035204-61.2016.4.04.7000/PR e 504955714.2013.404.7000/PR, e processos conexos, entre eles o processo 500661729.2016.4.04.7000/PR. A denúncia é extensa, sendo oportuna síntese. 2. Tramitam por este Juízo diversos inquéritos, ações penais e processos incidentes relacionados à assim denominada Operação Lavajato. Em grande síntese, na evolução das apurações, foram colhidas provas, em cognição sumária, de um grande esquema criminoso de corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito da empresa Petróleo Brasileiro S/A - Petrobras cujo acionista majoritário e controlador é a União Federal. Grandes empreiteiras do Brasil, especificamente a OAS, Odebrecht, UTC, Camargo Correa, Techint, Andrade Gutierrez, Mendes Júnior, Promon, MPE, Skanska, Queiroz Galvão, IESA, Engevix, SETAL, GDK e Galvão Engenharia, teriam formado um cartel, através do qual, por ajuste prévio, teriam sistematicamente frustrado as licitações da Petrobras para a contratação de grandes obras, e pagariam sistematicamente propinas a dirigentes da empresa estatal calculadas em percentual sobre o contrato. O ajuste prévio entre as empreiteiras eliminava a concorrência real das licitações e permitia que elas impusessem o seu preço na contratação, observados apenas os limites máximos admitidos pela Petrobrás (de 20% sobre a estimativa de preço da estatal). Os recursos decorrentes dos contratos com a Petrobrás, que foram obtidos pelos crimes de cartel e de ajuste de licitação crimes do art. 4º, I, da Lei nº 8.137/1990 e do art. 90 da Lei nº 8.666/1993, seriam então submetidos a condutas de ocultação e dissimulação e utilizados para o pagamento de vantagem indevida aos dirigentes da Petrobrás para prevenir a sua interferência no funcionamento do cartel. A prática, de tão comum e sistematizada, foi descrita por alguns dos envolvidos como constituindo a 'regra do jogo'. Receberiam propinas dirigentes da Diretoria de Abastecimento, da Diretoria de Engenharia ou Serviços e da Diretoria Internacional, especialmente Paulo Roberto Costa, Renato de Souza Duque, Pedro José Barusco Filho, Nestor Cuñat Cerveró e Jorge Luiz Zelada. Surgiram, porém, elementos probatórios de que o caso transcende a corrupção - e lavagem decorrente - de agentes da Petrobrás, servindo o esquema criminoso para também corromper agentes políticos e financiar, com recursos provenientes do crime, partidos políticos. Aos agentes e partidos políticos cabia dar sustentação à nomeação e à permanência nos cargos da Petrobrás dos referidos Diretores. Para tanto, recebiam remuneração periódica. Entre as empreiteiras, os Diretores da Petrobrás e os agentes políticos, atuavam terceiros encarregados do repasse das vantagens indevidas e da lavagem de dinheiro, os chamados operadores. Nesse quadro amplo, vislumbra o MPF uma grande organização criminosa formada em um núcleo pelos dirigentes das empreiteiras, em outro pelos executivos de alto escalão da Petrobrás, no terceiro pelos profissionais da lavagem e o último pelos agentes políticos que recebiam parte das propinas. A presente ação penal tem por objeto uma fração desses crimes. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 7 de 317 Em nova grande síntese, alega o Ministério Público Federal que o ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva teria participado conscientemente do esquema criminoso, inclusive tendo ciência de que os Diretores da Petrobrás utilizavam seus cargos para recebimento de vantagem indevida em favor de agentes políticos e partidos políticos. A partir dessa afirmação, alega o MPF que, como parte de acertos de propinas destinadas a sua agremiação política em contratos da Petrobrás, o Grupo OAS teria concedido, em 2009, ao Ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada na entrega do apartamento 164-A do Edifício Solaris, de matrícula 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP, bem como, a partir de 2013, em reformas e benfeitorias realizadas no mesmo imóvel, sem o pagamento do preço. Estima os valores da vantagem indevida em cerca de R$ 2.424.991,00, assim discriminada, R$ 1.147.770,00 correspondente entre o valor pago e o preço do apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em benfeitorias e na aquisição de bens para o apartamento. Na mesma linha, alega que o Grupo OAS teria concedido ao ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada no pagamento das despesas, de R$ 1.313.747,00, havidas no armazenamento entre 2011 e 2016 de bens de sua propriedade ou recebidos como presentes durante o mandato presidencial. Em ambos os casos, teriam sido adotados estratagemas subreptícios para ocultar as transações. Estima o MPF que o total pago em propinas pelo Grupo OAS decorrente das contratações dele pela Petrobrás, especificamente no Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, alcance R$ 87.624.971,26. Destes valores, R$ 3.738.738,00 teriam sido destinados especificamente ao exPresidente É a síntese da denúncia.' Questionam as Defesas a competência deste Juízo, alegando que os fatos não ocorreram da forma descrita pelo MPF e que o apartamento 164-A, a reformas dele e o pagamento das despesas de armazenagem dos bens do ex-Presidente não constituem vantagem indevida e que não tem qualquer relação com os contratos da Petrobrás. Ocorre que estes questionamentos são próprios ao mérito e só podem ser resolvidos no julgamento. A tese veiculada na denúncia é a de que o ex-Presidente teria responsabilidade criminal direta pelo esquema criminoso que vitimou a Petrobrás e que as supostas benesses por ele recebidas da OAS, doação simulada de apartamento, reforma do apartamento e pagamento das despesas de armazenagem estariam vinculadas a ele, representariam vantagem indevida auferida pelo ex-Presidente. Se essa tese é correta ou não, é uma questão de prova e que não pode ser definida antes do julgamento da ação penal e muito menos pode ser avaliada em exceção de incompetência. Mas a tese da denúncia, que atribui ao ex-Presidente responsabilidade criminal pelo ocorrido na Petrobrás e vincula às benesses aos crimes cometidos contra a estatal, é suficiente, nessa fase, para determinar a competência deste Juízo, igualmente responsável, conforme jurisprudência já consolidada, inclusive das Cortes Superiores, para o processo e julgamento dos crimes praticados no esquema criminoso que vitimou a Petrobrás. Rigorosamente, a própria Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, nessa exceção, esclareceu que não se pretende 'questionar a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba para apurar outros delitos, iniciados ou consumados fora do Paraná, que se ligam à Operação Lavajato'. De todo modo e considerando que essa não é a posição da Defesa de Paulo Okamoto, esclareça-se que tramitam por este Juízo diversos inquéritos, ações penais e processos incidentes relacionados à assim denominada Operação Lavajato. Em grande síntese, na evolução das apurações, foram colhidas provas, em cognição sumária, de um grande esquema criminoso de cartel, fraude, corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito da empresa Petróleo Brasileiro S/A - Petrobras cujo acionista majoritário e controlador é a União Federal. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 8 de 317 Grandes empreiteiras do Brasil, entre elas a OAS, UTC, Camargo Correa, Odebrecht, Andrade Gutierrez, Mendes Júnior, Queiroz Galvão, Engevix, SETAL, Galvão Engenharia, Techint, Promon, MPE, Skanska, IESA e GDK teriam formado um cartel, através do qual teriam sistematicamente frustrado as licitações da Petrobras para a contratação de grandes obras. Além disso, as empresas componentes do cartel, pagariam sistematicamente propinas a dirigentes da empresa estatal calculadas em percentual, de um a três por cento em média, sobre os grandes contratos obtidos e seus aditivos. A prática, de tão comum e sistematizada, foi descrita por alguns dos envolvidos como constituindo a 'regra do jogo'. Receberiam propinas dirigentes da Diretoria de Abastecimento, da Diretoria de Engenharia ou Serviços e da Diretoria Internacional, especialmente Paulo Roberto Costa, Renato de Souza Duque, Pedro José Barusco Filho, Nestor Cuñat Cerveró e Jorge Luiz Zelada. Surgiram, porém, elementos probatórios de que o caso transcende a corrupção - e lavagem decorrente - de agentes da Petrobrás, servindo o esquema criminoso para também corromper agentes políticos e financiar, com recursos provenientes do crime, partidos políticos. Aos agentes e partidos políticos cabia dar sustentação à nomeação e à permanência nos cargos da Petrobrás dos referidos Diretores. Para tanto, recebiam remuneração periódica. Entre as empreiteiras, os Diretores da Petrobrás e os agentes políticos, atuavam terceiros encarregados do repasse das vantagens indevidas e da lavagem de dinheiro, os chamados operadores. É possível realizar afirmação mais categórica em relação aos casos já julgados. Destaco, entre outras, as ações penais 5083258-29.2014.4.04.7000/PR, 508337605.2014.4.04.7000/PR, 5083838-59.2014.4.04.7000/PR, 5012331-04.2015.4.04.7000/PR, 5083401-18.2014.4.04.7000/PR, 5083360-51.2014.404.7000/PR, 508335189.2014.404.7000/PR e 5036528-23.2015.4.04.7000/PR, nas quais restou comprovado, conforme sentenças, o pagamento de milhões de reais e de dólares em propinas por dirigentes das empreiteiras Camargo Correa, OAS, Mendes Júnior, Setal Óleo e Gás, Galvão Engenharia, Engevix Engenharia e Odebrecht a agentes da Diretoria de Abastecimento e da Diretoria de Engenharia da Petrobrás. Merecem igualmente referência as sentenças prolatadas nas ações penais 502313531.2015.4.04.7000/PR, 5023162-14.2015.4.04.7000/PR e 5045241-84.2015.4.04.7000/PR, nas quais foram condenados por crime de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, os exparlamentares federais Pedro da Silva Correa de Oliveira Andrade Neto, João Luiz Correia Argolo dos Santos e José Dirceu de Oliveira e Silva, por terem, em síntese, recebido e ocultado recursos provenientes do esquema criminoso. Além dos casos já julgados, tramitam várias outras ações penais e inquéritos sobre o esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, como, v.g., as ações penais 505160623.2016.404.7000/PR e 5063271-36.2016.4.04.7000/PR. Por outro lado, a investigação do esquema criminoso, com origem nos inquéritos 2009.7000003250-0 e 2006.7000018662-8, iniciou-se com a apuração de crime de lavagem consumado em Londrina/PR, sujeito, portanto, à jurisdição desta Vara, tendo o fato originado a ação penal 5047229-77.2014.404.7000/PR. Apesar dos questionamentos da Defesa de Paulo Okamoto quanto à competência deste Juízo para os próprios inquéritos originários, resta claro, como se verifica na própria sentença prolatada na ação penal 5047229-77.2014.404.7000/PR (evento 556 da ação penal), que a competência sobre os fatos inicialmente apurados era deste Juízo, pois produto de crimes de corrupção, especificamente propina recebida pelo ex-deputado federal José Janene, foi, por operações de ocultação e dissimulação, utilizada para a realização de investimentos industriais em Londrina/PR, no que ele contou com o auxílio de Alberto Youssef e Carlos Habib Chater condenados naquele feito. Esta 13ª Vara Federal de Curitiba, por força de especialização determinada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, é competente para o processo e julgamento de crimes de lavagem de dinheiro ocorridos no território paranaense. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 9 de 317 Assim, perante este Juízo, foi distribuído o primeiro processo que tinha como objeto crimes relacionados ao esquema criminoso da Petrobrás, esses primeiros, aliás, consumados em Londrina/PR, tornando-o prevento para todo os demais. Quanto à alegação da Defesa de Paulo Okamoto de que maioria dos crimes teria ocorrido em São Paulo, não é ela seguida da demonstração necessária, já que os fatos havidos no esquema criminoso da Petrobrás ocorreram em todo o território nacional e até mesmo no exterior, inviabilizando qualquer contabilização precisa. Não obstante, como já também argumentado por este Juízo em outros casos, na perspectiva dos crimes praticados por Alberto Youssef, poderia ser reconhecida não apenas conexão e continência entre os crimes, mas continuidade delitiva entre diversos atos de lavagem, com o que o critério de fixação da competência é a prevenção, conforme art. 71 do CPP, e não o local da prática do maior número de crimes, ainda que incerto. Por outro lado, é muito difícil negar a vinculação entre todos esses casos que compõem o esquema criminoso que vitimou a Petrobrás. O próprio cartel das empreiteiras e o ajuste fraudulento de licitações, que compreende necessariamente empreitada coletiva, teria sua apuração inviabilizada se houvesse a dispersão dos processos e das provas em todo o território nacional. Mecanismos comuns de pagamento de propina e de lavagem de dinheiro foram utilizados nesses casos. Ilustrativamente, considerando os casos já julgados, o profissional da lavagem Alberto Youssef intermediou o pagamento de propinas para várias empreiteiras, como a Camargo Correa, a OAS, a Engevix, a Galvão Engenharia e a Braskem. De forma semelhante, Mario Frederico de Mendonça Goes teria intermediado propinas para Pedro José Barusco Filho não só provenientes da Andrade Gutierrez, mas de outras empresas, como da OAS. Dirigentes da Petrobrás já condenados por corrupção passiva usaram os mesmos mecanismos para receber propina, contas secretas mantidas no exterior, por exemplo, o ex-Diretor Paulo Roberto Costa nelas recebeu valores da Odebrecht e da Andrade Gutierrez, às vezes nas mesmas contas. Enfim, os elementos de vinculação são vários e óbvios e o conjunto probatório comum, com o que o reconhecimento da conexão e continência entre os casos, bem como eventualmente a continuidade delitiva, com a consequente reunião dos processos, é medida necessária para evitar dispersão de provas e julgamentos contraditórios. O próprio Egrégio Supremo Tribunal Federal tem sistematicamente enviado a este Juízo processos relativos a esse esquema criminoso que vitimou a Petrobrás em decorrência de desmembramentos de investigações perante ele instauradas, bem como provas colhidas a respeito dele. Isso ocorreu, por exemplo, com as provas resultantes dos acordos de colaboração de Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef, Nestor Cuñat Cerveró, Ricardo Ribeiro Pessoa e os dos executivos da Andrade Gutierrez. Diversos inquéritos ou processos envolvendo a apuração de crimes do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás foram objetos de desmembramento pelo Supremo Tribunal Federal e posterior remessa a este Juízo, como v.g., ocorreu quando do desmembramento das apurações nas Petições 5678 e 6027, com remessa a este Juízo dos elementos probatórios em relação ao ex-Senador Jorge Afonso Argello. Até mesmo ações penais que têm por objeto fatos do âmbito do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás têm sido desmembradas e remetidas a este Juízo para prosseguimento quanto aos destituídos de foro. O mesmo tem ocorrido com ações penais quando há perda superveniente do foro por prerrogativa de função, como ocorreu com a ação penal proposta contra o ex-Deputado Federal Eduardo Cosentino da Cunha no Inquérito 4146 e que, após a cassação do mandato, foi remetida a este Juízo, onde tomou o nº 505160623.2016.404.7000/PR. Aliás, os próprios inquéritos 5003496-90.2016.404.7000/PR, 500659738.2016.404.7000/PR e 5054533-93.2015.404.7000/PR, nos quais se apuram eventuais crimes do ex-Presidente, foram remetidos ao Egrégio Supremo Tribunal Federal em decorrência da nomeação do investigado como Ministro Chefe da Casa Civil, sendo devolvidos a este Juízo após a perda do foro por prerrogativa de função. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 10 de 317 Todos esses casos e exemplos indicam o posicionamento daquela Suprema Corte de que este Juízo é competente para processar e julgar os crimes investigados e processados no âmbito do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás. Também o Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado por reconhecer a competência deste Juízo ainda que provisoriamente, como se verifica na ementa do acórdão prolatado em 25/11/2014 no HC 302.604: 'PENAL. PROCESSO PENAL. CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO A RECURSO PRÓPRIO. OPERAÇÃO 'LAVA JATO'. PACIENTE PRESO PREVENTIVAMENTE E DEPOIS DENUNCIADO POR INFRAÇÃO AO ART. 2º DA LEI N. 12.850/2013; AOS ARTS. 16, 21, PARÁGRAFO ÚNICO, E 22, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, TODOS DA LEI N. 7.492/1986, NA FORMA DOS ARTS. 29 E 69, AMBOS DO CÓDIGO PENAL; BEM COMO AO ART. 1º, CAPUT, C/C O § 4º, DA LEI N. 9.613/1998, NA FORMA DOS ARTS. 29 E 69 DO CÓDIGO PENAL. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 01. De ordinário, a competência para processar e julgar ação penal é do Juízo do 'lugar em que se consumar a infração ' (CPP, art. 70, caput). Será determinada, por conexão, entre outras hipóteses, 'quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração ' (art. 76, inc. III).Os tribunais têm decidido que: I) 'Quando a prova de uma infração influi direta e necessariamente na prova de outra há liame probatório suficiente a determinar a conexão instrumental '; II) 'Em regra a questão relativa à existência de conexão não pode ser analisada em habeas corpus porque demanda revolvimento do conjunto probatório, sobretudo, quando a conexão é instrumental; todavia, quando o impetrante oferece prova pré-constituída, dispensando dilação probatória, a análise do pedido é possível ' (HC 113.562/PR, Min. Jane Silva, Sexta Turma, DJe de 03/08/09). 02. Ao princípio constitucional que garante o direito à liberdade de locomoção (CR, art. 5º, LXI) se contrapõe o princípio que assegura a todos direito à segurança (art. 5º, caput), do qual decorre, como corolário lógico, a obrigação do Estado com a 'preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio ' (CR, art. 144).Presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva não viola o princípio da presunção de inocência. Poderá ser decretada para garantia da ordem pública - que é a 'hipótese de interpretação mais ampla e flexível na avaliação da necessidade da prisão preventiva. Entende-se pela expressão a indispensabilidade de se manter a ordem na sociedade, que, como regra, é abalada pela prática de um delito. Se este for grave, de particular repercussão, com reflexos negativos e traumáticos na vida de muitos, propiciando àqueles que tomam conhecimento da sua realização um forte sentimento de impunidade e de insegurança, cabe ao Judiciário determinar o recolhimento do agente ' (Guilherme de Souza Nucci). Conforme Frederico Marques, 'desde que a permanência do réu, livre ou solto, possa dar motivo a novos crimes, ou cause repercussão danosa e prejudicial ao meio social, cabe ao juiz decretar a prisão preventiva como garantia da ordem pública '. Nessa linha, o Superior Tribunal de Justiça (RHC n. 51.072, Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 10/11/14) e o Supremo Tribunal Federal têm proclamado que 'a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa, enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva' (STF, HC n. 95.024, Min. Cármen Lúcia; Primeira Turma, DJe de 20.02.09). 03. Havendo fortes indícios da participação do investigado em 'organização criminosa' (Lei n. 12.850/2013), em crimes de 'lavagem de capitais' (Lei n. 9.613/1998) e 'contra o sistema financeiro nacional (Lei n. 7.492/1986), todos relacionados a fraudes em processos licitatórios das quais resultaram vultosos prejuízos a sociedade de economia mista e, na mesma proporção, em seu enriquecimento ilícito e de terceiros, justifica-se a decretação da prisão preventiva como garantia da ordem pública. Não há como substituir a prisão preventiva por https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 11 de 317 outras medidas cautelares (CPP, art. 319) 'quando a segregação encontra-se justificada na periculosidade social do denunciado, dada a probabilidade efetiva de continuidade no cometimento da grave infração denunciada ' (RHC n. 50.924/SP, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 23/10/2014). 04. Habeas corpus não conhecido.' (HC 302.604/PR - Rel. Min. Newton Trisotto 5.ª Turma do STJ - un. - 25/11/2014) Por algum motivo obscuro, a Defesa de Paulo Okamoto afirma, na inicial da exceção, que este Juízo teria cometido uma 'flagrante falsidade' ao citar o referido acórdão (fl. 69), mas como se verifica na ementa a questão da competência foi incidentemente apreciada. Por outro lado, os fatos narrados na denúncia tem ainda mais estreita conexão com os fatos que constituem objeto da ação penal 5083376-05.2014.4.04.7000/PR, na qual foram condenados criminalmente dirigentes da Construtora OAS por acertos e pagamento de propinas a agentes da Petrobrás nos contratos da Petrobrás com o Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e com o Consórcio CONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR. Afirma que as propinas acertadas nesses contratos teriam também servido como justificativa para as benesses em favor do ex-Presidente. Esclareça-se, por fim, que a competência é da Justiça Federal, pois, na assim denominada Operação Lavajato, há uma série de crime de competência da Justiça Federal. Por exemplo, crimes de corrupção e lavagem de dinheiro transnacionais. Com efeito, diversas ações penais tem por objeto crimes de corrupção que envolveriam pagamentos no exterior e ocultação de valores em contas secretas no exterior. Se os crimes têm caráter transnacional, ou seja iniciaram-se no Brasil e consumaram-se no exterior, isso atrai a competência da Justiça Federal. Afinal, o Brasil assumiu o compromisso de prevenir ou reprimir os crimes de corrupção e de lavagem transnacional, conforme Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção de 2003 e que foi promulgada no Brasil pelo Decreto 5.687/2006. Havendo previsão em tratado e sendo os crimes transnacionais, incide o art. 109, V, da Constituição Federal, que estabelece o foro federal como competente. Da mesma forma, no conjunto de fatos em apuração, há pagamento de propinas a parlamentares federais, como ilustram os casos já julgados relativamente aos parlamentares que supervenientemente perderam o mandato e o foro, o que por si só também define o foro federal como competente. Não se deve ainda olvidar que, segundo a denúncia, as benesses teriam sido concedidas pela OAS ao ex-Presidente em razão do cargo dele. Se atualmente ainda exercesse o mandato, a competência seria do Egrégio Supremo Tribunal Federal. Como não mais exerce, a competência passa a ser da Justiça Federal, pois haveria crime de corrupção de agente público federal. Assim, ainda que Petrobrás seja sociedade de economia mista, se, na ação penal e no conjunto de fatos investigados na Operação Lavajato, há crimes federais, a competência é da Justiça Federal. Portanto, a competência é da Justiça Federal e especificamente deste Juízo pela prevenção. 3. Ante o exposto, julgo improcedentes as exceções de incompetência. Traslade-se cópia desta decisão para os autos da exceção 5053657-07.2016.4.04.7000/PR e da ação penal 5046512-94.2016.4.04.7000/PR. O juízo de primeiro grau examinou com exaustão as circunstâncias que firmam a sua competência para julgamento de processos relacionados à 'Operação LavaJato', notadamente aqueles que envolvem ilícitos cometidos em desfavor da Petrobras. A denúncia é clara ao relatar elos entre os contratos da Construtora OAS firmados com a Petrobras (destacadamente nos Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e CONPAR, em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR) e as vantagens ilícitas obtidas pelos réus em razão de tais contratos. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 12 de 317 2.1.1. A alegação de usurpação de competência do Supremo Tribunal Federal pela 13ª Vara Federal de Curitiba/PR não se sustenta. Os apelantes referem que no início do caso se investigava abertamente o então Deputado Federal José Janene, em pleno exercício de cargo, o que lhe garantia prerrogativa de foro, pelo que a competência seria do Supremo Tribunal Federal e em conexão ao chamado 'Caso Mensalão' (AP nº 470). Argumentam que os supostos crimes de corrupção e organização criminosa, conforme a descrição contida na inicial, envolveriam membros do Congresso Nacional. Não obstante a coincidência de alguns personagens na 'Operação Lava-Jato' e no 'Mensalão', não há conexão instrumental que justifique a unidade de processamento dos feitos, até porque o chamado 'processo do Mensalão' já foi objeto de julgamento, com trânsito em julgado da decisão condenatória. Tampouco há competência originária da Suprema Corte para julgar o presente processo em relação àqueles agentes que não possuem prerrogativa de foro. Ao julgar incidente relativo à 'Operação Lava-Jato', o STF determinou o desmembramento quanto aos investigados que têm foro por prerrogativa de função em relação àqueles que não o tem. Isto decorre da recente modificação da jurisprudência do Tribunal Excelso que passou a determinar a cisão dos processos em que há investigados (ou réus) em relação àqueles que não o tem. A decisão proferida pela mais elevada Corte, no caso específico da 'Operação Lava-Jato', restou assim ementada: AÇÃO PENAL. QUESTÃO DE ORDEM. COMPETÊNCIA POR PRERROGATIVA DE FORO. DESMEMBRAMENTO DE INVESTIGAÇÕES E AÇÕES PENAIS. PRERROGATIVA PRÓPRIA DA SUPREMA CORTE. 1. O Plenário desta Suprema Corte mais de uma vez já decidiu que 'é de ser tido por afrontoso à competência do STF o ato da autoridade reclamada que desmembrou o inquérito, deslocando o julgamento do parlamentar e prosseguindo quanto aos demais'(Rcl 1121, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em 04/05/2000, DJ 16-06-2000 PP-00032 EMENT VOL-01995-01 PP-00033). Nessa linha de entendimento, decidiu o Plenário também que, 'até que esta Suprema Corte procedesse à análise devida, não cabia ao Juízo de primeiro grau, ao deparar-se, nas investigações então conjuntamente realizadas, com suspeitos detentores de prerrogativa de foro - em razão das funções em que se encontravam investidos -, determinar a cisão das investigações e a remessa a esta Suprema Corte da apuração relativa a esses últimos, com o que acabou por usurpar competência que não detinha' (Rcl 7913 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 12/05/2011, DJe-173 DIVULG 08-09-2011 PUBLIC 09-09-2011EMENT VOL-02583-01 PP-00066). 2. Por outro lado, a atual jurisprudência do STF é no sentido de que as normas constitucionais sobre prerrogativa de foro devem ser interpretadas restritivamente, o que determina o desmembramento do processo criminal sempre que possível, mantendo-se sob a jurisdição especial, em regra e segundo as circunstâncias de cada caso, apenas o que envolva autoridades indicadas na Constituição (Inq 3515 AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 13/02/2014). 3. No caso, acolhe-se a promoção do Procurador-Geral da República, para determinar o desmembramento dos procedimentos em que constam indícios de envolvimento de parlamentar federal, com a remessa dos demais à primeira instância, aí incluídas as ações penais em andamento. (AP 871 QO, Relator Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 10/06/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 13 de 317 Do voto do relator, colhe-se: De fato, nas investigações em que figuram outros supostos 'doleiros' que não Alberto Youssef (Carlos Habib Chater: Inquérito Policial 714/2009 - 2006.70.00.018662-8, Pedido de Busca e Apreensão 5001438-85.2014.404.7000/PR e Interceptação Telefônica 5026387-13.2013.404.7000/PR; Nelma Kodama: Inquérito Policial 1000/2013-504840188.2013.404.7000/PR, Pedido de Busca e Apreensão 5001461-31.2014.404.7000/PR e Interceptação Telefônica 5048457-24.2013.404.7000/PR; Raul Srour: Inquérito Policial 1002/2014 5048550-84.2013.404.7000/PR, Pedido de Busca e Apreensão 500144310.2014.404.7000/PR e Interceptação Telefônica 5049747-74.2013.404.7000/PR), não há notícia de participação de autoridade com foro por prerrogativa de função, de modo que não há razão para a manutenção de tais procedimentos no Supremo Tribunal Federal. (...) Registre-se que, embora as denúncias oferecidas nessas ações penais e seu respectivo recebimento tenham ocorrido alguns dias após 17 de abril de 2014, é certo afirmar, ademais, que foram baseadas em elementos probatórios colhidos em data anterior. Também em relação a elas, portanto, não há razão para submetê-las à jurisdição do STF, devendo ser remetidas ao juízo de primeiro grau para que lá reassumam seu curso a partir do estado em que se encontram, o que não inibe, convém enfatizar, que a higidez dos atos e provas nelas produzidos venha a receber o controle jurisdicional apropriado, se for o caso. Nos autos da Reclamação nº 17.623 e da Ação Penal nº 871 foi reafirmada a competência do Juízo de primeiro grau. O E. Superior Tribunal de Justiça seguiu na mesma linha ao julgar o HC nº 302.604/PR. Houvesse conexão e vinculação com autoridades com prerrogativa de função, nada justificaria, por exemplo, a distribuição de processos de forma livre no Supremo Tribunal Federal, sendo imperioso lembrar que, com a aposentadoria do Ministro Joaquim Barbosa, a Ação Penal nº 470 (e demais conexas, v.g., execuções) passou à relatoria do Ministro Roberto Barroso, enquanto que os novos processos, originados da denominada 'Operação Lava-Jato', foram distribuídos ao saudoso Ministro Teori Zavascki, hoje sob relatoria do Ministro Edson Fachin. Pedidos análogos já foram enfrentados pela 8ª Turma desta Casa nos julgamentos dos HCs nºs 5022894-42.2014.404.0000/PR, 5027273-89.2015.4.04.0000/PR e 5048957-70.2015.4.04.0000/PR. O nome de José Janene só veio à tona no ano de 2009, quando já não exercia mais o mandato parlamentar. Havia investigação com relação à empresa Angel Serviços Terceirizados Ltda. e a Torre Comércio de Alimentos Ltda., em virtude seu suposto emprego para lavagem de dinheiro de José Janene. O próprio Supremo Tribunal Federal, nos autos do Inquérito nº 2.245 que impulsionou a Ação Penal nº 470 ('Mensalão'), afastou a alegação de nulidade, assentando: (...) TERCEIRA PRELIMINAR. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO DECRETADA PELO MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU. INEXISTÊNCIA, À ÉPOCA, DE INVESTIGADOS COM FORO PRIVILEGIADO. COMPETÊNCIA. VALIDADE DOS ATOS. POSTERIOR RATIFICAÇÃO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Quando o magistrado de 1º grau autorizou a quebra do sigilo bancário e fiscal das pessoas físicas e jurídicas investigadas, ainda não havia qualquer indício da participação ativa e concreta de agente político ou autoridade detentora de prerrogativa de foro nos fatos sob investigação. Fatos novos, posteriores àquela primeira decisão, levaram o magistrado a declinar de sua competência e remeter os autos ao Supremo Tribunal Federal. Recebidos os autos, no https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 14 de 317 Supremo Tribunal Federal, o então Presidente da Corte, no período de férias, reconheceu a competência do Supremo Tribunal Federal e ratificou as decisões judiciais prolatadas pelo magistrado de primeiro grau nas medidas cautelares de busca e apreensão e afastamento do sigilo bancário distribuídas por dependência ao inquérito. Rejeitada a preliminar de nulidade das decisões proferidas pelo juiz de 1ª. instância. (...) (Inq 2245, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 28/08/2007, DJe-139 DIVULG 08-11-2007 PUBLIC 09-11-2007 DJ 09-11-2007 PP-00038 EMENT VOL-0229801 PP-00001 RTJ VOL-00203-02 PP-00473). DESTAQUEI Nessa linha, e com particular norte no entendimento registrado pelo Supremo Tribunal Federal, não prospera a alegação de nulidade invocada pela defesa em face da prerrogativa de foro do então Deputado José Mohamed Janene. Vale recordar que, no início da 'Operação Lava-Jato', por conta de liminar deferida pelo Ministro Teori Zavascki no bojo da Reclamação nº 17.623/PR, os autos foram remetidos ao E. Supremo Tribunal Federal com objetivo de examinar eventual usurpação de competência. Posteriormente, a 2ª Turma do Egrégio Supremo Tribunal Federal, apreciando Questões de Ordem suscitadas nas Ações Penais nºs 871 a 878, decidiu, por unanimidade, seguindo voto do e. relator, que a competência para processo e julgamento das ações penais e para o processo das investigações era da primeira instância, porque inexistente no pólo passivo ou como investigados autoridades com foro privilegiado. O tema foi submetido a este Tribunal no HC nº 501202838.2015.404.0000/PR. Na oportunidade, a 8ª Turma não conheceu da impetração por inexistência de flagrante ilegalidade com aptidão para abrir espaço à via especial do habeas corpus, mas enfrentou o tema: HABEAS CORPUS. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. DECISÕES MOTIVADAS. ILEGALIDADE. INOCORRÊNCIA. COMPETÊNCIA POR PREVENÇÃO. NULIDADE RELATIVA. PRECLUSÃO. DISCUSSÃO DE NULIDADE DE PROVAS. DILAÇÃO PROBATÓRIA. 1. Não cabe qualquer recurso contra a decisão que rejeita exceção de incompetência do juízo, Inobstante isso, objetivando evitar que o investigado e/ou réu seja processado por juízo incompetente, admite-se o uso do habeas corpus. 2. A competência da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR para processo e julgamento das ações penais relativas à denominada Operação Lava-Jato já foi reconhecida pelos Tribunais Superiores, não cabendo a renovação da discussão nesta Corte, pela via do habeas corpus. 3. Eventual inobservância da competência por prevenção é relativa, devendo ser arguida no momento oportuno, sob pena de preclusão, nos termos da Súmula 706/STF. 4. Questões relativas à nulidade de prova demandam dilação probatória e, salvo hipóteses excepcionais, não podem ser discutidas na via estreita do habeas corpus. 5. Habeas corpus não conhecido. (TRF4, HABEAS CORPUS Nº 5012028-38.2015.404.0000, 8ª Turma, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 30/04/2015). DESTAQUEI Ao fundamentar a ausência de flagrante ilegalidade, tracei considerações a respeito das alegações defensivas. Confira-se: Consoante se observa, as decisões foram fundamentadas, e não há ilegalidade flagrante. Ao contrário, a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR para processo e julgamento das ações penais relativas à denominada Operação Lava-Jato já foi reconhecida pelos Tribunais Superiores, não cabendo a renovação da discussão nesta Corte, pela via do habeas corpus. Ademais, as alegações de que a autoridade impetrada teria violado as regras de distribuição de processos - além de não terem sido minimamente comprovadas, como se percebe da justificativa do magistrado, de que a prevenção foi determinada em https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 15 de 317 observância às regras legais -, não foram objeto de insurgência no momento oportuno e pelas partes interessadas, tratando-se, assim, de matéria preclusa. Com efeito, o paciente deste habeas corpus não era parte nos inquéritos ou demais incidentes vinculados ao PCD que, agora, pretende alegar que foi distribuído a Juiz incompetente. Acrescento, ainda, que em momento algum foi demonstrado o prejuízo que o paciente teria suportado acaso sua tese fosse verídica, ou seja, se fosse reconhecido, hoje, que naquela oportunidade houve, de fato, um equívoco no reconhecimento da prevenção, e que o IPL 714/2009 devesse ter sido remetido à 2ª Vara Federal de Curitiba. Note-se que se trata de competência relativa, como se vê da seguinte ementa: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA POR PREVENCÃO. NULIDADE RELATIVA. SÚMULA 706/STF. PRECLUSÃO. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM. OFENSA AO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO OCORRÊNCIA. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS. LEGITIMIDADE. 1. Nos termos da Súmula 706/STF, é relativa a nulidade decorrente da inobservância da competência penal por prevenção, a qual deve ser arguida oportuna e tempestivamente, sob pena de preclusão. Precedentes. 2. É legítima a prorrogação de interceptações telefônicas, desde que a decisão seja devidamente fundamentada e observe o art. 5º, XII, da Constituição Federal e a Lei 9.296/96. Eventual referência às decisões pretéritas não traduzem motivação deficiente quando demonstrado que as razões iniciais legitimadoras da interceptação subsistem e o contexto fático delineado pela parte requerente indique a sua necessidade, como único meio de prova, para elucidação do fato criminoso. 3. Recurso ordinário improvido.(STF, RHC 108926/DF, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Julgamento: 24/02/2015) GRIFEI A tese contida na impetração somente poderia ser aceita se demonstrado o efetivo prejuízo suportado pelo paciente, o que não ocorreu na espécie. Ademais, a tese defensiva funda-se em eventual 'manobra para evitar a concreta possibilidade de redistribuição do feito'. O argumento é completamente desarrazoado. Aceitar a tese de manipulação da distribuição significaria aceitar que o magistrado de primeiro grau antevia as dimensões que tomariam as investigações. Não somente isso, deveria ter ele ciência antecipada de que o Inquérito Policial nº 616/2004, à época, também da competência da 2ª Vara Federal (atual 13ª), seria redistribuído para a 3ª Vara Federal de Curitiba/PR, atualmente denominada 14ª Vara Federal. Sobre isso, aliás, cabe anotar que o extrato da movimentação processual indica que o Inquérito 2004.70.00.033532-7/PR foi redistribuído 'por sorteio' ao Juízo da 14ª Vara Federal de Curitiba/PR, cujo titular era o Juiz Federal Nivaldo Brunoni. Assim, ocorrendo a distribuição por sorteio, como poderia o magistrado prever a separação dos inquéritos? De fato, jamais poderia. Na verdade, a pretensão defensiva, a par do extenso arrazoado, calca-se quase que exclusivamente nas consequências da redistribuição por prevenção ao IPL nº 714/2006, ocorrida quando a 2ª Vara Federal de Curitiba/PR detinha competência exclusiva nos crimes financeiros. Todavia, não dedica muitos argumentos para defender que a distribuição efetivamente devesse ocorrer com relação ao IPL nº 616/2006. E, ainda que assim o fizesse, considerando que a distribuição por prevenção não tem aptidão para gerar nulidade absoluta, mas apenas relativa e sujeita à comprovação de prejuízo (Súmula nº 706/STF), há de se questionar até mesmo a legitimidade. Nada obstante, vale registrar que Alberto Youssef foi condenado na Ação Penal nº 2004.70.00.006806-4 a penas privativas de liberdade reduzidas em razão dos benefícios obtidos com o acordo de delação premiada. Também como decorrência, os demais processos por crimes financeiros ou de lavagem, todos da competência da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR ficaram sobrestados. Desse modo, ainda que a representação da autoridade policial fizesse menção ao IPL 616/2004, dizia respeito a alguns dos fatos apurados e registrava a necessidade de 'instauração de procedimento criminal diverso a investigar ALBERTO YOUSSEF e sua https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 16 de 317 relação com STAEL FERNANDA RODRIGUES JANENE, ROSA ALICE VALENTE e MEHEIDIN HUSSEIN JENANI'. Ou seja, em nenhum momento a autoridade policial refere eventual prevenção ao IPL 616/2004. Feitos tais esclarecimentos, é importante ressaltar que, além de não ver demonstrada qualquer ilegalidade nas decisões impugnadas, penso não ser possível sequer o conhecimento do habeas corpus. De tudo o que se vê, a controvérsia carece de suporte lógico. Não há como extrair da decisão primitiva do juízo de origem qualquer interesse na manutenção do feito sob a sua competência. Da análise da peça inicial verifica-se que, embora tenham os impetrantes discorrido longamente sobre todas as questões referentes à (in)competência da autoridade impetrada, o pedido é expressamente no sentido de ver reconhecida 'a ilicitude dos elementos de prova obtidos a partir do Procedimento Criminal Diverso nº 2006.70.00.018662-8/PR (IPL 714/2009), que é nulo desde sua origem por violação direta da garantia do Juiz Natural (artigo 5º, LIII, da Constituição da República), em afronta também ao devido processo legal (artigo 5º, LIV, da Constituição da República)'. Ora, impetrando habeas corpus contra decisão que rejeitou a exceção de incompetência, só pode a parte postular que, em segundo grau de jurisdição, seja reconhecida a alegada incompetência já rejeitada pelo magistrado, e não pretender que o resultado seja o reconhecimento de nulidade/ilicitude de provas. Com efeito, questões relativas à nulidade de prova demandam dilação probatória e, salvo hipóteses excepcionais, não podem ser discutidas na via estreita do habeas corpus. Sendo assim, o pedido deste habeas corpus encontra-se dissociado das razões apresentadas, sendo descabida a via eleita para discutir a pretendida nulidade das provas. Ainda que o tema dissesse respeito exclusivamente à competência, inexiste flagrante ilegalidade a atrair a intervenção pela via excepcional do habeas corpus. Trago à colação, por pertinente, a sucessão de eventos, processos e fatos que deram origem, no primeiro grau e depois nesta Corte, à competência da 13ª Vara Federal e desta 8ª Turma, nos termos de decisão proferida no HC nº 5007601-32.2014.404.0000/PR: A representação da autoridade policial é bastante extensa e abrange diversos fatos delitivos. O cerne consiste na atividade de Carlos Habib Chater, que utilizaria pessoas interpostas e empresas em nome de pessoas interpostas, para a prática de crimes financeiros, evasão de divisas, e lavagem de dinheiro. Suas atividades supostamente ilícitas seriam desenvolvidas com empresas e contas mantidas no Distrito Federal, mas as operações criminosas, financeiras e de lavagem, se estenderiam a diversos pontos do território nacional. Embora sejam apontadas diversas empresas e contas utilizadas por Carlos, destaquem-se a Posto da Torre Ltda., Torre Comércio de Alimentos Ltda. e Angel Serviços Terceirizados Ltda.. Entre os supostos crimes identificados, encontra-se operação de lavagem de dinheiro consumada no Estado do Paraná. O início da investigação, aliás, perante este Juízo, iniciou-se em decorrência desta suposta operação de lavagem de dinheiro consumada no Estado do Paraná. O fato foi cumpridamente narrado na decisão que autorizou o início da interceptação telefônica, no processo 5026387-13.2013.404.7000/PR. Em síntese, o ex-Deputado Federal José Janene, acusado na conhecia Ação Penal 470 (Caso Mensalão), teria realizado investimentos, por pessoas interpostas, em empreendimento industrial em Londrina/PR, constituindo a empresa Dunel Indústria e Comércio Ltda. Janene não chegou a ser condenado, juntamente com seus pares no Partido Progressista, na referida Ação Penal 470 apenas em vista de seu falecimento antes do julgamento. De todo modo, foi verificado que os equipamentos utilizados no empreendimento industrial teriam sido adquiridos por depósitos em dinheiro efetuados por terceiros, empresas https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 17 de 317 aparentemente estranhas ao empreendimento fabril instalado em Londrina. Fornecedores do empreendimento teriam igualmente sido pagos por depósitos efetuados por terceiros. Parte destes investimentos foram rastreados até contas das empresas Angel Serviços Terceirizados Ltda., e Torre Comércio de Alimentos Ltda., CNPJ 07.542.146/0001-08, que são controladas por Carlos Habib Chater (especificamente, depósitos em 28/07/2008, de R$ 130.013,50 e R$ 145.013,50, procedentes das empresas Angel Serviços Terceirizados Ltda., CNPJ 08.641.915/0001-98, e Torre Comércio de Alimentos Ltda., CNPJ 07.542.146/0001-08, na conta da empresa Ferramentas Gerais Com. E Imp. S/A, para aquisição de equipamentos para o empreendimento em Londrina). É possível que outros pagamentos também tenham por origem estratagemas de Carlos Habib Chater, mas isso ainda não foi esclarecido. Aqui ter-se-ia indícios de crime de lavagem de dinheiro, tendo por antecedentes crimes contra a Administração Pública, com o investimento de recursos criminosos do falecido José Janene, através de Carlos Habib Chater, em empreendimento industrial em Londrina/PR, sendo oportuno destacar que esta Vara tem competência para crimes de lavagem consumados em todo o território paranaense. Ainda entre os supostos crimes desvelados na fase da investigação, observo relato na representação de crimes utilizando conta da empresa Gilson M. Ferreira Transporte ME, no Banco Itaú, agência Xaxim, em Curitiba/PR (fls. 145-194). A referida conta teria movimentado em 2012 e 2013 mais de vinte e três milhões de reais, em circunstâncias que indicam sua utilização para a prática de crimes financeiros e de lavagem de dinheiro. Referida conta que seria controlada pelos investigados Renê Luiz Pereira e Jorge Rafael Gomes Coelho, teria recebido vultosos depósitos do Posto da Torre Ltda., empresa controlada por Carlos Habib Chater (R$ 40.500,00 em 13/09/2013, R$ 50.000,00 e R$ 35.000,00 em 16/09/2013, fls. 149-151 da representação). A empresa Gilson Ferreira estaria sediada em Curitiba. Segundo a representação da autoridade policial, há fundada suspeita de que o numerário movimentado na conta esteja relacionado a transações de compra e venda de drogas ilícitas (fls. 153-160). Considerando a utilização da conta em Curitiba e a realização de depósitos do Posto da Torre na conta em Curitiba, ter-se-ia aqui mais um indicativo de crime de lavagem consumado em Curitiba, tendo por antecedentes crimes de tráfico de drogas. Releva destacar que, na relação entre Posto da Torre e a conta de Gilson M. Ferreira, houve, em uma operação, aparentemente participação de Alberto Youssef, como apontado na representação, fl. 160-175. Teria ele, aparentemente, a pedido de Carlos Habib Chater disponibilizado numerário em espécie para Renê Luiz Pereira. Tomando apenas estes dois exemplos, tem-se a narrativa na representação policial de indícios de crimes de lavagem de dinheiro consumados em território paranaense, em Londrina e em Curitiba, justificando a competência deste Juízo. Entre os crimes narrados na representação, os mais graves são os de lavagem. Ainda que hajam outros crimes consumados em outros locais, como no Distrito Federal, aplica-se a regra prevista no art. 78, II, 'a', do Código de Processo Penal. No curso das investigações, foram ainda descobertas intensas relações de Carlos Habib Chater com outros supostos operadores do mercado de câmbio negro, como Nelma Mitsue Penasso Kodama e Alberto Youssef (fl. 194 da representação). Também identificado intenso relacionamento entre Nelma Kodama e outro suposto operador do mercado de câmbio negro, Raul Henrique Srour. Relativamente a eles, foram instaurados processos próprios também distribuídos a este Juízo (v.g.: 501443-10.2014.404.7000/PR, 5001461-31.2014.404.7000/PR e 504959793.2013.404.7000/PR). Se supostos operadores do mercado de câmbio negro realizam operações entre si, caracterizando crimes financeiros ou de lavagem de dinheiro, é evidente a conexão ou continência entre os crimes, aplicando as regras dos arts. 76, II e III, e 77, I, do Código de Processo Penal. Assim, se Carlos Habib Chater e Alberto Youssef realizaram juntos operações de lavagem de dinheiro, como parece ser o caso da operação com a conta de Gilson M. Ferreira, ainda que não especificamente em associação criminosa (em quadrilha), a conexão e a continência são evidentes. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 18 de 317 O mesmo raciocínio é válido para as operações conjuntas de Carlos Habib Chater com Nelma Mitsue Penasso Kodama (v.g. fls. 22-25 da representação) e desta com Alberto Youssef e Raul Henrique Srour. Observo ainda que, pelo teor das interceptações, restou evidenciado que Nelma Mitsue Penasso Kodama teria mantido, no passado, relacionamento comercial intenso com Alberto Youssef e com Raul Henrique Srour, o que significa que as medidas investigatórias em relação a ela também poderão revelar fatos e provas relevantes em relação aos dois últimos. Por sua vez, as medidas investigatórias em relação a Alberto Youssef e Raul Henrique Srour poderão revelar fatos e provas relevantes em relação às atividades de Nelma Kodama. Diante dos relacionamentos entre Nelma Kodama e Alberto Youssef com Carlos Habib Chater, da mesma forma as medidas investigatórias contra um poderão esclarecer fatos e provas em relação aos outros e vice-versa. Registro ainda por oportuno, consultando os processos desmembrados, que há apontamento de supostos crimes praticados por Nelma Kodama consumados em Foz do Iguaçu, área sob a competência deste Juízo, e, quanto a Alberto Youssef, embora houvesse uma expectativa que, em decorrência de processos passados, houvesse abandonado a atividade criminosa, é notório que suas bases de atuação, no passado, como operador do mercado de câmbio negro, eram em São Paulo/SP e Londrina/PR, esta última sob a competência deste Juízo. Embora formados processos próprios, para evitar um acúmulo de fatos delitivos e de investigados em um único, este Juízo, diante da conexão e continência, permanece competente sobre todos os processos, nos termos dos art. s 80 e 82 do Código de Processo Penal, ainda que eventualmente não haja unidade de processo e julgamento. Entendimento contrário pode gerar decisões contraditórias e dispersão de provas. (grifei) Todas as investigações acima referidas estão conectadas, uma vez que lá estava em pauta a prática de crimes financeiros, como evasão de divisas e lavagem de recursos, sendo que diversos dos chamados 'operadores paralelos do mercado financeiro' ou 'doleiros' eram investigados. Por todos, faço referência dentre outros, a Alberto Youssef e Leonardo Meirelles, bem como à empresa LABOGEN. 2.1.2. Pois bem, o fato de executivos da Construtora OAS terem praticado crimes de corrupção, cujos atos estão vinculados a obras realizadas em outras localidades, não altera a definição da competência da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR, fixada em relação aos crimes cometidos contra a Petrobras, independentemente do local ou da existência de outros atos de corrupção praticados pelos executivos das empreiteiras. Na essência, estamos diante de fatos vinculados na origem a crimes financeiros praticados no Estado do Paraná. Essa compreensão foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal, consoante se observa no direcionamento dado às investigações decorrentes da homologação da colaboração premiada de executivos do Grupo Odebrecht, como a PETIÇÃO nº 6.800/DF STF, na medida em que os fatos que não têm relação com a estatal petrolífera foram enviados para outras comarcas ou subseções judiciárias. Refira-se, ainda, que a questão foi objeto de análise por este Tribunal na Ação Penal nº 5083376.05.2014.4.04.7000/PR. Nos itens 1 e 2 da Ementa do Acórdão ficou assentado: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 19 de 317 1. A competência para o processamento e julgamento dos processos relacionados à 'Operação Lava-Jato' perante o Juízo de origem é da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR, especializada para os crimes financeiros e de lavagem de dinheiro. 2. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar incidente relativo à 'Operação Lava-Jato', determinou o desmembramento quanto aos investigados que têm foro privilegiado em relação àqueles que não o tem. Ausente no pólo passivo da presente ação penal autoridades com foro privilegiado, não prospera a alegação defensiva de incompetência do juízo originário. No mesmo sentido, aliás, já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO 'LAVA-JATO'.NULIDADE. ALEGADA INCOMPETÊNCIA DA 13ª VARA FEDERAL DE CURITIBA/PR PARA PROCESSO E JULGAMENTO DO FEITO. INOCORRÊNCIA. COMPETÊNCIA DEFINIDA POR CONEXÃO INSTRUMENTAL. DEMONSTRADO O LIAME ENTRE AS PRIMEIRAS AÇÕES E A AÇÃO PENAL NA QUAL RESPONDE O ORA RECORRENTE. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. I - A alegada incompetência do Juízo Federal de origem, ao argumento de que o crime cometido em face da Petrobrás não atrairia a competência da Justiça Federal por ser a empresa sociedade de economia mista, não pode ser reconhecida na hipótese, haja vista a inteligência do inciso V do art. 109 da Constituição Federal, bem como pela aplicação das regras de conexão e continência ao caso concreto, a atrair a competência para o julgamento da ação perante a 13ª Vara Federal de Curitiba/PR. II - Da análise dos autos, verifica-se que a extensa denúncia demonstra a existência de diversos crimes de competência da Justiça Federal e Estadual, que foram reunidos por conexão para análise do Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR, aplicando-se o entendimento expresso da Súmula n. 122/STJ, segundo a qual 'Compete a Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, 'a', do Código de Processo Penal'. III - Não obstante o entendimento firmado pelo col. Pretório Excelso na Questão de Ordem no Inquérito n. 4.130/PR, no sentido de que 'O fato de a polícia judiciária ou o Ministério Público Federal denominarem de 'fases da operação Lava-jato' uma sequência de investigações sobre crimes diversos - ainda que sua gênese seja a obtenção de recursos escusos para a obtenção de vantagens pessoais e financiamento de partidos políticos ou candidaturas - não se sobrepõe as normas disciplinadoras de competência', no presente caso está suficientemente demonstrada a conexão a permitir a reunião dos processos, pela descrição do liame entre as primeiras ações e a ação penal na qual responde o ora recorrente pelos delitos de corrupção, lavagem e associação criminosa, constituindo a 13ª ação de uma sequência lógica de desdobramentos do feito na origem, desmembrado, este, em observância ao art. 80 do CPP. IV - A jurisprudência é firme no sentido de que eventual nulidade por violação de regras que determinam reunião de processos por conexão e continência demanda impreterivelmente a comprovação de prejuízo por se tratar de nulidade relativa, o que não foi demonstrado (precedentes). Recurso ordinário desprovido. (STJ, RHC 62.385/PR, 5ª Turma, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 28/06/2016, DJe 05/08/2016). É de relevo destacar o contido na Súmula nº 122 do Superior Tribunal de Justiça, pelo que se consagra a exceção à regra no art. 78, II, 'a', do Código de Processo Penal, de maneira que, havendo conexão entre crimes da competência da Justiça Estadual e da Justiça Federal, preponderará esta última. 2.1.3. A competência geral para casos relacionados à 'Operação Lava-Jato' também foi examinada pelo STJ, ainda que sucintamente, como preliminar no RHC nº 80.087/RS, interposto por PAULO TARCISO OKAMOTTO. Na oportunidade, assentou o e. Ministro Félix Fischer: Preliminar de incompetência deste Relator https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 20 de 317 Na petição de fls. 332-355 o Recorrente sustenta que inexiste prevenção a justificar a distribuição do presente recurso à minha relatoria, pois como não há unidade de julgamento (pelo contrário, há um miríade de ações penais e cautelares distribuídas na primeira instância, muitas com sentenças já proferidas inclusive), não há motivo para haver a distribuição por dependência nos tribunais. Sustenta que a questão central reside na distribuição originária por prevenção, ocorrida com o HC n. 291.013/PR, impetrado em favor de PAULO ROBERTO COSTA e distribuído por sorteio (inicialmente) em 24/3/2014, havendo uma complexa teia de dependências que remonta à operação Bidone, a 2ª fase da Lava-Jato. Diz que, a partir de então, permaneceu inalterada a lógica de dependências tanto no TRF como nesta Corte. Entretanto, sustenta que não há enlace direto entre a operação que levou à denúncia contra o Recorrente e a operação que remete à 2ª fase da Lava-Jato, pois os fatos são absolutamente distintos. Sendo assim, o Recorrente alega que não sou competente para o julgamento, como Relator, do presente recurso. Sucede que no Conflito de Competência n. 145.705/DF, ficou assentado que: Nos casos dos processos decorrentes da chamada 'Operação Lavajato', há estreito liame tanto intersubjetivo quanto instrumental que determina a aplicação da regra do art. 71 e seu § 2º para a solução deste conflito, não obstante a pluralidade de ações, e as bem lançadas razões expostas pelo eminente Ministro Felix Fischer. A conexão para o processamento dos feitos decorrentes da 'Operação Lavajato' foi fixada na 13ª Vara Federal da Seção Judiciária do Paraná; estendeu-se ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região e perdura no Supremo Tribunal Federal. Não há razão para que não seja reconhecida no âmbito deste Sodalício. Voto, por isso, no sentido de conhecer do conflito para, reconhecendo a prevenção para o processamento e julgamento das ações e recursos decorrentes da 'Operação Lavajato', desde que constatados os requisitos da interligação entre os sujeitos e organizações envolvidas, além da vinculação probatória, declarar competente o Ministro Felix Fisher, suscitado . Para melhor compreensão da matéria, cito excerto do parecer ministerial exarado no HC n. 339340/PR, de minha relatoria, no qual também foi levantada preliminar de incompetência por inexistência de prevenção: '[...]O Ministro Ribeiro Dantas, relator originariamente prevento para os processos decorrentes da investigação denominada 'Lava Jato', proferiu votos que restaram vencidos nos Habeas Corpus nºs 332.586, 332.637, 338.297, 331.829 e 338.345, todos do Paraná. Nesses processos, proferiu voto vencedor o Ministro Félix Fischer. Poder-se-ia argumentar que os recursos e habeas corpus posteriores não seriam decorrentes do mesmo processo criminal em curso na 13ª Vara Federal em Curitiba. Todavia, embora sejam múltiplas as ações penais em curso separadamente naquele Juízo Federal, decorrentes das investigações denominadas 'Lava Jato', não se pode deixar de considerar a conexão existente. Em outros termos, a separação das imputações em ações penais diversas que tramitam na 13ª Vara Federal em Curitiba não afasta a conexão entre elas. Aliás, é precisamente a conexão existente que justificou em decisões diversas, do STF e do TRF/4ª Região, a competência da 13ª Vara Federal em Curitiba para as ações penais decorrentes da investigação de atos de corrupção em detrimento da Petrobras (Lava jato). Portanto, há de se reconhecer também a conexão entre os recursos e habeas corpus posteriores, relacionados às ações penais em curso na 13ª Vara Federal em Curitiba, decorrentes da investigação de atos de corrupção em detrimento da Petrobras (Lava jato). [...]' (fls. 8.903-8.904 do HC n. 339.340/PR, grifou-se). https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 21 de 317 No presente caso, extrai-se que a Denúncia versa sobre recebimento de recursos espúrios decorrentes de crimes de corrupção (entre outros) praticados em prejuízo da Petrobras. Presente, portanto, a conexão. Dessa forma, rejeito a alegação de incompetência levantada pelo Recorrente. A decisão da Corte Especial do STJ bem indica a cadeia de competência em vários graus de jurisdição, pelo que não prospera a alegação de incompetência do Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR. Enfim, tudo mais o que se disser será mera repetição daquilo que tantas vezes tem sido assentado pela 8ª Turma e pelos Tribunais Superiores, no sentido de que a 13ª Vara Federal de Curitiba é competente para este e para os demais processos da 'Operação Lava-Jato' em fatos relacionados à Petrobras. 2.1.4. De igual modo não se há de falar em prevenção ou conexão aos Inquéritos nºs 4.243/DF e 4.325/DF, originários do Supremo Tribunal Federal. Sobre o tema, pontuou a sentença recorrida: 175. Alega a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva que a ação penal deve ser sobrestada a fim de aguardar o resultado das investigações no Supremo Tribunal Federal do Inquérito 4325 que visa a apurar a participação do ex-Presidente no grupo criminoso organizado que praticou crimes no âmbito da Petrobrás; 176. A presente ação penal tem por objeto específico crimes de corrupção e de lavagem. 177. O julgamento deles não depende da conclusão das investigações ou de eventual ação penal contra o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva por crime de pertinência a grupo criminoso organizado ou por crime de associação criminosa e que constitui o objeto do aludido Inquérito 4325. 178. Não cabe, portanto, a suspensão pretendida. Os crimes apurados são diversos. Enquanto que este feito tem por objeto imputações de corrupção e lavagem de dinheiro relacionadas a contratos da empresa OAS com a Petrobras, os inquéritos mencionados dizem respeito exclusivamente a delitos praticados por grupo ou organização criminosa, sobretudo de obstrução à justiça. Tais fatos não se comunicam e sequer há interdependência probatória. Considerando, dessa forma, que inexiste neste processo autoridade detentora de prerrogativa de função, afastada está a competência do Supremo Tribunal Federal para investigação e julgamento. Tanto é assim que no próprio Inquérito nº 4.243/DF já houve declinação de competência para a Justiça Federal de Primeiro Grau/DF. Confira-se, no que importa, a decisão do e. Ministro Edson Fachin: DECISÃO: 1. O presente inquérito teve, de início, quatro (4) linhas investigativas: (a) nomeação do Ministro Marcelo Navarro Ribeiro Dantas para compor o Superior Tribunal de Justiça com a finalidade de embaraçar a 'Operação Lava Jato', tendo como investigados Dilma Vana Roussef, José Eduardo Cardozo, Francisco Cândido de Melo Falcão e Marcelo Navarro Ribeiro Dantas; (b) embaraço à colaboração premiada do Senador Delcídio do Amaral, tendo como investigados Dilma Vana Roussef e Aloízio Mercadante; (c) embaraço à investigação mediante a nomeação de Luiz Inácio Lula da Silva para a Chefia da Casa Civil da Presidência da República, tendo como investigados Dilma Vana Roussef e Luiz Inácio Lula da Silva; e (d) atos de embaraço promovidos por Luiz Inácio Lula da Silva a partir do Senado Federal. 2. Por decisão do saudoso Ministro Teori Zavascki, relator à época deste inquérito, foi desmembrada a investigação exclusivamente com relação ao fato descrito no item 'd', permanecendo nesta Suprema Corte as demais apurações. (...) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 22 de 317 8. À luz do exposto: (i) acolho o pedido de arquivamento deduzido pelo Procurador-Geral da República em face de Dilma Vana Roussef, José Eduardo Cardozo, Francisco Cândido de Melo Falcão e Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, em relação à apuração dos fatos que envolvem a nomeação do Ministro Marcelo Navarro Ribeiro Dantas para compor o Superior Tribunal de Justiça com a finalidade de embaraçar a 'Operação Lava Jato'; (ii) determino o levantamento do sigilo deste inquérito; (iii) declino da competência para processar e julgar os fatos narrados na denúncia para a Seção Judiciária do Distrito Federal. Assim, ausente conexão indissociável, réu com prerrogativa de foro e, sobretudo, tendo em vista o quanto já decidido em inúmeros precedentes por este Tribunal e pelas Cortes Superiores, não merece acolhida a preliminar defensiva. 2.2. Suspeição do Juízo de primeiro grau As suspeições no processo penal têm previsão expressa no art. 254 do Código de Processo Penal, ipsis litteris: Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes: I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles; II - se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia; III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes; IV - se tiver aconselhado qualquer das partes; V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes; VI - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo Já decidiu o Supremo Tribunal Federal que o rol inserto no art. 254 do Código de Processo Penal é taxativo, não sendo suficiente que a parte alegue genérica e infundadamente a suspeição do magistrado sem indicação de fatos concretos e adequados à disciplina legal (HC nº 77.930, Maurício Corrêa, STF). Nas palavras do e. Ministro Celso de Mello, 'as causas geradoras de impedimento (CPP, art. 252) e de suspeição (CPP, art. 254) do magistrado são de direito estrito. As hipóteses que as caracterizam acham-se enumeradas, de modo exaustivo, na legislação processual penal. Trata-se de 'numerus clausus', que decorre da própria taxatividade do rol consubstanciado nas normas legais referidas' (HC 68784, Primeira Turma, julgado em 01/10/1991, DJ 26-03-1993 PP-05003 EMENT VOL-01697-03 PP00456). No mesmo sentido, o precedente do STF que segue: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE IMPEDIMENTO OU SUSPEIÇÃO DE DESEMBARGADOR FEDERAL DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA SEGUNDA REGIÃO PARA O JULGAMENTO DE RECURSO DE APELAÇÃO E HABEAS CORPUS: IMPROCEDÊNCIA. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. 1. Nos arts. 252 e 254 do Código de Processo Penal, não se preceitua ilegalidade em razão de ter exercido a função de Corregedor Regional da Justiça Federal da Segunda Região em processo administrativo instaurado em desfavor do Recorrente e a jurisdição no julgamento das referidas medidas judiciais. 2. A jurisprudência deste Supremo Tribunal assentou a impossibilidade de criação pela interpretação de causas de impedimento e suspeição. Precedentes. 3. Recurso ordinário a qual se nega provimento. (RHC 131735, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 23 de 317 Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 03/05/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-100 DIVULG 16-05-2016 PUBLIC 17-05-2016). GRIFEI Idêntico entendimento foi registrado pela 8ª Turma deste Tribunal em processo conexo à denominada 'Operação Lava-Jato'. Confira-se: 'OPERAÇÃO LAVA-JATO' PROCESSO PENAL. ARTS. 252 E 254 DO CPP. EXCEÇÃO, IMPEDIMENTO E SUSPEIÇÃO. ATUAÇÃO DO MAGISTRADO. DECISÕES. FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE EXCESSO. INEXISTÊNCIA DE ANTECIPAÇÃO OU INTERESSE NA CAUSA. DESMEMBRAMENTO DE PROCESSOS. CONEXÃO. 1. As hipóteses de impedimento e suspeição descritas nos arts. 252 e 254 do Código de Processo Penal constituem um rol exaustivo. Precedentes do Tribunal e do STF. Hipótese em que o juízo de admissibilidade da exceção se confundem com o mérito. 2. Regras de titularização e afastamento do magistrado são precisas e não admitem a integração de conteúdo pelo intérprete, impedindo, assim, que juízes sejam erroneamente mantidos ou afastados. O rol do art. 254, do CPP, constitui numerus clausus, e não numerus apertus, sendo taxativas as hipóteses de suspeição. Precedentes desta Corte e do STF (Exceção de Suspeição Criminal nº 5052962-04.2016.404.0000, Des. Federal Cláudia Cristina Cristofani, por unanimidade, juntado aos autos em 16/12/2016). (...). 5. Exceção de suspeição criminal improvida. (TRF4, EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL (TURMA) Nº 5018561-91.2017.404.7000/PR, 8ª TURMA, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 08/07/2017). De fato, a ampliação das possibilidades de suspeição resultaria na prevalência de conceitos indeterminados que não se afeiçoam à excepcionalidade. Em processo correlato, com os devidos ajustamentos, a Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani anotou que as regras de titularização e afastamento são precisas e não admitem a integração de conteúdo pelo intérprete, de modo a evitar o desligamento indevido do promotor e do juiz natural (Exceção de Suspeição Criminal (Seção) nº 5052962-04.2016.404.0000, 4ª Seção, por unanimidade, juntado aos autos em 16/12/2016). Em recente julgado, o Supremo Tribunal Federal reafirmou tal posição. Na Arguição de Suspeição nº 89, proposta pelo Exmº Sr. Presidente da República Michel Miguel Elias Temer Lulia em face do Exmº Sr. Procurador-Geral da República Rodrigo Janot Monteiro de Barros, o Ministro Edson Fachin esclareceu que referidas causas constituem rol taxativo e, por tal razão, não admitem alargamento pela via interpretativa. 2.2.1. A suspeição do magistrado vem, no dizer da defesa, fundada ainda em supostas ilegalidades e arbitrariedades na condução do processo, em especial, nos seguintes pontos: (i) ilegalidade da condução coercitiva; (ii) arbitrária quebra de sigilo telefônico; (iii) divulgação seletiva de diálogos; (iv) monitoramento da estratégia de defesa com a quebra de sigilo telefônico de advogados; (v) convicção da responsabilidade criminal do apelante na decisão de recebimento da denúncia; (vi) animosidade para com os defensores do apelante; (vii) prejulgamento em informações prestadas ao STF; (viii) criação na rede social 'Facebook' de página intitulada 'Eu MORO com ele #rosangelawolfmoro'; (ix) entrevista concedida ao portal da Folha de São Paulo no dia 30/07/2017, na qual teria se manifestado expressamente sobre o processo; (x) participação em eventos políticos e/ou com públicos manifestamente antagônicos ao apelante; (xi) aspectos relacionados à titularidade do domínio do apartamento triplex no Guarujá/SP, cuja transferência nunca poderia ter ocorrido. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 24 de 317 Com pequenas variações ou acréscimos, verifica-se a presença de duas classes de fundamentos. Na primeira, a defesa pede a declaração de suspeição, tendo em conta o histórico das decisões proferidas no curso da investigação. Como já amplamente abordado, as razões de decidir não provocam a suspeição do julgador, pois a sua externalização nada mais é do que dever constitucional de fundamentar. Isso não quer dizer pré-julgamento para a causa, em especial porque são decisões no estágio inicial da investigação e sempre em cognição sumária, de modo que não se prestariam, por si só, para amparar um juízo condenatório. Tal contexto reserva o aprofundamento para o curso da ação penal, onde será apurada a responsabilidade criminal do investigado, assegurado o contraditório e a ampla defesa, sem, porém, que as providências preliminares interfiram na imparcialidade do magistrado. Já da segunda classe, nota-se a reiterada alusão a fatos como manifestações da opinião pública, artigos acadêmicos, além da curiosa suposição de suspeição porque o juiz de primeiro grau figurou em pesquisas eleitorais como concorrente à eleição para Presidência da República para o pleito de 2018. Em linhas gerais, ganha relevo a tentativa da defesa de atribuir ao processo uma conotação política, visão esta bastante equivocada e que somente se explica pela tentativa de desqualificar não só o juiz natural, mas também a própria atividade jurisdicional. Ainda que do processo possam surgir repercussões políticas e sociais, aspectos externos não contaminam a sua condução. Tampouco se confirma qualquer seletividade deliberada para prejudicar o apelante ou mesmo o invocado antagonismo político. Há que se ter bem claro que o juiz não é parte no processo, nem assume a posição de antagonista com relação a qualquer investigado ou réu. Como decidido pela 4ª Seção, 'o excepto, em exceção de suspeição, não se transforma em parte. O manejo da exceção não convola o juiz em parte, não estando presente a pretensão resistida - o magistrado de primeiro grau não se transforma em autor ou réu a litigar com o excipiente, não estando a formular ou se defender de pedido perante o Estadojuiz' (Exceção de Suspeição Criminal nº 5052962-04.2016.404.0000, Des. Federal Cláudia Cristina Cristofani, por unanimidade, juntado aos autos em 16/12/2016). Em síntese, as insatisfações com relação às decisões judiciais não estão sujeitas a escrutínio sob a perspectiva da imparcialidade e é insuficiente para afastar o magistrado a livre interpretação com relação aos acontecimentos. Como fixado, 'regras de titularização e afastamento do magistrado são precisas e não admitem a integração de conteúdo pelo intérprete, impedindo, assim, que juízes sejam erroneamente mantidos ou afastados. O rol do art. 254, do CPP, constitui numerus clausus, e não numerus apertus, sendo taxativas as hipóteses de suspeição. Precedentes desta Corte e do STF' (TRF4, Exceção de Suspeição retro citada, 4ª Seção). De todo o modo, os temas foram exaustiva e repetidamente abordados neste Tribunal. Já foram propostas e julgadas as seguintes exceções de suspeição criminal: 5032506-82.2016.4.04.7000/PR, julgada em 26/10/2016; 5032531-95.2016.4.04.7000/PR, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 25 de 317 julgada em 26/10/2016 (ED em 08/02/2017); 5032521-51.2016.4.04.7000/PR, julgada em 26/10/2016 (ED em 08/02/2017); e 5051592-39.2016.4.04.7000/PR, julgada em 08/03/2017 (ED em 26/04/2017). Por oportuno, reproduzo as respectivas ementas de julgamento: PROCESSUAL PENAL. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. ATOS DO PROCESSO. DEVER DE FUNDAMENTAR. EXCESSO NÃO CONFIGURADO. ARTIGOS PUBLICADOS. IMPARCIALIDADE NÃO CARACTERIZADA. INEXISTÊNCIA DE ANTECIPAÇÃO OU INTERESSE NA CAUSA. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIAS JORNALÍSTICAS. IMPROCEDÊNCIA DA EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL. 1. Não gera impedimento do magistrado, tampouco implica em antecipação do juízo de mérito, a externalização das razões de decidir a respeito de diligências, prisões e recebimento da denúncia, comuns à atividade jurisdicional e exigidas pelo dever de fundamentar estampado na Constituição Federal. 2. A determinação de diligências na fase investigativa, como quebras de sigilo telemáticos e prisões cautelares não implica antecipação de mérito, mas sim mero impulso processual relacionado ao poder instrutório. 3. A ampla cobertura jornalística à investigação denominada de 'Operação Lava-Jato', bem como a manifestação da opinião pública, favoráveis ou contrárias, para as quais o magistrado não tenha contribuído, ou, ainda, a indicação do nome do excepto em pesquisas eleitorais para as quais não tenha anuído, não acarretam a quebra da imparcialidade do magistrado. 4. Eventuais manifestações do magistrado em textos jurídicos ou palestras de natureza acadêmica, informativa ou cerimonial a respeito de crimes de corrupção, não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à 'Operação Lava-Jato'. 5. Considerações do magistrado em texto jurídico publicado em revista especializada a respeito da Operação Mãos Limpas (Itália), têm natureza meramente acadêmica, descritiva e informativa e não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à 'Operação Lava-Jato', deflagrada, inclusive, muitos anos depois. De igual modo e por ter o mesmo caráter acadêmico, não autoriza que se levante a suspeição do magistrado ou mesmo o seu desrespeito às Cortes Recursais. 6. O art. 256 do Código de Processo Penal prevê que a suspeição não poderá ser declarada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo para criá-la, evitando assim ações deliberadas com o objetivo de afastar o magistrado da causa. Hipótese em que a representação do excipiente em face do excepto perante a Procuradoria-Geral da República por crime de abuso, não será suspeição. 7. A limitação de distribuição de processos ao juízo excepto diz respeito à administração da justiça da competência do Tribunal Regional da 4ª Região e não guarda correspondência com as causas de suspeição previstas no CPP ou implica em quebra de isenção do excepto. 8. Exceção de suspeição a que se nega provimento. (TRF4, EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL (TURMA) Nº 5032506-82.2016.404.7000/PR, 8ª TURMA, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 04/11/2016). PROCESSUAL PENAL. EXECEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. ATOS DO PROCESSO. DEVER DE FUNDAMENTAR. EXCESSO NÃO CONFIGURADO. ARTIGOS PUBLICADOS. IMPARCIALIDADE NÃO CARACTERIZADA. INEXISTÊNCIA DE ANTECIPAÇÃO OU INTERESSE NA CAUSA. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIAS JORNALÍSTICAS. IMPROCEDÊNCIA DA EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL. 1. Não gera impedimento do magistrado, tampouco implica em antecipação do juízo de mérito, a externalização das razões de decidir a respeito de diligências, prisões e recebimento da denúncia, comuns à atividade jurisdicional e exigidas pelo dever de fundamentar estampado na Constituição Federal. 2. A determinação de diligências na fase investigativa, como quebras de sigilo telemáticos e prisões cautelares não implica antecipação de mérito, mas sim mero impulso processual relacionado ao poder instrutório. 3. A ampla cobertura jornalística à investigação denominada de 'Operação Lava-Jato', bem como a manifestação da opinião pública, favoráveis ou contrárias, para as quais o magistrado não tenha contribuído, ou, ainda, a indicação do nome do excepto em pesquisas eleitorais para as quais não tenha anuído, não acarretam a quebra da imparcialidade do magistrado. 4. Eventuais manifestações do magistrado em textos https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 26 de 317 jurídicos ou palestras de natureza acadêmica, informativa ou cerimonial a respeito de crimes de corrupção, não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à 'Operação Lava-Jato'. 5. Considerações do magistrado em texto jurídico publicado em revista especializada a respeito da Operação Mãos Limpas (Itália), têm natureza meramente acadêmica, descritiva e informativa e não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à 'Operação Lava-Jato', deflagrada, inclusive, muitos anos depois. De igual modo e por ter o mesmo caráter acadêmico, não autoriza que se levante a suspeição do magistrado ou mesmo o seu desrespeito às Cortes Recursais. 6. O art. 256 do Código de Processo Penal prevê que a suspeição não poderá ser declarada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo para criá-la, evitando assim ações deliberadas com o objetivo de afastar o magistrado da causa. Hipótese em que a representação do excipiente em face do excepto perante a Procuradoria-Geral da República por crime de abuso, não será suspeição. 7. A limitação de distribuição de processos ao juízo excepto diz respeito à administração da justiça da competência do Tribunal Regional da 4ª Região e não guarda correspondência com as causas de suspeição previstas no CPP ou implica em quebra de isenção do excepto. 8. Exceção de suspeição a que se nega provimento. (TRF4, EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL (TURMA) Nº 5032531-95.2016.404.7000/PR, 8ª TURMA, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 04/11/2016). PROCESSUAL PENAL. EXECEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. ATOS DO PROCESSO. DEVER DE FUNDAMENTAR. EXCESSO NÃO CONFIGURADO. ARTIGOS PUBLICADOS. IMPARCIALIDADE NÃO CARACTERIZADA. INEXISTÊNCIA DE ANTECIPAÇÃO OU INTERESSE NA CAUSA. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIAS JORNALÍSTICAS. IMPROCEDÊNCIA DA EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL. 1. Não gera impedimento do magistrado, tampouco implica em antecipação do juízo de mérito, a externalização das razões de decidir a respeito de diligências, prisões e recebimento da denúncia, comuns à atividade jurisdicional e exigidas pelo dever de fundamentar estampado na Constituição Federal. 2. A determinação de diligências na fase investigativa, como quebras de sigilo telemáticos e prisões cautelares não implica antecipação de mérito, mas sim mero impulso processual relacionado ao poder instrutório. 3. A ampla cobertura jornalística à investigação denominada de 'Operação Lava-Jato', bem como a manifestação da opinião pública, favoráveis ou contrárias, para as quais o magistrado não tenha contribuído, ou, ainda, a indicação do nome do excepto em pesquisas eleitorais para as quais não tenha anuído, não acarretam a quebra da imparcialidade do magistrado. 4. Eventuais manifestações do magistrado em textos jurídicos ou palestras de natureza acadêmica, informativa ou cerimonial a respeito de crimes de corrupção, não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à 'Operação Lava-Jato'. 5. Considerações do magistrado em texto jurídico publicado em revista especializada a respeito da Operação Mãos Limpas (Itália), têm natureza meramente acadêmica, descritiva e informativa e não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à 'Operação Lava-Jato', deflagrada, inclusive, muitos anos depois. De igual modo e por ter o mesmo caráter acadêmico, não autoriza que se levante a suspeição do magistrado ou mesmo o seu desrespeito às Cortes Recursais. 6. O art. 256 do Código de Processo Penal prevê que a suspeição não poderá ser declarada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo para criá-la, evitando assim ações deliberadas com o objetivo de afastar o magistrado da causa. Hipótese em que a representação do excipiente em face do excepto perante a Procuradoria-Geral da República por crime de abuso, não será suspeição. 7. A limitação de distribuição de processos ao juízo excepto diz respeito à administração da justiça da competência do Tribunal Regional da 4ª Região e não guarda correspondência com as causas de suspeição previstas no CPP ou implica em quebra de isenção do excepto. 8. Exceção de suspeição a que se nega provimento. (TRF4, EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL (TURMA) Nº 5032521-51.2016.404.7000/PR, 8ª TURMA, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 04/11/2016). PROCESSUAL PENAL. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. REITERAÇÃO DE PEDIDOS JÁ ANALISADOS EM FEITOS ANTERIORES. NÃO https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 27 de 317 CONHECIMENTO. 1. Considerando, portanto, que os argumentos da defesa dos excipientes já foram examinados nos autos tombados sob os nºs 503250682.2016.4.04.7000/PR, 5032521-51.2016.4.04.7000/PR, e 5032531-95.2016.4.04.7000/PR, e que a mera indicação de 'fatos novos' que versam sobre fundamentos já analisados não reabre a discussão sobre matéria já decidida, verifica-se que presente feito revela-se mera reiteração de pedido, sendo incabível seu conhecimento nesta Corte 2. Exceção de suspeição não conhecida. (TRF4, EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL (TURMA) Nº 5051592-39.2016.404.7000/PR, 8ª TURMA, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 10/03/2017). Calha referir que a 'espetacularização' e os efeitos provocados na opinião pública, assim como o recebimento de premiações de natureza honorífica pelo magistrado, para o que nunca colaborou, não são temas oponíveis. Sequer são causas jurídicas. São fatores estranhos que, além de não estarem diretamente ligados à atuação do magistrado, guardam relação com o direito constitucional à liberdade de expressão. É fundamental explicar que eventual necessidade de intervenção recursal como ocorreu pontualmente - também não acarreta a suspeição do magistrado. É dizer, a admissão de tal linha argumentativa traria efeitos irreparáveis no sistema constitucional judicial. Não se afasta o magistrado quando o juízo recursal - em qualquer grau - reforma suas decisões, porque a submissão a vários graus é da essência do duplo grau e pretensão contrária equivaleria a punir a gênese da hermenêutica jurídica. 2.2.2. A determinação de diligências ou mesmo a condução coercitiva de investigados ou decretação de prisões na fase pré-processual fazem parte do cotidiano jurisdicional. A externalização pelo juiz de suas impressões sobre os fatos, como dito, apenas integram o dever de fundamentar, sem que tal proceder se confunda com comportamento tendencioso ou manifestação de interesse. Ou seja, a simples verificação dos pressupostos necessários à instauração de medidas cautelares não significa que o julgador seja suspeito ou esteja impedido de continuar na lide. Não é outro o entendimento adotado pela 8ª Turma em casos idênticos também relacionados à 'Operação Lava-Jato', como se observa do julgado que segue: PROCESSUAL PENAL. EXECEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. ATOS DO PROCESSO. DEVER DE FUNDAMENTAR. EXCESSO NÃO CONFIGURADO. ACORDO DE DELAÇÃO. PARTICIPAÇÃO DO MAGISTRADO. AÇÃO PENAL Nº 470/STF. JUIZ AUXILIAR. INEXISTÊNCIA DE JURISDIÇÃO. ARTIGOS PUBLICADOS. IMPARCIALIDADE NÃO CARACTERIZADA. AUTODECLARAÇÃO DE SUSPEIÇÃO ANTERIOR. IMPROCEDÊNCIA DA EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL. 1. Não gera impedimento do magistrado, tampouco implica em antecipação do juízo de mérito, a externalização das razões de decidir a respeito de diligências, prisões e recebimento da denúncia, comuns à atividade jurisdicional e exigidas pelo dever de fundamentar estampado na Constituição Federal. 2. A determinação de diligências na fase investigativa, como quebras de sigilo telemáticos e prisões cautelares não implica antecipação de mérito, mas sim mero impulso processual relacionado ao poder instrutório. (...) 12. exceção de suspeição improvida. (TRF4, Exceção de Suspeição Criminal nº 5004838-73.2015.404.7000/PR, 8ª Turma, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 09/04/2015). https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 28 de 317 No sistema brasileiro a jurisdição é una, i.e., não se separa o juízo que conduz o inquérito ou instrui a causa daquele que a julga. As medidas cautelares investigatórias são determinadas com fundamento em um juízo precário, notadamente com base em indícios. E o inquérito serve justamente para apurar a existência ou não do delito e identificar os possíveis envolvidos. Assim, no estágio inicial da ação, é desarrazoado supor que o juízo pudesse já firmar a sua convicção a respeito da responsabilidade penal do investigado, até mesmo porque, fosse a afirmação irrepreensível, somente teríamos condenações, e essa não é a realidade das diversas ações penais, inclusive daquelas relacionadas à 'Operação LavaJato' e do presente processo, em que denunciados foram inclusive absolvidos de algumas das imputações. É inevitável que o magistrado, ao analisar pedidos cautelares - naquele estágio ou já no curso do processo - incursione nos fatos que são trazidos ao seu conhecimento, ainda que somente em cognição sumária, típica das medidas acautelatórias. 2.2.3. Há longas considerações no sentido de que a condução coercitiva do excipiente equivaleria à prisão e que teria sido utilizada com viés político. A tese de que os desdobramentos da 'Operação Lava-Jato' têm natureza política não é original. Apesar de muito difundida, a teoria encontra obstáculo no próprio histórico das investigações, pois, ao longo de mais de três anos, não surgiu um só fato que dê guarida à afirmação defensiva. Não passa despercebido, todavia, que o requerente é figura pública e que a cobertura jornalística dada às fases da 'Operação Lava-Jato' a ele relacionadas tem maior ênfase. Igualmente é certo que há uma busca pela politização do processo judicial, seja com a promoção de mobilizações sociais, seja levando o debate a foros internacionais. Porém, nada pode ser atribuído à suposta parcialidade do julgador e não desqualifica a investigação, como se tivesse ela de fato um objetivo político, ainda que haja tentativas de terceiros de colherem frutos políticos com o seu resultado. Pelos elementos dos autos, estamos diante de decisões de primeiro grau fundamentadas e tomadas com base na interceptação telefônica de diálogos travados por investigados, indicando suposta intenção de associados do apelante de, em certa medida, oporem-se a qualquer diligência em seu desfavor. Em face disso, o magistrado de origem inclusive determinou a adoção de cautelas pela autoridade policial com a finalidade de evitar a exposição do conduzido. Vale lembrar que, em certo momento, tais diálogos levaram o juízo inclusive a questionar a utilidade das futuras interceptações telefônicas - posteriormente interrompidas -, dado o comprometimento da espontaneidade. Assim, não há nenhum sinal de quebra de imparcialidade do magistrado de origem, mas, sim, mera insurgência com relação ao mérito das medidas, não sendo a análise sob a ótica da suspeição a melhor forma de sindicá-las. 2.2.3.1. A par disso, o tema foi enfrentado no HC nº 501230095.2016.4.04.0000/PR, impetrado pelo corréu PAULO TARCISO OKAMOTTO, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 29 de 317 defendendo, grosso modo, que não pode a condução coercitiva prescindir de prévia intimação injustificadamente não atendida pelo réu/investigado. A pretensão reside basicamente na interpretação do art. 218 do Código de Processo Penal. Pois bem, ao proferir decisão inaugural naquele habeas corpus, indeferi o pedido liminar, com as seguintes considerações: No tocante à condução coercitiva do paciente, é admitida pela Lei Processual Penal nas hipóteses em que, regulamente intimado, a testemunha deixar de atender o chamado da autoridade policial ou do juízo (art. 218 do CPP). O cerne da discussão, neste caso, reside na possibilidade ou não de se utilizar do mesmo instituto sem motivação legal. Pois bem, sem emitir qualquer juízo definitivo neste momento de delibação, em primeiro lugar, deve-se ter presente que o Código Processo Penal data de 1941, devendo sua interpretação ganhar contornos mais adequados à Constituição Federal de 1988. Regra geral, caminha-se no sentido de que a condução coercitiva deve ser utilizada com relativa parcimônia. Deve-se perguntar, porém se em uma operação complexa como a 'Lava-Jato' seria possível dar irrestrita eficácia à regra processual? Penso que a resposta é negativa. Tal limitação poderia acarretar sério dano à colheita da prova. Em um grupo numeroso e que, ao menos em tese, praticaria crimes complexos, impõe-se que o comparecimento de investigados e testemunhas para depoimento seja simultâneo, circunstância, aliás, apontada pela autoridade coatora na decisão proferida no Pedido de Busca e Apreensão Criminal nº 5006617-29.2016.4.04.7000/PR/PR (evento 3). Registrou o magistrado: ...entendo que mais apropriado nessa fase o aprofundamento da colheita dos elementos probatórios, sem a imposição da prisão temporária. Não obstante, entendo que se justifica a condução coercitiva dos indicados para que prestem esclarecimentos nas mesmas datas das apreensões. A possibilidade de condução coercitiva simultânea surge como alternativa menos gravosa. A Lei nº 7.960/1989 admite a prisão temporária quando imprescindível para as investigações do inquérito policial. Ora, quando devidamente fundamentada, poder-se-ia, em tese, admitir a prisão cautelar como forma de preservar a investigação criminal e a busca de provas. Não é demais recordar que no âmbito da 'Operação Lava-Jato, sobretudo nos momentos iniciais de cada uma das fases, tem-se optado pela execução de todas as buscas e apreensões em um mesmo momento, do mesmo modo que as oitivas. E isso não significa, por si só, violação ao princípio da não autoincrimação, pois é assegurado ao conduzido invocar o direito ao silêncio. O que não se pode é conduzir a investigação no seu exclusivo interesse, sem preocupação com a eficácia do trabalho policial. Pelo exposto, e tendo em vista a investigação já se encontra em estágio mais avançado sem prejuízo de avaliação mais aprofundada quando do julgamento pelo Colegiado -, não vejo razão provável para a intervenção liminar preventiva, motivo pelo qual indefiro o pedido liminar. A condução coercitiva, por si só, não viola o direito constitucional ao silêncio, tampouco a presunção de inocência. Não há a obrigatoriedade de o suspeito a colaborar com a investigação, o que somente acontecerá se for de seu interesse. Segue intocável o nemo tenetur se detegere, não podendo o conduzido ser compelido a esclarecer os fatos criminosos, se assim não pretender. Isso não significa, todavia, que se exima do comparecimento. Ou seja: a condução é coercitiva, mas o depoimento não. Trata-se de restrição momentânea, porém, não muito diferente da obrigatoriedade de comparecimento após intimação para tanto. Em grande medida, é menos gravosa do que qualquer outra determinação segregatória. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 30 de 317 Ainda que haja um breve tangenciamento ao direito de ir e vir para uma finalidade específica, a condução coercitiva não se confunde com prisão cautelar - em qualquer das suas modalidades. Veja-se que o juízo de primeiro grau, ao se manifestar sobre o pedido ministerial, adequadamente ponderou: 4. Pleiteou o MPF a prisão temporária de Paulo Tarciso Okamoto, José de Filippi Júnior e Paulo Roberto Valente Gordilho. Apesar do requerimento do MPF, entendo que mais apropriado nessa fase o aprofundamento da colheita dos elementos probatórios, sem a imposição da prisão temporária. Não obstante, entendo que se justifica a condução coercitiva dos indicados para que prestem esclarecimentos nas mesmas datas das apreensões. GRIFEI Com efeito, recorrendo a um breve histórico da 'Operação Lava-Jato', as conduções coercitivas têm sido utilizadas com certa parcimônia. Talvez por se estar próximo da 50ª fase tal compreensão seja comprometida, mas o instituto vem sendo utilizado de modo proporcional à dinâmica e à dimensão da investigação. Não é demais referir que os investigados têm sido conduzidos com a assistência de seus advogados; a condução coercitiva se dá mediante ordem judicial; não há deslocamento do investigado para localidade outra que não a do seu domicílio e a condução dura exclusivamente o tempo necessário à tomada de depoimento. Além disso, é fundamental que: (a) as conduções coercitivas se mostrem imprescindíveis para a investigação, como forma de assegurar que todas as medidas investigativas - depoimentos e buscas e apreensões, por exemplo - sejam cumpridas simultaneamente; e, (b) notadamente, ocorram na fase inicial da investigação, como, de fato, ocorreram. Note-se que o Pedido de Busca e Apreensão Criminal nº 500661729.2016.4.04.7000/PR foi instaurado em 20/02/2016 e a decisão que determinou a condução do paciente perante a autoridade policial data de 24/02/2016, isto é, logo após o requerimento e ainda nos primeiros movimentos da investigação. Aliás, a condução coercitiva, como meio necessário à investigação, não é instituto exclusivo das investigações afetas à 'Operação Lava-Jato'. No âmbito do próprio STJ, por exemplo, foi determinada no bojo do INQ nº 784, com fundamento no art. 6º do CPP. Não por outra razão, é imprescindível que seja utilizada mediante ordem judicial. A condução coercitiva tem esteio em várias passagens no Código de Processo Penal, notadamente o art. 6º que prevê: Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994) (Vide Lei nº 5.970, de 1973) II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 31 de 317 III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV - ouvir o ofendido; V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura; VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter. X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa. 2.2.3.2. Trazendo tais premissas ao caso examinado, a sentença bem rejeitou a alegação defensiva de nulidade e de quebra de parcialidade, trazendo aspectos que devem ser ponderados. Confira-se o que anotou o juízo de primeiro grau na sentença ora recorrida: 67. Este Juízo, a pedido do MPF, deferiu autorização para condução coecitiva do exPresidente em 29/02/2016, (evento 3), do processo 5007401-06.2016.4.04.7000. 68. A decisão está amplamente fundamentada. 69. Além dos fundamentos expressos na decisão, é necessário destacar que, pela ocasião de sua prolação, não foi possível invocar razões adicionais quanto à necessidade da medida e que eram decorrentes do resultado da interceptação telefônica do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de seus associados realizada no processo 500620598.2016.4.04.7000 e então mantida em sigilo. 70. Com efeitos, alguns dos diálogos sugeriam que o ex-Presidente e associados tomariam providência para turbar a diligência, o que poderia colocar em risco os agentes policiais e mesmo terceiros. 71. Exemplificadamente, diálogo interceptado como o de 27/02/2016, entre o exPresidente Luiz Inácio Lula da Silva e o Presidente do Partido dos Trabalhadores, no qual o primeiro afirma ter ciência prévia de que a busca e apreensão seria realizada e revela cogitar 'convocar alguns deputados para surpreendê-los', medida que, ao final, não ultimou-se, mas que poderia colocar em risco a diligência. Em decorrência, a autoridade policial responsável pela investigação consignou em um dos autos de interceptação (auto de interceptação telefônica 054/2016, processo 5006205-98.2016.4.04.7000): 'O monitoramento identificou que alguns grupos sindicais e agremiações partidárias estão se mobilizando na tentativa de frustrar possíveis medidas cautelares. Essas medidas possivelmente ameaçam a integridade física e moral tanto dos investigados quanto dos policiais federais envolvidos. Assim sendo, sugere-se que sejam adotadas cautelas e procedimentos para evitar os riscos identificados.' 72. Não desconhece este Juízo as controvérsias jurídicas em torno da condução coercitiva, sem intimação prévia. 73. Mas, no caso, a medida era necessária para evitar riscos aos agentes policiais que realizaram a condução e a busca e apreensão na mesma data. 74. Observa-se, ademais, que o tempo mostrou que a medida era necessária, pois houve tumulto no Aeroporto de Congonhas, para onde o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi levado para depoimento, decorrente da convocação de militantes políticos para o local https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 32 de 317 a fim de pressionar as autoridades policiais. Isso restou evidenciado na referida data e ainda foi objeto de afirmação expressa no termo de depoimento por ele prestado na condução coercitiva (evento 3, comp 75, conforme se verifica em diversos trechos, como 'É uma manifestação favorável, de apoio ao presidente, que está vindo em direção ao local', 'Viu, Presidente, tem muita muita gente que veio em apoio ao senhor'). 75. A mesma convocação de militantes partidários ocorreu quando da realização do interrogatório judicial na presente ação penal, tendo havido a necessidade da adoção de mecanismos especiais de segurança para prevenir tumultos e conflitos. 76. Então a condução coercitiva foi medida que estava justificada no contexto e o tempo lhe deu ainda mais razão. 77. Ainda que se possa eventualmente discordar da medida, há de se convir que conduzir alguém, por algumas horas, para prestar depoimento, com a presença do advogado, resguardo absoluto à integridade física e ao direito ao silêncio, não é equivalente à prisão cautelar, nem transformou o ex-Presidente em um 'preso político'. Nada equivalente a uma 'guerra jurídica'. 78. A pedido do Ministério Público Federal, este Juízo por decisão de 24/02/2016 no processo 5006617-29.2016.4.04.7000 (evento 4), autorizou a busca e a apreensão de provas em endereços do ex-Presidente e de seus associados. 79. A decisão não só está longamente fundamentada, como delimita o objeto da buscas. 80. Na ocasião, foram colhidos elementos probatórios relevantes, inclusive para a presente ação penal, como se verifica nos itens 320-325. 81. Embora a busca e a apreensão tenha sido realizada em vários endereços, necessário observar que o esquema criminoso em investigação, envolvendo a prática sistemática de corrupção e lavagem de dinheiro em contratos da Petrobrás, com prejuízos estimados pela própria estatal em cerca de seis bilhões de reais, é igualmente extenso, justificando medidas de investigação, sempre fundadas em lei, mas amplas. 82. Embora sejam compreensíveis as reclamações de quem sofre a busca, fato é que buscas e apreensões domiciliares são medidas de investigação rotineiras no cotidiano de investigações criminais. 83. Nada equivalente a uma 'guerra jurídica'. O art. 6º da Lei Processual Penal tem amparo na Constituição Federal que, pelo seu art. 144, § 4º, assegura às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais. De qualquer maneira, a determinação de condução coercitiva, para além de não ter sido indicado pela defesa nenhum efetivo prejuízo concreto ao réu, não acarreta, por si só, a quebra de imparcialidade do julgador ou a nulidade do feito. 2.2.3.3. Não se descuida que há interpretações menos tolerantes com a utilização da condução coercitiva. Porém, é importante frisar que se trata de mecanismo processual à disposição da investigação, e, no ponto, com a devida vênia, não vejo inconstitucionalidade na medida, quando utilizada com parcimônia e com a finalidade de preservar a colheita da prova. Houvesse, de fato, violação à presunção de inocência ou fosse ela absoluta, nem a prévia intimação autorizaria a condução do investigado que, devidamente intimado, desatende a determinação. Sob tal ótica, até mesmo se poderia discutir a violação do rito previsto na Lei Processual Penal, o que, ao meu sentir, deve ser sempre balizado em face do princípio da proporcionalidade. Nessa mesma linha de argumentação, as medidas cautelares processuais dentre as quais se inclui a condução coercitiva - gozam de constitucionalidade reconhecida pelos Tribunais Nacionais. É certo que as decisões proferidas em fase de investigação https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 33 de 317 guardam grau de cognição sumária, sem que haja, frise-se, qualquer conclusão a respeito da responsabilidade criminal do investigado. Isso, porém, não as desqualifica; tampouco se poderia admitir que se retira do juízo valiosos instrumentos de investigação e instrução. Citem-se, a exemplo, as buscas e apreensões, as quebras de sigilo fiscal, telefônico e telemático, as preparatórias de arresto ou sequestro de bens. A estas, acrescentam-se as prisões processuais, que, diga-se, são ainda mais restritivas da liberdade e da presunção de inocência. Por conseguinte, quer parecer que a discussão a respeito da condução coercitiva não passa pela violação à presunção de inocência, como, de resto, são admissíveis as cautelares processuais e os meios de obtenção de prova, ainda que em certa medida e momentaneamente invasivas. É lição extraída da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, aliás, que inexistem direitos constitucionais absolutos. Como assentou a Ministra Ellen Gracie Northfleet, 'na contemporaneidade, não se reconhece a presença de direitos absolutos, mesmo de estatura de direitos fundamentais previstos no art. 5º, da Constituição Federal, e em textos de Tratados e Convenções Internacionais em matéria de direitos humanos. Os critérios e métodos da razoabilidade e da proporcionalidade se afiguram fundamentais neste contexto, de modo a não permitir que haja prevalência de determinado direito ou interesse sobre outro de igual ou maior estatura jurídico-valorativa' (HC nº 93.250). Não se foge da busca pelo exato ponto de equilíbrio entre a garantia do devido processo legal e a jurisdição eficaz das tutelas cautelares, de modo a evitar que alguma afronta à estrutura basilar do sistema se concretize. Ao conflito e ponderação entre garantias, o saudoso Ministro Teori Zavascki deu o nome de 'fenômenos de tensão'. Em obra insular que trata das tutelas antecipatórias, afirmou, com muita propriedade, que 'por se tratar de direitos fundamentais de idêntica matriz constitucional, não há hierarquia alguma, no plano normativo, entre o direito à efetividade da jurisdição e à segurança jurídica, pelo que hão de merecer, ambos, do legislador ordinário e do juiz, a mais estrita e fiel observância' (in Antecipação da tutela, São Paulo: Saraiva, 1997, p. 64) Embora o foco da obra fosse a antiga tutela antecipatória, mais do que tal contorno, o ensinamento passa por questões de direito constitucional, balizando a discussão a respeito da relativização de princípios insertos no art. 5º da Carta Política. 2.2.3.4. É importante desmistificar as alegações de violações cometidas pelo juízo de primeiro grau ao determinar a condução coercitiva dos investigados. O termo de depoimento do investigado, determinado na Petição nº 5007401-06.2016.4.04.7000/PR, revela que o conduzido foi devidamente representado e acompanho pelos advogados Roberto Teixeira, Cristiano Zanin Martins e Rodrigo Ferrão. Além das autoridades policiais e judiciárias de praxe, também acompanhou a tomada de depoimento o Deputado Federal Paulo Teixeira. Analisando a íntegra do interrogatório, verifica-se que, em nenhum momento foi negado ao interrogado, mesmo que parcialmente, manter-se em silêncio. Houve apenas https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 34 de 317 pedidos de esclarecimento formulados pelos defensores e atendidos pela autoridade policial. A prerrogativa do réu consta expressamente na decisão que determinou a sua condução coercitiva, nas seguintes letras: 'Na colheita do depoimento deve ser, desnecessário dizer, garantido o direito ao silêncio e a presença do respectivo defensor'. 2.2.3.5. A decisão de primeiro grau menciona, ainda, como justificativa: Autorizei buscas e apreensões pela decisão de 24/02 (evento 4) no processo 500661729.2016.4.04.7000 a pedido do MPF. As buscas estão associadas ao ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. Pleiteia o MPF em separado a condução coercitiva do ex-Presidente e de sua esposa para prestarem depoimento à Polícia Federal na data das buscas. Argumenta que a medida é necessária pois, em depoimentos anteriormente designados para sua oitiva, teria havido tumulto provocado por militantes políticos, como o ocorrido no dia 17/02/2016, no Fórum Criminal da Barra Funda, em São Paulo. No confronto entre polícia e manifestantes contrários ou favoráveis ao ex-Presidente, 'pessoas ficaram feridas'. Receia que tumultos equivalentes se repitam, com o que a oitiva deles, na mesma data das buscas e apreensões, reduziriam, pela surpresa, as chances de ocorrência de eventos equivalentes. Em complemento, repiso o que ponderou o juízo de primeiro grau na sentença recorrida que: ... diálogo interceptado como o de 27/02/2016, entre o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o Presidente do Partido dos Trabalhadores, no qual o primeiro afirma ter ciência prévia de que a busca e apreensão seria realizada e revela cogitar 'convocar alguns deputados para surpreendê-los', medida que, ao final, não ultimou-se, mas que poderia colocar em risco a diligência. Em decorrência, a autoridade policial responsável pela investigação consignou em um dos autos de interceptação (auto de interceptação telefônica 054/2016, processo 5006205-98.2016.4.04.7000): 'O monitoramento identificou que alguns grupos sindicais e agremiações partidárias estão se mobilizando na tentativa de frustrar possíveis medidas cautelares. Essas medidas possivelmente ameaçam a integridade física e moral tanto dos investigados quanto dos policiais federais envolvidos. Assim sendo, sugere-se que sejam adotadas cautelas e procedimentos para evitar os riscos identificados.' Mais do que a segurança dos agentes policiais e demais transeuntes, estava em risco o próprio depoimento do investigado. Isso fica bastante claro, vale recordar, pela ausência de espontaneidade dos personagens nas interceptações no processo nº 500620598.2016.4.04.7000/PR (quebra de sigilo) o que levou à interrupção das escutas telefônicas, mas permitiu que se constatasse a intenção de frustrar medidas em desfavor dos investigados. Houve, portanto, claro e concreto risco, não só à segurança, mas à própria investigação a justificar a condução coercitiva de investigados de forma concomitante. Sobre o tema, pertinentes as considerações lançadas pelo Ministério Público Federal em sua promoção (Petição nº 5007401-06.2016.4.04.7000/PR, evento 1): Com efeito, com fulcro no art. 3º do CPP e art. 798 do Código de Processo Civil, afigurase possível determinar a condução coercitiva de investigados enquanto medida cautelar decorrente do poder geral de cautela dos magistrados. Seria uma medida cautelar pessoal https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 35 de 317 substitutiva das prisões processuais, embora não expressamente prevista no art. 319 do Código de Processo Penal. Calha destacar que a condução coercitiva mostra-se mais branda que outras medidas cautelares, como a prisão preventiva e até mesmo a prisão temporária. A condução coercitiva seria corolário da aplicação do brocardo de que in eo quod plus est semper inest et minus ('quem pode o mais, pode o menos'; ou 'naquilo em que está o mais sempre se inclui o menos'). Tal providência é usualmente empregada quando da deflagração de operações policiais, diante da necessidade de acautelar a coleta probatória durante a deflagração, evitando, ainda, a combinação de versões. Notadamente o conhecido episódio do Fórum da Barra Funda em São Paulo/SP, com confrontos agendados entre manifestantes, indicava a organização de tentativas de turbar o ato investigatório, com a conclamação por correligionários e até mesmo por réu da presente ação penal. 2.2.4. Apega-se a defesa à tese de que a quebra de sigilo telefônico do advogado do apelante indicaria parcialidade do magistrado. Sobre o ponto, trago trecho da sentença recorrida: 95. Quanto à alegação de que se monitorou a estratégia de Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, mediante interceptação dos terminais dos advogados, ela, embora constantemente repetida, é falsa. 96. Foi autorizada, por decisão de 26/02/2016 no processo 500620598.2016.4.04.7000/PR (evento 42), a interceptação telefônica somente do terminal 11 98144-7777 de titularidade do advogado Roberto Teixeira, mas na condição de investigado, ele mesmo, e não de advogado. 99. A ilustrar a fundada suspeita de que ele estaria envolvido em ilícitos criminais, responde ele, Roberto Teixeira, à ação penal conexa 5063130-17.2016.404.7000/PR e está denunciado em outra ação penal, de nº 5021365-32.2017.404.7000/PR. 97. Havia fundada suspeita de que ele estaria envolvido em operações de lavagem de dinheiro e isso foi exposto já na decisão inicial da interceptação de 19/02/2016. 98. Se o advogado, no caso Roberto Teixeira, se envolve em condutas criminais, no caso suposta lavagem de dinheiro por auxiliar o ex-Presidente na aquisição de bens com pessoas interpostas, não há imunidade à investigação a ser preservada, nem quanto à comunicação dele com seu então cliente também investigado. 99. A ilustrar a fundada suspeita de que ele estaria envolvido em ilícitos criminais, responde ele, Roberto Teixeira, à ação penal conexa 5063130-17.2016.404.7000/PR e está denunciado em outra ação penal, de nº 5021365-32.2017.404.7000/PR. 100. Quanto ao telefone 11 3060-3310, supostamente do escritório de advocacia Teixeira Martins e Advogados, a interceptação foi autorizada tendo por presente informação de que o terminal seria titularizado pela empresa LILS Palestras do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e não por escritório de advocacia. Isso está expresso na decisão de 19/02/2016 (evento 4, processo 5006205-98.2016.4.04.7000/PR). 101. E nos relatórios da autoridade policial quanto à interceptação, sempre foi apontado tal terminal como pertinente à LILS Palestras. 102. Segundo o MPF, tal número de telefone estaria indicado no cadastro CNPJ da empresa LILS Palestras.Tal afirmação encontra comprovação na fl. 2 do arquivo anexo out2 do evento 166 do processo 5006205-98.2016.4.04.7000/PR e no cadastro CNPJ da LILS Palestras constante no evento 166, out5, do mesmo processo. 103. Ainda segundo o MPF na mesma petição, a empresa LILS Palestras, após o fim do sigilo sobre a interceptação, alterou o cadastro CNPJ para excluir do cadastro o referido telefone. Tal afirmação encontra comprovação na fl. 3 do arquivo anexo out2 do evento 166 do processo 5006205-98.2016.4.04.7000/PR. 104. O procedimento soa fraudulento, por representar alteração do estado das provas pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva no curso da investigação. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 36 de 317 105. Embora, em princípio pudesse ser considerada válida até mesmo a autorização para interceptação do referido terminal, ainda que fosse do escritório de advocacia, já que o sócio principal, Roberto Teixeira, era investigado e dele usuário, a autorização concedida por este Juízo tinha por pressuposto que o terminal era titularizado pela empresa do exPresidente e não pelo escritório de advocacia. 106. Este julgador só teve conhecimento de que o terminal era titularizado pelo escritório de advocacia quando a própria parte assim alegou, já após a cessação da interceptação. 107. É fato que, antes, a operadora de telefonia havia encaminhado ao Juízo ofícios informando que as interceptações haviam sido implantadas e nos quais havia referência, entre outros terminais, ao aludido terminal como titularizado pelo escritório de advocacia, mas esses ofícios, no quais o fato não é objeto de qualquer destaque e que não veiculam qualquer requerimento, não foram de fato percebidos pelo Juízo, com atenção tomada por centenas de processos complexos perante ele tramitando. O que este julgador tinha presente é que o terminal, como consta no cadastro CNPJ e nos autos de interceptação, era da LILS Palestras. 108. Releva destacar ainda que, mesmo interceptado o terminal 11 3060-3310, não foram selecionados pela autoridade policial diálogos relevantes dele provenientes. 109. Aliás, rigorosamente, apesar da argumentação dramática da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva no sentido de que teriam sido interceptados vinte e cinco advogados pela implantação da medida no terminal 11 3060-3310, não há concretamente o apontamento de diálogos interceptados no referido terminal de outros advogados que não do próprio Roberto Teixeira e nem de diálogos cujo conteúdo dizem respeito ao direito de defesa. 110. De se lamentar que, pelo fato da LILS Palestras indicar em seu cadastro no CNPJ o telefone de contato de escritório de advocacia, possam ter sido equivocadamente interceptados telefonemas estranhos à investigação, mas, se isso ocorreu, tais diálogos sequer foram selecionados como relevantes, preservando-se o seu conteúdo. 111. Então não corresponde à realidade dos fatos a afirmação de que se buscou ou foram interceptados todos os advogados do escritório de advocacia Teixeira Martins. 112. A fim de justificar a sua alegação de que haveria monitoramento da estratégia de defesa, a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva ainda cita na fl. 74 das alegações finais (evento 937), dois diálogos havidos entre o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Roberto Teixeira. 113. Cumpre ressalvar inicialmente que esse diálogos sequer compõem os elementos probatórios que instruem a denúncia, ou seja, não foram utilizados. 114. Observa-se, porém, que o telefone interceptado era o 11 963843690, de titularidade do Primeiro-Tentente Valmir Moares da Silva, da equipe de segurança do ex-Presidente. Tal telefone foi interceptado pois o agente de segurança cedia corriqueiramente, como aliás, ilustra o diálogo citado pela Defesa, o terminal para utilização do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 115. Então sequer se trata aqui de prova resultante da interceptação do terminal utilizado por Roberto Teixeira. 116. De todo modo, os diálogos não tratam de estratégia de defesa, mas como o seu conteúdo fica claro, da tentativa de contatar o então Ministro da Casa Civil Jaques Wagner com objetivos não totalmente esclarecidos, mas que certamente não envolvem o exercício legítimo da defesa. 117. Então, não houve, apesar da insistência repetida da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, qualquer tentativa de 'monitorar' a estratégia de defesa do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sendo absolutamente falsas afirmações da espécie. DESTAQUEI O substrato fático trazia fortes indicativos de que o interceptado teria participado de condutas ilícitas imputadas ao ex-Presidente e de que o advogado a ele cedia o seu telefone celular. Ainda. O telefone pertencente ao escritório de advocacia Teixeira Martins e Advogados teve autorização de quebra de sigilo, porque, segundo informação trazida pelo https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 37 de 317 MPF, seria titularizado pela empresa LILS Palestras do ex-Presidente (como documentação acostada aos autos) e não por ser escritório de advocacia. Tal fator determinante está expresso na decisão de 19/02/2016 (evento 4, processo 5006205-98.2016.4.04.7000/PR), pois levado em conta registro do CNPJ da empresa registrada em nome do apelante. Não houve, portanto, nenhuma tentativa de monitorar ilegalmente os advogados que hoje atuam na causa, mas sim quebra de sigilo em terminal telefônico que constava em nome da empresa do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. A título de ilustração, cite-se o julgamento da Apelação Criminal nº 5030648-16.2016.4.04.7000/PR, pela qual o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, a pedido do coinvestigado Roberto Teixeira, questionava a interceptação de terminais telefônicos dos advogados. A questão foi solvida por unanimidade pela 8ª Turma. A ementa de julgamento foi assim lançada: PENAL. PROCESSO PENAL. OPERAÇÃO 'LAVA-JATO'. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. VALIDADE. SIGILO PROFISSIONAL DO ADVOGADO. GARANTIA NÃO ABSOLUTA. PROVA ESTRANHA AO PROCESSO. EXCLUSÃO. 1. Indiscutível a existência de garantia constitucional (artigo 133 da CF) e legal (artigo 7º, II, da Lei nº 8.906/94) de inviolabilidade do sigilo do advogado e de suas comunicações. 2. Tal garantia, no entanto, não pode servir de abrigo à prática de ilícitos, devendo ser analisada no caso concreto e ponderada por outros valores e princípios também previstos na Carta Magna. 3. Conferir inviolabilidade ao advogado e às suas comunicações não importa em salvo-conduto para todos os seus atos. A garantia de sigilo visa ao alcance dos ditames do Estado Democrático de Direito, conferindo a todos os acusados o devido processo legal, e não uma salvaguarda para o cometimento de delitos sob o manto de tal proteção. 4. A prática de crime por advogado, sob o pretexto de exercício da profissão, não está acobertada pela inviolabilidade. Precedente do STF. 5. Não há nulidade na decisão que determina a interceptação de ramal telefônico tido por pertencente à empresa de um dos investigados com base em informações constantes em cadastro público (CNPJ). Uma vez constatado que o telefone é de titularidade de terceiro, estranho à investigação, a prova é imprestável aos autos, razão pela qual deve ser desentranhada e inutilizada, desde que haja requerimento da parte interessada em tal sentido. 6. Apelação parcialmente provida. (TRF4, APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5030648-16.2016.404.7000/PR, 8ª TURMA, Juiz Federal NIVALDO BRUNONI, por unanimidade, juntado aos autos em 05/05/2017). Ou seja, reconheceu-se a validade da decisão que determinou a quebra de sigilo, seguindo o voto do e. relator, Juiz Federal Convocado Nivaldo Brunoni, que bem detalha a questão: A controvérsia dos presentes autos cinge-se à inviolabilidade conferida aos advogados e à licitude da prova obtida mediante interceptação telefônica de Roberto Teixeira (terminal 11 98144-7777) e do escritório de advocacia do qual é sócio (Teixeira, Martins & Advogados - terminal 11 3060-3310). 3.1. Do terminal telefônico de Roberto Teixeira (11 98144-7777) A Constituição Federal preceitua em seu artigo 133 que 'o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei'. A Lei nº 8.906/94, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e Ordem dos Advogados do Brasil, prevê, por sua vez, em seu artigo 7º, II, a inviolabilidade dos advogados, nos seguintes termos: Art. 7º São direitos do advogado: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 38 de 317 (...) II - a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia; Não se discute, portanto, a existência de garantia constitucional e legal de inviolabilidade do sigilo do advogado e de suas comunicações. Tal garantia, no entanto, não pode servir de abrigo à prática de ilícitos. Em nosso ordenamento jurídico não há qualquer direito ou garantia fundamental absolutos. Até mesmo o direito à vida pode ser mitigado à luz de outros princípios, podendo ser relativizado diante de casos de legítima defesa ou estado de necessidade, por exemplo. O que importa dizer é que a garantia constitucional deve ser analisada no caso concreto e ponderada por outros valores e princípios também previstos na Carta Magna. Conferir inviolabilidade ao advogado e às suas comunicações não importa em salvoconduto para todos os seus atos. A garantia de sigilo visa o alcance dos ditames do Estado Democrático de Direito, conferindo a todos os acusados o devido processo legal, e não uma salvaguarda para o cometimento de delitos sobre o manto de tal proteção. O Supremo Tribunal Federal já se manifestou no sentido de que a prática de crime pelo advogado, sob pretexto de exercício da profissão, não está acobertada pela inviolabilidade: (...) 4. PROVA. Criminal. Interceptação telefônica. Necessidade demonstrada nas sucessivas decisões. Fundamentação bastante. Situação fática excepcional, insuscetível de apuração plena por outros meios. Subsidiariedade caracterizada. Preliminares rejeitadas. Aplicação dos arts. 5º, XII, e 93, IX, da CF, e arts. 2º, 4º, § 2º, e 5º, da Lei nº 9.296/96. Voto vencido. É lícita a interceptação telefônica, determinada em decisão judicial fundamentada, quando necessária, como único meio de prova, à apuração de fato delituoso. 5. PROVA. Criminal. Interceptação telefônica. Prazo legal de autorização. Prorrogações sucessivas. Admissibilidade. Fatos complexos e graves. Necessidade de investigação diferenciada e contínua. Motivações diversas. Ofensa ao art. 5º, caput, da Lei nº 9.296/96. Não ocorrência. Preliminar rejeitada. Voto vencido. É lícita a prorrogação do prazo legal de autorização para interceptação telefônica, ainda que de modo sucessivo, quando o fato seja complexo e, como tal, exija investigação diferenciada e contínua. 6. PROVA. Criminal. Interceptação telefônica. Prazo legal de autorização. Prorrogações sucessivas pelo Ministro Relator, também durante o recesso forense. Admissibilidade. Competência subsistente do Relator. Preliminar repelida. Voto vencido. O Ministro Relator de inquérito policial, objeto de supervisão do Supremo Tribunal Federal, tem competência para determinar, durante as férias e recesso forenses, realização de diligências e provas que dependam de decisão judicial, inclusive interceptação de conversação telefônica. 7. PROVA. Criminal. Escuta ambiental. Captação e interceptação de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos. Meio probatório legalmente admitido. Fatos que configurariam crimes praticados por quadrilha ou bando ou organização criminosa. Autorização judicial circunstanciada. Previsão normativa expressa do procedimento. Preliminar repelida. Inteligência dos arts. 1º e 2º, IV, da Lei nº 9.034/95, com a redação da Lei nº 10.217/95. Para fins de persecução criminal de ilícitos praticados por quadrilha, bando, organização ou associação criminosa de qualquer tipo, são permitidos a captação e a interceptação de sinais eletromagnéticos, óticos e acústicos, bem como seu registro e análise, mediante circunstanciada autorização judicial. 8. PROVA. Criminal. Escuta ambiental e exploração de local. Captação de sinais óticos e acústicos. Escritório de advocacia. Ingresso da autoridade policial, no período noturno, para instalação de equipamento. Medidas autorizadas por decisão judicial. Invasão de domicílio. Não caracterização. Suspeita grave da prática de crime por advogado, no escritório, sob pretexto de exercício da profissão. Situação não acobertada pela inviolabilidade constitucional. Inteligência do art. 5º, X e XI, da CF, art. 150, § 4º, III, do CP, e art. 7º, II, da Lei nº 8.906/94. Preliminar rejeitada. Votos vencidos. Não opera a inviolabilidade do escritório de advocacia, quando o https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 39 de 317 próprio advogado seja suspeito da prática de crime, sobretudo concebido e consumado no âmbito desse local de trabalho, sob pretexto de exercício da profissão. 9. PROVA. Criminal. Interceptação telefônica. Transcrição da totalidade das gravações. Desnecessidade. Gravações diárias e ininterruptas de diversos terminais durante período de 7 (sete) meses. Conteúdo sonoro armazenado em 2 (dois) DVDs e 1 (hum) HD, com mais de quinhentos mil arquivos. Impossibilidade material e inutilidade prática de reprodução gráfica. Suficiência da transcrição literal e integral das gravações em que se apoiou a denúncia. Acesso garantido às defesas também mediante meio magnético, com reabertura de prazo. Cerceamento de defesa não ocorrente. Preliminar repelida. Interpretação do art. 6º, § 1º, da Lei nº 9.296/96. Precedentes. Votos vencidos. O disposto no art. 6º, § 1º, da Lei federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, só comporta a interpretação sensata de que, salvo para fim ulterior, só é exigível, na formalização da prova de interceptação telefônica, a transcrição integral de tudo aquilo que seja relevante para esclarecer sobre os fatos da causa sub iudice. (...) (Inq 2424, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, DJe 25/03/2010) (grifei) Na hipótese dos autos, a interceptação do ramal telefônico de titularidade de Roberto Teixeira foi postulada pelo Ministério Público e deferida pelo juízo a quo, em decisão devidamente fundamentada, diante do preenchimento dos requisitos legais. Ao contrário do que afirma o apelante, não há qualquer ilegalidade no decreto de quebra de sigilo telefônico com fundamentação per relationem, tendo o magistrado feito alusão aos termos de decisão anterior, como forma de fundamentar a determinação, sobretudo porquanto coincidentes os fatos. A técnica da motivação per relationem é amplamente aceita pela jurisprudência pátria, de modo que a referência ao contido em decisão anterior, somada ao estágio e às circunstâncias da investigação, dispensa a repetição dos fundamentos primitivos. Nesse sentido: PROCESSUAL PENAL E PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL, ORDINÁRIO OU DE REVISÃO CRIMINAL. NÃO CABIMENTO. PARTICIPAÇÃO DE AGENTE COM FORO ESPECIAL. INDÍCIOS SÉRIOS E RELEVANTES. AUSÊNCIA. QUEBRA DO SIGILO TELEFÔNICO. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. Ressalvada pessoal compreensão diversa, uniformizou o Superior Tribunal de Justiça ser inadequado o writ em substituição a recursos especial e ordinário, ou de revisão criminal, admitindo-se, de ofício, a concessão da ordem ante a constatação de ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia. 2. A competência em razão da função somente incide a partir do momento em que constatados indícios sérios e relevantes da participação de agente com direito ao foro especial, situação não admitida na origem e de fatos incertos, com valoração não cabível no habeas corpus. 3. Inexiste ilegalidade no decreto de quebra de sigilo telefônico com fundamentação per relationem, como quando o magistrado faz alusão aos termos do requerimento da polícia e do parecer do Ministério Público para embasar o deferimento. 4. Habeas corpus não conhecido. (HC 201400476661, NEFI CORDEIRO, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA: 25/09/2014 ..DTPB:.) A Lei nº 9.296/96 prevê em seu artigo 2º que constituem requisitos para a interceptação das comunicações telefônicas (i) a presença de indícios da autoria ou da participação em infração penal, (ii) não ser possível a realização da prova por outros meios disponíveis e (iii) o fato investigado constituir infração penal punida com pena de reclusão. Do conjunto dos autos, depreende-se preenchidos tais requisitos, como já fundamentado pelo juízo singular nas decisões em que deferiu as interceptações (eventos 4 e 42 do pedido de quebra de sigilo nº 5006205-98.2016.4.04.7000/PR): Verificam-se, assim, indícios de que Roberto Teixeira participou de fatos que, em tese, configuram lavagem de dinheiro (ocultação da real propriedade de bens provenientes de crimes de corrupção) (i), crime esse punível com pena de reclusão (iii). Também restou https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 40 de 317 demonstrada a impossibilidade de realização da prova por outros meios, já esgotados (ii), como bem fundamentou o juízo na primeira decisão que deferiu a interceptação (evento 4): Apesar do MPF ter reunido um acervo considerável de provas, especialmente em relação ao apartamento e o sítio, a complexidade dos fatos, encobertos por aparentes falsidades e pela utilização de pessoas interpostas, autoriza a utilização da interceptação telefônica para a completa apuração dos fatos. Talvez ela possa melhor esclarecer a relação do ex-Presidente com as empreiteiras e os motivos da aparente ocultação de patrimônio e dos benefícios custeados pelas empreiteiras em relação aos dois imóveis. Não vislumbro no presente momento outro meio para elucidar tais fatos salvo a interceptação ou outros métodos de investigação mais invasivos. Ademais, como bem ressalvou o magistrado a quo na decisão que indeferiu o pedido da ora apelante, 'nos poucos diálogos interceptados no referido terminal e que foram selecionados como relevantes pela autoridade policial e, por conseguinte, juntados ao processo 5006205-98.2016.4.04.7000/PR, não há nenhum que possa ser facilmente identificável como atinente à discussão da defesa do ex-Presidente. Aliás, a Requerente e mesmo a Defesa do ex-Presidente nas petições já apresentadas a este Juízo não apontam nenhum diálogo específico cujo conteúdo estaria de fato relacionado ao direito de defesa' (evento 12 do originário). Sendo assim, não sendo a suposta prática de crimes acobertada pela garantia constitucional da inviolabilidade do sigilo do advogado e preenchidos os requisitos legais previstos na Lei nº 9.296/96, reputo válida a interceptação do ramal telefônico pertencente a Roberto Teixeira. 3.2. Do terminal telefônico do escritório Teixeira, Martins & Advogados (11 3060-3310) Postula o Conselho apelante, ainda, a declaração de invalidade da prova decorrente da interceptação do terminal telefônico nº (11) 3060-3310, sob o argumento de que pertencente ao escritório Teixeira, Martins & Advogados. Inicialmente, frise-se não haver qualquer ilegalidade na decisão que determinou a produção da prova em questão. A decisão que autorizou a quebra de sigilo fora devidamente fundamentada e visava a interceptação de ramal pertencente à empresa de um dos investigados no Inquérito Policial nº 5006597-38.2016.404.7000/PR. Conforme amplamente demonstrado pela prova dos autos, a empresa L.I.L.S. Palestras, Eventos e Publicações Ltda., ao preencher os seus dados cadastrais, informou à Receita Federal como sendo seu o número de telefone (11) 3060-3310 (evento 1 - PROMOÇÃO5, pág. 24). Foi, portanto, a empresa interceptada que forneceu a informação de utilização de determinado número telefônico como seu. Pelas informações fornecidas pela Receita Federal, depreende-se que tão logo levantado o sigilo das interceptações, a empresa L.I.L.S. Palestras, Eventos e Publicações Ltda. alterou o seu telefone no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, passando a constar o número (00) 1111-1111 (evento 1 - PROMOÇÃO5, pág. 24). Ou seja, tanto no momento do requerimento formulado pelo Ministério Público de quebra de sigilo, quanto no dia da prolação da decisão que a deferiu, a informação pública, fornecida pelos próprios investigados, era de que o ramal telefônico (11) 3060-3310 pertencia à empresa alvo. Somente depois de deferida e implementada a interceptação, verificou-se que a referida linha telefônica pertencia, em verdade, ao escritório Teixeira, Martins & Advogados (ofício enviado pela empresa de telefonia constante no evento 41 - OFIC4, dos autos nº 5006205-98.2016.4.04.7000/PR/PR). Assim, não há falar em nulidade da decisão que determina a interceptação de ramal telefônico tido por pertencente a um dos investigados com base em informações constantes em cadastro público (CNPJ). Por outro lado, constatado que o telefone é de titularidade de terceiro, estranho à investigação, a prova pode ser imprestável aos autos, autorizando o desentranhamento e sua inutilização, nos termos do artigo 9º da Lei nº 9.296/96, verbis: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 41 de 317 Art. 9° A gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada. Parágrafo único. O incidente de inutilização será assistido pelo Ministério Público, sendo facultada a presença do acusado ou de seu representante legal. Assim, ausente nulidade na decisão que autorizou a interceptação do ramal telefônico nº (11) 3060-3310, podendo a prova produzida ser excluída dos autos, a pedido de uma das partes, diante da posterior constatação de que a linha pertencia a pessoa estranha à investigação. Não se vê nas razões de decidir deliberada intenção de prejudicar o apelante ou os demais investigados, pois havia fundada motivação para o deferimento da quebra de sigilo e a medida invasiva teve como terminais telefônicos aqueles constantes em cadastros oficiais do CNPJ da sua empresa. A medida foi determinada ainda na fase préprocessual e, naquele momento, apontava-se para a necessidade de identificar os supostos envolvidos em diversos delitos, não somente os que foram apurados nesta ação penal. Em se tratando de quebra de sigilo prévia - e, portanto, preparatória -, dela podem surgir diversas ações penais, como de fato aconteceu. Exemplo disso é que o advogado Roberto Teixeira responde às Ações Penais nº 5063130-17.2016.404.7000/PR e nº 5021365-32.2017.404.7000/PR, a quem é imputada a participação em crimes correlatos. De qualquer modo, não há registro na sentença de utilização de qualquer das interceptações ou mesmo de que tenham alguma utilidade para o presente processo. Tampouco a defesa aponta expressamente qual ou quais seriam as interceptações prejudiciais, limitando sua insurgência ao campo da teoria e da nulidade genérica. Por fim, anote-se que o saudoso Ministro Teori Zavascki, na referida reclamação nº 23.457, considerou: Cumpre deixar registrado que o reconhecimento, que aqui se faz, de nulidade da prova colhida indevidamente deve ter seu âmbito compreendido nos seus devidos limites: referese apenas às escutas telefônicas captadas após a decisão que determinou o encerramento da interceptação. Não se está fazendo juízo de valor, nem positivo e nem negativo, sobre o restante do conteúdo interceptado, pois isso extrapolaria o objeto próprio da presente reclamação. Portanto, nada impede que qualquer interessado, pela via processual adequada, conteste a higidez da referida prova. DESTAQUEI Nessa linha, a violação de competência da Corte Suprema tem conexão exclusiva no que pertine ao levantamento de sigilo e à nulidade das interceptações posteriores à determinação de interrupção, somente pela captura de diálogos travados entre o apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e a então Presidenta da República. Períodos anteriores, dessa forma, não estão abrangidos pela decisão do Supremo Tribunal Federal. Tanto que o saudoso Ministro Teori Zavascki, fez constar que 'não se identifica, a princípio, tenham sido as investigações ou as interceptações telefônicas abertamente voltadas contra pessoas detentoras de foro por prerrogativa de função no STF' e determinou fossem 'desentranhados e devolvidos ao juízo reclamado os documentos protocolados sob o número 22.476/2016 (Incidente de Restituição de Coisas https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 42 de 317 Apreendidas 50110065-45.2016.4.04.7000/PR/PR), para que tenha processamento naquele juízo'. 2.2.5. Argumenta a defesa, ainda, que o julgador é imparcial porque levantou o sigilo de interceptações telefônicas ilegais. Novamente inexiste correspondência entre a decisão apontada e alguma causa de suspeição ou impedimento. O sigilo do inquérito vem em benefício da investigação, não podendo ser invocado para a proteção de investigados ou para acobertar o próprio crime, premissa esta fielmente seguida nas diversas ações penais desdobradas da 'Operação Lava-Jato'. O paradigma que orienta o julgador não é novo ou foi utilizado com exclusividade neste processo. Como anotado pelo juízo de primeiro grau na Exceção de Suspeição Criminal nº 5032521-51.2016.4.04.7000/PR, 'quanto à alegação de que o levantamento do sigilo teria gerado controvérsias que impediram o Excipiente de tomar posse como Ministro do Estado, é de se questionar se presente aqui uma relação estrita de causa e efeito, pois a insatisfação com o anterior Governo precedeu o fato. De todo modo, ainda que existente, tratar-se-ia de consequências externas ao processo e fora do alcance do poder de decisão deste julgador'. As consequências administrativas e políticas são estranhas ao ofício penal e não podem ser invocadas como causa de suspeição. É de se recordar que a impossibilidade de posse do apelante como Ministro de Estado decorreu de decisão liminar deferida pelo Ministro Gilmar Mendes nas Medidas Cautelares nos Mandados de Segurança nºs 34.070/DF e 34.071/DF, e não por decisão atribuída ao juiz de primeiro grau. 2.2.6. De igual modo, não socorre o apelante a alegação de que o magistrado indevidamente teria produzido provas de ofício no curso da investigação e que, portanto, seria suspeito. O art. 156 do CPP autoriza: Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: I - ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; II - determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante. Muito embora seja possível ao juiz determinar a produção de provas, a defesa não indica especificamente a quais decisões se refere e a respectiva correlação de prejuízo. Apenas a título de argumentação e sem deixar de ressaltar que a exceção de suspeição não é terreno fértil para isso, eventuais máculas nas decisões devem ser tratadas pontualmente, e não com questionamentos genéricos sob a ótica da isenção do julgador. 2.2.7. Também há tentativa de obter a declaração de suspeição do juízo porque teria ele pré-julgado a causa ao prestar informações ao Supremo Tribunal Federal https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 43 de 317 na Reclamação nº 23.457. Por oportuno, reproduzo, no ponto, os fundamentos de rejeição da suspeição perante a 8ª Turma: 4. Alega ainda a Defesa que o julgador teria pré-julgado a causa ao prestar informações ao Supremo Tribunal Federal na Reclamação 23.457. Aqui mais uma vez a Defesa confunde regular exercício da jurisdição com causa de suspeição. O eminente Ministro Teori Zavascki deferiu, em 22/03/2016, liminar na Reclamação 23.457, avocando os processos envolvendo o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, posteriormente devolvidos, e solicitou informações. Cumprindo determinação do Supremo Tribunal Federal, este Juízo prestou informações em 29/03/2016 (Ofício 700001743752, evento 161 do processo 500620598.2016.4.04.7000/PR). As informações são longas em decorrência da controvérsia instaurada. Na ocasião, o Juízo esclareceu ao Egrégio Supremo Tribunal Federal cumpridamente os motivos da interceptação e o motivo do levantamento do sigilo sobre os diálogos, o que exigiu esclarecer a relevância jurídico- criminal dos diálogos interceptados. Apesar da demonstração da relevância jurídico-criminal dos diálogos interceptados, isso foi feito, como consta ali expressamente, com base em juízo provisório e não definitivo quanto aos fatos, como se depreende da utilização frequente das expressões 'cognição sumária', 'em princípio' ou 'aparentemente'. Ilustrativamente destaco trecho: 'Em cognição sumária, o ex-Presidente contatou o atual Ministro da Fazenda buscando que este interferisse nas apurações que a Receita Federal, em auxílio às investigações na Operação Lavajato, realiza em relação ao Instituto Lula e a sua empresa de palestras. A intenção foi percebida, aparentemente, pelo Ministro da Fazenda que, além de ser evasivo, não se pronunciou acolhendo a referida solicitação. O ex-Presidente, aparentemente, tentou obstruir as investigações atuando indevidamente, o que pode configurar crime de obstrução à Justiça (art. 2º, §1º, da Lei nº 12.850/2013). Mesmo sem eventual tipificação, condutas de obstrução à Justiça são juridicamente relevantes para o processo penal porque reclamam medidas processuais para coartá-las. Assim, em princípio, não se pode afirmar que o referido diálogo interceptado não teria relevância jurídico-criminal. E se tem, não se pode afirmar que a divulgação afronta o direito à privacidade do ex-Presidente.' (Grifou-se) Por outro lado não há qualquer afirmação deste julgador da procedência das suspeitas do MPF contra o ex-Presidente no esquema criminoso da Petrobrás. Enfim, não há como depreender do conteúdo das informações qualquer pré-julgamento, são todas afirmações baseadas em cognição sumária e provisória e motivadas exclusivamente pela necessidade de prestar as informações determinadas pelo próprio Egrégio Supremo Tribunal Federal. Não se verifica qualquer pré-julgamento nas informações prestadas ao Supremo Tribunal Federal, mas, como já esclarecido no tópico 3.1, apenas dever de fundamentar. O Ofício nº 700001743752 (evento 161 do processo 500620598.2016.4.04.7000/PR) faz apenas um detalhado resumo das diligências policiais e das quebras de sigilo, destacando fundamentos que já haviam sido apontados nas decisões cautelares. Significa dizer, o mesmo juízo de valor exarado na decisão, foi apenas reforçado nas informações prestadas. O fato bastante comum envolvendo o levantamento de sigilo de escutas telefônicas - sem olvidar que a disciplina legal visa à proteção da investigação e dos investigados -, motivou a propositura de representação disciplinar contra o magistrado. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 44 de 317 O feito aportou na Corte Especial como recurso (PA Corte Especial nº 0003021-32.2016.4.04.8000/RS), ao qual foi negado provimento, havendo tão somente um voto dissonante. Paralelamente, foi distribuída a PETIÇÃO nº 000102285.2016.4.04.0000/RS, pela qual o apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, juntamente com Marisa Letícia Lula da Silva, Fábio Luis Lula da Silva, Sandro Luis Lula da Silva, Luis Cláudio Lula da Silva e Marcos Cláudio Lula da Silva buscavam a procedência de ação penal privada subsidiária em face do Juiz Federal Sérgio Fernando Moro. Na ocasião, narraram as seguintes condutas supostamente ilegais: (a) a condução coercitiva do primeiro Querelante, para prestar depoimento (processo nº 5007401-06.2016.4.04.7000/PR); (b) a autorização de busca e apreensão de bens e documentos (processo nº 5006617-29.2016.4.04.7000/PR); (c) as quebras dos sigilos das comunicações telefônicas dos Querelantes, e o levantamento do sigilo das conversas telefônicas interceptadas em decorrência dessas quebras (processo nº 500620598.2016.4.04.7000/PR). Ao examinar a queixa-crime, a 4ª Seção deste Tribunal, por unanimidade, rejeitou-a. O julgamento foi assim ementado: PENAL E PROCESSUAL PENAL. QUEIXA-CRIME SUBSIDIÁRIA. ABUSO DE PODER E QUEBRA DE SIGILO DE COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS INTERCEPTADAS. ATOS JUDICIAIS. CONDUÇÃO COERCITIVA. QUEBRA DE SIGILO TELEFÔNICO. LEVANTAMENTO DE SIGILO. BUSCA E APREENSÃO. ARQUIVAMENTO DE NOTÍCIAS DE FATOS, A REQUERIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. INÉRCIA INOCORRENTE. QUANTO AO FATO REMANESCENTE - BUSCA E APREENSÃO - NÃO RESTOU CARACTERIZADO O ALEGADO ABUSO DE PODER. REJEIÇÃO DA QUEIXA-CRIME SUBSIDIÁRIA. 1. Para que caiba a propositura da ação penal privada, subsidiária da ação penal pública, é necessário que fique demonstrada a inércia do Ministério Público (Federal, no caso). 2. Essa inércia não se caracteriza quando o Ministério Público requer o arquivamento de notícias-crime, e o órgão judicial competente acolhe seu pedido. 3. Em face disso, no presente caso, os fatos abarcados por arquivamentos anteriormente deferidos (ou seja, a condução coercitiva, a decretação da quebra do sigilo telefônico e o levantamento do sigilo das comunicações interceptadas) não podem dar ensejo à propositura de queixa-crime subsidiária. 4. Ademais, os arquivamentos foram feitos com base na atipicidade das condutas questionadas, formando-se, com base neles, a coisa julgada material. 5. Ainda que esse óbice fosse superado, não há fatos novos que justifiquem a propositura da ação penal, quanto à matéria que constituiu objeto de arquivamento anterior. 6. Uma parte dessa matéria constituiu objeto de reclamação, ao STF (Rcl. Nº 23.457), o qual não determinou a tomada das providências previstas no artigo 40 do Código de Processo Penal. 7. Quanto ao fato remanescente - busca e apreensão -, não há quaisquer elementos concretos que sinalizem para a presença do abuso de autoridade referido na petição que veicula a queixa-crime subsidiária. 8. Queixa-crime subsidiária rejeitada. (TRF4, PETIÇÃO Nº 000102285.2016.404.0000, 4ª SEÇÃO, Des. Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, por unanimidade, D.E. 15/03/2017, PUBLICAÇÃO EM 16/03/2017) Como consequência, o quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal na Reclamação nº 23.457 não torna inapto o juízo para prosseguimento na causa. Até mesmo porque, como registrado pelo e. Relator, 'não restando evidenciado que o magistrado agiu https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 45 de 317 com dolo, fraude, ou grave desídia, não há motivo para cogitar-se da aplicação de sanção disciplinar'. À idêntica conclusão chegou a Corte Especial deste Tribunal ao julgar o recurso em representação disciplinar antes referido. 2.2.8. Surge alegação de suspeição do magistrado porque contra ele foi protocolada representação por abuso de autoridade. Segundo o art. 256 do Código de Processo Penal 'a suspeição não poderá ser declarada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo para criá-la', evitando assim ações deliberadas da defesa com o objetivo de afastar o magistrado da causa. Ademais, a representação proposta pela própria parte não deixa de ser igualmente fator externo ao processo, assim como outras representações protocoladas perante a Procuradoria Regional da República da 4ª Região ou nas Corregedorias deste Tribunal e do Conselho Nacional de Justiça. Não se pode inferir, portanto, a perda de imparcialidade do julgador por ato imputado ao próprio excipiente. 2.2.9. Há afirmação, também, no sentido de estar comprometida a imparcialidade do julgador, haja vista a publicação de matérias jornalísticas a respeito da investigação. A afirmação é de todo despropositada. A divulgação de matérias a respeito do caso investigado e da participação dos envolvidos é típica dos sistemas democráticos. Aliás, deve-se ressaltar que o interesse da imprensa por processos judiciais não é um fenômeno surgido com a deflagração da 'Operação Lava-Jato'. Muitos outros casos já tiveram ampla divulgação. Talvez o de maior notoriedade, a Ação Penal nº 470/STF, conhecida como Mensalão, ganhou acompanhamento quase em tempo integral nas seguidas sessões de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal. Pois bem, a repercussão do caso não guarda vínculo com o processo, pelo que não se há de questionar a imparcialidade do magistrado em face de matérias jornalísticas para as quais não participou. Esta Turma já se debruçou sobre o tema em processo relacionado à 'Operação Lava-Jato': OPERAÇÃO LAVA-JATO' PROCESSO PENAL. ARTS. 252 E 254 DO CPP. EXCEÇÃO, IMPEDIMENTO E SUSPEIÇÃO. ATUAÇÃO DO MAGISTRADO. DECISÕES. FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE EXCESSO. INEXISTÊNCIA DE ANTECIPAÇÃO OU INTERESSE NA CAUSA. PUBLICAÇÕES JORNALÍSTICAS. PUBLICAÇÃO DE ARTIGOS JURÍDICOS. FINALIDADE ACADÊMICA. AUTODECLARAÇÃO EM INQUÉRITO ANTERIOR. INEXISTÊNCIA DE PERTINÊNCIA FÁTICA. 1. As hipóteses de impedimento e suspeição descritas nos arts. 252 e 254 do Código de Processo Penal constituem um rol exaustivo. Precedentes do Tribunal e do STF. Hipótese em que o juízo de admissibilidade da exceção se confundem com o mérito. 2. O impedimento inserto no inciso I do art. 252 do Código de Processo Penal refere-se à atuação do magistrado no mesmo processo em momento anterior e tem como elemento fundamental a atuação formal em razão de função ou atribuição. 3. Não gera impedimento do magistrado a externalização das razões de decidir a respeito de diligências, prisões e recebimento da denúncia, comuns à atividade jurisdicional e exigidas pelo dever de fundamentar estampado na Constituição Federal. 4. A determinação de diligências na fase investigativa, como quebras de sigilo telemáticos e prisões cautelares, não implica https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 46 de 317 antecipação de mérito, mas mero impulso processual relacionado ao poder instrutório. 5. A ampla cobertura jornalística à investigação denominada de 'Operação Lava-Jato', bem como a manifestação da opinião pública, favoráveis ou contrárias, para as quais o magistrado não tenha contribuído, não acarretam a quebra da imparcialidade do magistrado. 6. Eventual manifestação genérica do magistrado em textos jurídicos de natureza acadêmica a respeito de crimes de corrupção, não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à 'Operação Lava-Jato'. 7. Inexistindo pertinência fática entre as causas de suspeição autodeclarada em procedimento penal pretérito e os fatos ora investigados, não se há de falar em ausência de imparcialidade do magistrado. 8. Exceção de suspeição improvida. (TRF4, Exceção de suspeição criminal nº 504010084.2015.404.7000/PR, 8ª Turma, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 22/10/2015). Assegurada a todos os cidadãos e à imprensa - de papel fundamental em uma democracia -, a opinião dos meios de comunicação, ao contrário do que largamente difundido, não pauta a atuação jurisdicional. A propósito, é difícil imaginar uma democracia legítima sem imprensa livre. A discussão a respeito de tentativas de imposição de limites à sua atuação já chegou ao Plenário do Supremo Tribunal Federal que, em julgado paradigmático, assentou que não há liberdade de imprensa pela metade. Confira-se teor do julgado: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). [..]. 2. REGIME CONSTITUCIONAL DA LIBERDADE DE IMPRENSA COMO REFORÇO DAS LIBERDADES DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO, DE INFORMAÇÃO E DE EXPRESSÃO EM SENTIDO GENÉRICO, DE MODO A ABARCAR OS DIREITOS À PRODUÇÃO INTELECTUAL, ARTÍSTICA, CIENTÍFICA E COMUNICACIONAL. A Constituição reservou à imprensa todo um bloco normativo, com o apropriado nome 'Da Comunicação Social' (capítulo V do título VIII). A imprensa como plexo ou conjunto de 'atividades' ganha a dimensão de instituição-ideia, de modo a poder influenciar cada pessoa de per se e até mesmo formar o que se convencionou chamar de opinião pública. Pelo que ela, Constituição, destinou à imprensa o direito de controlar e revelar as coisas respeitantes à vida do Estado e da própria sociedade. A imprensa como alternativa à explicação ou versão estatal de tudo que possa repercutir no seio da sociedade e como garantido espaço de irrupção do pensamento crítico em qualquer situação ou contingência. Entendendo-se por pensamento crítico o que, plenamente comprometido com a verdade ou essência das coisas, se dota de potencial emancipatório de mentes e espíritos. O corpo normativo da Constituição brasileira sinonimiza liberdade de informação jornalística e liberdade de imprensa, rechaçante de qualquer censura prévia a um direito que é signo e penhor da mais encarecida dignidade da pessoa humana, assim como do mais evoluído estado de civilização. [...]. O art. 220 da Constituição radicaliza e alarga o regime de plena liberdade de atuação da imprensa, porquanto fala: a) que os mencionados direitos de personalidade (liberdade de pensamento, criação, expressão e informação) estão a salvo de qualquer restrição em seu exercício, seja qual for o suporte físico ou tecnológico de sua veiculação; b) que tal exercício não se sujeita a outras disposições que não sejam as figurantes dela própria, Constituição. A liberdade de informação jornalística é versada pela Constituição Federal como expressão sinônima de liberdade de imprensa. Os direitos que dão conteúdo à liberdade de imprensa são bens de personalidade que se qualificam como sobredireitos. Daí que, no limite, as relações de imprensa e as relações de intimidade, vida privada, imagem e honra são de mútua excludência, no sentido de que as primeiras se antecipam, no tempo, às segundas; ou seja, antes de tudo prevalecem as relações de imprensa como superiores bens jurídicos e natural forma de controle social sobre o poder do Estado, sobrevindo as demais relações como eventual responsabilização ou consequência do pleno gozo das primeiras. A expressão constitucional 'observado o disposto nesta Constituição' (parte final do art. 220) traduz a incidência dos dispositivos tutelares de outros bens de personalidade, é certo, mas https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 47 de 317 como consequência ou responsabilização pelo desfrute da 'plena liberdade de informação jornalística' (§ 1º do mesmo art. 220 da Constituição Federal). Não há liberdade de imprensa pela metade ou sob as tenazes da censura prévia, inclusive a procedente do Poder Judiciário, pena de se resvalar para o espaço inconstitucional da prestidigitação jurídica. Silenciando a Constituição quanto ao regime da internet (rede mundial de computadores), não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias e opiniões, debates, notícias e tudo o mais que signifique plenitude de comunicação. [...] (ADPF 130, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 30/04/2009, DJe-208 DIVULG 05-11-2009 PUBLIC 06-11-2009 EMENT VOL-02381-01 PP-00001 RTJ VOL-00213- PP-00020 - destaquei) 2.2.10. Em outra linha de argumentação, o magistrado seria suspeito em razão de texto escrito em 2004 a respeito da denominada Operação Mãos Limpas. Não merece prosperar a pretensão. Muito embora as ações e reações surgidas com operação italiana e a similar brasileira sejam, em certa medida, comuns, o referido artigo tem índole meramente informativa e sequer é contemporâneo aos fatos. Note-se que foi publicado na Revista CEJ/Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários. Brasília: CJF, n.º 26, em setembro de 2004, praticamente uma década antes da 'Operação Lava-Jato'. Difícil supor, diante disso, que um texto descritivo e acadêmico a respeito do combate ao crime organizado em outro país, muitos anos antes, possa afetar a imparcialidade do juiz condutor da causa ou que signifique prenúncio de condenação. Ademais, eventuais opiniões externas não representam, vale repetir, antecipação de mérito ou pré-julgamento. Nesse sentido, precedente deste Tribunal: PROCESSUAL PENAL. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. ATOS DO PROCESSO. DEVER DE FUNDAMENTAR. EXCESSO NÃO CONFIGURADO. ACORDO DE DELAÇÃO. PARTICIPAÇÃO DO MAGISTRADO. AÇÃO PENAL Nº 470/STF. JUIZ AUXILIAR. INEXISTÊNCIA DE JURISDIÇÃO. ARTIGOS PUBLICADOS. IMPARCIALIDADE NÃO CARACTERIZADA. AUTODECLARAÇÃO DE SUSPEIÇÃO ANTERIOR. IMPROCEDÊNCIA DA EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL. 1. Não gera impedimento do magistrado, tampouco implica em antecipação do juízo de mérito, a externalização das razões de decidir a respeito de diligências, prisões e recebimento da denúncia, comuns à atividade jurisdicional e exigidas pelo dever de fundamentar estampado na Constituição Federal. (...). 5. Eventuais manifestações do magistrado em texto jurídico publicado em revista especializada a respeito da Operação Mãos Limpas (Itália), tem natureza meramente acadêmica, descritiva e informativa e não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à 'Operação Lava-Jato', deflagrada, inclusive, muitos anos depois. De igual modo e por ter o mesmo caráter acadêmico, não autoriza que se levante a suspeição do magistrado ou mesmo o seu desrespeito às Cortes Recursais. 7. Hipótese em que a garantia do duplo grau de jurisdição restou preservado pelas inúmeras impugnações manejadas pela defesa do excipiente perante o Tribunal Regional e Tribunais Excepcionais. 8. Como já assentado em outras oportunidades no bojo da Operação Lava-Jato, inexiste liame objetivo entre os fatos outrora imputados ao exDeputado Federal José Janene e aqueles pelos quais o excipiente foi denunciado. (...) (TRF4, Exceção de Suspeição Criminal nº 5004838-73.2015.404.7000/PR, 8ª Turma, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 09/04/2015). DESTAQUEI 2.2.11. Há questionamento da imparcialidade do julgador porque o Tribunal Regional Federal da 4ª Região teria, por resoluções, limitado sua competência aos casos referentes à assim denominada 'Operação Lava-Jato'. O tema foi abordado na sentença, da qual se extrai (Exceção de Suspeição Criminal nº 5032521-51.2016.4.04.7000/PR): https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 48 de 317 Ora, a decisão do TRF4 decorre do grande número de processos relativos à Operação Lavajato e a sua complexidade. Necessário focar a atuação de um juiz nesses feitos e permitir que os demais sejam cuidados por outros juízes. Não ficou claro como isso poderia determinar a suspeição desse julgador. Ainda que a argumentação do Excipiente faça pouco sentido, falta seriedade à argumentação da Defesa do Excipiente no tópico, o que dispensa maiores comentários. Cuida-se, novamente, de suposta suspeição dissociada do processo. A pretensão é bastante genérica e não tem efeitos sobre a isenção do juiz. De resto, os crimes praticados contra a administração pública, de corrupção e organização criminosa, devem ser tratados com prioridade, segundo determinação do Conselho Nacional de Justiça. Tal circunstância, somada à conhecida grandiosidade da 'Operação LavaJato', justifica a limitação temporária de distribuição ao juiz prevento, a qual se deu por deliberação deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Como já anotado, 'a limitação de distribuição de processos ao juízo excepto diz respeito à administração da justiça da competência do Tribunal Regional da 4ª Região e não guarda correspondência com as causas de suspeição previstas no CPP ou implica em quebra de isenção do excepto' (Exceção de Suspeição nº 5032531-95.2016.4.04.7000/PR - minha relatoria, 8ª Turma do TRF4 - un. - j. 08/03/2017) 2.2.12. Segundo sustentado, ainda, o julgador de primeiro grau seria suspeito porque: (a) já participou de diversos eventos políticos; (b) teria participado de jantar promovido pelo Instituto dos Advogados do Paraná e que, ao final, teria revelado que o excipiente estaria condenado até o final do ano; (c) alguns setores da sociedade imaginam que o excepto já tem convicção formada a respeito da responsabilidade criminal do excipiente; (d) institutos de pesquisa de opinião passaram a incluir seu nome em cenários de eleições presidenciais. No ponto, reporto-me às razões de rejeição de exceção de suspeição criminal antes indicada. Anotou o juízo de origem: 7. Alega o Excipiente que o julgador 'já participou de diversos eventos políticos' (fl. 46-50) Trata-se aqui de afirmação falsa. Este julgador jamais participou de evento político. Nenhum dos eventos citados, organizados principalmente por órgãos da imprensa, constitui evento político. Quanto à afirmação do Excipiente de que seria vítima de calúnias ou difamações por parte dos órgãos de imprensa organizadores dos eventos, oportuno lembrar que, ainda que isso fosse verdadeiro, não controla este julgador a linha editorial de tais órgãos de imprensa. Quanto a esses eventos, esclareça-se ainda que, relativamente ao evento na aludida LIDE, em São Paulo, no qual estava presente o Sr. João Dória Júnior, é importante destacar que ele ocorreu, em 22/09/2015, muito distante da eleição municipal neste ano ou da própria definição de referida pessoa como candidato à Prefeitura de São Paulo. Além disso, a palestra foi destinada aos empresários ali presentes, sem qualquer conotação política. Já sobre a participação do julgador no evento na LIDE Paraná durante este mesmo ano de 2016, não contou ele com a presença do Sr. João Dória Júnior, nem sequer a organização ou convite foi da responsabilidade dele. 8. Afirma o Excipiente que o julgador teria, no dia 09/06/2016, participado 'de jantar promovido pelo Presidente do Instituto dos Advogados do Paraná, e, ao final, para um reduzido público, teria afirmado que o Excipiente seria condenado até o final do corrente ano'. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 49 de 317 A fonte seria notícia de blog (https://osdivergentes.com.br/tales-faria/tietagem-moroprovoca-racha-entre-advogados-e-fofoca-de-prisao-de-lula/). Fundar uma exceção de suspeição em notícia de blog revela apenas conduta processual temerária da Defesa do Excipiente. De todo modo, para esclarecer o que não precisaria ser esclarecido não fosse a conduta temerária, a notícia é absolutamente falsa quanto à suposta afirmação do ora julgador. Aliás, até mesmo o referido jantar nunca ocorreu. Falta seriedade à argumentação da Defesa do Excipiente no tópico, o que dispensa maiores comentários. 9. Alega o Excipiente que o julgador seria suspeito porque alguns segmentos da sociedade teriam a idéia de que o julgador já teria posição firmada em relação ao Excipiente (fls. 5154). Faltou ao Excipiente esclarecer como atos ou 'idéias' de terceiros podem justificar a suspeição do julgador. Falta seriedade à argumentação da Defesa do Excipiente no tópico, o que dispensa maiores comentários. 10. Argumenta o Excipiente que o julgador seria suspeito porque 'institutos de pesquisa de opinião passaram a incluir seu nome em cenários de eleições presidenciais.' Faltou ao Excipiente esclarecer como atos de terceiros podem justificar a suspeição do julgador. Falta seriedade à argumentação da Defesa do Excipiente no tópico, o que dispensa maiores comentários. Mais uma vez os fundamentos da suspeição são completamente estranhos. Anote-se que o magistrado de primeiro grau - como de resto o Poder Judiciário - não tem ingerência sobre a linha editorial de jornais e revistas ou mesmo sobre a opinião pública. Deve-se dizer que a imprensa exerce papel fundamental no controle das instituições e esse importante pilar do Estado Democrático não pode ser enfraquecido em virtude das insatisfações de quaisquer pessoas, inclusive de réus em processo penal. Em um período de luz - e não de sombra - as interpretações dos meios de comunicação são livres e legítimas, sejam elas favoráveis às investigações, sejam em apoio ao ex-Presidente. Imune a isso, porém, o processo é julgado conforme os fatos e as provas que nele estão encartadas, nunca influenciado pelo clamor popular, pela crítica ou pela história dos investigados. Como afirmando pela e. Ministra Carmen Lúcia no célebre julgamento conhecido por 'Mensalão', 'não estamos julgando histórias pessoais porque, às vezes, elas são construídas com desvios. Não estou julgando pessoas que em diversas situações tiveram condutas sérias. Estou julgando apenas se houve a prática imputada pelo Ministério Público'. Não há de se falar, pois, em pré-julgamento ou parcialidade, ante a falta de aptidão dos fatos invocados para interferir na convicção do julgador. Importa, sim, que as decisões sejam fundamentadas, como de fato são. Aliás, nos diversos processos em que houve julgamento de mérito pelo primeiro grau, há réus absolvidos de parte ou de todos os fatos que lhe foram imputados - inclusive neste feito -, demonstrando que o julgamento pauta-se segundo as provas e a convicção do juiz sentenciante. No mais, a participação em eventos, com ou sem a presença de agentes políticos, não macula a isenção do juiz, em especial porque possuem natureza meramente https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 50 de 317 acadêmica, informativa ou cerimonial, sendo notório que em tais aparições não há pronunciamentos específicos a respeito de processos em andamento. Há, pois, nítida tentativa de politizar solenidades que não possuem tal natureza e que se a têm, certamente não é em razão da presença de qualquer autoridade do Judiciário. Nessa perspectiva, eventos com a presença de políticos não se traduzem em eventos políticos partidários. 2.2.13. Também infundada a afirmação de que a testemunha José Afonso, zelador do edifício Solaris, proferiu ofensas aos defensores do excipiente, sem ser advertido pelo juiz. Transcrevo, por pertinente, excerto do depoimento em que a defesa questionava o ingresso da testemunha na vida política: (...) Defesa:- O senhor pode descrever como é que se deu esse seu ingresso na política? Depoente:- Olha, vou falar um negócio para você, eu, depois dessa situação toda que teve no Solaris eu fiquei desempregado, numa situação difícil onde você nem imagina... Defesa:- A pergunta é sobre o ingresso do senhor na política. Juiz Federal:- Ele está explicando. Ministério Público Federal:- Ele está explicando. Juiz Federal:- Não corte a palavra da testemunha. O senhor pode responder a pergunta como o senhor estava respondendo. Depoente:- Você não sabe o que é uma pessoa estar desempregada, passando por uma dificuldade terrível, o desemprego está altíssimo, porque eu fui envolvido numa situação que eu não tenho culpa nenhuma, eu perdi o meu emprego, perdi a minha moradia, aí você vem querer me acusar, falar alguma coisa contra mim, o que você faria numa situação, como é que você sustentaria a sua família? Defesa:- Não, senhor José Afonso, eu não estou acusando o senhor. Depoente:- Você nunca passou por isso, quem é você para falar alguma coisa contra mim? Vocês são, posso falar o que vocês são, vocês são um bando de lixo, lixo, isso que vocês são, o que vocês estão fazendo com o nosso país, fizeram com o nosso país, isso... Juiz Federal:- Senhor José Afonso, senhor José Afonso. Senhor José Afonso, por gentileza, vamos se acalmar aqui, não é o momento de ofender ninguém aqui, eu peço para o senhor se acalmar, certo? Então, pelo que eu entendi, o senhor estava desempregado e resolveu entrar pra política, foi isso? Depoente:- Foi isso, doutor Moro, eu vejo, ele desmereceu o poder judiciário, chegam e desfazem de vocês, rapaz, isso é coisa que não se faz... Juiz Federal:- Certo, senhor José Afonso. Defesa:- Excelência... Juiz Federal:- Certo, senhor José Afonso, mas eu vou pedir para o senhor, independentemente da sua opinião sobre isso, eu respeito a sua opinião, todo mundo respeita a sua opinião, mas eu vou pedir para o senhor responder as questões, assim, menos emocionalmente, mais objetivamente, certo, perfeito? Depoente:- Está certo, está certo, perfeito. DESTAQUEI Ora, os trechos acima destacados dispensam maiores considerações e sequer haveria relação com o processo o ingresso da testemunha na vida política. Fato é que ela foi efetivamente advertida pelo juízo para que respondesse aos questionamentos de modo objetivo, sem esboçar emoções. Os testemunhos da acusação e defesa são igualmente válidos, independente da carga ideológica pretérita ou mesmo de afinidades partidárias, cabendo ao magistrado aferir a prestabilidade de suas afirmações no exame do mérito. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 51 de 317 2.2.14. Diz a defesa que o juiz é parcial porque, duas semanas após a prolação da sentença, deu entrevista ao portal da Folha de São Paulo dela tratando. No ponto, sirvo-me de trecho reproduzido nas próprias razões recursais: Folha - Há sentenças na Lava Jato que não se baseiam apenas em documentos, mas também em outros tipos de provas. Um exemplo é a condenação do ex-presidente Lula, que aponta que os benefícios concedidos ao ex-presidente têm como 'única explicação' a corrupção na Petrobras. Qual sua posição sobre o uso de presunções desse tipo? Sergio Moro - Sobre a sentença do ex-presidente, tudo o que eu queria dizer já está na sentença, e não vou fazer comentários. Teoricamente, uma classificação do processo penal é a da prova direta e da prova indireta, que é a tal da prova indiciária. Para ficar num exemplo clássico: uma testemunha que viu um homicídio. É uma prova direta. Uma prova indireta é alguém que não viu o homicídio, mas viu alguém deixando o local do crime com uma arma fumegando. Ele não presenciou o fato, mas viu algo do qual se infere que a pessoa é culpada. Quando o juiz decide, avalia as provas diretas e as indiretas. Não é nada extraordinário em relação ao que acontece no cotidiano das varas criminais. GRIFOS ORIGINAIS. Primeiramente, há que se referir que a defesa dá maior ênfase à pergunta do jornalista do que à resposta do juiz. À indagação, respondeu o magistrado: 'tudo o queria dizer já está na sentença, e não vou fazer comentários'. No restante, há apenas considerações genéricas a respeito do exame de provas, utilizando-se, inclusive, de exemplo bastante dissociado do caso ora tratado. Nada além, portanto, do que já explicitado na própria sentença. Além disso, a entrevista se deu em momento posterior à sua prolação, pelo que não teria aptidão - se assim fosse - de macular a compreensão do magistrado a respeito dos fatos. 2.2.15. Alega o apelante que o juízo é suspeito em razão da página denominada 'Eu MORO com ele #rosangelawolfmoro', criada na rede social Facebook. De fato, como a própria defesa admite, 'o seu propósito seria agradecer 'às inúmeras mensagens de carinho recebidas'. Até aí, tudo muito correto e normal'. Afirma, porém, que a página contém mensagens de ódio e apoio e que revela a estrutura da parcialidade e complementa: 'Quem não quiser ver - porque não quer - então, não veja'. Sem adentrar na qualidade das manifestações, não são elas imputáveis diretamente ao juízo de primeiro grau. É inaceitável supor que o Judiciário selecione o que pode ou não ser publicado em uma rede social, qualificando as livres manifestações do pensamento. A essas manifestações - que, por óbvio, estão impregnadas de cargas ideológicas e paixões - dá-se o nome de liberdade de expressão, algo tão caro nos Estados Democráticos que não se pode sequer pensar em fragilizá-la ao talante do 'ofendido'. Qualificadas ou não, corretas ou incorretas - e esse recente fenômeno opinativo, muitas das vezes desconhece os fatos e provas do processo - as manifestações contrárias à 'Operação Lava-Jato' são proporcionais às manifestações de apoio. Posições desfavoráveis ao apelante são tão legítimas quanto às favoráveis (também impregnadas de ideologias e paixões), sendo desarrazoado pensar que o debate fora dos autos é capaz de contaminar o processo em qualquer grau de jurisdição. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 52 de 317 A tentativa de emprestar um caráter ideológico ao processo é desarrazoada. Eventual antagonismo político somente tem lugar na tese defensiva e em eventuais críticos da 'Operação Lava-Jato', sobretudo após as investigações identificarem representantes do voto popular envolvidos no esquema de corrupção sistêmica que assolou a Petrobras. O protagonismo atribuído ao magistrado e às vezes, de forma geral, ao próprio Judiciário, é tese tentadora e difundida por muitos, que nada mais fazem, do que, eles próprios, buscarem o tão criticado protagonismo. Todos são crédulos nas suas verdades irrefutáveis e certamente se auto-atribuindo maior grau de isenção do que qualquer juiz ou tribunal. Porém, em se tratando de investigação deflagrada há mais de três anos e que tinha por finalidade apurar crimes cometidos por doleiros, é preciso esclarecer que o processo não é um mecanismo para obstaculizar a intenção do apelante de concorrer novamente ao cargo de Presidente da República. Reforça tal percepção a denúncia ter sido oferecida em 14/09/2016, ou seja, dois anos antes das próximas eleições gerais, cujo período de convenções e inscrições de candidaturas sequer está próximo. Ou seja, a aspiração do apelante a cargo eletivo, seja ele qual for, não serve de porto seguro, muito menos tem aptidão para contaminar o processo. Fosse assim, a qualquer denunciado bastaria invocar razões políticas para desqualificar a jurisdição. A afirmação é ainda mais frágil quando percebido que - nos limites da competência da instância originária - agentes políticos de outros partidos foram denunciados e condenados, até mesmo em segundo grau. Opiniões externas, sejam elas juridicamente abalizadas ou não, mostram-se irrelevantes para apurar a suspeição do magistrado. Louvando sempre o debate acadêmico - nada além disso -, registre-se que, em contraposição às teses de inúmeros juristas em prol da declaração de suspeição do juiz de origem, há outras tantas em sentido contrário e de igual envergadura. O processo penal não tem ideologia política, tampouco é popular ou elitista. Servindo-me de uma expressão bastante utilizada ultimamente, mas, por vezes, distorcida, pode-se dizer que o processo penal é republicano e, nessa linha, não há contaminações, exceto no imaginário dos resistentes ao efetivo combate à corrupção. 2.3. Suspeição dos Procuradores da República A defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA sustenta a suspeição dos Procuradores da República Deltan Martinazzo Dallagnol, Antonio Carlos Welter, Carlos Fernando Dos Santos Lima, Januário Paludo, Isabel Cristina Groba Vieira, Orlando Martello, Diogo Castor de Mattos, Roberson Henrique Pozzobon, Julio Carlos Motta Norocha, Jerusa Burmann Viecill, Paulo Roberto Galvão de Carvalho, Athayde Ribeiro Costa e Laura Gonçalves Tessler - integrantes da chamada Força Tarefa da 'Operação Lava-Jato'. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 53 de 317 Diz que os representantes ministeriais têm protagonizado verdadeiro show midiático contra o apelante, até mesmo extrapolando nas imputações e chegando a propagandear acusações desassociadas do objeto da ação penal, como na 'infeliz apresentação de Power Point'. Alega que as condutas dos integrantes da Força Tarefa violam a presunção constitucional de inocência e procuram colocar o apelante em situação delicada perante a opinião pública. Requer, com isso, 'sejam declarados nulos os atos praticados pelos Procuradores da República eivados de suspeição'. Como já esclarecido, as exceções de suspeição encontram previsão numerus clausus no art. 254 do Código de Processo Penal. A sentença assim rejeitou a suspeição dos membros do Ministério Público Federal: 128. Reclama ainda a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva que a 'guerra jurídica' estaria caracterizada pela realização pelos Procuradores da República de uma entrevista coletiva, em 14/09/2016, na qual teriam atacado a imagem do ex-Presidente ao explicar o conteúdo da denúncia. 129. Sobre esta questão, este Juízo já rejeitou a exceção de suspeição promovida pela Defesa contra os Procuradores da República subscritores da denúncia e participantes da aludida entrevista coletiva, com cópia no evento 335. Remete-se ao ali exposto. 130. Ainda que eventualmente se possa criticar a forma ou linguagem utilizada na referida entrevista coletiva, isso não tem efeito prático para a presente ação penal, pois o que importa são as peças processuais produzidas. 131. Ainda que eventualmente se possa entender que a entrevista não foi, na forma, apropriada, parece distante de caracterizar uma 'guerra jurídica' contra o ex-Presidente. 132. Por fim, ainda sobre a afirmada 'guerra jurídica', seria ela também decorrente da 'instrumentalização da mídia' ou estaria sendo realizada 'com apoio de setores da mídia tradicional'. 133. Em ambiente de liberdade de expressão, cabe à imprensa noticiar livremente os fatos. O sucessivo noticiário negativo em relação a determinados políticos, não somente em relação ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, parece, em regra, ser mais o reflexo do cumprimento pela imprensa do seu dever de noticiar os fatos do que alguma espécie de perseguição política a quem quer que seja. Não há qualquer dúvida de que deve-se tirar a política das páginas policiais, mas isso se resolve tirando o crime da política e não a liberdade da imprensa. 134. Entre os fatos recentes, encontra-se um escândalo criminal com prejuízos de corrupção estimados em cerca de seis bilhões de reais pela própria Petrobrás e que teria ocorrido durante os mandatos do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de sua sucessora. É natural, no contexto, que a imprensa tenha notícias para divulgar. 135. De todo modo, este Juízo não controla e não pretende controlar a imprensa, nem tem qualquer influência em relação ao que ela publica. 136. Além disso, como este mesmo Juízo explicitou, mesmo desnecessariamente, no interrogatório judicial do ex-Presidente, o processo será decidido com base nas leis e nas provas ('eu lhe asseguro que vai ser julgado unicamente com base nas leis e na prova do processo, o senhor pode ficar seguro quanto a isso'), independentemente de qualquer posicionamento da imprensa a respeito do caso. 137. Enfim, todas essas decisões foram tomadas no exercício regular da jurisdição e as alegações de que o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva sofreria alguma espécie de 'lawfare' não encontram sustentação nos fatos da investigação e do processo, aparentando ser um rematado exagero por parte da Defesa de acusado que responde o processo em liberdade, não só de locomoção, mas de manifestação, e que vem exercendo amplamente a sua defesa. 138. No fundo, portanto, é mais uma tentativa de diversionismo em relação ao mérito da acusação e de apresentar o ex-Presidente como vítima de uma 'guerra jurídica' inexistente. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 54 de 317 Apenas para rememorar, a defesa do apelante propôs exceção de suspeição criminal, tombada sob o nº 5051579-40.2016.4.04.7000/PR, negada em primeiro grau, nos seguintes termos: No caso, a causa alegada pela Defesa para suspeição dos Procuradores da República seria o fato de, quando da propositura da denúncia, terem eles concedido uma entrevista coletiva, fato esse havido em 14/09/2016. Teria a entrevista antecipado conteúdo condenatório e teria caracterizado verdadeiro 'espetáculo', contrário à discrição profissional exigida. Alega ainda a Defesa que a denúncia oferecida, com adjetivações como 'ardilosamente', teria sido desrespeitosa, também refletindo exagero, excesso e imparcialidade. Alega ainda a Defesa que o ex-Presidente teria sido elevado a 'inimigo capital' dos Procuradores da República, o que justificaria a exceção. Apesar das alegações da Defesa, ela não aponta qualquer fato objetivo que se enquadre nas hipóteses de impedimento do art. 252 do CPP. Tampouco indica qualquer fato que se enquadre no art. 254 do CPP. Esclareça-se que o Ministério Público é parte, então dele não se espera propriamente imparcialidade. Ainda assim, por sua vinculação à lei e por ter por objetivo promover não interesse próprio, mas o interesse da sociedade em Juízo, é uma parte sui generis. Não pode o representante do Ministério Público agir, por exemplo, na promoção de algum interesse pessoal, por rancor ou por favorecimento. Porém, a argumentação apresentada pela Defesa é simplória e poderia ser assim resumida, como o acusado Luiz Inácio Lula da Silva é inocente, todos os que agem contra ele, no caso os Procuradores da República que apresentaram a denúncia, são seus inimigos e só podem estar agindo com intuito político partidário ou político-ideológico. Embora se possa alegar isso publicamente, como questionável artifício retórico para desmerecer politicamente a acusação, para a Justiça é necessário algo concreto e com amparo legal. Só há impedimento ou suspeição nos casos previstos em lei e não há qualquer descrição de fato objetivo pela Defesa que autorize concluir que os Procuradores da República, que promoveram a ação penal, agem por motivos pessoais, políticos ou ideológicos contra o ex-Presidente. Se a aludida entrevista pode ser eventualmente criticada pela forma e linguagem utilizada, isso não é causa de impedimento ou suspeição. Aparentemente, pretendeu o MPF informar a sociedade a propositura da ação penal e explicitar seus motivos, como espécie de prestação de contas, o que considerando a notoriedade do denunciado tem lá a sua justificativa. A afirmação, na entrevista ou na denúncia, do suposto poder de Luiz Inácio Lula da Silva de comando dos crimes havidos na Petrobrás tem, por sua vez, possível pertinência com a eventual caracterização dos benefícios supostamente recebidos das empreiteiras como propina. Se isso é ou não procedente, é questão a ser resolvida quando do julgamento, após debates ou instrução, mas afirmar o fato não é, por evidente, causa de suspeição ou de impedimento da Acusação. Quanto aos adjetivos utilizados na denúncia, trata-se de argumentação do MPF e não se vislumbra, com facilidade, neles um tom desrespeitoso. Certamente, a imputação de crime a outrem nunca é totalmente respeitosa, já que contém afirmações incriminadoras contra o acusado, mas isso não é causa de suspeição ou impedimento. Aliás, sobre linguagem e adjetivos, as peças da Defesa são, usualmente, bem mais desrespeitosas com a Acusação do que o contrário. Enfim, a exceção de suspeição, carente de base legal, é manifestamente improcedente, motivo pelo qual rejeito-a. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 55 de 317 Em face de tal rejeição, a defesa impetrou o HC nº 500419595.2017.4.04.0000/PR. Ocorre que as exceções de suspeição em face de membros do Ministério Público não são sindicáveis em segundo grau por recurso específico, por expressa definição do art. 104 do Código de Processo Penal. Apesar disso, afastou-se a alegação de flagrante excesso na função acusatória a ponto de amparar a admissibilidade do remédio constitucional, em julgamento assim ementado: HABEAS CORPUS. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO' SUSPEIÇÃO DO ÓRGÃO ACUSADOR. DECISÃO DENEGATÓRIA. INEXISTÊNCIA DE RECURSO. VEDAÇÃO EXPRESSA DO ART. 104 DO CPP. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. INADEQUAÇÃO DO WRIT. ORDEM NÃO CONHECIDA. 1. O habeas corpus é remédio constitucional voltado ao combate de constrangimento ilegal específico, de ato ou decisão que afete, potencial ou efetivamente, direito líquido e certo do cidadão, com reflexo direto em sua liberdade. 2. Eventual discussão a respeito de vícios materiais e formais da prova poderá ter lugar no curso da própria ação penal ou mesmo em sede recursal, não restando demonstrado flagrante constrangimento ilegal capaz de provocar a suspensão dos atos processuais. 3. O art. 104 do Código de Processo Penal é expresso ao prever que as decisões de primeiro grau que rejeitam as exceções de impedimento ou suspeição dos agentes do Ministério Público não estão sujeitas a recurso. Hipótese em que a utilização do habeas corpus deve ser vista com extrema cautela. Precedentes do STJ. 4. Somente a existência de flagrante ilegalidade na decisão de primeiro grau autoriza a utilização do habeas corpus como meio de impugnação. Não caracterizada qualquer das hipóteses previstas no art. 252 e 254 do CPP ou ainda não havendo indicativos de inimizade capital entre os representantes do Ministério Público Federal e o paciente, não merece trânsito a impetração. 5. Compete ao Ministério Público Federal, no uso de suas prerrogativas e funções constitucionais, promover, privativamente, a ação penal pública (art. 129, I, CF88). 6. Ordem de habeas corpus não conhecida. (TRF4, HABEAS CORPUS Nº 5004195-95.2017.404.0000, 8ª TURMA, Juiz Federal NIVALDO BRUNONI, por unanimidade, juntado aos autos em 18/05/2017). Na oportunidade, ponderou o Juiz Federal Convocado Nivaldo Brunoni, na esteira do que decidido em inúmeras oportunidades pela 8ª Turma, que fatores externos ao processo não possuem aptidão para causar a suspeição do juiz ou mesmo do órgão ministerial. Foi além o então relator: Ainda que tais manifestações possam ser questionadas e os excessos merecedores de criticas, fato é que a pretensão punitiva tem lugar exclusivamente no processo criminal. E, sendo o órgão ministerial o titular da ação penal, não se pode imaginar que ofereça denúncia em desfavor do paciente sem que esteja convicto da sua responsabilidade criminal. Com efeito, admitir-se irrestritamente a tese defensiva, significaria colocar obstáculos à atuação do Ministério Público Federal, o que não se afeiçoa às suas prerrogativas e funções constitucionais, como promover, privativamente, a ação penal pública (art. 129, I, CF88). A par disso, o controle de legalidade e a procedência ou não da denúncia é tema para a instrução processual, e as suspeições e impedimentos estão disciplinadas nos arts. 252 e 254 do Código de Processo Penal, cujo rol não contempla a utilização de linguagem inapropriada pelos promotores. Dessa forma, em que pese tenha dado margem a críticas, inclusive de respeitáveis juristas, não se verifica da referida entrevista qualquer mácula na denúncia que, por vezes de maneira bastante incisiva, defende a responsabilização penal do paciente como reflexo das funções institucionais do Ministério Público Federal. Por fim, o tema já foi objeto de debate tanto pelo Conselho Nacional do Ministério Público Federal, quanto pelo Supremo https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 56 de 317 Tribunal Federal, sendo que nenhum dos casos houve qualquer indicativo de suspeição ou de que haja inimizade capital entre as partes. Como acréscimo e por extremamente pertinentes ao deslinde da controvérsia, trago à colação as ponderações dos Desembargadores Leandro Paulsen e Victor Luiz dos Santos Laus na ocasião do julgamento do referido habeas corpus (evento 36 - NTAQ1): Des. Federal LEANDRO PAULSEN (PRESIDENTE): Na sequência, cabe a mim proferir o voto. Fiz a leitura atenta do material trazido pelo Relator. O Código de Processo Penal diz do descabimento de recurso contra essa decisão do Juiz. De qualquer modo, nós sempre avançamos um pouco, justamente para verificar se por acaso existe algo de teratológico no processo, se a decisão do Magistrado não está bem fundada, enfim, se há alguma irregularidade que pode, efetivamente, prejudicar a existência de um processo justo, na medida em que todo e qualquer cidadão, como bem disse o Advogado da tribuna, do mais humilde ao mais destacado, seja econômica ou politicamente, tem a garantia de só se submeter a um processo justo, a um processo em que se busque efetivamente a verdade. Desse modo, ingressa-se na análise da questão de fundo nessa medida, na medida de se poder flagrar eventualmente algo que exija do Tribunal superar esse juízo de admissibilidade e poder obstar o curso de uma ação que seja lesiva ao devido processo legal. No caso dos autos, o que temos? Temos esta iniciativa do Ministério Público de levar ao conhecimento da sociedade as denúncias que estava oferecendo, as investigações que estava realizando e eventualmente o cometimento de algum excesso por parte da forçatarefa do Ministério Público ao referir fatos ou fazer ilações que desbordavam das denúncias então oferecidas. É referido que o próprio Min. Teori Zavascki, que havia se manifestado nesse sentido, e é bastante possível que sim, este excesso tenha-se verificado. A questão é se saber quais são os efeitos desse excesso, em algumas palavras dito midiático, daquela apresentação. Os efeitos desse excesso seriam tornar os procuradores suspeitos para atuar no caso? Os efeitos desse excesso seriam submeter os procuradores a algum tipo de sanção disciplinar? Os efeitos desse excesso poderiam se dar também na esfera cível? Sabemos que as instituições brasileiras estão abertas aos cidadãos. Neste final de semana mesmo, houve uma publicação também relativa ao paciente e há notícias nos jornais de que o paciente entraria ou teria entrado com uma ação contra aquele órgão de imprensa. Todos nós temos direitos de acesso ao Judiciário. O paciente ingressou com um pedido no Conselho Nacional do Ministério Público contra justamente essa exposição feita pela força-tarefa. Não houve naquele órgão ao qual cabe a correição dos Procuradores nenhum provimento favorável ao paciente. O Magistrado, de outro lado, o Magistrado de piso, ao analisar essa exceção, adequadamente fundamentou a sua decisão no sentido da rejeição, apontando que o Ministério Público é parte, o Ministério Público, portanto, pode requerer a condenação, pode fazer as fundamentações e as manifestações que entender, e que se houver algum excesso fora dos autos isso necessariamente não trará suspeição por parte dos Procuradores. Destacou o Magistrado, na origem, que não há nenhum daqueles indicadores de impedimento ao funcionamento no processo, trabalhados pelos artigos 252 e 254 do CPP, não há a evidência ali de que além de eventual excesso de linguagem ou de motivação os Procuradores tenham qualquer razão pessoal contra o paciente que esteja motivando as suas ações. Não há nenhum elemento no sentido de que a realização das investigações e o ajuizamento das denúncias esteja sendo motivado senão pelo cumprimento das funções institucionais do Ministério Público. E aqui cabe, quem sabe, a retomada de uma frase que volta e meia é trazida à tona no sentido de que nem tudo que incomoda é inconstitucional. Temos alguns excessos sim por parte da acusação, é o que parece haver nesta hipótese, assim como muitas vezes parece que há alguns excessos fora dos autos e mesmo no aviamento de recursos por parte das defesas, mas o Judiciário está atento, está sereno na análise dessas questões para ver se isso realmente compromete o andamento do processo, ou não. No caso em questão, não se https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 57 de 317 tem evidência de que o Ministério Público esteja extrapolando as suas funções e que eventuais excessos possam comprometer a função institucional do Ministério Público. Desse modo, eu adiro à posição do eminente Relator e não conheço do habeas corpus. GRIFO NOSSO Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS: Sr. Presidente: Acredito que, assim como o Dr. Nivaldo, V. Exa. exauriu o tema. Ainda que a Turma tenha por tradição não recepcionar o habeas corpus nessas hipóteses, a Turma não se dispensa de fazer um exame para fins de conhecimento se há, ou não, em princípio, um manifesto constrangimento que possa autorizar a superação dessa preliminar de conhecimento. E foi o que V. Exa. observou agora há pouco. Vinha refletindo ao longo da sessão, enquanto ouvia as sustentações orais, a do Dr. Cristiano e a do Ministério Público aqui presente, e o que mais me parece que deve orientar nossa reflexão - e aqui estarei sendo acaciano, ou seja, dizendo o óbvio - é a Constituição. A Constituição de 1988 alterou o paradigma do processo penal brasileiro. Isso é do conhecimento de todos. E temos aqui estudantes presentes à nossa assistência, daí a nossa redobrada responsabilidade. O que a Constituição fez em 1988? Ou seja, o que os constituintes fizeram em 1988? O que os brasileiros e brasileiras chamados a escrever a Constituição fizeram em 1988? Deixaram claro que ao Juiz compete o julgamento, a acusação é entregue ao Ministério Público. Essa ruptura de paradigma no âmbito do processo penal... Porque até então muito se conhecia de leis que traziam o Judiciário também para a fase extrajudicial, aqueles antigos procedimentos judicialiformes, tudo aquilo ficou banido com a Constituição de 1988, que estabeleceu esse divisor de águas: Juiz julga, Ministério Público acusa, advogado defende, promove a defesa das pessoas que são acusadas. Qual a importância dessa premissa, Sr. Presidente, Juiz Nivaldo? Esses vícios apontados de suspeição ao Ministério Público deitam raízes, eles têm uma certa conexão com um outro princípio que, embora não esteja positivado na nossa Constituição, é muito facilmente extraível do bojo dos elementos que lá estão escritos, que é o princípio da imparcialidade. Imparcial é condição de quem julga. Se o Ministério Público é um órgão de acusação, ele não é imparcial, a rigor. Ministério Público é um ente híbrido, vamos dizer assim. E aqui sem qualquer conotação pejorativa. É que o modelo constitucional inaugura um hibridismo também. Ministério Público, quando atua em Tribunais, é um órgão parecerista, é um fiscal da lei, é um custus legis, e quando atua na promoção da persecução criminal é parte, ou seja, o órgão Ministério Público é parte, portanto, ele tem um compromisso. E na perspectiva do Ministério Público, se a ele cabe impulsionar a persecução criminal, o primeiro compromisso que ele tem é com essa persecução criminal, portanto não há oferecimento de denúncia por exercício de denúncia. Só há oferecimento de denúncia quando há uma convicção formada do órgão do Ministério Público de que há crime a ser perseguido judicialmente. Porque ao Ministério Público são dadas três oportunidades: ele pede o arquivamento, solicita nova diligência ou denuncia quando está convicto. Portanto, se houve o oferecimento de uma denúncia, a instituição Ministério Público está convicta de que há crime a ser perseguido em juízo. Portanto, a sua condição de parte o mune de todos os instrumentos necessários a essa persecução, assim como a defesa. O contraponto é necessário. Assim como à defesa são entregues e reconhecidas todas as estratégias possíveis e necessárias para a defesa de seu constituinte, ao Ministério Público também são entregues idênticas prerrogativas. Mas daí temos de abrir um parêntese. Enquanto o advogado é um cidadão particular que está no seu múnus profissional, o Ministério Público é um órgão do Estado, então a ele também não cabe tudo. Não há uma liberdade ampla e indiscriminada, ou seja, as balizas da atuação de um membro do Ministério Público enquanto parte são aquelas que estão previstas nos dispositivos que V. Exas. mencionaram agora há pouco: 252 do CPP e o seu congênere do Processo Civil. Ou seja, há que perquirir se existe uma maldade, há que perquirir se existe má-fé, há que perquirir se existe uma deslealdade na condução deste agente ministerial. E todas as vezes em que esse agente ministerial está convicto de que está orientado à promoção de uma infração penal, temos de analisar isso. Em que sentido? É razoável se exigir, no exercício de uma persecução criminal, apenas e tão somente a https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 58 de 317 entrega da peça acusatória ou reconheceríamos que nisso haveria uma acusação inócua, uma acusação ineficaz, uma acusação quase que infamante, porque destituída de um papel promocional dessa acusação. Esse é o ponto. Se o Ministério Público oferece uma denúncia e limita-se a assinar, o que diríamos? Recursos públicos estão sendo gastos, recursos humanos estão sendo alocados sem qualquer perspectiva? Uma aventura judicial? Aí sim teríamos de reconhecer que haveria um excesso do Ministério Público, porque não estava fazendo aquilo que o Estado reconhece como sua obrigação constitucional. Está lá no art. 129 da Constituição da República. Portanto, quando o Ministério Público se demite daquela sua obrigação, que é constitucional, daí temos de suspender o juízo. Algo está errado. Agora, quando o Ministério Público, certo ou errado, está convicto de que existe algum crime a ser perseguido, ele está no exercício da sua função constitucional. A atuação do Poder Judiciário dá-se em termos de controle dessa atuação, ou seja, temos que decotar excessos que pode haver aqui ou acolá, assim como se faz com a defesa, sabemos disso. Ou seja, o Juiz, na realidade, é o ponto de equilíbrio da relação processual. Ele está entre duas pretensões que são opostas. Em uma ação penal não existem pretensões comuns: alguém está acusando e alguém está-se defendendo, e o Juiz exerce o ponto de equilíbrio nisso. Então, na realidade, se houve excesso ou se não houve excesso, pelos elementos que tenho neste habeas corpus, não tenho como de antemão superar essa barreira do conhecimento. Ou seja, o que temos aqui, em princípio, descrito, tanto na peça que impetra o habeas corpus como nas informações prestadas pela autoridade em primeiro grau, é que houve um exercício de direito. Pode-se dizer que um exercício de direito de uma forma mais enfática? Pode. Pode-se dizer que houve um exercício de direito de uma forma até então inovadora? Pode. Pode-se dizer que o exercício deste direito alcançou ampla publicidade? Pode. Tudo isso pode. Agora, nisso há a priori um excesso? Nisso a priori houve uma violação manifesta de algum princípio ou de alguma garantia constitucional? Penso que não, porque em princípio o que na base existe exatamente é isso, duas concepções absolutamente antagônicas: a da acusação está convicta de que crime houve, a da defesa, é óbvio, está no seu papel, defende seu constituinte. E todos com a mesma ênfase. A todos são reconhecidas a mesma ousadia, a mesma sagacidade, porque estão no exercício de seu compromisso profissional. Nenhum dos dois deve ser temeroso ou deve deixar de ser altivo. Não. Isso é uma qualidade tanto do advogado, Dr. Cristiano, como também é uma qualidade dos membros do Ministério Público, desde que não haja excessos. Então, na realidade, posta a questão nesses termos, não havendo essa manifesta arbitrariedade ou coisa parecida, não tenho como superar essa barreira do conhecimento. É claro, sabemos que se vícios forem revelados ao longo dessa instrução criminal, no momento adequado serão objeto de exame. Se alcançarem patamar tal que comprometa a idoneidade, a legitimidade, a higidez de uma entrega futura de uma sentença, daí sim serão objetos de exame e estarão devolvidos ao Tribunal se houver recurso. Então me parece que neste momento a intrusão, a interferência do Tribunal nessa questão esbarra nessa barreira que foi corretamente apontada pelo Relator, Juiz Nivaldo, do conhecimento. Por isso, pedindo vênia, senhor Presidente, acompanho V. Exas. quanto ao não conhecimento, a barreira do conhecimento. GRIFEI Pois bem, nada obstante as pertinentes críticas tecidas pelo saudoso Ministro Teori Zavascki à apresentação do MPF, não é possível verificar intrinsicamente qualquer pecha na acusação. O exame do caso conclama compreender que o Ministério Público é o titular da ação penal e seus membros gozam de independência em seu mister. Diz a Lei Complementar nº 75/93: Art. 4º São princípios institucionais do Ministério Público da União a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional. Art. 6º Compete ao Ministério Público da União: (...) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 59 de 317 V - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; Sob esse enfoque, não é razoável exigir-se isenção daquele que promove a ação penal. A construção de uma tese acusatória - procedente ou não -, ainda que possa gerar desconforto no acusado, não contamina a atuação ministerial. É normal e ínsita ao processo penal a posição acusatória assumida pelos Procuradores da Força Tarefa da 'Operação Lava-Jato', não se podendo supor a existência de inimizade capital para com qualquer dos acusados. Servindo-me novamente de precedente do Supremo Tribunal Federal, à idêntica conclusão chegou aquela Corte no julgamento da Arguição de Suspeição nº 89, antes referida. Os debates que se seguiram ao voto do e. relator são elucidativos a respeito do alegado excesso de linguagem. Confira-se: Para o ministro Alexandre de Moraes, não ficou provado nos autos a caracterização de inimizade capital que possa levar à declaração de suspeição do procurador-geral. Segundo o ministro, eventuais excessos verbais que possam ter ocorrido por parte de Rodrigo Janot não justificam a sua suspeição, se não se demonstrar a existência de aversão ou ódio, provando que a conduta persecutória apontada realmente existiu. Os fatos apontados pela defesa do presidente da República não configuram causa de suspeição nos moldes previstos no Código de Processo Penal, salientou em seu voto a ministra Rosa Weber. As alegações da defesa, no sentido da caracterização da inimizade capital e do aconselhamento a qualquer das partes, como bem esclarecido pelo relator, não ficaram configuradas nos autos, disse a ministra. Ao também acompanhar o relator pela rejeição da arguição, o ministro Luiz Fux lembrou que o procurador-geral da República é o único integrante do MPF que pode investigar e processar o presidente da República. Para o ministro, a atuação de Rodrigo Janot sempre se pautou nos limites da impessoalidade e de suas atribuições institucionais. Frases de efeito, para o ministro, são ditas a todo instante, mas o que o procurador quis dizer é que enquanto houver indícios de crimes, haverá investigação. O mesmo entendimento foi declarado pelo ministro Ricardo Lewandowski. Para ele, o procurador-geral, exercendo sua responsabilidade constitucional, denunciou o presidente da República, dentro do seu âmbito de competência. Quanto à utilização de expressão um pouco mais inusitada, o ministro lembrou que tal frase também foi endereçada a outros investigados e denunciados, não sendo o presidente da República o único alvo, sendo que outros políticos e partidos foram igualmente atingidos. O ministro Celso de Mello disse que quem age exercendo legitimamente suas funções institucionais não pode ser qualificado como inimigo capital. O decano disse não ver, nos autos, qualquer 'patologia jurídica' que aponte hipótese de abuso de poder. Além disso, o ministro lembrou que o procurador-geral da República é o promotor natural do presidente da República nas infrações penais a ele atribuídas. Também acompanharam o relator o ministro Dias Toffoli e a ministra presidente Cármen Lúcia. Não participaram do julgamento os ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. (fonte Supremo Tribunal Federal, em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=355566). Ademais, apesar de a defesa narrar alguns fatos que, ao seu sentir, configurariam manifesta perseguição política, a exceção é genérica no que diz respeito à atuação de cada procurador, limitando-se a relacionar os nomes dos integrantes da chamada Força Tarefa, sem, todavia, individualizar as respectivas condutas. 2.4. Cerceamento de defesa - premissas gerais https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 60 de 317 A conduta imputada a cada denunciado está narrada na denúncia e, com base nela, a defesa se manifesta na resposta à acusação e nos demais atos do processo. Vale dizer, do ponto de vista material, não há correlação com aquilo que não está nos autos, tampouco violação à ampla defesa. Isso porque no sistema processual vigente o juiz é o destinatário da prova e pode recusar a realização daquelas que se mostrarem irrelevantes, impertinentes ou protelatórias, conforme previsão do art. 400, §1º, do Código de Processo Penal. Como ensinam Douglas Fischer e Eugênio Pacelli, 'a ampla defesa não pode ser confundida com a possibilidade de a defesa escolher a forma que entender mais adequada para a prova, mesmo que sem qualquer utilidade prática. Ampla defesa não é o que a defesa quer, mas o que pode fazer à luz da concretização de todos os princípios constitucionais no processo penal. Portanto, não está em jogo apenas a ampla defesa, mas também o devido processo legal (que é devido pra ambas as partes), em que um dos princípios reguladores também é a celeridade processual' (in Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência, 5ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 860). É ao julgador que cabe a aferição de quais são as provas desnecessárias para a formação de seu convencimento, de modo que não há ilegalidade no indeferimento fundamentado das cópias que a defesa pretendia, notadamente por impertinentes à apuração da verdade. Nesse sentido: HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO DE PROVA. SUBSTITUIÇÃO DO ATO COATOR. SÚMULA 691. 1. Não há um direito absoluto à produção de prova, facultando o art. 400, § 1.º, do Código de Processo Penal ao juiz o indeferimento de provas impertinentes, irrelevantes e protelatórias. Cabíveis, na fase de diligências complementares, requerimentos de prova cuja necessidade tenha surgido apenas no decorrer da instrução. Em casos complexos, há que confiar no prudente arbítrio do magistrado, mais próximo dos fatos, quanto à avaliação da pertinência e relevância das provas requeridas pelas partes, sem prejuízo da avaliação crítica pela Corte de Apelação no julgamento de eventual recurso contra a sentença (...). (HC 100.988/RJ - Relatora para o acórdão: Min. Rosa Weber - 1ª Turma - por maioria - j. 15.5.2012) Afora isso, de acordo com a jurisprudência pacificada nos Tribunais, as alegações de nulidade devem apresentar motivação plausível e demonstração do efetivo prejuízo, em prestígio ao princípio pas de nullité sans grief, segundo o qual não há nulidade sem prejuízo, a teor da previsão constante no art. 563 do Código de Processo Penal, in verbis: Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. Nesse sentido, colaciona-se julgado recente do STF: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. INEXISTÊNCIA DE ARGUMENTAÇÃO APTA A MODIFICÁ-LA. MANUTENÇÃO DA NEGATIVA DE SEGUIMENTO. TESTEMUNHA INQUIRIDA MEDIANTE CARTA PRECATÓRIA. DEFENSORIA PÚBLICA ESTRUTURADA NO JUÍZO DEPRECADO. NOMEAÇÃO DE DEFENSOR DATIVO. TESTEMUNHA QUE DESCONHECIA OS FATOS OBJETO DE APURAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO A LEGITIMAR A PROCLAMAÇÃO DE NULIDADES. AGRAVO REGIMENTAL https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 61 de 317 DESPROVIDO. 1. (...) 2. Inobservâncias processuais não contaminam a higidez processual na hipótese em que inocorrente prejuízo às partes. Aplicação, em matéria de nulidades, do art. 563 do CPP, que traduz o princípio reitor em que se consagra que, sem prejuízo, não se proclamam nulidades. 3. Hipótese concreta em que as irregularidades articuladas, se existentes, não comprometeram a validade da marcha processual, visto que as audiências não produziram conteúdo probatório prejudicial aos pacientes que comprovadamente eram assistidos pela Defensoria Pública ao tempo da prática dos atos processuais. 4. Agravo regimental desprovido. (HC 130549 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 28/10/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-243 DIVULG 16-11-2016 PUBLIC 17-11-2016) Com tais premissas, aplicáveis ao exame de qualquer nulidade, e sem descuidar para que a previsão do art. 400, § 1º do CPP e, por consequência, o poder instrutório do juízo, não se torne letra morta, somente se admite a intervenção do juízo recursal quando houver flagrante ilegalidade. Suficientemente fundamentada a decisão que indefere intento probatório, não se há de falar em nulidade do feito, em especial se a prova requerida não guarda pertinência com os fatos apurados no processo. 2.5. Indeferimento de provas periciais, documentais e testemunhais Há alegação de que a ação penal é nula em razão do indeferimento de inúmeras provas. Ao apresentar resposta à acusação, dentre outras providências, foram lançados os seguintes pedidos pela defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA: (a) prova pericial multidisciplinar, que objetiva identificar se houve desvio de recursos da Petrobras em favor de seus agentes em relação aos três contratos indicados na denúncia; quem seriam os beneficiários dos recursos desviados, bem como se houve algum tipo de repasse desses eventuais recursos desviados em favor dos pacientes; (b) prova pericial econômicofinanceira, a fim de apurar se a OAS utilizou diretamente de recursos eventualmente ilícitos oriundos dos três contratos firmados com a Petrobras indicados na denúncia, na construção e eventuais benfeitorias realizadas no empreendimento Condomínio Solaris ou, ainda, para pagamento da empresa Granero para armazenagem do acervo presidencial e, ainda, para apurar os prejuízos eventualmente causados à União em virtude dos eventuais desvios verificados em relação aos três contratos indicados na denúncia; (c) prova pericial no Condomínio Solaris a fim de apurar: (i) a data em que o empreendimento foi finalizado; (ii) a situação das unidades do empreendimento, inclusive no que tange ao registro no Cartório de Registro de Imóveis; (iii) as alterações eventualmente realizadas na unidade 164-A após a finalização do Condomínio Solaris; (iv) o valor da unidade 164-A e das alterações eventualmente realizadas no local; (v) eventual posse da unidade 164-A pelos pacientes. Ainda: (d) informações da Presidência da República relativas às 84 missões empresariais realizadas pelo Primeiro Paciente no cargo de Presidente da República entre os anos de 2003 a 2010, incluindo os destinos e os participantes; (e) documentos do TCU e da Controladoria-Geral da União relativos a todos os procedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras do período compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisões proferidas nesses procedimentos; (f) documentos relativos a PLANNER TRUSTEE para informar (com cópia) a relação contratual mantida com a empresa OAS em relação ao Condomínio Solaris, incluindo, mas não se limitando, os recursos disponibilizados para a construção do empreendimento, as garantias envolvidas e, ainda, o status da operação; (g) a oitiva do Embaixador Paulo Cesar de Oliveira Campos para contrapor as afirmações contidas na https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 62 de 317 denúncia - especialmente em relação ao caráter lícito, probo e ético da atuação do Primeiro Impetrante em relação aos assuntos relativos à Petrobras e a outros órgãos de governo. Os pedidos foram indeferidos pela decisão lançada no evento 114 da Ação Penal nº 5046512-94.2016.4.04.7000/PR: Analiso os requerimentos probatórios: i - 'Seja determinado ao MPF: que anexe a estes autos (i) cópia de todas as propostas de delação premiada e eventuais alterações ou modificações apresentadas pelos Senhores: Pedro da Silva Corrêa de Oliveira Andrade Neto; Delcídio do Amaral Gomez; Fernando Antônio Falcão Soares; Pedro Barusco Filho; Milton Pascowitch;Ricardo Ribeiro Pessoa; Walmir Pinheiro; Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura; Augusto Ribeiro Mendonça;Eduardo Hermelino Leite; Mario Frederico de Mendonça Goes;Antonio Pedro Campello de Souza Dias; Flávio Gomes Machado Filho; Otavio Marques de Azevedo; Paulo Roberto Dalmazzo; Rogério Nora de Sá; Nestor Cuñat Cerveró; Paulo Roberto da Costa; e Dalton dos Santos Avancini; (ii) a íntegra dos termos de colaboração firmados com os citados delatores e, ainda, eventuais depoimentos complementares (todos); (iii) todos os áudios e vídeos relativos às delações premiadas celebradas com os citados colaboradores, inclusive de eventuais depoimentos complementares; (iv) que traga aos autos o Laudo de Perícia Criminal Federal nº 368/2016SETEC/SR/DPF/PR, que foi referido no item 171 da denúncia mas não foi anexado à peça; (v)que traga aos autos o acordo de delação premiada firmado com Sérgio Machado e todos os seus anexos, depoimentos, vídeos,uma vez que o material foi mencionado no item 34 da Denúncia mas não instruiu a peça; (vi) sejam anexados aos autos os termos de colaboração premiada - com todos os anexos e declaraçõesfirmados com os seguintes colaboradores, que foram referidos na Denúncia mas não instruíram aquele petitório: Pedro da Silva Corrêa de Oliveira Andrade Neto (anexo 14), Fernando Antônio Falcão Soares (anexo 45), Pedro José Barusco Filho (anexos 46,47), Milton Pascowitch (anexo 48, 53, 54), Ricardo Ribeiro Pessoa (anexos 51, 52), Walmir Pinheiro (anexo 55), Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura (anexo 71), Augusto Ribeiro de Mendonça Neto (anexo 78, 79, 97, 287), Eduardo Hermelino Leite (anexo 80), Mario Frederico de Mendonça Goes (anexo 81), Flávio Gomes Machado Filho (anexo 84), Otavio Marques de Azevedo (anexo 85), Paulo Roberto Dalmazzo (anexo 86), Rogério Nora de Sá (anexo 87), Julio Gerin de Almeida Camargo (anexo 125), Antonio Pedro Campello de Souza Dias (anexos 82 e 83) e Dalton do Santos Avancini (anexo288);' Observo que a denúncia já está instruída com cópias de acordos de colaboração firmados e termos de colaboração específicos. Então a Defesa deve esclarecer a quais acordos ou termos de depoimento se refere e que estariam faltando, discriminadamente. Prazo de cinco dias. Desde logo, defiro o requerido para que o MPF promova a juntada, em cinco dias do Laudo de Perícia Criminal Federal nº 368/2016-SETEC/SR/DPF/PR, e para esclareça se dispõe de 'propostas' escritas para a colaborações premiadas celebradas no âmbito deste Juízo. Prazo de cinco dias. ii - 'Seja determinado à PETROBRAS, que encaminhe para estes autos (i) cópia de todas as atas de reuniões ordinárias e extraordinárias do seu Conselho de Administração e do seu Conselho Fiscal, incluindo eventuais anexos, no período compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016; (ii) cópia de todas as atas de reuniões ordinárias e extraordinárias da Comissão de Licitação da Companhia no mesmo período e, ainda, de pareceres manifestações emitidos pelo órgão nesse período; (iii) cópia integral dos processos administrativos relativos aos 3 contratos indicados na Denúncia69; (iv) o histórico funcional completo,incluindo, mas não se limitando, a informações sobre a data de admissão e forma de admissão, todos os cargos https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 63 de 317 ocupados, e órgãos envolvidos na designação de cada cargo exercido na Companhia pelas seguintes pessoas: Delcídio do Amaral Gomez, Nestor Cuñat Cerveró, Paulo Roberto da Costa e Pedro Barusco;(v) todos os elementos relativos aos pagamentos realizados pela Companhia ao Grupo OAS em relação aos três contrato sindicados na Denúncia, incluindo, mas não se limitando, aos respectivos comprovantes de pagamento, com a indicação das datas, locais e meios usados para a realização de tais pagamentos;(vi) cópia de eventuais auditorias financeiras e jurídicas relativas aos três contratos indicados na Denúncia;' A pretensão de juntada, no período de 2003 a 2016, de todas as atas de reuniões de Conselho de Administração, Conselho Fiscal e das dezenas de Comissões de Licitação da Petrobrás, não se justifica. Provas tem um custo e o objeto da denúncia é determinado, relativo a três contratos. A documentação da Petrobrás é, portanto, a pertinente aos três contratos e não a todas as atas de reuniões dos órgãos colegiados da Petrobrás em treze anos. Observo, ademais, que a denúncia contém vários documentos relativos aos três contratos celebrados pela OAS, em consórcio, com a Petrobrás, inclusive os relatórios sobre as auditorias internas realizadas pela Petrobrás e que foram aparentemente ignorados pela Defesa (v.g. evento 3, arquivos comp115, comp141 e comp142). Considerando, de todo modo, a sentença prolatada na ação penal conexa 508337605.2014.4.04.7000/PR, na qual esses contratos foram examinados, forme a Secretaria mídia com o conteúdo eletrônico dos eventos 205, 251, 269, 633 e 634 daquela ação penal e afete-se a este processo eletrônico, disponibilizando cópia às partes. Junte a Secretaria diretamente no processo eletrônico cópia dos seguintes documentos constantes nos seguintes eventos daquela ação penal evento 1, out6, out40, out42, out 66, out 69, out76 e out77. Assim, indefiro a juntada de todas as atas de órgãos colegiados da Petrobras em treze anos assim como todas as atas de comissões de licitação da empresa em treze anos. Caso desses documentos, haja alguns específicos pertinentes, poderá a Defesa discriminar e esclarecer a relevância para eventual nova decisão do Juízo. Prazo de cinco dias. Relativamente à documentação dos três contratos especificados na denúncia, concedo à Defesa o prazo de 10 dias para eventuais requerimentos de documentos complementares além daqueles cuja juntada foi ora determinada. Defiro desde logo a intimação da Petrobrás, na pessoa de seus defensores, para a juntada: a) do histórico funcional completo, incluindo, mas não se limitando, a informações sobre a data de admissão e forma de admissão, todos os cargos ocupados, e órgãos envolvidos na designação de cada cargo exercido na Companhia pelas seguintes pessoas: Delcídio do Amaral Gomez, Nestor Cuñat Cerveró, Paulo Roberto da Costa e Pedro José Barusco Filho; e b) relação sintética com os pagamentos efetuados, indicando valor, data e meio de pagamento, relativamente aos dois contratos com o Consórcio RNEST/CONEST e o contrato com o Consórcio CONPAR. Prazo de vinte dias para a Petrobrás. iii. 'Seja determinado à BANCOOP, que encaminhe aos autos: (i)relação de todos os empreendimentos que foram transferidos ao Grupo OAS; (ii) informação de outros empreendimentos que foram transferidos as empresas do ramo da construção civil diversas da OAS; (iii) o histórico da transferência desses empreendimentos, incluindo, mas não se limitando, à participação do Ministério Público e eventual(is) homologação(ões) judicial(is) e, ainda, a análise por outros órgãos de controle; (iv) o histórico da cota-parte da Segunda Defendente no empreendimento Mar Cantábrico;' Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias. iv. 'Seja determinado ao CONDOMÍNIO SOLARIS que encaminhe para estes autos (i) cópia de todos os registros de entrada e saída dos Defendentes no Edifício Navia https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 64 de 317 até a presente data - seja por meio de imagens, seja por meio de anotações; (ii) cópia das petições iniciais e relatórios sobre o status atual das ações de cobrança de condomínio relativas às unidades de propriedade da OAS; (iii) relação de todos os moradores e prestadores de serviços registrados no período compreendido entre 2009 até a presente data;' Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado. Como a medida requerida tem custos, deve a Defesa primeiro esclarecer se arcará com os eventuais custos da requisição de dessa informações e documentos. Deve ainda a Defesa esclarecer o motivo de requisição de cópia de todas as iniciais e ações de cobrança de condomínio relativas às unidades de propriedade da OAS, quando no presente feito pertinente apenas um apartamento. Deve ainda esclarecer o que pretende com a relação de todos os moradores e prestação de serviços, já que há questões de privacidade envolvidas. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados, completos e justificados diante de requerimentos probatórios extensos e custosos. Prazo de cinco dias. v. 'Seja determinado à GRANERO, que encaminhe para estes autos cópia de todas as correspondências e contrato(s) firmado(s) em relação ao acondicionamento do acervo presidencial relativo ao Primeiro Defendente;' Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado. Observo ainda que o contrato de armazenagem discutido no feito já está nos autos (fl. 134 da denúncia), devendo a Defesa melhor esclarecer o que pretende. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias. vi. 'Seja determinado à FAST SHOP S/A que encaminhe para estes autos cópia de notas fiscais relativas a todas as compras realizadas pelo Grupo OAS no estabelecimento no período compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016;' Não cabe impor à empresa privada o ônus de encaminhar cópia de todas as compras realizadas por empresas do Grupo OAS em treze anos. Deve a Defesa esclarecer o que pretende e caso insista deverá indicar endereço e representante a ser provocado, além de empresas e CNPJs do Grupo OAS cujas notas fiscais pretende requisitar. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados, completos e justificados, máxime diante de requerimentos probatórios extensos e custosos. Prazo de cinco dias. 'vii. 'Seja determinado à KITCHENS COZINHAS E DECORAÇÕES LTDA. que encaminhe para estes autos cópia de notas fiscais relativas a todas as compras realizadas pelo Grupo OAS no estabelecimento no período compreendido entre1º/01/2003 a 16/01/2016;' Não cabe impor à empresa privada o ônus encaminhar cópia de todas as compras realizadas por empresas do Grupo OAS em treze anos. Deve a Defesa esclarecer o que pretende e caso insista deverá indicar endereço e representante a ser provocado, além de empresas e CNPJs do Grupo OAS cujas notas fiscais pretende requisitar. É ônus da parte - e a Defesa sabe disso - apresentar requerimentos determinados, completos e justificados, máxime diante de requerimentos probatórios extensos e custosos. Prazo de cinco dias. 'viii. Seja determinado à TALLENTO CONSTRUTORA LTDA. que informe se houve algum contato feito com a empresa pelos Defendentes e, em caso positivo, encaminhe a estes autos cópia de eventual correspondência e seu objeto;' Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 65 de 317 'ix. Seja determinado à OAS que informe se (i) contratou palestras de outros exPresidentes da República do Brasil e, caso seja positiva a resposta, indique os eventos e valores envolvidos; (ii) se fez doações a outros ex-Presidentes da República do Brasil ou a entidades a eles relacionadas e, caso seja positiva a resposta, indique as datas e valores envolvidos;' Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias. 'x. Seja determinado à PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA que encaminhe para estes autos informações relativas às 84 missões empresariais realizadas pelo Primeiro Defendente no cargo de Presidente da República entre os anos de 2003 a 2010, incluindo os destinos e os participantes;' As oitenta e quatro missões empresariais realizadas pelo ex-Presidente não constituem objeto da denúncia e aparentam ser prova custosa e de duvidosa relevância. Deve a Defesa melhor esclarecer a pertinência e relevância da prova, além de, se insistir, indicar endereço e representante a ser provocado. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias. 'xi. Seja determinado ao CONGRESSO NACIONAL que (i)informe o status de todos os projetos de lei apresentados pela Presidência da República entre os anos de 2003 a 2010, constando, dentre outras coisas, as emendas apresentadas e eventual quórum de aprovação; (ii) encaminhe a estes autos cópia integral do relatório final e de todos os documentos relativos à 'CPMI do Mensalão';' Deve a Defesa esclarecer a pertinência e a relevância da apresentação de todos os projetos de lei apresentados pela Presidência em dez anos, emendas apresentadas e quórum de aprovação, já que a prova aparenta ser custosa e de duvidosa relevância. Quanto ao segundo requerimento, o relatório final da CPMI dos Correios está disponível em http://www.senado.gov.br/comissoes/CPI/RelatorioFinalVol1.pdf desnecessária a requisição. Quanto à juntada de todos os documentos relativos à CPMI, deve a Defesa esclarecer a quais documentos se refere e a pertinência do requerido. Prazo de cinco dias. '(xii) Seja determinado ao TCU, que encaminhe para estes autos (i)cópia de todos os procedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras relativos ao período compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisões proferidas nesses procedimentos;' Deve a Defesa esclarecer a relevância e a pertinência do requerido. A denúncia reporta-se a três contratos e obras da Petrobrás e não a todos. Inviável requisitar junto ao TCU todos os procedimentos de fiscalização de contas e auditoria da Petrobrás em treze anos. Prazo de cinco dias. '(xiii) Seja determinado à CGU que encaminhe para estes autos (i)cópia de todos os procedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras relativos ao período compreendido entre 1º/01/2003a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisões proferidas nesses procedimentos;' Deve a Defesa esclarecer a relevância e a pertinência do requerido. A denúncia reporta-se a três contratos e obras da Petrobrás e não a todos. Inviável requisitar junto à CGU todos os procedimentos de fiscalização de contas e auditoria da Petrobrás em treze anos. Prazo de cinco dias. '(xiv) Seja determinado à empresa PLANNER TRUSTEE que (i)informe a relação contratual mantida com a empresa OAS em relação ao Condomínio Solaris, incluindo, mas não se limitando, os recursos disponibilizados para a construção do https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 66 de 317 empreendimento, as garantias envolvidas e, ainda, o status da operação e, ainda, (ii) encaminhe aos autos cópia dos documentos correspondentes;' Deve a Defesa esclarecer a relevância e a pertinência do requerido, por se tratar de prova aparentemente custosa e estranha ao objeto da acusação. Se insistir, indicar endereço e representante a ser provocado. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias. Em relação aos requerimentos em xv, xvi, xvii, deve a Defesa indicar endereço e representante a ser provocado das três empresas de auditoria. Mais uma vez é ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. '(xviii) Seja determinada a realização de prova pericial multidisciplinar a fim de identificar (i) se houve desvio de recursos da Petrobras em favor de seus agentes em relação aos três contratos indicados na Denúncia; (ii) quem seriam os beneficiários dos recursos desviados; e, ainda, (iii) se houve algum tipo de repasse desses eventuais recursos desviados em favor dos Defendentes; '(xix) Seja determinada a realização de prova pericial econômico financeira a fim de apurar (i) se a OAS utilizou diretamente de recursos eventualmente ilícitos oriundos dos três contratos firmados com a Petrobras indicados na Denúncia na construção e eventuais benfeitorias realizadas no empreendimento Condomínio Solaris ou, ainda, para pagamento da empresa Granero para armazenagem do acervo presidencial; (ii) os prejuízos eventualmente causados à UNIÃO em virtude dos eventuais desvios verificados em relação a esses três contratos indicados na Denúncia;' '(xxi) Seja determinada a realização de prova pericial no Condomínio Solaris a fim de apurar (i) a data em que o empreendimento foi finalizado; (ii) a situação das unidades do empreendimento,inclusive no que tange ao registro no Cartório de Registro de Imóveis; (iii) as alterações eventualmente realizadas na unidade164-A após a finalização do Condomínio Solaris; (iv) o valor da unidade 164-A e das alterações eventualmente realizadas no local; (v) eventual posse da unidade 164-A pelos Defendentes;' Examino os requerimentos em xviii, ixi e xxi em conjunto. A ampla defesa, direito fundamental, não significa um direito amplo e irrestrito à produção de qualquer prova, mesmo as impossíveis, as custosas e as protelatórias. Cabe ao julgador, como dispõe expressamente o art. 400, §1º, do CPP, um controle sobre a pertinência, relevância e necessidade da prova. Conquanto o controle deva ser exercido com cautela, não se justificam a produção de provas manifestamente desnecessárias ou impertinentes ou com intuito protelatório. Acerca da vitalidade constitucional de tal regra legal, transcrevo o seguinte precedente de nossa Suprema Corte: 'HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO DE PROVA. SUBSTITUIÇÃO DO ATO COATOR. SÚMULA 691. 1. Não há um direito absoluto à produção de prova, facultando o art. 400, § 1.º, do Código de Processo Penal ai juiz o indeferimento de provas impertinentes, irrelevantes e protelatórias. Cabíveis, na fase de diligências complementares, requerimentos de prova cuja necessidade tenha surgido apenas no decorrer da instrução. Em casos complexos, há que confiar no prudente arbítrio do magistrado, mais próximo dos fatos, quanto à avaliação da pertinência e relevância das provas requeridas pelas partes, sem prejuízo da avaliação crítica pela Corte de Apelação no julgamento de eventual recurso contra a sentença. 2. Não se conhece de habeas corpus impetrado contra indeferimento de liminar por Relator em habeas corpus requerido a Tribunal Superior. Súmula 691. Óbice superável apenas em hipótese de teratologia. 3. Sobrevindo decisão do colegiado no Tribunal Superior, há novo ato coator que desafia enfrentamento por ação própria.' (HC 100.988/RJ Relatora para o acórdão: Min. Rosa Weber - 1ª Turma - por maioria - j. 15.5.2012) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 67 de 317 Assim, as provas requeridas, ainda que com cautela, podem passar pelo crivo de relevância, necessidade e pertinência por parte do Juízo. O controle da pertinência é ainda mais relevante no caso de prova pericial, já que esta é custosa e demorada. Daí a previsão específica do art. 184 do CPP: 'Art. 184. Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial negará a perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da verdade.' As três perícias requeridas são impróprias. A acusação é singela. Transcrevo novamente da decisão de recebimento da denúncia: 'A partir dessa afirmação, alega o MPF que, como parte de acertos de propinas destinadas a sua agremiação política em contratos da Petrobrás, o Grupo OAS teria concedido, em 2009, ao Ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada na entrega do apartamento 164-A do Edifício Solaris, de matrícula 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP, bem como, a partir de 2013, em reformas e benfeitorias realizadas no mesmo imóvel, sem o pagamento do preço. Estima os valores da vantagem indevida em cerca de R$ 2.424.991,00, assim discriminada, R$ 1.147.770,00 correspondente entre o valor pago e o preço do apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em benfeitorias e na aquisição de bens para o apartamento. Na mesma linha, alega que o Grupo OAS teria concedido ao ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada no pagamento das despesas, de R$ 1.313.747,00, havidas no armazenamento entre 2011 e 2016 de bens de sua propriedade ou recebidos como presentes durante o mandato presidencial. Em ambos os casos, teriam sido adotados estratagemas subreptícios para ocultar as transações. Estima o MPF que o total pago em propinas pelo Grupo OAS decorrente das contratações dele pela Petrobrás, especificamente no Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, alcance R$ 87.624.971,26. Destes valores, R$ 3.738.738,00 teriam sido destinados especificamente ao exPresidente.' Pela primeira perícia, pretende a Defesa que os peritos informem se houve desvio de recursos da Petrobrás em relação aos três contratos da Petrobrás com o Grupo OAS e se parte deles foi destinado ao ex-Presidente. Pela segunda perícia, quer a Defesa que seja verificado se há é possível estabelecer um rastro financeiro entre os valores recebidos do Grupo OAS e os recursos utilizados para construção do Edifício Solaris ou para pagamento das benfeitorias do apartamento ou para pagamento da armazenagem. Para ambas as perícias requeridas, não há afirmação, em princípio, na denúncia de que exatamente o dinheiro recebido pelo Grupo OAS nos contratos com a Petrobrás foi destinado especificamente em favor do ex-Presidente. Dinheiro é fungível e a denúncia não afirma que há um rastro financeiro entre os cofres da Petrobrás e os cofres do exPresidente, mas sim que as benesses recebidas pelo ex-Presidente fariam parte de um acerto de propinas do Grupo OAS com dirigentes da Petrobrás e que também beneficiaria o ex-Presidente. Então a perícia, além de inapropriada, seria inócua pois a acusação não se baseia em um rastreamento específico. A prova é de natureza documental e oral, não é pericial. Quanto ao requerimento de apuração dos prejuízos sofridos pela Petrobrás nos contratos com o Grupo OAS, não faz ele parte da acusação. O prejuízo apontado decorreria da prática do cartel e ajuste fraudulento de licitação, imputações que não foram realizadas contra o ex-Presidente. Relativamente a terceira perícia pretendida, é ela desnecessária ou inadequada para definir a data da finalização do empreendimento ou para verificar o registro de imóveis do prédio e principalmente para definir 'eventual posse da unidade 164-A pelos Defendentes'. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 68 de 317 Esses fatos demandam prova de natureza documental e oral e não pericial. Enfim, indefiro as três perícias requeridas porque impróprias ou inadequadas aos fins pretendidos ou mesmo impertinentes ou irrelevantes. '(xx) Seja determinada a realização de perícia documentoscópica na 'Proposta de Adesão Sujeita à Aprovação' firmada entre a Primeira Defendente e a BANCOOP a fim de apurar (i) eventual alteração no tocante à indicação da unidade mencionada, (ii)especificar o momento em que foi realizada essa eventual alteração e, ainda, (iii) a autoria dessa eventual alteração;' Antes de apreciar o requerido, deve o MPF informar se dispõe do original dos documentos em questão (fl. 96 da denúncia) e se positivo deve depositá-los em Juízo em cinco dias. '(xxii) Seja determinada a realização de prova pericial no material compreendido no 'Contrato de Armazenagem' indicado na Denúncia a fim de apurar se são 'bens pessoais pertencentes a LULA', como afirma da Denúncia, ou se diz respeito a parte do acervo presidencial do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva,na forma definida pela Lei nº 8.394/91.' Antes de apreciar o requerido, considerando que a própria Defesa afirma que seriam 'bens pessoais pertencentes a Lula' e considerando que, no contexto, deve existir uma relação desses bens e a indicação de sua origem, deverá a Defesa apresentar a relação desses bens e esclarecer a sua origem, a fim de viabilizar a prova requerida. Prazo de dez dias. Além dos diversos requerimentos probatórios, arrolou trinta e sete testemunhas, com dois Senadores, dois deputados federais, o Ministro da Fazenda e um Ministro do TCU entre outros. Relativamente às testemunhas residentes no exterior, deve a Defesa, sob pena de preclusão, demonstrar a imprescindibilidade em cinco dias, nos termos do art. 222-A do CPP. Com efeito, não há ilegalidade na decisão do juízo de primeiro grau no que diz respeito à prescindibilidade das provas requeridas. Tendo como norte as considerações tecidas no item 2.4, as pretensões defensivas foram todas e cada uma examinadas e, na porção indeferida, há fundamentação idônea. Ao menos no que diz respeito à documentação referente aos três contratos apontados na denúncia, além de outros documentos requeridos, a documentação foi juntada pela Petrobras. Agregue-se, no ponto, as considerações tecidas pelo Juiz Federal Convocado Danilo Pereira Junior quando do indeferimento da liminar no HC nº 500299116.2017.4.04.0000/PR: Observe-se que a autoridade coatora apreciou os pedidos de forma fundamentada, indeferindo aqueles que entendeu impertinentes, sobretudo diante da ausência de correlação entre o que a defesa pretende provar e aquilo que consta na inicial acusatória. Assim, por exemplo, não se há de falar em cerceamento de defesa no caso de indeferimento de perícia contábil para aferir se os valores supostamente alcançados aos pacientes a título de vantagem ilícita originam-se diretamente dos contratos firmados entre a Petrobras e a Construtora OAS. Tampouco seria tal circunstância da essência dos crimes imputados. Recorrendo-se a um breve histórico dos delitos investigados no âmbito da 'Operação Lava-Jato', aliás, foi identificado o envolvimento de Alberto Youssef com possíveis atos de lavagem de dinheiro provenientes de obras contratadas pela Petrobras. Descortinou-se um milionário esquema de corrupção envolvendo grandes empreiteiras nacionais. Tais empresas formaram um cartel, através do qual, por ajuste prévio, teriam sistematicamente frustrado as licitações da Petróleo Brasileiro S/A - Petrobras para a contratação de grandes obras. O grupo chamou a atenção pela organização, contando https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 69 de 317 inclusive com estatuto em linguagem cifrada, algo que foge da normalidade de organizações criminosas. As empresas do chamado 'Clube' ajustavam os preços dos contratos e os dividiam de modo organizado, burlando qualquer possibilidade real de concorrência das obras da Estatal. Para tanto, contavam com a 'cobertura' de empregados de alto escalão. Em extensão, identificou-se inúmeras empresas utilizadas, albergadas por supostos contratos de prestação de serviço e consultoria, que, no mais das vezes, serviriam tão somente para dar ar de legalidade aos valores subtraídos dos cofres da Petrobras. Como beneficiários, constatou-se a presença de agentes públicos ou políticos de alto escalão. Tal contexto não pode ser desprezado. (...) Não há de se falar em produção de prova pericial quando não se mostrar imprescindível à solução da causa. Postulou a defesa perícia para apurar 'i) a data em que o empreendimento foi finalizado; (ii) a situação das unidades do empreendimento, inclusive no que tange ao registro no Cartório de Registro de Imóveis; (iii) as alterações eventualmente realizadas na unidade 164-A após a finalização do Condomínio Solaris; (iv) o valor da unidade 164-A e das alterações eventualmente realizadas no local; (v) eventual posse da unidade 164-A por Lula e Marisa Letícia'. Como bem anotou o juízo de origem, os fatos demandam prova documental e oral, não pericial. GRIFEI A prova pericial requerida é irrelevante à solução da controvérsia, em particular aquela destinada a identificar a origem dos recursos supostamente pagos a título de propina. Isso porque a inicial acusatória é cristalina ao indicar que a Construtora OAS mantinha um caixa geral para pagamento de propinas ao Partido dos Trabalhadores. Em certa medida, a denúncia é coerente com o contexto. A solicitação ou recebimento de vantagem indevida, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, ou aceitar promessa de tal vantagem (art. 317, CP), não pressupõe que o pagamento seja proveniente somente de recursos ilícitos. De igual modo, são impertinentes as testemunhas que nada acrescentam para a elucidação dos fatos. A defesa requereu a oitiva do Embaixador Paulo Cesar de Oliveira Campos, que tinha por finalidade demonstrar a atuação lícita, proba e ética do ex-Presidente em relação aos assuntos relacionados a Petrobras. Pretende a defesa, na verdade, tão somente trazer aos autos depoimento meramente abonatório a respeito da gestão do apelante à frente da Presidência da República, sem apontar, contudo, nenhuma pertinência do testemunho para com os fatos narrados na denúncia. Também não há ilegalidade no indeferimento de juntada de documentos relativos às missões empresariais realizadas pelo ex-Presidente entre os anos de 2003 e 2010, pois isso não desnatura ou modifica a compreensão com relação aos fatos imputados na acusação. É irrelevante, porque imprestável para aferir a legalidade do pagamento do acervo presidencial por empresa privada, saber, ainda, qual o tratamento jurídico dado por ex-Presidentes ao seus acervos. Para fins penais, não se questiona, como já assentado em HC nº 5042023-62.2016.4.04.0000/PR, a possibilidade de financiamento por empresas de https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 70 de 317 projetos dessa espécie. Contudo, o que se discute não é a regularidade ou não da operação, mas sim em quais circunstâncias se deu o financiamento. Ou seja, o registro do investimento na forma da lei, não afasta a possibilidade de que seja custeado com recursos escusos. Sobre isso, anotei ao solver a referida impetração: Em primeiro lugar, porque a integração ou não dos bens armazenados ao patrimônio cultural da União dependem, além da identificação detalhada do que está armazenado, da sua adequação ao previsto na Lei nº 8.394/1991 (regulamentada pelo Decreto nº 4.343/2002), notadamente no que toca com a catalogação e preservação, conforme disposto em regulamento. Em segundo, porque o interesse cultural, por si só, não derruba a peça acusatória no ponto, que se funda na premissa de que a retribuição seria, na verdade, repasse de propina na forma de locação. O mesmo se diga com relação aos projetos de lei apresentados pelo governante. A imputação é bastante específica e a prova requerida, além de ser pública e passível de obtenção pela própria defesa, é de duvidosa utilidade, assim como documentos referentes ao Tribunal de Contas, à Controladoria-Geral da União ou a Planner Trustee, no que pertine aos recursos disponibilizados pela OAS para construção e o empreendimento Solaris. Novamente aqui, a defesa segue em linha absolutamente oposta à tese acusatória, que destaca a existência de um caixa único não oficial de propina. Para finalizar, reproduzo decisão terminativa proferida pelo e. Ministro Félix Fischer no HC nº 390.433/PR, que buscava a discussão de matéria correlata: 2. À vista do entendimento consagrado na Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal, de regra, não cabe ao Superior Tribunal de Justiça conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão liminar de Tribunais de segundo grau de jurisdição, sob pena de supressão de instância. Sabe-se, entretanto, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal admite o abrandamento da incidência do entendimento sumulado em casos excepcionais, podendose conferir, entre outros: o HC 122.670, Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgado em 05/08/2013; HC 121.181, Relator(a): Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 22/04/2014, quando a decisão impugnada é teratológica, manifestamente ilegal ou abusiva. No caso do presente HC, portanto, cabe analisar se houve flagrante constrangimento ilegal ou teratologia na decisão pela qual foi negada a concessão liminar do writ impetrado em favor do Paciente perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região. É certo que o acusado tem o direito de requerer a produção das provas que entender pertinentes para o exercício de seu direito de defesa, garantido constitucionalmente. É certo também, porém, que o magistrado pode indeferir as provas que forem consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias (art. 400, § 1º, do CP). Em relação a isso, assim se pronunciou o ilustre Relator do HC originário: [...]De outro norte, no sistema processual vigente, o juiz é o destinatário da prova e pode recusar a realização daquelas que se mostrarem irrelevantes, impertinentes ou protelatórias, conforme previsão do art. 400, §1º, do Código de Processo Penal. A ampla defesa não pode ser confundida com a possibilidade de realização de todo e qualquer ato processual pretendido, mesmo que sem qualquer utilidade prática. [...] https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 71 de 317 É lícito ao juízo, portanto, o indeferimento de provas que, a seu sentir, mostram-se desnecessárias para a formação de seu convencimento, em especial quando os requerimentos da defesa buscam ampliar a discussão para fora dos limites da acusação, como ocorreria se permitida a juntada de todos os contratos ou atas de todas as reuniões da mais alta administração da Petrobras.[....]' (fl. 39). Da análise do excerto acima, verifica-se que o e. Relator analisou a questão, mas entendeu que o Juízo de primeiro grau poderia indeferir eventuais provas que entendesse desnecessárias. Assim, a análise do cabimento do presente Habeas Corpus, já que ainda não houve o julgamento do HC originário na instância inferior, é no sentido de verificar se o indeferimento de provas foi manifestamente ilegal ou houve decisão teratológica. Da leitura da peça acusatória, verifica-se que o Paciente está sendo denunciado pelas supostas práticas dos delito de: 1) Corrupção passiva qualificada, em sua forma majorada, previsto no art. 317, caput e §1º, c/c art. 327, §2º, todos do Código Penal, no período compreendido entre 11/10/2006 e 23/01/2012, por 7 vezes, em concurso material; 2) Lavagem de capitais, previsto no art. 1º c/c o art. 1º § 4º, da Lei nº 9.613/98, no período compreendido entre 08/10/2009 e a data da denúncia, por 3 vezes, em concurso material; 3) Lavagem de capitais, previsto no art. 1º c/c o art. 1º § 4º, da Lei nº 9.613/98, no período compreendido entre 01/01/2011 e 16/01/2016, por 61 vezes, em continuidade delitiva. Isto porque, em suma, de acordo com o resumo feito pelo magistrado de primeiro grau quando analisou o recebimento da Denúncia, '(...) o ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva teria participado conscientemente do esquema criminoso, inclusive tendo ciência de que os Diretores da Petrobrás utilizavam seus cargos para recebimento de vantagem indevida em favor de agentes políticos e partidos políticos. A partir dessa afirmação, alega o MPF que, como parte de acertos de propinas destinadas a sua agremiação política em contratos da Petrobrás, o Grupo OAS teria concedido, em 2009, ao Ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada na entrega do apartamento 164-A do Edifício Solaris, de matrícula 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP, bem como, a partir de 2013, em reformas e benfeitorias realizadas no mesmo imóvel, sem o pagamento do preço. Estima os valores da vantagem indevida em cerca de R$ 2.424.991,00, assim discriminada, R$ 1.147.770,00 correspondente entre o valor pago e o preço do apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em benfeitorias e na aquisição de bens para o apartamento. Na mesma linha, alega que o Grupo OAS teria concedido ao ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada no pagamento das despesas, de R$ 1.313.747,00, havidas no armazenamento entre 2011 e 2016 de bens de sua propriedade ou recebidos como presentes durante o mandato presidencial. Em ambos os casos, teriam sido adotados estratagemas subreptícios para ocultar as transações. Estima o MPF que o total pago em propinas pelo Grupo OAS decorrente das contratações dele pela Petrobrás, especificamente no Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, alcance R$ 87.624.971,26. Destes valores, R$ 3.738.738,00 teriam sido destinados especificamente ao ex-Presidente.' A defesa alega que requereu a produção de provas periciais, documentais e testemunhais, e que, no entanto, o Juízo de 1º grau indeferiu a realização de várias dessas provas, por meio de decisões com fundamentações que seriam inadequadas e inidôneas. Quanto às provas periciais, requereu a defesa: 'Seja determinada a realização de prova pericial multidisciplinar a fim de identificar (i) se houve desvio de recursos da Petrobras em favor de seus agentes em relação aos três contratos indicados na Denúncia; (ii) quem seriam os beneficiários dos recursos desviados; e (iii) se houve algum tipo de repasse desses eventuais recursos desviados em favor de Lula e Marisa Letícia'; https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 72 de 317 'Seja determinada a realização de prova pericial econômico-financeira a fim de apurar: (i) se a OAS utilizou diretamente de recursos eventualmente ilícitos oriundos dos três contratos firmados com a Petrobras indicados na Denúncia na construção e eventuais benfeitorias realizadas no empreendimento Condomínio Solaris ou, ainda, para pagamento da empresa Granero para armazenagem do acervo presidencial; (ii) os prejuízos eventualmente causados à UNIÃO em virtude dos eventuais desvios verificados em relação a esses três contratos indicados na Denúncia'; 'Seja determinada a realização de prova pericial no Condomínio Solaris a fim de apurar: (i) a data em que o empreendimento foi finalizado; (ii) a situação das unidades do empreendimento, inclusive no que tange ao registro no Cartório de Registro de Imóveis; (iii) as alterações eventualmente realizadas na unidade 164-A após a finalização do Condomínio Solaris; (iv) o valor da unidade 164-A e das alterações eventualmente realizadas no local; (v) eventual posse da unidade 164-A por Lula e Marisa Letícia'. (fl. 12). Analisando tais pedidos, assim entendeu o Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba (fls. 380/381): 'Pela primeira perícia, pretende a Defesa que os peritos informem se houve desvio de recursos da Petrobrás em relação aos três contratos da Petrobrás com o Grupo OAS e se parte deles foi destinado ao ex-Presidente. Pela segunda perícia, quer a Defesa que seja verificado se há é possível estabelecer um rastro financeiro entre os valores recebidos do Grupo OAS e os recursos utilizados para construção do Edifício Solaris ou para pagamento das benfeitorias do apartamento ou para pagamento da armazenagem. Para ambas as perícias requeridas, não há afirmação, em princípio, na denúncia de que exatamente o dinheiro recebido pelo Grupo OAS nos contratos com a Petrobrás foi destinado especificamente em favor do ex-Presidente. Dinheiro é fungível e a denúncia não afirma que há um rastro financeiro entre os cofres da Petrobras e os cofres do exPresidente, mas sim que as benesses recebidas pelo ex-Presidente faziam parte de um acerto de propinas do Grupo OAS com dirigentes da Petrobrás e que também beneficiariam o ex-Presidente. Então a perícia, além de inapropriada, seria inócua pois a acusação não se baseia em um rastreamento específico. A prova é de natureza documental e oral, não é pericial. Quanto ao requerimento de apuração dos prejuízos sofridos pela Petrobrás nos contratos com o Grupo OAS, não faz ele parte da acusação. O prejuízo apontado decorreria da prática do cartel e ajuste fraudulento de licitação, imputações que não foram realizadas contra o ex-Presidente. Relativamente a terceira perícia pretendida, é ela desnecessária ou inadequada para definir a data da finalização do empreendimento ou para verificar o registro de imóveis do prédio e principalmente para definir 'eventual posse da unidade 164-A pelos Defendentes'. Esses fatos demandam prova de natureza documental e oral e não pericial. Enfim, indefiro as três perícias requeridas porque impróprias ou inadequadas aos fins pretendidos ou mesmo impertinentes ou irrelevantes.' Já o relator do HC originário, ao indeferir a liminar almejada, entendeu não haver ilegalidade, já que o juiz pode indeferir provas e houve fundamentação adequada para tanto. Assim, feita uma análise inicial dos requerimentos da defesa, bem como do indeferimento feito pelo Juízo de 1º grau, verifica-se que os dois primeiros requerimentos de provas periciais não teriam como provar, como acredita a defesa, que o Paciente não teria praticado as condutas que lhe são imputadas, pois como foi dito a Denúncia não faz uma ligação entre os contratos indicados e os valores supostamente recebidos pelo Paciente, já que peça acusatória trata de um 'caixa geral de propina'. Quanto ao terceiro requerimento de prova pericial, que seria perícia no Condomínio Solaris, o Juízo de 1º grau entendeu que ela seria desnecessária ou inadequada, e que os fatos demandariam prova documental e oral, e não pericial. Da mesma forma, reputa-se em princípio correta essa fundamentação, tendo em vista que a data em que o empreendimento foi finalizado e a situação das unidades do https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 73 de 317 empreendimento, inclusive no que tange ao registro, podem ser apuradas por certidões, que são públicas, no próprio Cartório de Registro de Imóveis da localidade, como também o valor da unidade, já as alterações eventualmente realizadas na unidade 164-A após a finalização do Condomínio e eventual posse da unidade por parte do Paciente podem ser obtidas por meio de prova oral. Ante o teor do indeferimento das provas periciais pelo Juízo de primeiro grau e da decisão liminar proferida no HC, não se vislumbra manifesta ilegalidade, muito menos teratologia, a ponto de admitir-se a superação da Súmula nº 691 do STF. Das provas documentais requeridas pela defesa e que restaram indeferidas Requereu a defesa cópia de todas as atas de reuniões ordinárias e extraordinárias do Conselho de Administração e Conselho Fiscal da Petrobrás, incluindo eventuais anexos, no período compreendido entre 01/01/2003 a 16/01/2016, e cópia de todas as atas de reuniões ordinárias e extraordinárias da Comissão de Licitação da Companhia no mesmo período e, ainda, cópias de pareceres e manifestações emitidos pelo órgão nesse período. Requereu também que fosse determinado ao Tribunal de Contas da União o envio de cópia de todos os procedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras relativos ao período compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisões proferidas nesses procedimentos, bem como fosse determinado à Controladoria Geral da União o envio de cópia de todos os procedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras relativos ao período compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisões proferidas nesses procedimentos. Quanto ao pedido de juntada de todas as atas, assim se manifestou o Juízo de primeiro grau (fl. 376): 'A pretensão de juntada, no período de 2003 a 2016, de todas as atas de reuniões de Conselho de Administração, Conselho Fiscal e das dezenas de Comissões de Licitação da Petrobras, não se justifica. Provas tem um custo e o objeto da denúncia é determinado, relativo a três contratos. A documentação da Petrobrás é, portanto, a pertinente aos três contratos e não a todas as atas de reuniões dos órgãos colegiados da Petrobrás cm treze anos. Observo, ademais, que a denúncia contém vários documentos relativos aos três contratos celebrados pela OAS, em consórcio, com a Petrobrás, inclusive os relatórios sobre as auditorias internas realizadas pela Petrobrás e que foram aparentemente ignorados pela Defesa (v.g. evento 3, arquivos compll5, compl41 e compl42). Considerando, de todo modo, a sentença prolatada na ação penal conexa 508337605.2014.4.04.7000/PR, na qual esses contratos foram examinados, forme a Secretaria mídia com o conteúdo eletrônico dos eventos 205, 251, 269, 633 e 634 daquela ação penal e afete-se a este processo eletrônico, disponibilizando cópia às partes. Junte a Secretaria diretamente no processo eletrônico cópia dos seguintes documentos constantes nos seguintes eventos daquela ação penal evento 1, outó, out40, out42, out 66, out 69, out76 e out77. Assim, indefiro a juntada de todas as atas de órgãos colegiados da Petrobrás em treze anos assim como todas as atas de comissões de licitação da empresa em treze anos. Caso desses documentos, haja alguns específicos pertinentes, poderá a Defesa discriminar e esclarecer a relevância para eventual nova decisão do Juízo. Prazo de cinco dias.' Já o Relator do HC impetrado por conta de tal indeferimento entendeu que houve fundamentação adequada, não se justificando a concessão da liminar requerida. Assim, considerando que o indeferimento da prova requerida foi devidamente fundamentado, não há flagrante ilegalidade ou teratologia a justificar o processamento do presente HC enquanto ainda não julgado o HC originário. Quanto à documentação solicitada ao Tribunal de Contas da União e à ControladoriaGeral da União, assim se manifestou o Juízo: 'Deve a Defesa esclarecer a relevância e a pertinência do requerido. A denúncia reportase a três contratos e obras da Petrobrás e não a todos. Inviável requisitar junto ao TCU https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 74 de 317 todos os procedimentos de fiscalização de contas e auditoria da Petrobrás em treze anos. Prazo de cinco dias.' 'Deve a Defesa esclarecer a relevância e a pertinência do requerido. A denúncia reportase a três contratos e obras- da Petrobrás e não a todos. Inviável requisitar junto à CGU todos os procedimentos de fiscalização de contas e auditoria da Petrobrás em treze anos. Prazo de cinco dias.' O TRF não viu ilegalidade em tal indeferimento, pois, da mesma forma, houve fundamentação pertinente. Quanto ao requerimento para que fosse determinado à Presidência da República que encaminhasse aos autos informações relativas às 84 missões empresariais realizadas pelo Paciente quando estava no cargo de Presidente da República, entendeu o Juízo processante que estas informações não constituem objeto da Denúncia, aparentando ser prova custosa e duvidosa. Para demonstrar a pertinência do pedido, assim aduziu o impetrante: 'É evidente a pertinência desse material para demonstrar que o Paciente buscou incentivar a internacionalização das empresas brasileiras sem qualquer distinção.' (fl. 16). De fato, em uma análise inicial, não se verifica a relevância da prova requerida com os fatos imputados ao Paciente, tendo em vista também que este não está sendo denunciado pelo crime de associação criminosa com outros funcionários públicos ou empreiteiros/empresários. Verifica-se o mesmo em relação ao pleito para que fosse determinado ao Congresso Nacional que informasse o status de todos os projetos de lei apresentados pela Presidência da República entre os anos de 2003 a 2010, constando, dentre outras coisas, as emendas apresentadas e eventual quórum de aprovação. Quanto a esse pedido o Juízo processante referiu que os dados são públicos, podendo a defesa levantar essa prova, o que se reputa correto. Quanto ao pedido de que fosse determinado à empresa Planner Trustee que informasse a relação contratual mantida com a empresa OAS em relação ao Condomínio Solaris (incluindo os recursos disponibilizados para a construção do empreendimento, as garantias envolvidas e o status da operação, bem como que encaminhasse aos autos cópia dos documentos correspondentes), verifica-se que a Denúncia sustenta que o apartamento 164-A, do referido condomínio, foi personalizado e decorado com recursos provenientes dos crimes praticados em prejuízo da Petrobrás, não se referindo a construção do mesmo, como consta do pedido. Enfim, não se evidencia a manifesta ilegalidade na decisão liminar proferida no HC perante o Tribunal Regional Federal a justificar o conhecimento do presente Habeas Corpus, já que o caso ainda está pendente de julgamento do TRF. Da prova testemunhal indeferida Quanto à oitiva de testemunha que possui residência em outro país (França), esta se daria por meio de carta rogatória. Sobre esse instrumento dispõe o CPP, em seu art. 222-A que 'As cartas rogatórias só serão expedidas se demonstrada previamente a sua imprescindibilidade'. Quanto a isso os impetrantes aduzem que: 'A oitiva do Embaixador Paulo Cesar de Oliveira Campos se mostra efetivamente necessária para melhor apuração dos fatos narrados e imputados especialmente em relação ao Paciente, uma vez que ocupou relevantes cargos durante o seu governo e poderá prestar valiosos esclarecimentos para contrapor as afirmações contidas na denúncia - especialmente em relação ao caráter lícito, probo e ético da atuação do mesmo em relação aos assuntos relativos à Petrobras e a outros órgãos de governo.' (fl. 19, grifou-se). Do excerto acima, verifica-se, a princípio, que a oitiva da testemunha residente na França seria, como bem aduziu a defesa, para atestar especialmente as qualidades do acusado, como seu caráter lícito probo e ético. Dessa análise inicial constata-se que a testemunha seria 'abonatória' das condutas do réu, não sendo demonstrada a sua imprescindibilidade em relação aos fatos imputados ao Paciente. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 75 de 317 Ante tais considerações, não se vislumbra manifesta ilegalidade, pois o indeferimento da produção de tal prova foi justificado. Assim, não havendo manifesta ilegalidade ou teratologia na decisão negativa da liminar requerida nos autos do HC nº 5002991-16.2017.4.04.0000/PR, ainda pendente de julgamento, não compete a este Superior Tribunal de Justiça conhecer do presente Habeas Corpus, devendo ser aplicada a Súmula nº 691 do STF. Destaco, por fim, os seguintes precedentes no sentido de ser considerado, de plano, incabível o processamento do Habeas Corpus, em casos como o presente: a) no Pretório Excelso: HC nº 103570, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ acórdão Min. Rosa Weber, DJe de 22/8/2014; HC nº 121828, Primeira Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 25/6/2014; HC nº 123549 AgR, Segunda Turma, Rel.ª Min. Cármen Lúcia, DJe de 4/9/2014; b) nesta Corte de Justiça: HC nº 392.348/RO, Sexta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro; HC nº 392.249/PR, Sexta Turma, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior; HC nº 392.316/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Ribeiro Dantas; HC nº 391.936/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik; HCnº 392.187/SP, Sexta Turma, Relª. Ministra Maria Thereza de Assis Moura. 3. Ante o exposto, com fulcro no art. 34, inciso XX, e art. 210, ambos do RISTJ, indefiro liminarmente o processamento do presente Habeas Corpus, eis que inadmissível. Para não passar in albis, registre-se que com ou sem a ocorrência de sobrepreço na licitação ou prejuízo da Petrobras, é possível examinar se houve a prática de corrupção ativa e passiva, além de lavagem de dinheiro. Não é fundamental para o deslinde da questão saber se houve superfaturamento e em que montante se deu. Tampouco é imprescindível para o crime a apuração de efetivo prejuízo. A hipótese não é meramente cerebrina, vez que já foi objeto de outros processos penais perante esta Corte. É possível ocorrer fraude à licitação independentemente de majoração dos custos do objeto licitado; também é possível que haja o pagamento de propina a servidor público, ainda que o preço da obra seja aquele que a própria administração estimou. Por isso, não se verifica a indispensabilidade da perícia, já que os valores da licitação não configuram requisito essencial para a solução do processo. Os contratos relacionados à denúncia, especificamente Consórcio Conest/RNEST em obras da Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e Consórcio CONPAR em obras da Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, compõem o acervo probatório. Desnecessário, neste momento preliminar, tecer considerações detalhadas a respeito da procedência ou não da tese acusatória, bastando indicar que a apuração da origem dos recursos utilizados pela OAS para pagamento de propina não é imprescindível para a identificação dos crimes imputados. Não é da essência da corrupção, por exemplo, que o pagamento tenha correlação com uma ou outra avença específica, bastando apenas que tenha sido efetivamente oferecida ou exigida a vantagem espúria, em razão do cargo. De todo o modo, auditorias são limitadas e, por anos, comissões internas da Petrobras curiosamente passaram ao largo das fraudes existentes, o que somente veio a se modificar após a deflagração da 'Operação Lava-Jato'. Ademais, a jurisprudência é pacífica e direciona-se para a 'autonomia e independência das esferas civil, penal e administrativa, razão porque eventual improcedência de demanda ajuizada na esfera civil ou de procedimento administrativo instaurado não vincula ação penal instaurada em https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 76 de 317 desfavor do agente', de maneira que as conclusões no âmbito cível ou administrativo não desmerecem as conclusões do juízo criminal (HC 201402666794, RIBEIRO DANTAS, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:18/10/2017). Com essas considerações, reafirmando o poder instrutório do juízo, a teor do art. 400, § 1º do CPP, resta rejeitada a preliminar. 2.6. Concessão de prazo exíguo para exame de documentação juntada pela Petrobras Sustenta a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA que foi fixado prazo exíguo para o exame de documentação juntada pela Petrobras. A questão foi examinada no HC nº 5021284-34.2017.4.04.0000/PR, cuja ordem foi denegada em acórdão assim lançado: 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. HABEAS CORPUS. EXAME DE PROVA. EXCEPCIONALIDADE. UTILIDADE DO PROCESSO. PERTINÊNCIA COM A DENÚNCIA. JUÍZO INSTRUTÓRIO. INEXISTÊNCIA DE PERTINÊNCIA MATERIAL. 1. (...) 3. O juízo de admissibilidade do habeas corpus para tratar de matérias outras não relacionadas ao direito de ir e vir deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, a fim de evitar o comprometimento da ampla defesa e da utilidade da própria ação penal. Hipótese excepcional de intervenção recursal no juízo instrutório exclusivamente em razão da peculiaridade do caso, sem prejuízo da reafirmação do poder instrutório do magistrado de primeiro grau. 4. Inviável em sede de habeas corpus adentrar na pertinência ou não de determinada prova no processo penal, sob pena de a corte recursal incursionar em matéria afeta à instrução, de conhecimento exclusivo do juízo de primeiro grau. 5. O juiz é o destinatário da prova e pode recusar a realização daquelas que se mostrarem irrelevantes, impertinentes ou protelatórias, conforme previsão do artigo 400, §1º, do Código de Processo Penal. Hipótese em que o indeferimento de provas requeridas pela defesa foi devidamente fundamentado e a decisão impugnada não representa flagrante ilegalidade. 6. Prejudicado o exame do agravo regimental. Ordem de habeas corpus não conhecida. (TRF4, HABEAS CORPUS Nº 5021284-34.2017.404.0000, 8ª TURMA, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 28/06/2017). Embora a 8ª Turma tenha decidido pelo não conhecimento do writ, foram tecidas considerações a respeito do pretendido prazo de noventa dias para exame da documentação. As postulações da defesa - ora objeto de insurgência - foram indeferidas pela decisão lançada no evento 778 da Ação Penal: 2. Pleiteia a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva que seja oficiado à Construtora OAS e à OAS Empreendimentos para fornecimento dos balanços analíticos relativos aos exercícios de 2010, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015, os quais serviram como referência para a elaboração das demonstrações financeiras da empresa. Embora tenha dúvidas sobre a pertinência e relevância de tal prova, defiro. Oficie-se, com prazo de cinco dias, às duas empresas, solicitando envio dessa documentação preferivelmente em meio eletrônico. 3. Retomo o despacho de 07/04/2017 (evento 717): 'Retomo o consignado no item 5 do termo de audiência de 15/03/2017 (evento 687). Ali consignei que a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva apresentou petição requerendo que sejam requisitadas da Petrobrás dezenas, centenas ou milhares de documentos (evento 685). Ofereci oportunidade para que a Defesa apresentasse esclarecimentos a respeito da relevância ou pertinência da prova. A Defesa apresentou a petição do evento 694 com esclarecimentos. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 77 de 317 Decido. Como já consignei no evento 685, vários dos documentos requeridos são de muito duvidosa relevância ou pertinência para o objeto da ação penal, como cópia das eventuais operações de seguro ou de resseguros dos contratos de construção narrados na inicial ou 'listagem de todos os valores mobiliários, inclusive, mas sem limitação, ações, ADR, debêntures e dívidas, de emissão a Petrobrás, suas subsidiárias e coligadas, no Brasil e no exterior emitidos desde janeiro de 2003'. Os esclarecimentos da Defesa não ajudaram a demonstrar a pertinência da prova. Aparentemente, pretende a Defesa demonstrar que as entidades de seguro ou resseguro não teriam detectado corrupção nos contratos da Petrobrás, tampouco a Comissão de Valores Imobiliários ou Securities Exchange Comission. Ora, se não há notícia de que tais entidades detectaram no passado crimes de corrupção, é o que se pode desde logo afirmar, sem a necessidade de requisitar cópias de milhares de documentos para isso. Em outras palavras, não havendo prova nos autos de que tais entidades tenham detectado tais crimes, é o que se terá presente no julgamento, ou seja, que tais entidades não detectaram, no passado, os crimes de corrupção narrados na denúncia. Isso não quer dizer necessariamente que os crimes não ocorreram, já que executados, segundo a denúncia, em segredo. Quanto à cópia integral dos procedimentos de licitação que geraram os contratos da Petrobras com o Consórcio Conest/RNEST em obras da Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras da Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, é inviável a juntada aos autos de cópia integral de licitações de contratos de bilhões de reais. Por outro lado, os autos já estão instruídos com dezenas de documentos relativos a esse contrato e licitação. A questão já foi objeto de decisão deste Juízo quando da apreciação das respostas preliminares (decisão de 28/10/2016, evento 114). O mesmo, aliás, em relação ao pedido de juntadas de todas as atas de assembléias da Petrobrás ou de reuniões da Diretoria de executivos da Petrobrás, diligência igualmente desnecessária. A ampla defesa não vai ao extremo de exigir a produção de dezenas, centenas ou milhares de documentos da parte adversa sem que tenham pertinência ou relevância para o processo. Assim, indefiro, com base no art. 400, §1º, do CPP, as requisições de documentos constantes na petição do evento 694, porque manifestamente impertinentes ou irrelevantes. Defiro, apenas por liberalidade, que a Defesa consulte todos esses documentos requeridos junto à própria Petrobrás, na sede da empresa ou onde eles estiverem arquivados, extraindo cópia por sua própria conta e custo. Fica determinado à Petrobrás, na pessoa de seus advogados, que comuniquem à empresa estatal a presente determinação e que ela deverá disponibilizar, em sua própria sede ou no local onde se encontrem armazenados, a referida documentação. A própria Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva é quem deve realizar o contato com a Petrobrás, o que deve ser feito por intermédio dos advogados ou de pessoa por eles indicada. Eventuais documentos poderão ser juntados diretamente pela Defesa até a fase do art. 402 do CPP.' A Petrobrás informou na audiência de 20/04/2017 (evento 736) que preferia apresentar os documentos em questão diretamente em Juízo, ao invés de disponibilizá-los à Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva em sua sede. Apresentou a Petrobrás a petição do evento 768 e a mídia do evento 769 com os documentos. Dos documentos, ressalvou que não junto todas as atas de reunião da Diretoria Executiva entre 2003 a 2014, mas apenas as pertinentes aos contratos da Petrobrás mencionados na denúncia, por entender que a medida exporia segredos de negócio da empresa, sem que houvesse pertinência ou relevância desses documentos para estes autos. A Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva peticionou reclamando do fornecimento dos documentos em meio digital, afirmando aparentemente que preferia o acesso dos https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 78 de 317 documentos na sede da Petrobrás (evento 757), e reclamando contra a falta de juntada de todas as atas da Diretoria Executiva da Petrobrás entre 2003 e 2014 (evento 771). Decido. Como adiantei, a ampla defesa não vai ao extremo de exigir a produção de dezenas, centenas ou milhares de documentos da parte adversa sem que tenham pertinência ou relevância para o processo. Este julgador havia deferido o acesso aos documentos na própria Petrobrás para poupar o ônus da estatal de produzi-los todos, o que evidentemente tem um custo. Preferindo a Petrobrás produzir os documentos em meio digital, fez ela mais do que o Juízo solicitou. E atendeu especificamente o que a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva requereu inicialmente. Então não cabe qualquer reclamação da Defesa. Quanto à questão da falta de juntada de todas as atas e reunião da Diretoria Executiva entre 2003 a 2014, a juntada das atas das reuniões pertinentes aos contratos mencionados na denúncia, envolvendo o Consórcio CONEST/RNEST e o Consórcio CONPAR, já é suficiente. As outras reuniões simplesmente não têm relevância ou pertinência para o julgamento do feito e não se justifica impor a Petrobrás o ônus de produzir as atas, ainda mais quando presente, como afirma, um risco quanto as suas estratégias e segredos de negócio, máxime diante da dimensão do requerido, todas as atas em um período de mais de dez anos. Caso a Defesa pretenda a juntada de alguma ata específica nesse período e que eventualmente seja relevante para o processo, poderá discriminar. Então tenho presente que a Petrobrás atendeu plenamente ao despacho do evento 717. Quanto ao pedido de prazo para examinar os documentos, descabe, por falta de qualquer base legal, suspender a ação penal para que a Defesa possa examinar documentos. A controvérsia está centrada no requerimento de prova, na forma como seria ela fornecida e no prazo da defesa para exame do material acostado aos autos. Veja-se que a juntada de documentação pela Petrobras foi requerida pela própria defesa. Ainda que em certa medida impertinente ao processo, porquanto não relacionada aos contratos indicados na denúncia, foi facultada pelo juízo de primeiro grau a sua obtenção para posterior juntada ao processo, inclusive com o comparecimento pessoal na sede da empresa. Contudo, na audiência do dia 20/04/2017, a Petrobras ponderou que seria mais lógico que o material em questão fosse juntado aos autos por meio digital por ela própria, na condição de assistente de acusação. Da ata daquela audiência extrai-se (evento 736): Relativamente à requisição de documentos efetuados pela Defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, a Petrobras informou que preferia, ao invés de disponibilizá-los na sede da empresa, tendo inclusive anotado prazo para tanto. A questão foi solvida pelo juízo de primeiro grau com a permissão de juntada do material em meio digital. Presente ao ato, a defesa do paciente nada opôs ou requereu em sentido diverso. Ora, é válida a juntada de documentação em meio digital, apesar de a parte interessada insistir em recebê-la ou acessá-la de forma diversa, em especial porque, no momento oportuno, não se insurgiu expressamente. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 79 de 317 Assim, a necessidade probatória resta atendida, mesmo que de forma diversa da pretendida pela defesa. Diga-se, ainda, que, em se tratando de prova requerida pela defesa - o esclarecimento é fundamental - nada mais adequado do que a sua juntada ao processo, como autorizado, até porque a Petrobras é parte no processo, pelo que refoge ao razoável a pretensão de comparecimento na sua sede. Também não há ilegalidade latente quanto ao não fornecimento de contratos e documentos que não digam respeito às imputações não contidas na denúncia. Cabe lembrar que a conduta imputada a cada denunciado está narrada na acusação e, com base nela, a defesa se manifesta na resposta inicial e nos demais atos do processo. Significa dizer, do ponto de vista material, não há correlação entre a atuação da defesa e aquilo que não está nos autos. Não há aqui, portanto, violação à ampla defesa. A propósito, importa referir a manifestação da Petrobras (evento 768): 5. É de se ter em mente que a decisão deste Juízo atendeu o interesse da ampla defesa, embora a grande maioria dos documentos solicitados não tenha pertinência temática com a causa. Contudo, a diligência da parte requerida não pode importar em desnecessária devassa, parafraseando, às avessas, a diligência de busca e apreensão que é um dos meios para 'apreender coisas achadas ou obtidas por meio criminoso' (CPP, art. 240, § 1º, c). Ademais, não se descarta a hipótese de que eventual visita à sede da peticionaria - vítima dos graves crimes em apuração - transforme-se em um evento de apelo midiático, causando inclusive transtornos aos funcionários da Companhia. 6. Assim é que não se compreende - respeitosamente - a resistência da defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, manifestada na petição do Evento 758, em aceitar o encaminhamento dos documentos diretamente a este Juízo. Tal permitirá, inclusive, um maior tempo de análise dos documentos pelas partes. Tal referência é apenas ilustrativa. No tocante ao acesso a todas as atas da Diretoria Executiva da Petrobras no período de 2003 a 2014, disse ainda a assistente: ... a PETROBRAS é uma sociedade de economia mista, exploradora de atividade econômica, sujeita ao regime próprio das empresas privadas (CF, art. 173) e, consequentemente, à concorrência de outras empresas no Brasil e no exterior. Além da proteção constitucional, a proteção ao segredo de negócio é assegurada na legislação pátria conforme disposto na Lei de Acesso à Informação (Lei n.º 12.257/2011): 'Art. 22. O disposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.' Assim, não se vê fundamento legal para que a defesa do réu tenha acesso indiscriminado aos segredos de negócio da peticionária, completamente alheios aos fatos relativos a presente ação penal. Não se pode conceber, por exemplo, que os segredos de negócio como a estratégia de exploração do pré-sal sejam devassados e expostos para que empresas concorrentes possam deles se utilizar. Assim, a peticionária junta, nesta oportunidade, apenas as atas que se referem às questões discutidas nestes autos, ou seja, os contratos das obras. Recorrendo a uma breve retrospectiva, a impertinência da juntada de contratos e documentos não relacionados aos fatos imputados já havia sido objeto de https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 80 de 317 controvérsia quando do exame das respostas à acusação e indeferida. Neste ponto, aliás, há aparente coincidência também com o objeto do HC nº 5002991-16.2017.4.04.0000/PR. A pretensão de prazo especial não inferior a noventa dias para o exame do material apresentado pela Petrobras carece de previsão legal. A documentação juntada em meio digital é inédita para todos os atores processuais (defesa, acusação e juízo). Não se desconsidera que a existência de milhares de páginas para exame demanda longo tempo, mas carece de razoabilidade a pretensão de sobrestamento da ação penal até a aferição da integralidade da documentação por ela própria solicitada, quando a inicial acusatória está suficientemente instruída. Analisando detidamente as razões de apelação, muito embora passados aproximadamente cinco meses da decisão proferida na audiência registrada no evento 736 (em 20/04/2017, computando-se bem mais que os noventa dias solicitados, portanto) não se identifica argumentações expressivas acerca da documentação juntada pela Petrobras. As alegações são apenas genéricas, não havendo este Tribunal, diante de tal contexto, de se dedicar a revisar todo o material para atestar a pertinência de determinada informação e eventualmente a existência de alguma nulidade, sem que a própria defesa tenha se desincumbido de tal ônus de modo eficaz. Se não pelo amor à teoria das nulidades, nada justifica a discussão. Os contratos relativos às imputações estão acostados aos autos e a análise da documentação solicitada pela própria defesa não observa prazo especial, porquanto, repitase, ausente previsão legal. Ao contrário do que requerido - exame da documentação diretamente na sede da assistente -, a prova efetivamente foi por outro meio produzida e não é passível de oposição a pretensão de prazo que a parte requerente entende razoável (não inferior a noventa dias). 2.7. Proibição de gravação de audiências pela defesa Sustenta a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA cerceamento de defesa em razão do indeferimento de pedido para gravação autônoma do interrogatório do apelante, realizado no dia 10/05/2017. Aduz que a pretensão encontra respaldo no art. 367 do Código de Processo Civil e que a negativa do juízo caracterizou cerceamento de defesa. A tese circunscreve-se à possibilidade de a própria parte gravar o ato de interrogatório do réu. Na ocasião, ao indeferir o pleito, assim anotou o juízo de origem (evento 797): 1. Designada audiência de interrogatório de Luiz Inácio Lula da Silva para 10/05, às 14:00. A Defesa do acusado na petição do evento 772 requer a alteração da forma de captação das imagens da audiência para que seja registrado o que se passa em todo o recinto e não apenas o depoimento do acusado. Comunica ainda que pretende gravar, em áudio e vídeo, a audiência. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 81 de 317 2. No termo de 04/05/2017, solicitei esclarecimentos da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silve e oportunizei manifestação das demais partes. Em petição do evento 793, esclareceu como pretende realizar a gravação. O MPF, em petição do evento 792, manifestou-se contrariamente à pretensão da Defesa. A Defesa de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, em petição do evento 794, manifestou-se contrariamente à pretensão da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva. 3. Não assiste razão à Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva em afirmar que a forma de gravação dos depoimentos em audiência resulte em prejuízo aos acusados. A câmara é focada no depoente, acusado ou testemunha, porque se trata do elemento probatório relevante e que será avaliado pelos julgadores das várias instâncias. Não há qualquer intenção de prejudicar o acusado ou sugerir a sua culpa com esse foco, tanto assim que o depoimento das testemunhas, que não sofrem qualquer acusação, é registrado da mesma forma. Aliás, esse é um procedimento não deste Juízo, mas de toda a Justiça Federal da 4ª Região, de gravar os depoimentos com o foco no depoente. Por outro lado, se é certo que o novo Código de Processo Civil tem norma prevendo a possibilidade de gravação da audiência por qualquer das partes independente de autorização judicial (art. 367, §6º), também é correto que o Código de Processo Penal não tem equivalente previsão legal. O que há no CPP é somente a previsão legal de gravação audiovisual, sempre que possível, dos depoimentos (art. 405 do CPP). Se o CPP tem norma específica, não se aplica subsidiariamente o CPC no ponto. Ademais, considerando que os depoimentos já são gravados, fica sem muito sentido a aplicação subsidiária do art. 367, §6º, do CPC no processo penal. Nem tudo que é pertinente ao processo civil é igualmente pertinente ao processo penal, já que o objeto deste normalmente envolve questões mais delicadas, acusações criminais de maior impacto e repercussão do que questões cíveis. Rigorosamente o art. 367, §6º, do CP, precisa ainda ser melhor avaliado pelas Cortes de Justiça, pois a previsão nele contida contrasta com as praxes habituais dos Tribunais, inclusive do Supremo Tribunal Federal, que proíbem que as sessões sejam gravadas em áudio e vídeo pelas partes, admitindo somente a gravação oficial. Além disso, não se ignora que o acusado Luiz Inácio Lula da Silva e sua Defesa pretendem transformar um ato normal do processo penal, o interrogatório, oportunidade que o acusado tem para se defender, em um evento político-partidário, tendo, por exemplo, convocado militantes partidários para manifestações de apoio ao Ex-Presidente na referida data e nessa cidade, como se algo além do interrogatório fosse acontecer. Assim, há um risco de que o acusado e sua Defesa pretendam igualmente gravar a audiência, áudio e vídeo, não com finalidade privadas ou com propósitos compatíveis com os admitidos pelo processo, por exemplo permitir o registro fidedigno do ocorrido para finalidades processuais, mas sim com propósitos político-partidários, absolutamente estranhos à finalidade do processo. A gravação pela parte da audiência com propósitos político partidários não pode ser permitida pois se trata de finalidade proibida para o processo penal. Também necessário ressalvar que não houve consenso entre as partes acerca da gravação pretendida pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, tendo havido oposição tanto do Ministério Público Federal como da Defesa de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, este acusado, aliás, com tantos direitos como o ex-Presidente. Na esteira do que afirmam o Ministério Público e a Defesa de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, permitir que um profissional contratado pela parte registre a audiência poderia colocar em risco o sigilo da comunicação entre os advogados e entre os representantes do MPF, pois diálogos paralelos poderiam ser captados, e ainda geraria o risco de exposição desnecessária da imagem das pessoas presentes e que já informaram que não desejam que suas imagens sejam gravadas e expostas na ocasião. Assim sendo e com base no art. 251 do CPP, indefiro o requerido na petição do evento 772. Será mantida a forma de gravação atual dos depoimentos, focada a câmara no depoente, pois é o depoimento a prova a ser analisada, e fica vedada a gravação em áudio e vídeo autônoma pretendida pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 82 de 317 Apesar disso, para evitar qualquer afirmação equivocada de que se pretende esconder algo na audiência, informo que será efetuada, na referida data, uma gravação adicional de imagens do depoimento do acusado Luiz Inácio Lula da Silva, não frontal, mas lateralmente e que retratará a sala de audiência com um ângulo mais amplo. Tal gravação oficial será igualmente disponibilizada no processo às partes. Ciência ao MPF, Assistente de Acusação e Defesas. 4. Dispõe o art. 296 da Consolidação Normativa da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região: 'Art. 296. Durante os trabalhos da audiência, os Juízes deverão adotar as medidas necessárias para evitar a captação sonora ou audiovisual, salvo na hipótese de concordância das partes e sempre de modo a não prejudicar o normal desempenho da função jurisdicional.' Em vista do ali exposto e de experiência negativa anterior em outra ação penal, na qual conteúdo de depoimento de acusado foi transmitido para veículos de imprensa antes mesmo do fim da audiência, informo às partes, MPF, Assistente de Acusação e Defesas, que será vedado o ingresso, em 10/05/2017, na sala de audiência com aparelhos celulares. Ciência ao MPF, Assistente de Acusação e Defesas. A defesa impetrou o HC nº 5021421-16.2017.4.04.0000/PR nesta Corte, indeferido liminarmente pelo Juiz Federal Convocado Nivaldo Brunoni. Com efeito, não se verifica ilegalidade no indeferimento do pedido pelo juízo de primeiro grau. As gravações de audiência naquela instância já passam de uma década e, até hoje, nunca transitou por este Tribunal inusitado pedido, tampouco notícia de que a gravação oficial realizada pela Justiça Federal tenha sido prejudicial a algum réu. Apesar dos esforços argumentativos, não vejo como se aplicar subsidiária e indistintamente regras emprestadas, já que o Código de Processo Penal traz previsão própria a respeito do tema (art. 405), muito embora não desça às minúcias do Código de Processo Civil. Nessa perspectiva, deve-se ter cuidado com as tentativas de processualização civil do processo penal, já que, havendo disposição específica especial, não se aplica o CPC. Note-se que o juízo determinou a colocação de mais um equipamento de gravação, mas o fez por mera liberalidade, e não por supor alguma provável falha do sistema de gravações. A propósito, isso não ocorreu ao longo de toda 'Operação Lava-Jato' ou mesmo nos 197 (cento e noventa e sete) juízos criminais e cíveis de toda a 4ª Região; e não se tem relatos de prejuízos às partes. De todo modo, argumentou a defesa, ainda, que o importante seria capturar a completude do ato judicial para observar as expressões faciais e corporais não somente do acusado, mas também do Parquet e, por que não, do Juízo. Ora, o Ministério Público Federal e o Juízo não são réus ou testemunhas do processo. Há, na verdade, excesso da defesa ao referir constrangimentos ilegais em desfavor do paciente, segundo entende, caracterizados por fatos absolutamente estranhos ao curso da ação penal. Disse a defesa (inicial do HC nº 5021421-16.2017.4.04.0000/PR): https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 83 de 317 À Acusação cabe a ampla divulgação dos atos do processo que lhe convém, como a apresentação da denúncia, e à Defesa nada cabe, mesmo quando se trata da constituição de provas no processo, o que a todos interessa? Frente a estes constrangimentos ilegais perpetrados contra o Paciente, necessário se torna sua contenção, evitando-se que os princípios regentes do Código de Processo Penal, como a ampla defesa e o contraditório não sejam subvertidos em uma lógica que convola a lei procedimental em instrumento inquisitorial. As razões de recurso seguem em linha semelhante, mas não encontram respaldo na sequência de fatos. Sequer seria possível ao juízo e ao órgão ministerial esconder da defesa determinada informação perante tantos atores processuais presentes à audiência. O mesmo ato judicial contou com a presença de outros corréus e seus defensores. A defesa de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO manifestou-se expressamente de modo contrário à gravação independente, defendendo, na mesma linha do que decidido em sede de habeas corpus, a inaplicabilidade do Código de Processo Civil ao caso. Destacou, além disso, não haver mácula na gravação realizada pela própria serventia e que a modificação na forma de captação das imagens não se mostra necessária à garantia da ampla defesa e do contraditório. Com acerto, a fidelidade das declarações do depoente está assegurada pela gravação oficial e as razões de apelação nada indicaram em sentido contrário. A tese, novamente, passa ao largo dos fatos. A construção de uma tese indireta de suposta violação à ampla defesa somente se justifica nos dizeres da defesa, pois, de rigor, nem sequer existe pertinência lógica entre uma coisa e outra. Ou, se existente correlação com a não gravação autônoma, não trouxe a defesa em suas razões de apelação um só fato concreto diretamente relacionado àquele ato. Não se olvida que em outra audiência (em 09/02/2017 - evento 508, TERMOAUD1) houve manifestação do magistrado a respeito de gravações não autorizadas e que, por isso, teria anotado a ausência de direito à gravação independente (item 9). Contudo, o excerto da decisão acostada pela defesa não revela nenhuma animosidade ou crítica aos defensores constituídos ou ao apelante, mas sim mera orientação de caráter geral a todos os presentes. O tema chegou ao Superior Tribunal de Justiça nos autos do HC nº 389.589/PR, impetrado em razão do indeferimento liminar do HC nº 502142116.2017.4.04.0000/PR, pelo Juiz Federal Convocado Nivaldo Brunoni. Apesar de não conhecido o writ, anotou o e. Ministro Félix Fischer: A respeito do primeiro requisito, tenho que não restou suficientemente demonstrado. Com efeito, não há como se considerar ilegal o indeferimento da gravação da audiência de forma autônoma pela parte, ao argumento de que não se aplica o art. 367 do Código de Processo Civil, pois de fato o código aplicável ao processo penal, evidentemente, é o Código de Processo Penal. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 84 de 317 É certo que o CPP admite interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento de princípios gerais do direito (art. 3º do CPP). Mas isto só ocorre quando o próprio CPP é omisso. No caso, o CPP, em seu art. 405, expressamente prevê a gravação audiovisual, sempre que possível, dos depoimentos (e isto está ocorrendo). Assim, se o CPP tem norma específica, não se aplica subsidiariamente o CPC. No mais, como bem anotou o TRF, deve-se ter cuidado com as tentativas de processualização civil do processo penal, pois tem objetos distintos (o processo penal envolve questões mais delicadas, com acusações criminais de maior impacto e repercussão do que questões cíveis). Quanto ao pedido para que a gravação da audiência capte imagens de todos que participarem fazendo perguntas ou tecendo esclarecimentos (e não só o acusado), também não se vislumbra a 'fumaça do bom direito' em favor do Paciente, primeiramente por falta de previsão legal. Além disso, ao contrário do alegado pela Defesa, não se vislumbra prejuízo na forma de gravação da audiência (focada na pessoa que presta depoimento), pois tal foco decorre do fato de ser tal pessoa quem está prestando depoimento. No mais, o próprio Juízo, em homenagem à Defesa, informou que fará uma gravação adicional de imagens do depoimento do Paciente, focada na sala de audiência com um ângulo mais amplo. Assim, mostra-se desarrazoada a tentativa de atribuir à gravação autônoma a qualidade de contraprova. A proposta ganha ares de mera especulação, pois deixa de indicar expressamente qual seria a hipotética mácula ou prejuízo do ato judicial. Nem mesmo após a sua realização e a disponibilização da gravação nos autos, a defesa conseguiu se desincumbir de tal ônus. 2.8. Indeferimento de perguntas a colaboradores A defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA alega cerceamento de defesa em razão do indeferimento de perguntas aos colaboradores, sustentando que o art. 203 do Código Penal estabelece o dever de a testemunha responder com a verdade. Como já referido, descabe à Corte Recursal sindicar toda a prova e, no caso, as declarações tomadas em juízo pelos colaboradores. Assim, o exame fica restrito aos depoimentos de Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, Eduardo Hermelino Leite, Pedro Barusco, Nestor Cerveró, Alberto Youssef, Milton Pascovitch e Fernando Antônio Falcão Soares, expressamente indicados nas razões de recurso (fls. 129-142). Afirma a defesa que as testemunhas acima referidas estão em fase de firmar ou já firmaram acordo de colaboração premiada no Brasil ou no exterior e que, portanto, não apresentam a isenção necessária de uma testemunha. Sem razão, contudo. Na verdade, a utilidade das declarações de colaboradores é questão a ser aferida quando do enfrentamento do mérito. Porém, anote-se que as perguntas indeferidas pelo juízo não dizem respeito aos fatos do processo. Todas elas trazem questionamentos a respeito de eventuais colaborações que estariam sendo entabuladas, o que, ao sentir da defesa, comprometeria a veracidade das afirmações dos depoentes, porque interessados em fazer prevalecer suas versões. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 85 de 317 Ainda que os depoimentos de colaboradores devam ser vistos com ressalvas, as ponderações necessárias têm lugar quando do exame do acervo probatório como um todo, como reservado pela própria Lei nº 12.850/2013, segundo disposto no art. 4º, §§ 11 e 16: § 11. A sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia. § 16. Nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador. Conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal o acordo de colaboração configura 'negócio jurídico personalíssimo', não podendo seus termos, por conseguinte, serem questionados por terceiros, ainda que réus delatados. Tal entendimento restou sufragado pelo STF no julgamento do MS nº 34.831/DF, assim ementado: 4. Ilegitimidade ativa de terceiros para efeito de impugnação judicial do acordo de colaboração premiada. Res inter alios acta. Doutrina. Precedentes do Supremo Tribunal Federal (Pleno e 2a Turma). (...) 7. Inviabilidade de impugnação, sem sede de mandado de segurança, do próprio acordo de delação premiada. Possibilidade, no entanto, de o delatado (condição não ostentada pela parte impetrante) contestar, em juízo, no exercício do direito de defesa, o depoimento do agente colaborador e as provas que se produzirem por efeito de sua cooperação. DESTAQUE O acórdão de julgamento traz a seguinte observação: Vale também recordar, considerada a pretensão mandamental deduzida pela parte ora impetrante, que a jurisprudência plenária desta Suprema Corte firmou-se no sentido de recusar, em favor de terceiros, legitimidade ativa 'ad causam' para questionar - por meio de mandado e segurança (ou de qualquer outra ação judicial, exceto no âmbito de procedimento penal instaurado contra o delatado e no qual este figure como investigado ou como réu) - a validade jurídica do ato que homologou acordo de colaboração premiada celebrado entre o Ministério Público e agentes colaboradores, eis que o negócio jurídico processual em questão, em razão de sua natureza personalíssima, constitui, em relação a terceiros, 'res inter alios acta', a significar que o seu conteúdo não obriga nem vincula a esfera jurídica dos 'extranei', motivo pelo qual nem mesmo os corréus (ou partícipes) dos crimes praticados pelo colaborador, eventualmente mencionados nas declarações subjacentes ao acordo, adquirem legitimação jurídica para buscar-lhe a invalidação. A posição do Superior Tribunal de Justiça também segue no sentido de que falece interesse jurídico aos delatados para questionar os termos de acordo de delação firmado por outrem: A colaboração premiada é uma técnica especial de investigação, meio de obtenção de prova advindo de um negócio jurídico processual personalíssimo, que gera obrigações e direitos entre as partes celebrantes (Ministério Público e colaborador), não possuindo o condão de, por si só, interferir na esfera jurídica de terceiros, ainda que citados quando das declarações prestadas, faltando, pois, interesse dos delatados no questionamento quanto à validade do acordo de colaboração premiada celebrado por outrem. Precedentes do STF e STJ. 3. Recurso Ordinário em habeas corpus a que se nega provimento.(STJ, 5a Turma, Relator Ministro Reynaldo Fonseca, DJe de 07/11/2016). É possível aos colaboradores prestarem depoimentos na qualidade de testemunhas com fulcro no art. 4º, § 12, da Lei nº 12.850/13. Referida disposição diz https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 86 de 317 apenas que o colaborador, ainda que tenha sido beneficiado pelo perdão judicial, poderá ser ouvido em juízo a pedido das partes ou por iniciativa da autoridade policial, mas não diz a que título. Veja-se: § 12. Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial. Assim, uma vez excluídos do pólo passivo da ação penal e tendo o dever de falar a verdade em decorrência do acordo firmado, natural que suas oitivas sejam realizadas na condição de testemunhas. Tanto é assim que o § 14 do mesmo artigo de lei refere a 'depoimentos': Artigo 4°, § 14. Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade Em suma, o § 12 do art. 4º da Lei 12.850/13 deve ser interpretado de modo a possibilitar ao colaborador não denunciado ser ouvido. Já aquele que tem contra si um processo em curso será interrogado, mas, ainda assim, com direito de resguardar o compromisso assumido no acordo de colaboração. A garantia do exercício do contraditório e da ampla defesa está associada à configuração dos colaboradores como testemunhas, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça, no âmbito da 'Operação Lava-Jato', no julgamento do Recurso em Habeas Corpus interposto no interesse de Alexandrino Ramos de Alencar (STJ, RHC 201600225786, 5ª Turma, Rel. Min. Felix Fischer, DJE DATA: 02/05/2016): É cediço que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da AP nº 470 AgR - sétimo/MG, Relator Ministro Joaquim Barbosa (DJe 186, de 02/10/2009), entendeu que o sistema processual brasileiro não admite a oitiva do corréu na qualidade de testemunha ou, mesmo, de informante. Tal exceção, no entanto, é aberta ao caso do corréu colaborador. A questão já foi debatida pela 8ª Turma deste Tribunal, como se vê exemplificativamente do precedente abaixo colacionado: OPERAÇÃO LAVA-JATO'. HABEAS CORPUS. CABIMENTO. PROVA. DEPOIMENTOS. EXCEPCIONALIDADE. UTILIDADE DO PROCESSO. TERMOS DE COLABORAÇÃO ACESSO. PROTEÇÃO POR SIGILO. PERTINÊNCIA COM A DENÚNCIA. JUÍZO INSTRUTÓRIO. COLABORADOR. DEPOIMENTO EM JUÍZO COMO TESTEMUNHA. COMPROMISSO. CORRÉU. DIREITO AO SILÊNCIO. EXCEPCIONALIDADE. LEI Nº 12.850/2013. RÉU. OUTRA AÇÃO PENAL. INEXISTÊNCIA DE PERTINÊNCIA MATERIAL. 1. (...) 5. Inexiste direito da parte a termos de colaboração relativos a fatos não pertinentes ao processo em que foi denunciado e protegidos por sigilo. 6. O sigilo sobre os termos de colaboração e documentos de outros processos tem por finalidade proteger a própria investigação, cabendo ao juízo de primeiro grau a adequada ponderação. 7. O sistema processual brasileiro não admite a oitiva de corréu na qualidade de testemunha ou, mesmo, de informante, exceção aberta para o caso de corréu colaborador, conforme Lei nº 12.850/2013. 8. O corréu colaborador poderá depor em juízo, inclusive compromissado em dizer a verdade, seja pela expressa disposição constante no art. 4º, § 14 da Lei nº 12.850/2013, seja para atestar a veracidade de suas declarações e assim fazer valer os benefícios previstos no acordo. 9. Não há impedimento https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 87 de 317 a que réu em outra ação penal sirva como testemunha do juízo, quando os delitos imputados as partes não guardam correlação entre si. 10. Eventual direito ao silêncio do réu tem natureza pessoal e não se mostra agredido com o testemunho a respeito de fatos imputados em outras ações penais. 11. Ordem de habeas corpus denegada. (TRF4, HABEAS CORPUS Nº 5036273-16.2015.404.0000, 8ª Turma, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 20/11/2015). De qualquer modo, garantir aos pretensos colaboradores a reserva de confidencialidade em tratativas internacionais, cujos fatos não estão diretamente ligados ao objeto do presente processo (corrupção e lavagem de dinheiro), em nada viola o direito defensivo. Como concluído pelo juízo de primeiro grau, 'não há qualquer invalidade na submissão de colaboradores ao compromisso de dizer a verdade, quer ouvidos como testemunhas ou como acusados, antes tendo a medida expressa previsão legal e objetivando proteger os delatados, ora acusados contra falso depoimento'. 2.9. Supressão da fase de diligências complementares do art. 402 do CPP 2.9.1 Afirma a defesa que houve 'supressão da fase de diligências complementares do art. 402 do CPP', em razão do indeferimento de diversas diligências complementares solicitadas pela defesa. Em regra, como já desenvolvido no item 2.4, cabe ao magistrado avaliar o cabimento de determinada diligência, porquanto submetida ao critério judicial de necessidade e relevância das provas (§ 1º do art. 400 CPP, na forma da Lei nº 11.719/08), não se confundindo o indeferimento de provas, notadamente após encerrada a instrução, com eventual supressão da fase do art. 402 do CPP. Nessa perspectiva, a defesa requereu no HC nº 502742132.2017.4.04.0000/PR fosse reconhecida a ilegalidade do indeferimento de provas para que outra decisão seja proferida pelo juízo de origem. A inicial da impetração incursionou em aspectos que já haviam sido abordados pelo juízo de primeiro grau e pelo Tribunal, como o indeferimento de provas no curso da ação penal ou a alegada parcialidade do juízo. Além disso, trouxe discussões sobre matérias absolutamente estranhas à fase processual do art. 402 do CPP, como a inépcia da denúncia e a ausência de justa causa para a ação penal, superadas pela prolação da sentença. 2.9.2. Para que não restem dúvidas, contudo, veja-se o que dispõe o art. 41 do Código de Processo Penal: Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas. Da inicial exige-se que esclareça os fatos criminosos imputados aos acusados 'com todas as suas circunstâncias', ou seja, delimitando todos os elementos indispensáveis à sua perfeita individualização. Tais aspectos restaram devidamente observados na https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 88 de 317 hipótese dos autos, visto que o Ministério Público Federal descreve pormenorizadamente os fatos delituosos e participação de cada um dos denunciados. Há narrativa clara das condutas criminosas praticadas, imputando-as a cada um dos acusados qualificados. Além disso, a persecução penal amparava-se em elementos indiciários suficientes. A respeito, na fase inicial do processo, não é necessária prova cabal dos fatos, pois para isso se presta justamente a instrução do processo. Nesse contexto, a inicial possui a aptidão necessária ao exercício da ampla defesa, pois observa aos requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal. Sobre o tema, o precedente que segue: Não é inepta a denúncia formulada em obediência aos requisitos traçados no art. 41 do Código de Processo Penal, descrevendo perfeitamente a conduta típica, cuja autoria é atribuída a agente devidamente qualificado, circunstâncias que permitem o exercício da ampla defesa e preservam o devido processo legal. 2. Este Superior Tribunal tem entendimento jurisprudencial no sentido de que, com a superveniência de sentença condenatória, fica preclusa a alegação de inépcia da denúncia (STJ, AGRESP 1555105, 6a T., DJE de 30/06/2016, Relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR). Note-se que, em se tratando dos denominados delitos de autoria coletiva, a denúncia é válida ainda que não individualize minuciosamente as atuações de cada um dos acusados, mas demonstre um liame entre a sua ação e a suposta prática delituosa. O essencial é considerar que a alegação de inépcia da inicial resulta superada com a superveniência de sentença condenatória, uma vez que não se pode falar em ausência de aptidão da denúncia ou de justa causa nos casos em que os elementos carreados aos autos autorizam a prolação de condenação. Tal entendimento é presente na jurisprudência. A propósito, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: A superveniência da sentença penal condenatória torna esvaída a análise do pretendido reconhecimento de inépcia da denúncia, uma vez que o exercício do contraditório e da ampla defesa foi viabilizado em sua plenitude durante a instrução criminal. (STJ, AgRg no AREsp 537.770/SP, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, DJe 18/08/2015) Conforme jurisprudência desta Corte Superior, resta superada a alegação de inépcia da denúncia com a superveniência de sentença condenatória, por se tratar de título jurídico que afasta a dúvida quanto à existência de elementos suficientes não só para a inauguração do processo penal como também para a própria condenação (STJ, AgInt no HC 301.215/RJ, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 07/06/2016, DJe 17/06/2016). No mesmo sentido, já decidiu a 8ª Turma em processo relacionado à 'Operação Lava-Jato': 5. INÉPCIA DA DENÚNCIA. A denúncia não pode ser considerada inepta quando formulada em obediência aos requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal, descrevendo de forma clara as condutas típicas praticadas, atribuindo-as a acusados devidamente qualificados, com todas as circunstâncias que permitem o exercício da ampla defesa. Ademais, com a superveniência de sentença condenatória resulta preclusa a https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 89 de 317 alegação de inépcia da denúncia e de ausência de justa causa. Precedentes do STJ. (ACRIM nº º 5045241-84.2015.404.7000/PR, 8ª Turma, Des. Federal Leandro Paulsen, juntado aos autos em 10/10/2017). 2.9.3. No remanescente, reproduzo, por pertinente, a decisão que indeferiu o intento probatório (evento 836 da ação penal): 2. A Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, em petição de vinte e oito páginas, requereu diversas provas (evento 824). 2.a Pretende que seja informado pela Construtora OAS e a OAS Empreendimentos quais seriam as empresas que realizariam auditoria sobre elas e depois para que estas sejam instadas a informar se teriam conhecimento se o acusado Luiz Inácio Lula da Silva teria praticado algum ilícito ou se houve irregularidade na transferência do empreendimento Solaris da BANCOOP para a OAS Empreendimentos. A prova é absolutamente desnecessária. O acusado se defende contra fatos objetivos. Assim, se não há no processo notícia de que as auditorias sobre a OAS detectaram prática de ilícitos pelo acusado Luiz Inácio Lula da Silva, é isso que o Juízo considerará. Não há necessidade de provocá-las para esse tipo de manifestação em sentido negativo. Ademais, é de se presumir que os acertos de corrupção entre o Presidente da OAS e o exPresidente da República, acaso existentes, não eram informados pelo primeiro às auditorias, nem por ela detectados, já que realizados em segredo. Quanto à transferência do empreendimento imobiliário do Mar Cantábrico/Condomínio Solaris, não há sequer questionamento de que toda ela seria ilícita, não tendo pertinência a prova em relação a esse ponto. Indefiro, portanto, o requerido. 2.b. Requer que a OAS Empreendimentos seja instada a informar quem seriam os responsáveis pela elaboração do Plano de Recuperação Judicial do âmbito da empresa e que depois sejam ouvidos os representantes para que 'sejam esclarecidos aspectos do plano de recuperação judicial da OAS sobre a propriedade do apartamento 164-A, do Condomínio Solaris, no Guarujá'. Esse requerimento vem na esteira da petição da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva constante no evento 730 no sentido de que, em março de 2016, a Administradora Judicial da OAS Empreendimentos relacionou entre os bens da empresa o aludido apartamento triplex 164-A. A ver do Juízo, já está bem demonstrado pela Defesa que o referido apartamento foi incluído, em março de 2016, entre os bens de titularidade da OAS na recuperação judicial. Tem o Juízo o fato como provado. Observo que, em princípio, o apartamento em questão encontra-se formalmente em nome da OAS Empreendimento, aparentando ser natural que figure nesse rol da recuperação judicial, máxime após as providências tomadas pelo acusado e sua ex-esposa de publicamente desistir da aquisição formal de apartamento ou da cota correspondente no Condomínio Solaris, podendo ser citada nesse sentido a nota emitida pelo Instituto Lula em 12/12/2014 (evento 724, anexo11). De todo modo, se a inclusão do apartamento na recuperação judicial é ou não relevante para o julgamento, é uma questão que será apreciada na sentença. Em qualquer hipótese, absolutamente desnecessária outra prova dessa inclusão. Quanto à pretensão de oitiva de novas testemunhas, devia a Defesa ter indicado nome e endereço, sendo inapropriado pretender transferir o ônus a terceiros. Indefiro, portanto, o requerido por deficiência no requerimento e desnecessidade da prova. 2.c. Reclama que sejam ouvidas arquitetas identificadas como Jessica Malzone e outra somente por Paula, que teriam sido mencionadas pelo acusado Rodrigo Moreira Ferreira em seu interrogatório, e que teriam trabalhado no projeto de reforma do apartamento triplex. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 90 de 317 Testemunhas referidas podem ser ouvidas na fase do art. 402. Entretanto, é ônus da parte apresentar a identificação completa, inclusive endereço. Não cabe transferir o ônus a terceiros. De todo modo, os projetos de reforma do apartamento triplex teriam sido apresentados ao ex-Presidente e a sua ex-esposa pelos acusados JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e Paulo Gordilho, segundo os depoimentos, aparentemente, por estes prestados. Roberto Moreira Ferreira também declarou, aparentemente, que os contatos com o casal eram efetuados a partir deles. A Defesa, aparentemente, questiona a veracidade desses depoimentos. Mas, verazes ou não, as arquitetas arroladas de maneira precária sequer teriam o que esclarecer, já que não teriam tido contato com o casal presidencial mesmo segundo os depoimentos questionados pela Defesa. E, considerando a quantidade de depoimentos já tomados sobre a reforma do apartamento triplex, não são necessários outros sobre o mesmo assunto. Essa questão também foi tratada no item 3, adiante. Indefiro, portanto, o requerido, pois a Defesa não cumpriu o ônus de identificar propriamente as testemunhas e indicar o endereço e além disso os depoimentos não teriam relevância para esclarecer os fatos. 2.d. A Defesa reclama que a Petrobrás não atendeu integralmente o pedido de requisição de documentos feitos pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva em 14/03/2017 (evento 685). Como já consignei longamente no despacho de 07/04/2017 (evento 717) e ainda no despacho de 04/05/2017 (evento 778), a Defesa requereu dezenas, centenas ou milhares de documentos da Petrobras de duvidosa relevância ou pertinência. Por certa liberalidade, deferi que fossem colhidos na sede da própria Petrobrás pela Defesa. Entretanto, a Petrobrás preferiu apresentá-los em Juízo, o que o fez em mídia eletrônica, conforme eventos 768 e 769. Tive a requisição de documentos por satisfeita, conforme despacho de 04/05/2017 (evento 778). Não cabe voltar a essa questão. Inclusive quanto aos documentos dos contratos discriminados na inicial entre a Petrobrás e os Consórcios CONPAR e o CONEST/RNEST, consignei, já no despacho de 28/10/2016, quando da apreciação da resposta preliminar (evento 114), que a denúncia já estava instruída com cópia de vários documentos pertinentes (evento 3, comp113 a comp115, comp119 a comp123, comp141 a comp160) e ainda determinei o traslado de peças da ação penal conexa 5083376-05.2014.4.04.7000/PR, com elementos pertinentes aos referidos contratos, que foram então juntados no evento 153, bem como mídia juntada no evento 154 com diversos elementos relativos aos referidos contratos e licitação. A ação penal está ainda instruída com os Relatórios das Comissões Internas da Petrobrás sobre as obras na REPAR e na CONEST, com informações detalhadas sobre as obras (evento 3, comp141, comp142 e comp115). Já era o que bastava, mas ainda vieram os elementos adicionais dos eventos 768 e 769. Não cabe, por outro lado, como já consignei juntar a integralidade dos processos de licitação, projetos e contratos de bilhões de reais nos autos, ainda mais sem a demonstração de sua necessidade. Já é suficiente, não cabendo a requisição de mais milhares de documentos, com os custos inerentes, da Petrobrás, pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, sem a demonstração de sua necessidade. Indefiro, portanto, o requerido. Caso quando do julgamento, constate a existência de documento do contratos ou das licitações ou da Petrobrás imprescindível ao julgamento, baixarei em diligência. 2.e. Requer a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva a oitiva de Bruno Zeemann do Pinho, Irineu Soares, Gleuber Vieira e Fábio Colletti Barbosa, os dois primeiros membros da comissão de ética da Petrobrás e os dois últimos do Comitê de Auditoria da empresa. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 91 de 317 O objetivo seria obter 'informações relevantes do ponto de vista dos controles internos da empresa e de suas estruturas de governança quando do processo de contratação dos consórcios em questão'. Mais uma vez, testemunhas referidas podem ser ouvidas na fase do art. 402. Entretanto, é ônus da parte apresentar a identificação completa, inclusive endereço. Não cabe transferir o ônus a terceiros. Além disso, pelos depoimentos prestados e documentos colacionados, os ajustes de licitação e os pagamentos de propina nos contratos da Petrobrás não teriam sido identificados, no período dos fatos, pelos órgãos de controle da Petrobrás. Então é irrelevante a oitiva pretendida, pois referidas pessoas nada saberão esclarecer. Indefiro, portanto, o requerido pela deficiência do requerimento e pela irrelevância da prova. 2.f. Requer a Defesa informações sobre a utilização do imóvel 164-A em operação de emissão de debêntures pela OAS Empreendimentos. Assim, pretende que sejam requisitados documentos da Planner Trustee e ouvida a sua Diretora. Mais uma vez a Defesa não se preocupou em indicar endereço da testemunha, uma omissão pouco compreensível. De todo modo, observo que a utilização do imóvel 164-A do Condomínio Solaris para emissão de debêntures era conhecida desde o oferecimento da denúncia, pois isso está anotado na matrícula (evento 3, comp228). Também anotado o cancelamento da hipoteca posteriormente. Aliás, isso não ocorreu somente com o referido imóvel, mas com outros do mesmo prédio, como o apartamento 131-A, antigo 141-A (correspondente à cota adquirida pela Sra. Mariza Letícia), como se verifica na matrícula no evento 3, comp299. Como aparentemente esclareceu o acusado JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO em seu interrogatório, trata-se de uma operação de financiamento normal no mercado imobiliário, não havendo qualquer motivo que justifique a requisição de documentos ou a oitiva requerida pela Defesa. Além disso, como esses elementos já estavam na denúncia, não se trata de prova cuja necessidade surgiu no decorrer da instrução. Assim sendo, indefiro a prova em questão por sua manifesta irrelevância, porque não se trata de prova cuja necessidade surgiu no decorrer da instrução e igualmente pela deficiência no requerimento. 2.g. Pretende a Defesa a oitiva de Luiz Paulo Cesar Silveira e Antônio Luiz Feijó Nicolau, diretores da APSIS, responsáveis pela assinatura do Plano de Recuperação Judicial da OAS. Aqui mais uma vez, a Defesa esqueceu-se de indicar endereços, o que é um elemento necessário quando se arrolam testemunhas. Cabe indeferir a prova pelos mesmos motivos já apontados no item 3.b, pela deficiência do requerimento e irrelevância da prova. 2.h. Pretende a Defesa a expedição de ofícios com requisição de informações das auditorias externas da Petrobrás (KPMG, Ernst & Youg e Pricewaterhousecooper). Junte a Secretaria a estes autos cópia das respostas apresentadas pela Ernest & Young e pela Pricewaterhousecooper na ação penal conexa 5063130-17.2016.4.04.7000/PR a ofícios dessa natureza (eventos 284 e 315). É o quanto basta. Desnecessário solicitar informações da KPMG (ainda não prestadas na ação penal conexa). O acusado se defende contra fatos objetivos. Assim, se não há no processo notícia de que as auditorias externas da Petrobrás detectaram prática de ilícitos pelo acusado Luiz Inácio Lula da Silva, é isso que o Juízo considerará. Não há necessidade de provocá-las para esse tipo de manifestação. Aliás, como se depreende do teor da resposta da Ernest & Young, nem caberia à auditoria a apuração desse tipo de fato: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 92 de 317 'Conforme explicitou-se presencialmente, por ocasião da audiência realizada 29 de março, na sede desse Foro, cabe informar que os serviços de auditoria financeira das demonstrações contáveis executados para a Petrobras, se deram em referência aos exercícios de 2003 a 2005, desde a data base de 31/03/2003 até a data base de 31/12/2005. Os trabalhos se consubstanciaram em auditoria independente das demonstrações contábeis preparadas pela administração da companhia, culminando na emissão de parecer sobre todos os aspectos relevantes da sua posição patrimonial e financeira, consoante as Normas Brasileiras de Contabilidade e a legislação específica. Considere-se, portanto, que o escopo dos serviços supramencionados se circunscreveu, unicamente, àquele objeto, não incluindo qualquer forma de fiscalização ou investigação quanto à condução das atividades empresariais. Sendo assim, resta prejudicada a possibilidade de informação quanto a eventual ato de corrupção ou ato ilícito perpetrados, com a participação do Excelentíssimo Senhor ex-Presidente da República LUIZ INÁCIO Lula da Silva, posto que tal averiguação não fora objeto do trabalho de auditoria realizado' - GRIFEI.' Então a prova pretendida é absolutamente desnecessária. 2.i. Requer a Defesa perícia contábil financeira para apurar de quem seria o imóvel 164-A do Condomínio Solaris e ainda se o imóvel foi dado em garantia de operação financeira pela OAS Empreendimentos. Perícia é prova custosa e demorada. Quanto à titularidade do bem, trata-se de questão central da acusação, mas não é a perícia a prova pertinente para a resolução da questão e sim os depoimentos e os documentos já colacionados. Quanto à utilização do imóvel como garantia para emissão de debêntures, com o posterior cancelamento da hipoteca, basta ver a matrícula, como já colocado no item 3.f., sendo a perícia absolutamente desnecessária. Indefiro, portanto, a prova como absolutamente imprópria, além da necessidade dela não ter surgido no decorrer da instrução, já que a informação estava na matrícula anexada à denúncia, como apontado no item 3.f. 2.j. Requer a Defesa que seja oficiado à ABIN e à Polícia Federal para que informem se, entre 2003 e 2010 houve apuração da existência de um macro-sistema de corrupção na Petrobrás. Como a própria Defesa alega, foram ouvidos em Juízo os Diretores dos referidos órgãos que negaram ter havido uma investigação com esse objeto. Se houvesse, aliás, seria notória. Absolutamente desnecessária a prova. Indefiro. 2.k. Alega a Defesa que, durante a fase de instrução, houve referência de que os terminais telefônicos de Alberto Youssef teriam sido monitorados desde o ano de 2006 por decisões deste Juízo. Requer a apresentação de tal prova. Não houve qualquer interceptação do terminal telefônico de Alberto Youssef desde 2006 e, sem descontinuidade, até a sua prisão preventiva em 17/03/2014. Aliás, a Defesa não esclarece a fonte de tal informação nos autos. No que remotamente interessa o feito, houve autorização de interceptação telefônica e telemática, em fase das investigações no âmbito da Operação Lavajato e no que tem alguma maior relevância, nos processos 502638713.2013.404.7000/PR (Carlos Habib Chater) e 504959793.2013.404.7000/PR (Alberto Youssef). A primeira interceptação foi autorizada por decisão de 11/07/2013 e sucessivamente prorrogada até 17/03/2014, sempre por decisões cumpridamente fundamentadas e fulcradas principalmente na constatação da prática de crimes permanentes, continuados e reiterados durante a interceptação (v.g. eventos 9, 22, 39, 53, 71, 102, 125, 138, 154, 175, 190 e 214 do processo 502638713.2013.404.7000/PR e eventos 3, 10, 22, 36, 47, 56 e 78 do processo 504959793.2013.404.7000/PR). https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 93 de 317 Esses processos 502638713.2013.404.7000/PR e 504959793.2013.404.7000/PR não têm sigilo decretado e estão disponíveis à consulta pela Defesa, como aliás estavam desde o início. Essas interceptações apenas muito remotamente interessam o presente caso, tendo sido instrumentais somente para outras ações penais conexas no âmbito da Operação Lavajato, mas não produziram elementos probatórios relevantes para estes autos. Inexiste qualquer interceptação de Alberto Youssef na qual se faz referência ao acusado Luiz Inácio Lula da Silva, quer para afirmar, quer para infirmar sua eventual responsabilidade. Prejudicada a prova, sem prejuízo do acesso pela Defesa aos processos 502638713.2013.404.7000/PR e 504959793.2013.404.7000/PR, a qual já tinha. 2.l Pleiteia a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva para que o MPF esclareça o status das negociações de acordos de colaboração com JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e Agenor Franklin Magalhães Medeiros e os benefícios oferecidos. A questão já foi objeto das audiências de interrogatório, nas quais os acusados declararam que estariam tentando celebrar um acordo de colaboração premiada, mas que nada teria sido ultimado e nenhuma oferta de benefício concreto teria já sido realizada. Então a questão resta prejudicada. Não cabe ainda exigir a apresentação de informações sobre eventual e incerto acordo de colaboração não-celebrado. 2.9.4. Pelo que se observa, a insurgência da defesa reside nos seguintes pontos: (a) auditorias internas e externas da Construtora OAS e OAS Empreendimentos; (b) plano de recuperação judicial da Construtora OAS e da OAS Empreendimentos; (c) oitiva de ex-funcionários da OAS Empreendimentos; (d) documentos não juntados pela Petrobras aos autos, como os contratos referentes às obras apontadas na denúncia; (e) esclarecimento a respeito das operações financeiras com oitiva de diretores da Planee Trustee, Apsis Consultoria e G5 Evercore; (f) informações da ABIN e da Polícia Federal a respeito de investigações sobre o macro esquema de corrupção entre os anos de 2003 e 2010; (g) decisões do juízo coator que autorizaram o monitoramento de Alberto Youssef; e (h) disponibilização dos Termos de Colaboração Premiada de corréus. Ao contrário do alegado, a discussão não diz respeito, na integralidade, a providências típicas da fase processual do art. 402 do Código de Processo Penal, que deverá estar única e inafastavelmente relacionada a fatos novos surgidos no curso da instrução. Há temas repetidos e indeferidos em outras oportunidades, inclusive nesta Corte. Assim, no HC nº 5002991-16.2017.4.04.0000/PR, a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA ventilou pedido semelhante. Naquela assentada, consignei no voto condutor: 2. Do exame da flagrante ilegalidade 2.1. Ao apresentar resposta à acusação, dentre outras providências, a defesa requereu: (a) prova pericial multidisciplinar, que objetiva identificar se houve desvio de recursos da Petrobras em favor de seus agentes em relação aos três contratos indicados na denúncia; quem seriam os beneficiários dos recursos desviados, bem como se houve algum tipo de repasse desses eventuais recursos desviados em favor dos pacientes; (b) prova pericial econômico-financeira, a fim de apurar se a OAS utilizou diretamente de recursos eventualmente ilícitos oriundos dos três contratos firmados com a Petrobras indicados na denúncia, na construção e eventuais benfeitorias realizadas no empreendimento Condomínio Solares ou, ainda, para pagamento da empresa Granero para armazenagem do acervo presidencial e, ainda, para apurar os prejuízos eventualmente causados à União https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 94 de 317 em virtude dos eventuais desvios verificados em relação aos três contratos indicados na denúncia; (c) prova pericial no Condomínio Solares a fim de apurar: (i) a data em que o empreendimento foi finalizado; (ii) a situação das unidades do empreendimento, inclusive no que tange ao registro no Cartório de Registro de Imóveis; (iii) as alterações eventualmente realizadas na unidade 164-A após a finalização do Condomínio Solares; (iv) o valor da unidade 164-A e das alterações eventualmente realizadas no local; (v) eventual posse da unidade 164-A pelos pacientes. Requereu, ainda: (d) informações da Presidência da República relativas às 84 missões empresariais realizadas pelo Primeiro Paciente no cargo de Presidente da República entre os anos de 2003 a 2010, incluindo os destinos e os participantes; (e) documentos do TCU e da Controladoria-Geral da União relativos a todos os procedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras do período compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisões proferidas nesses procedimentos; (f) documentos relativos a PLANNER TRUSTEE para informar (com cópia) a relação contratual mantida com a empresa OAS em relação ao Condomínio Solaris, incluindo, mas não se limitando, os recursos disponibilizados para a construção do empreendimento, as garantias envolvidas e, ainda, o status da operação; (g) a oitiva do Embaixador Paulo Cesar de Oliveira Campos para contrapor as afirmações contidas na denúncia especialmente em relação ao caráter lícito, probo e ético da atuação do Primeiro Impetrante em relação aos assuntos relativos à Petrobras e a outros órgãos de governo. As pretensões defensivas foram todas e cada uma delas examinadas pelo juízo de origem e, na porção indeferida, há fundamentação idônea. Nada obstante, pretende a defesa, em alguns casos, a produção de prova de forma diversa daquela que se deu no processo, substituindo, por exemplo, prova documental de propriedade imóvel por prova testemunhal. 2.9.5. Prosseguindo-se sob tal premissa, não tem relevância para o feito, e isso é fato, senão notório, muito próximo disso, as interceptações de Alberto Youssef determinadas no início das investigações. A 'Operação Lava-Jato', no seu nascedouro, investigava operações irregulares de câmbio sem qualquer referência ou ligação com o acusado, de maneira que não há o que provar nesse sentido. Na mesma linha, nada há a reparar no indeferimento de consulta à ABIN e à Polícia Federal, haja vista que seus Diretores, ouvidos em juízo, já indicaram que não houve investigação a respeito do macro esquema de corrupção. Novamente, não se justifica a anulação buscada, porque a prova já foi, ainda que de modo diverso do pretendido pela defesa, produzida. Considerando, assim, que: (a) os pedidos indicados não diziam respeito à fase do art. 402 do Código de Processo Penal, tendo sido tratados na resposta inicial da defesa; (b) alguns pedidos inclusive foram atacados neste Tribunal em habeas corpus anteriores; (c) no sistema processual vigente o juiz é o destinatário da prova e pode recusar a realização daquelas que se mostrarem irrelevantes, impertinentes ou protelatórias, conforme previsão do art. 400, §1º, do Código de Processo Penal; e (d) há fundamentação idônea quanto ao indeferimento, seja porque já produzida nos autos por outro meio admitido em direito, seja pela completa impertinência; não merece trânsito a insurgência recursal. 2.10. Indeferimento de juntada de depoimentos tomados na Ação Penal nº 5063130-17.2016.404.7000/PR https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 95 de 317 Pugnou a defesa a nulidade da ação penal em face do indeferimento da juntada de depoimentos prestados por Jorge Gerdau, Bruno Boetger, Pérsio Dangot, Glenn Mallett, João Paulo Torres, Patrícia Moraes, Graciema Bertoletti, Antonio Romualdo Galliez Pinto da Silva, Caio Scatamburlo Costa, Fábio Gabai Puga e Sérgio Spinelli Silva Júnior, porque seriam de extrema relevância para a discussão conduzida na presente ação penal. Aduz que 'em despacho proferido no dia 11.07.2017, o Juízo a quo indeferiu pedido formulado pelo Apelante que pugnou pela juntada de depoimentos tomados na ação penal conexa de autos nº 5063130-17.2016.4.04.7000/PR, sob a alegação de que '[d]escabe o pretendido nessa fase e os depoimentos referidos sequer são relevantes para o julgamento da presente'.' Com efeito, ultrapassada a fase do art. 402 do Código de Processo Penal, mostra-se indevida a reabertura da instrução processual. Não socorre à defesa a alegação de 'que os referidos depoimentos ocorreram após a apresentação das alegações finais pelo Apelante, razão pela qual não se pugnou por sua juntada anteriormente'. Note-se que os pedidos não trazem características próprias dos requerimentos complementares da fase do art. 402 do Código de Processo Penal, reservada a provas surgidas no curso da ação a respeito das quais as partes não tinham conhecimento ou delas não poderiam dispor, como detalhadamente esclarecido no item 2.9 anterior. Compulsando-se os autos da ação penal correlata (506313017.2016.404.7000/PR), percebe-se que as ditas testemunhas foram arroladas pela própria defesa naquele feito, motivo pelo qual não se sustenta a tese de que tais depoimentos sejam novos. Cabe recordar que a defesa impetrou o HC nº 502027889.2017.4.04.0000/PR (ação penal correlata) no qual discutia a necessidade ou não de o réu comparecer pessoalmente às audiências das testemunhas, tendo sido a liminar concedida em 03/05/2017 pelo Juiz Federal Convocado Nivaldo Brunoni e a ordem concedida, pois 'o acompanhamento pessoal do réu à audiência das testemunhas é faculdade legal a ele conferida para o exercício da autodefesa, podendo relegá-la em prol da defesa técnica constituída. Hipótese que não se assemelha à necessidade de comparecimento pessoal do réu para o seu interrogatório pessoal ou mesmo aquele que encontra-se beneficiado por liberdade provisória, cuja ausência injustificada poderia, inclusive, acarretar-lhe a decretação de revelia' (acórdão juntado aos autos em 28/06/2017 - evento 15). Em 23/02/2017 e muito antes de inaugurada a fase do art. 402 do CPP da ação ora em julgamento, a defesa já havia juntado rol de testemunhas no evento 80 da Ação Penal nº 5063130-17.2016.404.7000/PR. A contar de então, seguiram-se debates a respeito da pertinência de relevância de uma ou outra testemunha, tendo o juízo exercido a ponderação que lhe confere o art. 400, § 1º, da Lei Processual Penal. Nada obstante as audiências somente terem iniciado em 03/07/2017, não haveria obstáculo para que a própria defesa, nesta ação penal que ora se examina, tivesse juntado idêntico ou no mínimo semelhante rol de testemunhas no momento adequado, de https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 96 de 317 maneira que não poderá alegar a nulidade em razão de pedido extemporâneo, provocado por sua própria omissão. Equivale dizer, pertinentes ou não os testemunhos, não há amparo no art. 402 do Código de Processo Penal para que se admita a juntada de prova de interesse da defesa e a respeito da qual tinha prévio conhecimento e tempo hábil de requerê-la, inclusive em resposta à acusação. Não o fazendo, não pode a defesa exigir que, após encerrada a instrução, a ação penal seja ampliada para deferir o que já poderia ter sido requerido, notadamente em se tratando de depoimentos que classifica como tão essenciais, mas que já seriam de conhecimento antes mesmo da fase de diligências complementares. De toda maneira, os depoimentos incorporados à apelação ou mesmo as razões recursais nada demonstram ou esclarecem com relação aos fatos especificamente imputados, devendo-se entendê-los, no máximo, como abonatórios de conduta. 2.11. Falta de apuração de incidente de falsidade documental Foi arguido incidente de falsidade documental, que tinha por finalidade a 'apuração de incontornáveis inconsistências em documentos apresentados por Léo Pinheiro'. Questionou a defesa a autenticidade de documento apresentado em 15/05/2017 (evento 849), pois haveria discrepância entre datas, se comparado o email à notícia publicada em 2016 pelo Portal Folha de São Paulo. A questão foi solvida pela decisão do evento 894. Confira-se: Decidi sobre os requerimentos das partes na fase do art. 402 do CPP no evento 836, decisão de 15/05/2017. Antes, na audiência de 10/05/2017 (evento 820), foi concedido às partes o prazo de cinco dias para a juntada de novos documentos. O MPF e as Defesas de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e de Luiz Inácio Lula da Silva juntaram documentos (eventos 849, 850 e 852). A Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva realiza uma série de novos requerimentos, pleiteando a reabertura da instrução (evento 888, pet1). Decido. A instrução principal e a complementar estão encerradas. Não cabem novas diligências. Os documentos foram juntados pelas partes nos prazos fixados pelo Juízo, não havendo nenhuma irregularidade, mas a sua juntada não reabre a instrução. A sua juntada aos autos e abertura de prazo para manifestação representa a sua submissão ao contraditório, não fazendo sentido a alegação da necessidade de novas diligências. Quanto ao questionamento da autenticidade constante na fl. 4 da petição do evento 888 e igualmente no incidente de falsidade apresentado (processo 502204092.2017.4.04.7000/PR), a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva comete, aparentemente, um equívoco na análise do material. Indo ao documento em questão, evento 849, anexo2, juntado por petição da Defesa de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, percebe-se de plano que a prova consiste na cópia da mensagem eletrônica constante na fl. 18 do anexo e que tem por texto: 'Telmo, Seria bom sabermos qual das coberturas é a que precisamos ter atenção especial. Lucas.' https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 97 de 317 Na fl. 17, antecedente, o que existe é um comentário descritivo e ainda de um advogado (attorney reviwe comments), provavelmente contratado pela OAS ou por JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO para organizar as provas a serem apresentadas em sua colaboração. Esse comentário da fl. 17 não é a prova e certamente foi feito mais recentemente, daí constar o link à matéria de 04/03/2016. Bem, a Defesa questiona a autenticidade do documento de fl. 17 que não é a prova propriamente dita, mas apenas um comentário descritivo e, por evidente, posterior sobre a prova propriamente dita, da fl. 18. Então o questionamento sobre a autenticidade não faz sentido, pois o documento de fl. 17 é só uma descrição da prova da fl. 18. Quanto aos questionamentos sobre as mensagens de whatsapp do evento 849, anexo4, não vislumbro muito relevância sobre o seu conteúdo, mas examinarei os questionamentos da Defesa sobre o seu conteúdo na sentença. Se reputá-los relevantes, reavaliarei o pedido de perícia realizado. Igualmente examinarei os questionamentos da Defesa sobre os documentos juntados pelo MPF na sentença, se reputar necessário convertendo o feito em diligência. Indefiro, portanto, os requerimentos para reabertura da instrução por Luiz Inácio Lula da Silva. Aguarde-se a apresentação das alegações finais nos prazos já fixado. Exclua a Secretaria a petição da Petrobrás do evento 890 pois pertinente a outra ação penal e como requerido no evento 891. Ciência às partes. A defesa propôs o Incidente de Falsidade Criminal nº 502204092.2017.4.04.7000/PR, que foi rejeitado na origem, com remissão à decisão anterior e com reforço no sentido de que 'a Defesa questiona a autenticidade do que não é prova, mas um comentário descritivo sobre uma prova'. Em face de tal decisão, foi impetrado neste Tribunal o HC nº 5026479-97.2017.4.04.0000/PR, cuja ordem foi liminarmente indeferida, nos seguintes termos: (...) Pois bem, nada obstante as considerações tecidas pela defesa acerca da existência de falsificação, inviável, em sede de habeas corpus, avançar sobre a questão ou mesmo sobre a correção ou não da decisão ora impugnada. 2. Isso porque o Código de Processo Penal é expresso ao estabelecer que caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença, (...) que decidir o incidente de falsidade (art. 581, XVIII). Ou seja, havendo recurso previsto na Lei Processual Penal, descabe a utilização do habeas corpus como seu substitutivo. Tal percepção não muda quando cotejada a previsão expressa do art. 581, XVIII do CPP com a tese defensiva no sentido de que a decisão de primeiro grau não solucionou a controvérsia, mas apenas inviabilizou o processamento do incidente. Ora, a negativa de seguimento ao incidente tem a mesma natureza interlocutória da decisão que soluciona o mérito do incidente. Não se há de perquirir, para tal finalidade, a qualidade da decisão proferida pelo juízo de primeiro grau, sob pena de se chancelar a utilização do habeas corpus para ingressar em questões que não lhe são afetas em razão da simples variação do pedido, dos fundamentos da decisão ou do recurso. Veja-se que sequer seria o caso a aplicação do princípio da fungibilidade, haja vista que o recurso criminal em sentido estrito deve ser protocolado em primeiro grau, possibilitando inclusive ao magistrado prolator da decisão hostilizada, o juízo de reconsideração. 3. O remédio heróico destina-se a corrigir eventual ilegalidade praticada no curso do processo, mas, em especial, quando houver risco ao direito de ir e vir do investigado ou réu. Não está em pauta, pois, o cerceamento à liberdade do paciente, tampouco o risco de que isto venha a ocorrer. Também não é caso de trancamento da ação penal por ausência de requisito próprio, mostrando-se questionável, pois, o uso do writ. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 98 de 317 A intervenção do juízo recursal de modo prematuro deve ser evitada, de modo a resguardar o curso natural das ações penais relacionadas à tão complexa e grandiosa 'Operação Lava-Jato'. Tal entendimento foi reafirmado pela 8ª Turma, como se extrai do julgado que segue: HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO. DESCABIMENTO. 1. A impetração de habeas corpus destina-se a corrigir eventual ilegalidade praticada no curso do processo, sobretudo quando houver risco ao direito de ir e vir do investigado ou réu. Significa dizer que o seu manejo, a fim de discutir questões processuais, deve ser resguardado para situações excepcionais, quando houver flagrante ilegalidade e que afete sobremaneira a ampla defesa. 2. Eventual discussão a respeito de quaisquer vícios materiais e formais da prova poderá ter lugar no curso da própria ação penal ou mesmo em sede recursal, não restando demonstrado flagrante constrangimento ilegal capaz de provocar a suspensão dos atos processuais. 3. Não conhecida da impetração da ordem de habeas corpus e julgado prejudicado o pedido liminar. (HC nº 5030376-41.2014.404.0000, 8ª TURMA, minha relatoria, por unanimidade, juntado em 22/01/2015). A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, já aponta para a necessidade de racionalização do uso do habeas corpus. Com mais razão, deve-se cautela no exame de questões que dizem respeito à instrução do processo em sede mandamental. Tal necessidade é potencializada no específico caso da investigação em curso, dada a sua grandiosidade e complexidade natural. 3.1. Embora possa parecer excesso de rigor, impera a necessidade de melhor otimizar o uso do habeas corpus, sobretudo por se tratar de processo afeto à 'Operação Lava-Jato', com centenas de habeas corpus impetrados, boa parte deles discutindo matérias absolutamente estranhas ao incidente. A par disso, a jurisprudência do Tribunal tem sido flexível em alguns casos - porque não dizer tolerante - de impetrações sem afeição com o direito à liberdade. Em geral, a respeito de quaisquer vícios materiais e formais da prova terá lugar no curso da própria ação penal ou mesmo em sede recursal, de maneira que não há constrangimento ilegal a simples existência de decisões relacionadas à instrução do feito. Ou seja, as questões relativas à produção de prova são, em regra, afetas ao Juízo de primeiro grau, sendo que eventual alegação de cerceamento de defesa deve ser arguida em preliminar de apelo, à vista da sentença (HC nº 0000537-56.2014.404.0000, 7ª Turma, Juiz Federal José Paulo Baltazar Junior, v.u., publ. 13/06/2014). Nesse preciso sentido é o Enunciado nº 6, do I Fonacrim: O habeas corpus não deve ser admitido para impugnação de decisão interlocutória, quando o risco de restrição à liberdade de locomoção for remoto, ou para antecipar a discussão de questões de direito ou de fato cuja resolução é apropriada na sentença ou nos recursos cabíveis contra esta. A análise de tais questões só se mostra aconselhável nos casos em que a decisão de primeiro grau possa encerrar, ainda que em tese, flagrante ilegalidade. Dessa forma, ainda que assente nos Tribunais a possibilidade de utilização do habeas corpus em casos de excepcional ilegalidade, tal hipótese deve ser vista com elevada cautela, sob o risco de se transformar o remédio constitucional em um instrumento de controle direto e em tempo real sobre a atuação do juízo da causa. Não se há de confundir juízo de admissibilidade com controle prematuro do primeiro grau pelo Tribunal, pois isso violaria a essência da jurisdição e abriria espaço para que os Tribunais conheçam originariamente de matéria afeta ao juízo natural. Como é assente na jurisprudência deste Tribunal, apenas se mostra passível de seguimento o habeas corpus quando se estiver diante de decisão flagrantemente ilegal, o que não é o caso. É de se notar que o magistrado fundamentou o indeferimento de cada uma das provas requeridas, considerando sua desnecessidade, irrelevância e impertinência. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 99 de 317 A propósito, o próprio Código de Processo Penal prevê em seu art. 148 que, qualquer que seja a decisão, não fará coisa julgada em prejuízo de ulterior processo penal ou civil, ressalva feita pelo juízo de primeiro grau. 3.2. De resto, a tese defensiva no caminho da falsidade é, pelo menos, frágil. Uma simples análise do documento impugnado deixa claro que não se está diante de falsificação, mas de meros comentários sobrepostos pela defesa do réu JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, em tradução livre, 'comentários de revisão do advogado'. A mesma expressão aparece em outros documentos juntados pela defesa do corréu 'Léo Pinheiro'. A existência de comentários no corpo da página não significa que tenha havido falsificação do documento, mas apenas agregado este elemento, sem qualquer preocupação em falsear seu teor. Fosse, de fato, uma tentativa de falsificação pela defesa do corréu, seria de técnica quase que primária, porque a fonte utilizada em nada combina com aquela existente do texto do email. Sequer as anotações estão na mesma lauda. Os comentários são posteriores e apenas estão em sequência (como também está a folha de comentários da fl. 1 do ANEXO2 (evento 849). Até mesmo porque não são necessários conhecimentos científicos aprofundados para saber que as notas da lauda 17 não são originárias do email. Conhecimentos básicos já são suficientes para perceber isso. Até porque seria inexplicável que tais comentários, que nada mais representam do que a indexação da documentação juntada, figurassem, se realmente compusessem o corpo da mensagem, antes mesmo do cabeçalho da mensagem e contendo termos, como control number, que não são comuns a mensagens eletrônicas. Ora, a tese dos impetrantes é frágil. Nesse aspecto, vale destacar que a defesa, ao afirmar que a autoridade coatora reconheceu que o registro de email contém informação incompatível com suposta comunicação eletrônica, realiza interpretação des contextualizada da decisão impugnada, desconsiderando as circunstâncias em que o documento foi apresentado pela defesa do corréu e identificadas pelo juízo de primeiro grau. 4. Diante de todo esse contexto, não se verifica ilegalidade na decisão que negou seguimento ao incidente de falsidade. Assim, havendo recurso específico para os incidentes de falsidade e sendo inaplicável o princípio da fungibilidade e, ainda, inexistente flagrante ilegalidade na decisão de primeiro grau capaz de excepcionalmente a competência da Corte Recursal pela via do habeas corpus, sequer é caso de seu processamento, sem prejuízo de reexame da questão, se for o caso, em sede de apelação criminal. Ante o exposto, forte no art. 220 do RITRF, indefiro liminarmente a ordem de habeas corpus. Em que pese o indeferimento liminar da ordem, as considerações tecidas ao se examinar a existência ou não de flagrante ilegalidade contrapõem-se à argumentação de falsidade documental. Como visto, cuida-se de mera indexação e comentário do advogado a fim de auxiliar a defesa do corréu LÉO PINHEIRO, pelo que carece de mínima razoabilidade a pretensão de discutir a falsidade da documentação. Essa posição foi referendada pela 8ª Turma: 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. EXAME DE PROVA. EXCEPCIONALIDADE. UTILIDADE DO PROCESSO. PERTINÊNCIA COM A DENÚNCIA. JUÍZO INSTRUTÓRIO. SUBSTITUTIVO DE RECURSO. 1. (...). 2. Havendo recurso específico para os incidentes de falsidade e sendo inaplicável o princípio da fungibilidade e, ainda, inexistente flagrante ilegalidade na decisão de primeiro grau capaz de excepcionalmente a competência da Corte Recursal pela via do habeas corpus, sequer é caso de seu processamento, sem prejuízo de reexame da questão, se for o caso, em sede de apelação criminal. 3. Eventual discussão a respeito de vícios materiais e formais da prova poderá ter lugar no curso da própria ação penal ou mesmo em sede recursal, não restando https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 100 de 317 demonstrado flagrante constrangimento ilegal capaz de provocar a suspensão dos atos processuais. 4. O juízo de admissibilidade do habeas corpus para tratar de matérias outras não relacionadas ao direito de ir e vir deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, a fim de evitar o comprometimento da ampla defesa e da utilidade da própria ação penal. 5. Inviável em sede de habeas corpus adentrar na pertinência ou não de determinada prova no processo penal, sob pena de a corte recursal incursionar em matéria afeta à instrução, de conhecimento exclusivo do juízo de primeiro grau. 6. O juiz é o destinatário da prova e pode recusar a realização daquelas que se mostrarem irrelevantes, impertinentes ou protelatórias, conforme previsão do artigo 400, §1º, do Código de Processo Penal. Hipótese em que o indeferimento de provas requeridas pela defesa foi devidamente fundamentado e a decisão impugnada não representa flagrante ilegalidade. 7. Sob pena de tornar a previsão do art. 400, § 1º do CPP e, por consequência, o poder instrutório do juízo letra morta, somente se admite a intervenção do juízo recursal quando houver flagrante ilegalidade. 8. Agravo regimental improvido. Mantida a decisão que o indeferiu liminarmente. (TRF4, AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS Nº 5026479-97.2017.404.0000, 8ª TURMA, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 08/07/2017). Assim, não há nenhuma justificativa para o processamento do incidente de falsidade, exceto para retardar o andamento do processo penal que, diga-se, deve 'caminhar' em linha reta, não lateralmente. 2.12. Violação à autodefesa - reinquirição perante o Tribunal Argumenta a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA que, no dia 10/05/2017, foi realizado o interrogatório pessoal do apelante e que, embora o processo penal constitucional seja norteado pela presunção de inocência, houve um verdadeiro ato de inquisição por parte do juízo de primeiro grau. Por isso, postula a sua reinquirição em segundo grau a fim de livremente elucidar diversos trechos do interrogatório, com fundamento no art. 616 do Código de Processo Penal. Alega que foram feitas, por exemplo, indagações a respeito da AP/STF nº 470, sem relação com o tema probando, e sobre a compra do sítio em Atibaia, cuja apuração de responsabilidade criminal é objeto de outra ação penal. Refere também que o magistrado condutor da audiência repetiu questionamentos, formulando 347 perguntas, em contraste com o órgão acusador que formulou 138. A pretensão é desarrazoada e permito-me discorrer sobre o tema realizando ligeira inversão na ordem de razões. 2.12.1. Em primeiro lugar, o disposto no art. 616 do Código de Processo Penal, no sentido de autorizar novo interrogatório, reinquirição de testemunhas ou a realização de novas diligências, não traz faculdade aos réus e ao Ministério Público Federal, mas ao relator, quando entender haver dúvida a respeito de fatos. Tal prerrogativa, contudo, deve ser utilizada com cautela. A jurisprudência de ambas as Turmas Criminais do Superior Tribunal de Justiça segue exatamente nesta direção: HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO (ARTIGO 121, § 2º, INCISOS II E IV, DO CÓDIGO PENAL). RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PEDIDO DE PRODUÇÃO DE PROVAS FORMULADO ANTES DO JULGAMENTO DA INSURGÊNCIA. AUSÊNCIA https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 101 de 317 DE PREVISÃO LEGAL. INDEFERIMENTO PARCIAL FUNDAMENTADO. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. Ao interpretar o artigo 616 do Código de Processo Penal, que prevê que no julgamento das apelações criminais é possível novo interrogatório do réu, reinquirição de testemunhas e realização de outras diligências, esta Corte Superior de Justiça consolidou o entendimento de que o Tribunal, diante do conjunto probatório já produzido, tem a faculdade de autorizar ou não a produção de tais provas, sendo imprópria a implementação de nova instrução processual no segundo grau de jurisdição. 2. No caso dos autos, além de se estar diante do julgamento de recurso em sentido estrito, para o qual sequer há a previsão de realização de diligências em segundo grau de jurisdição, foram declinadas justificativas plausíveis para a negativa de remessa dos autos ao Ministério Público para análise de laudo pericial particular juntado pela defesa, uma vez que o referido exame não foi produzido sob o crivo do contraditório e sequer foi objeto de análise no primeiro grau de jurisdição, o que revela que a sua apreciação apenas pelo Tribunal Estadual caracterizaria indevida supressão de instância. 3. Ordem denegada. (HC 201302914457, JORGE MUSSI, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA: 30/09/2014). PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME DE EVASÃO DE DIVISAS. OPERAÇÕES DÓLAR-CABO. ABSOLVIÇÃO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA DA AUTORIA. APELAÇÃO. REQUISIÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DA REALIZAÇÃO DE NOVAS DILIGÊNCIAS. ART. 616 DO CPP. FACULDADE DO TRIBUNAL, CÂMARA OU TURMA COMPETENTE. REEXAME DA NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DAS DILIGÊNCIAS. INCURSÃO NO CONJUNTO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ. 1. No julgamento das apelações poderá o tribunal, câmara ou turma, proceder a novo interrogatório do acusado, reinquirir testemunhas ou determinar outras diligências (CPP, art. 616). 2. A adoção do expediente a que se refere o art. 616 do codex processual penal é mera faculdade do Tribunal competente para o julgamento do apelo interposto, devendo a produção das provas das alegações tanto da acusação quanto da defesa ficar adstrita ao âmbito da instrução criminal. Precedentes de ambas as Turmas julgadoras integrantes da 3.ª Seção. Ressalva do ponto de vista da Relatora. 3. É inadmissível o reexame, em sede de recurso especial, da necessidade de realização das diligências no Tribunal a quo com esteio no art. 616 do CPP. Referida tarefa exige a incursão desta Corte Superior no conjunto fático-probatório carreado aos autos, o que, como de sabença, é labor proscrito na via especial, consoante inteligência da Súmula n.º 07/STJ. 4. Recurso especial a que se nega provimento. (RESP 201201878308, ALDERITA RAMOS DE OLIVEIRA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/PE), STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA: 08/02/2013). O tema já foi inclusive objeto de controvérsia em processos outros relacionados à 'Operação Lava-Jato', como se observa exemplificativamente do julgado abaixo: QUESTÃO DE ORDEM. PROCESSUAL PENAL. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. INSTRUÇÃO. APELAÇÃO. REQUISIÇÃO DE NOVAS DILIGÊNCIAS. ART. 616 DO CPP. FACULDADE DO TRIBUNAL. LAUDO PERICIAL. PROVA NOVA. 1. No julgamento das apelações poderá o tribunal, câmara ou turma, proceder a novo interrogatório do acusado, reinquirir testemunhas ou determinar outras diligências (CPP, art. 616). 2. A adoção do expediente a que se refere o art. 616 do Estatuto Processual Penal é mera faculdade do Tribunal competente para o julgamento do apelo interposto, devendo a produção das provas das alegações tanto da acusação quanto da defesa ficar adstrita ao âmbito da instrução criminal. Precedentes de ambas as Turmas julgadoras integrantes da 3.ª Seção do STJ. 3. Inviável a reabertura da instrução criminal em segundo grau para reabertura de contraditório a respeito de laudo pericial juntado pela defesa, tendo em vista que a questão confunde-se com as razões da própria apelação interposta, sob pena de acarretar incursão prematura sobre matéria a ser tratada no recurso apropriado. 4. Questão de ordem solvida para não conhecer do pedido defensivo. (TRF4, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 102 de 317 QUESTÃO DE ORDEM NA APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5083351-89.2014.404.7000/PR, 8ª Turma, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos 16/06/2017). Tal entendimento foi reafirmado em decisão inicial pelo Ministro Félix Fischer no HC nº 404.030/PR, impetrado em razão de indeferimento em apelação criminal correlata. Em breve síntese, indicou o e. Relator naquela Corte Superior que 'o art. 616 do CPP (que permite aos tribunais, antes do julgamento da apelação, determinar outras diligências) é, de fato, uma faculdade, de modo que (...) cabe ao próprio Tribunal decidir pelo uso ou não da faculdade que a lei lhe confere'. Na hipótese, sequer de produção de prova se trata. A simples insatisfação da defesa com o seu interrogatório e o interesse de novamente se manifestar sobre os fatos a respeito dos quais já foi o réu interrogado, não abre espaço à utilização do estatuído no art. 616 do Código de Processo Penal. Em segundo, da premissa trazida não decorre logicamente a conclusão de necessidade de que o réu seja reinterrogado pelo Tribunal. Tal proceder significaria, pois, violação à competência do juízo de origem, a quem cabe a condução do feito. Lembrando que a competência do Tribunal para o caso é recursal, eventual reconhecimento de invalidade no interrogatório conduziria à nulidade do feito e o seu retorno ao primeiro grau para designação de novo ato, mas nunca a sua realização pelo Órgão Recursal em sobreposição ao juízo constitucionalmente competente. 2.12.2. Na questão de fundo, não prospera a tese de violação à autodefesa, tema, aliás, em nenhum momento abordado pela defesa após a realização da audiência, nem mesmo em sede de alegações finais. Nessa perspectiva, é insustentável a alegação quase que integralmente genérica a respeito de excessos ocorridos durante o ato judicial. A tentativa de invalidar o depoimento é bastante frágil e limita-se a perguntas que não teriam relação com o tema probando, assim como a compra do sítio em Atibaia, cuja apuração de responsabilidade criminal é objeto de outra ação penal. Descabe aqui escrutinar todo o material probatório em busca de eventuais nulidades que a própria defesa deixou de indicar. E, no que diz respeito às frações de audiência apontadas, não se observa qualquer violação ao princípio da autodefesa que ora fundamenta a insurgência. Ao interrogado foi assegurado o direito ao silêncio e dispensado o compromisso de dizer a verdade. É da essência da autodefesa que do réu não é exigido se auto-incriminar. E não se vê tal garantia constitucional, reproduzida no art. 186 do CPP, de alguma forma violada, tendo o interrogando inclusive a invocado, como especificamente se percebe no caso do Sítio de Atibaia/SP (evento 820 - VIDEO3, 19'30'; VIDEO4, 0'38'). Sobre o procedimento em audiência, dispõe o art. 187 do Código de Processo Penal: Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 103 de 317 § 1º Na primeira parte o interrogando será perguntado sobre a residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais. § 2º Na segunda parte será perguntado sobre: I - ser verdadeira a acusação que lhe é feita; II - não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela; III - onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta; IV - as provas já apuradas; V - se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e se tem o que alegar contra elas; VI - se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido; VII - todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração; VIII - se tem algo mais a alegar em sua defesa. Os questionamentos do juízo, ao contrário do que sustentado, estão em consonância com a normativa e têm correlação com os fatos investigados, sobretudo com o grande esquema de corrupção que assolou a Petrobras e beneficiou agentes públicos, políticos e grandes empreiteiras. Nada obstante, em inúmeras oportunidades a defesa orientou o interrogando a não responder perguntas. É pertinente gizar que, em mais de uma oportunidade, o direito ao silêncio foi reafirmado pelo juízo de primeiro grau. Particularmente, no tocante às perguntas relativas ao contexto geral do esquema de corrupção havido na Petrobras, disse o magistrado: '...quem vai julgar esse processo é o juiz. E o juiz consigna que entende relevante as relações e atitudes do senhor ex-Presidente em relação aos seus subordinados e assessores. Daí as indagações sobre esse caso específico. Se o senhor exPresidente não quiser responder ou entender que não tem condições de responder ou que não quer responder, ele tem o direito ao silêncio' (evento 820 - VIDEO7). A defesa, aliás, na sequência do interrogatório, pediu a palavra para esclarecer que 'a despeito de a Constituição da República e a legislação de hierarquia inferior assegurar o direito ao silêncio, o interrogando faz questão de responder todas as indagações do Ministério Público. Ele não vai usar ... a não ser, a não ser que se extrapole no tema probando, é única, a única exceção' (evento 820 - VIDEO8). Posteriormente, surge a passagem mais significativa. Quase ao final da audiência, a defesa técnica fez constar que o réu foi orientado a não responder perguntas dos defensores dos corréus (evento 820 - VIDEO10, 7' e VIDEO11). Já no encerramento do ato, foi dada a palavra ao interrogando para livre manifestação por aproximadamente 20 (vinte) minutos, que optou, todavia, por fazer declarações sem qualquer utilidade jurídica para a elucidação dos fatos. Nesse quadro, considerando que ao apelante foi assegurado o direito ao silêncio e de não se auto-incriminar, do qual inclusive fez uso em diversas oportunidades por orientação da defesa técnica, descabe, agora, sem indicação de efetivo prejuízo, dar-se https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 104 de 317 suporte à reiterada tese de excessos cometidos na condução da audiência que não condiz com a realidade dos autos. 2.12.3. Ao juiz compete a condução do processo e da audiência, podendo formular perguntas e indeferir aquelas consideradas irrelevantes (art. 400, caput e § 1º, do CPP). Assim, do interrogatório do réu, sobretudo porque, repita-se, foi expressamente assegurado o direito ao silêncio, não se verifica nenhum excesso capaz de comprometer a imparcialidade do julgador, em particular em razão de perguntas relacionadas ao amplo contexto investigado. Tal entendimento foi reafirmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do HC nº 389.211: Já a postura do magistrado na condução da audiência de instrução (consistente em permitir perguntas que extrapolariam o objeto da denúncia e permitir, segundo alegam os impetrantes, que uma testemunha insultasse os advogados do Paciente), tem-se que o deferimento ou não de perguntas pelo magistrado, bem como a própria condução da audiência, são, da mesma forma, atividades típicas da jurisdição, valendo então, como fundamentos, os mesmos argumentos já utilizados para rechaçar as demais teses que guardam semelhança com a questão. DESTAQUEI Refira-se, ainda, que a defesa solicitou a presença de um representante da Ordem dos Advogados do Brasil no interrogatório de 10/05/2017. A entidade de classe, com base em decisão proferida pela Câmara de Direitos e Prerrogativas, requereu a presença ao representante Andrey Salmazo Poubel (OAB/PR 36.458) (evento 795). O pedido foi deferido (evento 797): 5. A OAB/PR solicita que, a pedido do defensor de Luiz Inácio Lula da Silva, seja permitida a presença de representante da Ordem na audiência do dia 10/05. Muito embora inexista qualquer razão concreta para que a OAB/PR esteja presente, resolvo deferir o requerido, sem maiores considerações. O Procurador Geral da OAB, que deverá vir sozinho, deve informar na data de hoje, à Secretaria do Juízo a forma de deslocamento pretendido. O Termo de Audiência aponta o comparecimento do representante da OAB, como requerido. O tema foi objeto de análise na sentença recorrida, tendo anotado o magistrado: 139. Alega ainda a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva que este julgador teria revelado 'animosidade' em relação aos defensores constituídos do ex-Presidente. 140. Ora, basta ler os diversos depoimentos transcritos de acusados e testemunhas nesta ação penal para constatar que este julgador sempre tratou os defensores com urbanidade, ainda que não tivesse reciprocidade. 141. Nas audiências, a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva e neste ponto também de Paulo Tarciso Okamoto levantavam sucessivamente questões de ordem durante as inquirições do Ministério Público ou as deste Juízo, tumultuando o ato. Pode, evidentemente, qualquer parte levantar questões de ordem, mas uma vez apresentadas e indeferidas, não cabe reapresentá-las indefinidamente e prejudicar o normal desenvolvimento da audiência. 142. Pontualmente, o Juízo ainda foi ofendido pelos defensores, como se verifica em alguns trechos desses lamentáveis episódios. Transcreve-se apenas alguns: 'Juiz Federal:- Doutor, a defesa pelo jeito vai ficar levantando questão de ordem a cada dois minutos nessa inquirição, é inapropriado, doutor, está tumultuando a audiência. Defesa:- Pode ser inapropriado, mas é perfeitamente jurídico e legal. Juiz Federal:- Estão tumultuando a audiência. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 105 de 317 Defesa:- Porque o juiz preside o regime é presidencialista, mas o juiz não é o dono do processo. Juiz Federal:- Certo, mas então está... Defesa:- Aqui os limites são a lei, a lei é a medida de todas as coisas, e a lei do processo disciplina esta audiência, a defesa tem direito de fazer uso da palavra pela ordem para arguir questão de ordem, ou se vossa excelência quiser eliminar a defesa, e eu imaginei que isso já tivesse sido sepultado em 1945 pelos aliados e vejo que ressurge aqui nesta região agrícola do nosso país, se vossa excelência quiser suprimir a defesa, então eu acho que não há necessidade nenhuma de nós continuarmos essa audiência. Juiz Federal:- Doutor, a defesa está tumultuando a audiência, levantando questão de ordem atrás de questão de ordem, não permitindo aqui que o Ministério Público produza a prova, tanto o Ministério Público tem direito a produzir a prova como a defesa.' (evento 388) 'Juiz Federal:- Doutor, essa questão já foi apreciada a um contexto, o juiz está permitindo. Defesa:- Contexto, qual é o contexto, só existe na cabeça de vossa excelência, que contexto é esse, o contexto para nós é a denúncia, que contexto? O contexto é a denúncia. Juiz Federal:- Doutor, está indeferido. Defesa:- Um contexto que só existe na cabeça de vossa excelência, o contexto é a denúncia... Juiz Federal:- Doutor...' (evento 388) 'Juiz Federal:- São esclarecimentos do depoimento, eu ouvi, respeito, agora peço que respeitem a posição do juízo de fazer as questões aqui também pertinentes na forma da lei e na interpretação do juízo. Defesa:- Tá certo, lavro o protesto porque a interpretação do juízo aberra da constituição e da lei processual penal. Juiz Federal:- Aí deixe então para as alegações finais, com toda aquela retórica e tudo. Vou seguir... Defesa:- Vossa excelência, entende então que a participação da defesa é retórica? Juiz Federal:- Não, doutor, eu só acho que a defesa está faltando com a educação. Defesa:- Eu não, eu estou fazendo um questionamento, eu não fiz, eu estou indagando a vossa excelência se a nossa participação aqui é meramente retórica? Juiz Federal:- Não, doutor. Então, vamos prosseguir, eu posso fazer minhas perguntas, a defesa vai permitir? Defesa:- Se vossa excelência fizer isso na ordem processual adequada sim. Juiz Federal:- Eu estou fazendo, doutor. Defesa:- Seguindo o processo penal, pelo menos o código que nós conhecemos. Juiz Federal:- Sem mais intervenções, por gentileza. O senhor declarou no seu depoimento dessas nomeações esse 'Intuito arrecadatório', o senhor pode me esclarecer isso?' (evento 388) 'Juiz Federal:- Tá, doutor, como eu presido essa audiência, então eu entendo que eu posso fazer na minha interpretação. Defesa:- Então fica o protesto da defesa contra o comportamento de vossa excelência, que viola o código do processo penal. Juiz Federal:- Certo, na sua interpretação, doutor, na interpretação correta do código... Defesa:- A interpretação de quem trabalha com processo penal. Juiz Federal:- Ah, doutor. Defesa:- Somos professores de processo penal. Juiz Federal:- Tá ótimo, doutor. Então eu vou seguir as minhas indagações aqui, se a defesa permitir evidentemente. Então foi mencionado, havia essa questão da fragilidade que o senhor mencionou, mas houve daí uma necessidade então de arrecadar mais dinheiro, é isso, de propina, não sei se isso ficou claro?' https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 106 de 317 'Ministério Público Federal:- Claro. Senhora Mariuza, naquele momento a senhora Marisa foi tratada pelo Grupo OAS como adquirente do imóvel, como uma pessoa que estava visitando o imóvel para ver se tinha interesse em comprar ou como uma pessoa que já era a destinatária do imóvel? Defesa:- Excelência, o doutor está induzindo a resposta. Juiz Federal:- Não, não está induzindo a resposta. Defesa:- Ele está colocando... Juiz Federal:- Ele colocou três alternativas. Defesa:- Sim, mas de qualquer forma... Juiz Federal:- Está indeferido. Defesa:- É uma opinião que ele está perguntando. Juiz Federal:- A senhora pode responder, por gentileza, senhora Mariuza, se a senhora tiver condições de responder? Depoente:- Não estou ouvindo, não consegui ouvir. Juiz Federal:- Pode refazer a pergunta? Ministério Público Federal:- Senhora Mariuza, ficou claro, senhora Mariuza, nessa visita a senhora Marisa Letícia estava sendo tratada pelo Grupo OAS como uma possível compradora do imóvel ou como uma pessoa para quem esse imóvel já tinha sido destinado? Defesa:- Excelência... Juiz Federal:- Não, doutora, está indeferido. Defesa:- Não, não, excelência, pela ordem, por favor, eu tenho direito de fazer uma intervenção. Juiz Federal:- Sim. Não está sendo gravado nada do que a senhora, doutora, está falando. Defesa:- Excelência, essa pergunta já foi feita, vossa excelência consistentemente em todas as audiências tem indeferido perguntas refeitas, inclusive pelo processo de celeridade da audiência, a pergunta já foi feita e a testemunha respondeu, era um potencial cliente nas palavras dela. Juiz Federal:- Não, doutora, eu acho que não foi feita essa pergunta e está indeferida a sua intervenção. Pode refazer a pergunta novamente, eu solicitaria que não houvesse novas intervenções. Ministério Público Federal:- Senhora Mariuza, nessa visita a senhora Marisa Letícia estava sendo tratada pelo Grupo OAS como uma pessoa que poderia vir a adquirir o imóvel ou como uma pessoa que já havia adquirido, já era proprietária do imóvel, o imóvel já estava destinado a ela. Defesa:- Fica o protesto aqui de novo, excelência. Juiz Federal:- Doutor, o senhor está sendo inconveniente, doutor. Defesa:- Ele está pedindo a opinião da testemunha, a defesa não é inconveniente na medida em que estamos no exercício da profissão. Juiz Federal:- Já foi indeferida a sua questão. Defesa:- Mas eu sei, não pode... Juiz Federal:- Já foi indeferida a sua questão, doutor. Defesa:- Vossa excelência não pode caçar a palavra da defesa. Juiz Federal:- Posso, doutor. Defesa:- Não pode porque nós estamos colocando uma questão muito importante, relevante, o ilustre procurador está pedindo a opinião da testemunha e ele não pode pedir a opinião da testemunha. Juiz Federal:- O doutor está sendo inconveniente, já foi indeferida a sua questão, já está registrada e o senhor respeite o juízo! Defesa:- Mas, escute, eu não respeito vossa excelência enquanto vossa excelência não me respeita como defensor do acusado! Juiz Federal:- O senhor respeite o juízo, já foi indeferido! Defesa:- Vossa excelência tem que me respeitar como defensor do acusado, aí vossa excelência tem o respeito que é devido a vossa excelência. Juiz Federal:- Já foi indeferido. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 107 de 317 Defesa:- Mas se vossa excelência atua aqui como o acusador principal, vossa excelência perde todo o respeito. Juiz Federal:- Sua questão já foi indeferida, o senhor não tem a palavra. O senhor pode repetir essa questão que foi feita pelo. A senhora pode responder essa questão, afinal ela era tratada como adquirente potencial ou uma pessoa para a qual o imóvel já havia sido destinado? Mariuza Marques:- Tratada como se o imóvel já tivesse sido destinado.' (evento 425) 'Juiz Federal:- Então o senhor sabia que era uma solicitação do PMDB ao governo? Depoente:- Pela imprensa, mas no conselho não foi discutido isso. Juiz Federal:- E o senhor nunca indagou, nunca... José Gabrielli:- Não, na verdade nós não tínhamos... Defesa:- Pela ordem, Excelência, há um limite Excelência. Juiz Federal:- Eu estou fazendo as perguntas, doutor. Defesa:- Vossa Excelência está insistindo. Juiz Federal:- Eu estou fazendo as perguntas, doutor, não estou induzindo a testemunha. Defesa:- Está induzindo, é a quinta pergunta. Já respondeu. São perguntas já respondidas, vão ser respondidas de novo, Excelência. Juiz Federal:- Eu ouvi pacientemente as perguntas da defesa e do Ministério Público, eu estou fazendo as minhas perguntas, certo? Defesa:- Mas as suas perguntas são as perguntas de um inquisidor e não as perguntas de um juiz que quer esclarecer um fato. Juiz Federal:- Doutor, respeite o juízo. Defesa:- Eu estou (ininteligível) Vossa Excelência. Defesa:- Vossa Excelência respeite então a ordem processual. Juiz Federal:- Respeite o juízo, doutor. O senhor não tinha nem conhecimento então?' (evento 607) 143. O comportamento inadequado da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva e da de Paulo Tarciso Okamotto foi inclusive objeto de censura pelo renomado e veterano advogado criminal René Ariel Dotti, atuando como representante da Petrobrás, durante o interrogatório judicial do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (evento 885): 'Assistente de Acusação:- Eu peço a palavra de novo. Nós não podemos criar nesse interrogatório um confronto pessoal dos advogados com o juiz da causa, isso é óbvio, é até contraproducente como é elementar, eu tenho a impressão de que os incidentes da audiência serão reportados com toda a fidelidade pelo nosso colega da Ordem e os excessos que eventualmente surjam, porque essa é sua obrigação aqui na Ordem dos Advogados, de retratar o comportamento das partes representadas e os incidentes. Terminei minha questão de ordem.' 'Juiz Federal:- Perfeito, vamos prosseguir. Senhor ex-presidente o senhor vislumbra alguma contradição na sua posição, o senhor afirmar que não tem qualquer responsabilidade de todos esses crimes, mas também não reconhecer publicamente qualquer responsabilidade das pessoas que trabalham no partido e no governo? Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva :- Isso é uma questão política, reconhecimento de alguma coisa, vossa excelência está pedindo posicionamento político do depoente, então a orientação da defesa técnica é que não emita neste momento nenhum tipo de pronunciamento, que não seja em relação ao processo. Assistente de Acusação:- Uma questão de ordem, permita-me, meu colega, o magistrado tem evidentemente no interesse de apurar o fato e as condições pessoais do acusado na individualização da pena, se for o caso, os seus antecedentes, a sua personalidade, enfim, as condições pessoais, a sua moral inclusive, principalmente o seu caso moral. Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva:- O senhor está julgando o que? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 108 de 317 Assistente de Acusação:- Não estou julgando ninguém, eu estou justificando a pergunta do juiz, e o juiz pode perguntar porque é matéria de fixação da pena, o juiz pode fazer isso, é fixação da pena, personalidade, não estou representando ninguém. Juiz Federal:- Doutor, doutor, respeite o advogado que está falando agora, não é seu momento, o doutor tem falado nessa audiência o tempo todo cansativamente, o advogado está falando agora. Assistente de Acusação:- Parece que não se respeita a autoridade do juiz do caso, é evidente isso, inclusive falando sem pedir a palavra, isso não se faz, Fernando, isso não se faz, isso não se faz numa audiência, evidentemente não se faz numa audiência isso, proteste contra o juiz, recorra contra o juiz, mas não enfrente o juiz pessoalmente na audiência, para o público está presente e você também, você também, você fala sem pedir licença, você fala sem pedir licença. Defesa de Paulo Okamotto:- De maneira nenhuma, professor.' 144. Mesmo a reclamação da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva de que teria sido ofendida pelo depoente José Afonso Pinheiro e de que o Juízo teria permanecido inerte é improcedente. A ofensa de fato ocorreu (evento 426), mas partiu de pessoa simples que afirmou ter perdido o emprego por conta da questão envolvendo o apartamento 164-A, triplex, e que respondia a uma linha de indagação hostil da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva. Ainda assim foi a testemunha censurada de imediato ('Juiz Federal Senhor José Afonso, senhor José Afonso. Senhor José Afonso, por gentileza, vamos se acalmar aqui, não é o momento de ofender ninguém aqui, eu peço para o senhor se acalmar, certo? Então, pelo que eu entendi, o senhor estava desempregado e resolveu entrar pra política, foi isso?'). 145. Nesse contexto de comportamento processual inadequado por parte da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, é bastante peculiar a reclamação dela de que este julgador teria agido com animosidade contra os defensores em questão. 146. O que este julgador fez foi conduzir da melhor forma possível as audiências, a fim de colher a prova, e evitar que os tumultos gerados pelo comportamento inadequado da defesa, incluindo pontuais ofensas, atrapalhasse o bom andamento do processo. 147. Poderia o Juízo ter tomado providências mais enérgicas em relação a esse comportamento processual inadequado, mas optou, para evitar questões paralelas desnecessárias, prosseguir com o feito. 148. Então a alegação da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva não tem razão de ser e mais uma vez é estratégia de puro diversionismo, aqui examinada apenas por ter sido alegada. Pois bem, a transcrição indica que a alegação da defesa não ultrapassa o estágio da teoria. As atitudes dos defensores do apelante foram inclusive objeto de crítica do conceituado advogado Renê Ariel Dotti. E isso, reflita-se, não decorre da posição contrária que ocupam no processo os réus e a Petrobras - esta como assistente de acusação -, pois o valor e o denodo do advogado - essencial à Justiça - não têm como baliza moral o cliente que defende ou a posição jurídica que representa. Passados vários meses do ato judicial, chama a atenção que a Ordem dos Advogados do Brasil, presente ao ato na defesa das prerrogativas dos advogados, nada requereu ou 'denunciou' com relação às relatadas animosidades, justamente porque a interpretação bastante peculiar com relação aos acontecimentos não é absolutamente correta. 2.13. Falta de correlação entre a denúncia e a sentença e ausência de fundamentação https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 109 de 317 2.13.1. Sustenta a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA que há mácula na sentença, seja porque o apelante foi denunciado por ter recebido o apartamento triplex, mas condenado por ter-lhe sido oferecido esse imóvel; seja porque a denúncia afirmou que a origem da suposta vantagem indevida seria proveniente dos contratos da Petrobras, enquanto a sentença consignou que não há relação entre tais contratos e a suposta vantagem indevida recebida por meio dos investimentos da OAS Empreendimentos no triplex. Diz a defesa, ipsis litteris: O ato de recebimento exige a demonstração de que algo que não pertencia a alguém passou a pertencer. Esta mudança no estado de coisas se dá com a entrada do bem na posse. Se alegado que houve, ainda, a transferência da propriedade da coisa, necessário, para a condenação, que isto seja demonstrado. Por sua vez, o ato de que algo foi atribuído a alguém (conduta passiva na perspectiva deste alguém) não exige a demonstração de que o indivíduo entrou na posse da coisa, justamente porque esta conduta é totalmente diversa do ato de receber algo. A implicação desta manobra jurídica desenvolvida na sentença é a de que foi alterado o nível de exigência probatória para a comprovação dos fatos apresentados. No cenário apresentado pela denúncia é preciso provar que o Apelante entrou na posse ou obteve a propriedade do apartamento tríplex - o que requer comprovação de que houve uso ou gozo ou disposição (alternativa ou cumulativamente) do bem. Já no cenário contido na sentença, tendo havido a alteração dos fatos imputados, torna-se desnecessária a prova de que o Apelante exerceu algum dos poderes inerentes à propriedade do bem imóvel. Não merece prosperar a tese. A denúncia é bastante clara e indica todas as circunstâncias em que teriam sido cometidos os crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro, inclusive e especialmente, no que interessa nesse ponto, em relação ao apartamento triplex e à lavagem de recursos. Dispensados os detalhes, porque somente relevantes para o exame do mérito, a denúncia expressamente afirma que o apelante 'solicitou, aceitou promessa e recebeu, direta e indiretamente, para si e para outrem, inclusive por intermédio de tais funcionários públicos, vantagens indevidas, as quais foram de outro lado e de modo convergente oferecidas e prometidas por LÉO PINHEIRO e AGENOR MEDEIROS'. Adiante, o Ministério Público Federal aponta que os réus 'dissimularam e ocultaram a origem, a movimentação, a disposição e a propriedade de R$ 2.424.990,83 provenientes dos crimes de cartel, fraude à licitação e corrupção praticados pelos executivos da CONSTRUTORA OAS em detrimento da Administração Pública Federal, notadamente da PETROBRAS, conforme descrito nesta peça, por meio: (i) da aquisição em favor de LULA e MARISA LETÍCIA, por intermédio da OAS Empreendimentos, do apartamento 164-A do Condomínio Solaris, localizado na Av. Gal. Monteiro de Barros, nº 638, em Guarujá/SP, no valor de R$ 1.147.770,96, assim como pela manutenção em nome da OAS Empreendimentos do apartamento que pertencia a LULA e MARISA LETÍCIA, pelo menos desde data próxima a 08/10/2009 até a presente data; (ii) do pagamento de R$ 926.228,82, entre 08/07/2014 e 18/11/2014, pela OAS Empreendimentos à TALLENTO CONSTRUTORA LTDA., para efetuar as reformas estruturais e de acabamento realizadas no imóvel para adequá-lo aos desejos da família do ex-Presidente da República; e (iii) do pagamento de R$ 350.991,05, entre 26/09/2014 e 11/11/2014, pela OAS Empreendimentos à KITCHENS COZINHAS E DECORACOES LTDA. e à FAST SHOP S.A., para custear a aquisição de móveis de decoração e de eletrodomésticos para o referido apartamento, adequando-o aos desejos da família do ex-Presidente da República'. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 110 de 317 Todos os temas que permeiam as condutas imputadas foram exaustivamente avaliados na sentença, sequer se podendo falar em redefinição jurídica com relação aos fatos. É da jurisprudência deste Tribunal que 'o princípio da correlação estabelece que há necessidade imperiosa da correspondência entre a condenação e a imputação, ou seja, o fato descrito na peça inaugural de um processo deve guardar estrita relação com o fato constante na sentença pelo qual o réu é condenado' (TRF4, ACRIM nº 500113889.2015.404.7000/PR, 7ª Turma, Juiz Federal Guilherme Beltrami, por unanimidade, juntado aos autos em 05/07/2017). Igualmente já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que 'o princípio da correlação entre a denúncia e a sentença condenatória representa no sistema processual penal uma das mais importantes garantias ao acusado, porquanto descreve balizas para a prolação do édito repressivo ao dispor que deve haver precisa correspondência entre o fato imputado ao réu e a sua responsabilidade penal' (HC 284.546/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, DJe 8/3/2016). Do cotejo da inicial acusatória com a sentença tem-se que o magistrado respeitou os aspectos da peça inaugural. Não se olvida que a defesa traz à discussão questões relacionadas à inexistência de transferência do apartamento triplex ou mesmo à ausência de ilegalidade no armazenamento do acervo presidencial. Desta última conduta, aliás, os réus foram absolvidos. Porém, tal argumentação - que será examinada no momento oportuno - não conduz à nulidade da sentença por ausência de correlação, pois não se exige da acusação ou do juízo a adoção de definição jurídica ou o reconhecimento de elementar que a defesa entende essencial ao tipo penal. Todavia, no que diz respeito ao contraditório, a sentença não traz alteração com relação aos fatos ou à tipificação, conclusão esta que somente é possível se examinada no todo, e não apenas por um ou outro seguimento isoladamente. Significa dizer que a incorporação à denúncia de expressão indicativa de inexistência de transferência apenas reforça a percepção do órgão acusatório de elemento tendente a ocultar a real propriedade do bem, mas, não, fundamental à tipificação. A leitura integral das quase 150 laudas da peça de acusação desfaz o equívoco. A optar-se por uma interpretação segmentada, talvez se chegue à equivocada conclusão, por exemplo, de que os crimes não estariam relacionados a contratos da Petrobras. Porém, em síntese, a denúncia e a sentença são bastante claras e seguem na linha de que o recorrente praticou o delito de corrupção passiva com o recebimento do triplex como parte do pagamento de propina oriunda dos contratos da Petrobras firmados com a OAS - e posterior lavagem -, pelo que não se tem qualquer nulidade por ausência de correlação. 2.13.2. Em outra linha, a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA postula a nulidade da sentença por falta de fundamentação. Para tanto, tece longas considerações a respeito de questões pontuais, como a ausência de indicação de ato de ofício, confusão entre os delitos de corrupção passiva e lavagem de dinheiro e invalidades na dosimetria da pena (fls. 185-197). https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 111 de 317 Há certa incorreção conceitual nas alegações defensivas. Apesar de abordar a temática em preliminar, a indicação ou mesmo a necessidade de prática de ato de ofício pelo agente para a caracterização do crime de corrupção passiva tem espaço adequado no exame de mérito, sobretudo na aferição dos elementos do tipo. No que importa neste momento em que a defesa alega ausência de fundamentação e, portanto, nulidade do decreto condenatório, diga-se que há expressa menção no sentido de que 'a efetiva prática de ato de ofício ilegal é causa de aumento de pena, mas não é exigido para a tipificação dos crimes dos arts. 317 e 333 do CP' (evento 948 - SENT1, item 863), de modo que, também esta preliminar deve ser rejeitada. 2.13.3. O mesmo se diga a respeito das impugnações relacionadas à dosimetria da pena. Tanto é assim que a defesa indica pontos bastante específicos que nada mais são do que insatisfação com os parâmetros aplicados pelo magistrado. Ainda em primeiro grau, houve esclarecimento do juízo em sede de embargos de declaração (evento 981): 3.i. Alega a Defesa, no item 2.7, que haveria omissões do Juízo quanto à pena. Teria havido omissão por parte do Juízo em relação 'aos critérios da quantia de aumento' na primeira fase de aplicação da penal. Também alega que haveria contradição pois a atenuante do art. 65, I, do CP teria sido calculada em seis meses tanto para o crime de lavagem, como para o de corrupção. Ora, dosimetria da pena não é matemática, conforme já decidiu o Egrégio Supremo Tribunal Federal: 'A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena. (...)' (HC 107.409/PE, 1.ª Turma do STF, Rel. Min. Rosa Weber, un., j. 10.4.2012, DJe-091, 09.5.2012) Este Juízo elencou longamente os critérios que levaram à fixação da pena para o crime de corrupção e de lavagem. Há que considerar que o crime de corrupção tem pena mínima de dois anos e máxima de doze anos, enquanto a lavagem de três anos a dez anos, com o que o reconhecimento de vetoriais negativas levam a aumentos diferenciados em um e outro caso. Não cabe o fracionamento pretendido pela Defesa a partir da pena mínima, critério ausente na lei. Também ausente qualquer previsão legal de que a atenuante deva ser calculada com base em fração das penas bases. Alega ainda a Defesa, quanto à causa de aumento do art. 317, §1.º, do CP, o acréscimo da pena pela prática do ato de ofício, que ela não teria sido caracterizada, já que o ato de ofício teria sido praticado anteriormente ao pagamento da vantagem. O Juízo reconheceu a prática de ato de ofício com infração da lei, conforme itens 886-891. Então não há qualquer omissão. Não há também qualquer exigência legal de que a prática do ato de ofício ilegal seja sucessivo ao pagamento da vantagem indevida. Ainda quanto à dosimetria, questiona a Defesa o critério para cálculo dos dias multas. Aqui esclareça-se que o cálculo foi proporcional ao aumento da pena privativa de liberdade. Assim, por exemplo, para o crime de corrupção, com pena mínima de dois a doze anos, a pena privativa de liberdade, de seis anos de reclusão, resultou proporcionalmente em cento e cinquenta dias multa, calculada entre o mínimo e o máximo de dias multa (dez a trezentos e sessenta dias multa), correspondendo o acréscimo de quatro anos da pena mínima ao acréscimo de cento e quarenta dias multa. Quanto ao valor do dia multa, o critério foi expressado no item 948 e teve por base a renda declarada pelo próprio ex-Presidente. Pode a Defesa reputar o valor excessivo, mas isso não é causa para embargos de declaração. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 112 de 317 Ainda neste tópico questiona a Defesa, a fixação do dano mínimo em dezesseis milhões de reais, indagando quanto cada um dos condenados no processo pagaria. Ora, a responsabilidade por danos decorrentes de crimes é, como sabido, solidária entre todos os responsáveis, não sendo possível atribuir frações de responsabilidade. Não há, portanto, omissão, obscuridade ou contradição no ponto. Enfim, quanto aos embargos de declaração da Defesa do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, inexistem omissões, obscuridades ou contradições na sentença, devendo a Defesa apresentar os seus argumentos de impugnação da sentença em eventual apelação e não em incabíveis embargos. Ante o exposto, embora ausentes omissões, obscuridades ou contradições na sentença, recebo os embargos para os esclarecimentos acima. Ou seja, sem prejuízo de que a dosimetria da pena seja reexaminada ou mesmo dispensada, se eventualmente acolhido o pedido absolutório, não há nulidade a ser declarada por ausência de fundamentação, quando o pedido se funda em mera discordância das partes com os critérios utilizados pelo juízo de primeiro grau na sentença. 2.14. Pelo todo já considerado pelo juízo de primeiro grau - seja nos incidentes que precederam à prolação da sentença, seja pelos fundamentos lançados no decreto condenatório -, o que se agrega como razão de decidir, somado ao que ora se consigna, devem ser rejeitadas integralmente todas as preliminares invocadas pelas defesas. 3. DO MÉRITO 3.1. Do standard probatório 3.1.1. Sem embargo de outras questões periféricas, o cerne dos recursos reside na suficiência ou não do conjunto probatório para a formação do juízo condenatório, fundado tanto em provas diretas como indícios, conforme autorizado pelos arts. 155 e 239 do Código de Processo Penal. Indício, seguindo a definição legal, é 'a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias'. Equivale dizer, é um juízo que se exerce a partir de determinados fatos comprovados, para se concluir acerca de outros fatos ou circunstâncias deles decorrentes. Tanto a prova direta quanto os indícios têm valor jurídico, 'até porque a prova indiciária não é 'prova menor', no âmbito do livre convencimento (...), mas com maiores cautelas devem ser adotadas, notadamente no que se refere ao modelo de constatação aplicável' (KNIJNIK, Danilo. A prova nos juízos cível, penal e tributário. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2007, p. 49). Em precisa lição, acrescenta o doutrinador, reproduzindo lição de Ignazio Manzoni: Com efeito, 'para que o fato desconhecido possa reputar-se provado por presunção simples, não basta apresentar-se como conseqüência possível ou mais ou menos provável do fato conhecido. A mera possibilidade de ocorrência de um certo fato não pode ser considerada suficiente para reputá-lo ocorrido (...). Para que a presunção assuma relevância probatória, exige-se algo mais. Requer-se não apenas que o fato ignorado esteja no âmbito das conseqüências possíveis, mas em grau de probabilidade tal, que induza o convencimento racional de que o fato desconhecido tenha efetivamente ocorrido. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 113 de 317 É no grau de relação de inferência, entre o fato conhecido e o desconhecido, que repousa a força demonstrativa deste meio probatório. Quanto maior a chance de que o fato ignorado seja conseqüência do fato conhecido, maior a relevância probatória da presunção' (op. cit., p. 49) (sublinhei) O tema das provas é de fundamental importância, em especial porque os delitos imputados aos acusados são complexos e de difícil apuração, muitas vezes dependente de um conjunto de indícios para a sua comprovação. Esta prova indireta deverá ser 'acima de qualquer dúvida razoável', excluindo-se a possibilidade dos fatos terem ocorrido de modo diverso daquele alegado pela acusação. É dizer, seguindo na lição de Knijnik, que os diversos indícios que envolvem o fato probando devem ser analisados em duas etapas, primeiro em relação a cada indício; depois o conjunto deles. 'Assim, sendo cada indício certo e preciso, pode-se obter a concordância a partir do conjunto' (op. cit., p. 51), e um único indício, mesmo que certo e grave, pode acarretar na exclusão de um juízo de certeza quanto aquilo que se pretende provar. De tal compreensão não destoa Gustavo Badaró, ao afirmar que 'a atividade probatória desenvolvida com vista à verificação dos fatos históricos serve de fundamento para a pretensão, quando for bem sucedida, permitirá a conclusão de que há um 'altíssimo grau de probabilidade' de ocorrência de tais fatos' (in Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Editora RT, 2003, p. 62). O juízo lógico para gerar o convencimento acerca de fatos ou circunstâncias está a depender, nessa linha, da maior ou menor solidez que representar dentro do contexto em que está inserido. Importa registrar que a legislação e a jurisprudência pátria pouco avançam sobre o nível (standard) probatório exigível para um decreto condenatório, quase sempre limitando-se à persuasão racional e ao livre convencimento do juiz. Colhe-se da experiência estrangeira o parâmetro da existência de prova 'acima de uma dúvida razoável' (proof beyond a reasonable doubt). Essa 'prova acima de uma dúvida razoável' importa no reconhecimento da inexistência de verdades ou provas absolutas, devendo o intérprete/julgador valer-se dos diversos elementos existentes nos autos, sejam eles diretos ou indiretos, para formar sua convicção. Assim, tanto provas diretas quanto indícios devem ser considerados para composição do quadro fático que se busca provar. Além disso, a 'prova acima de uma dúvida razoável' implica no firme convencimento acerca da ocorrência do fato e da culpa do acusado. Por vezes, a certeza absoluta é de obtenção praticamente impossível ou, ao menos, inviável. Isso porque a obtenção de prova cabal a respeito dos fatos, sob a ótica da verdade, é pretensão ilusória. Como explicou Teori Zavascki, '... o que a lei exige não é, certamente, prova de verdade absoluta - que será sempre relativa, mesmo quando concluída a instrução -, mas uma prova robusta, que, embora no âmbito de cognição sumária, aproxime, em segura https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 114 de 317 medida, o juízo de probabilidade do juízo de verdade' (in Antecipação da tutela. São Paulo : Saraiva, 1997, p. 104). Sérgio Sahione Fadel, ao comentar a exigência de prova inequívoca processual, tece críticas ao conceito, argumentando que, 'se, na verdade, se fosse exigir do proponente da ação prova dotada de tal qualidade e de tal poder de persuasão, seria de total inviabilidade o próprio procedimento, entendido como a sucessão de atos processuais, uma vez que o juiz, com base nela, não seria jamais suscetível de errar' (in Antecipação da tutela no processo civil. 2. ed., São Paulo: Dialética, 2002, p.28) A probabilidade, em síntese, é a prevalência dos motivos convergentes sobre outros, divergentes. Entretanto, as evidências devem levar o julgador, para que possa ser emitido um decreto condenatório, ao firme convencimento da culpa, sendo que a dúvida deve levá-lo à absolvição do réu. Essa noção consta do Manual de Instruções aos Jurados, produzido pelo Federal Judicial Center, em 1987, nos Estados Unidos, cujas orientações devem servir de guia para o julgamento nos Tribunais Federais do Júri feitos naquele País. Para maior clareza, transcrevo do original (http://www.fjc.gov/public/pdf.nsf/lookup/crimjury.pdf/ $file/crimjury.pdf, p. 44): 'As I have said many times, the government has the burden of proving the defendant guilty beyond a reasonable doubt. Some of you may have served as jurors in civil cases, where you were told that it is only necessary to prove that a fact is more likely true than not true. In criminal cases, the government's proof must be more powerful than that. It must be beyond a reasonable doubt. Proof beyond a reasonable doubt is proof that leaves you firmly convinced of the defendant's guilt. There are very few things in this world that we know with absolute certainty, and in criminal cases the law does not require proof that overcomes every possible doubt. If, based on your consideration of the evidence, you are firmly convinced that the defendant is guilty of the crime charged, you must find him guilty. If on the other hand, you think there is a real possibility that he is not guilty, you must give him the benefit of the doubt and find him not guilty.' Tal perspectiva também está presente no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, adotado pelo Brasil a partir do Decreto nº 4.388/2002, que, no seu art. 66, estabelece: '3. Para proferir sentença condenatória, o Tribunal deve estar convencido de que o acusado é culpado, além de qualquer dúvida razoável'. Sobre o nível de prova necessário ao decreto condenatório, inspirado no modelo alienígena, já decidiu o E. Supremo Tribunal Federal: DIREITO PENAL. AÇÃO PENAL DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA. OPERAÇÃO SANGUESSUGA. FRAUDE EM LICITAÇÃO. CRIME DO ART. 90 DA LEI 8.666/1993. CORRUPÇÃO PASSIVA. QUADRILHA. DEPUTADO FEDERAL. FALTA DE PROVA HÁBIL. ABSOLVIÇÃO. 1. A presunção de inocência, princípio cardeal no processo criminal, é tanto uma regra de prova como um escudo contra a punição prematura. Como regra de prova, a melhor formulação é o 'standard' anglo-saxônico - a responsabilidade criminal há de ser provada acima de qualquer dúvida razoável -, consagrado no art. 66, item 3, do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. 2. À falta de prova suficiente da participação do acusado, Deputado Federal, nos crimes licitatórios praticados com verbas decorrentes de https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 115 de 317 emendas parlamentares de sua autoria, bem como do recebimento de vantagem indevida em decorrência das emendas parlamentares e, ainda, de associação a grupo dedicado à prática de fraudes e peculatos na aquisição de ambulâncias com recursos federais, impõese a absolvição. 3. Ação penal julgada improcedente. (AP 521, Relatora Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, publicado em 06-02-2015 - destaquei) Queixa-crime ajuizada contra parlamentar. Injúria. Delito praticado por meio de matéria divulgada em periódico escrito. Alegada falta de justa causa por inexistência de dolo específico voltado a atingir a honra da vítima. Necessidade da dilação probatória. Subsunção dos fatos à conduta típica descrita na inicial acusatória. Queixa recebida. 1. A verificação acerca da narração de fato típico, antijurídico e culpável, da inexistência de causa de extinção da punibilidade e da presença das condições exigidas pela lei para o exercício da ação penal (aí incluída a justa causa) revela-se fundamental para o juízo de admissibilidade de deflagração da ação penal. A inexistência de dolo específico é questão que deve situar-se no âmbito da instrução probatória, por não comportar segura ou precisa análise nesta fase processual, que é de formulação de um simples juízo de delibação. 2. As condutas em foco, todavia, se amoldam, em tese, ao delito invocado na peça acusatória, sendo que a defesa apresentada pelo querelado não permite concluir, de modo robusto, ou para além de toda dúvida razoável, pela improcedência da acusação. 3. Queixa recebida. (Inq 2968, Relator Ministro Dias Toffoli, Tribunal Pleno, publicado em 17-08-2011 - destaquei) O Superior Tribunal de Justiça já adotou mesmo posicionamento: PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 2º DA LEI N. 8.176/1991 E ART. 55 DA LEI N. 9.605/1998. CONCURSO FORMAL. PRESCRIÇÃO. FALTA DE PROVAS. (...) 5. O estado jurídico de inocência, corolário da dignidade da pessoa humana, exige para a condenação a certeza além da dúvida razoável, não sendo admissível sequer a alta probabilidade. Ausentes elementos de prova aptos a demonstrar os fatos imputados, devem os réus ser absolvidos com fundamento no art. 386, II, do CPP. Ação penal julgada improcedente, absolvendo-se os acusados com fundamento no art. 386, II, do CPP. (APn 719/DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Corte Especial, DJe 18/11/2014 - destaquei) Sem embargo, a busca pela prova acima de qualquer dúvida razoável, a persuasão racional ou o livre convencimento motivado, conduzem na mesma direção, qual seja, de prova suficiente acerca da materialidade e autoria. 3.1.2. Em complemento a essas considerações relativas à prova, convém abordar outro tema introdutório. A defesa do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA insurgiu-se quanto aos interrogatórios de corréus, os quais estariam negociando com a Procuradoria da República a celebração de acordo de colaboração. Nas diferentes audiências, questionou a existência de acordos, seus termos e quais os benefícios que estariam sendo concedidos. Para além do que já foi considerado com relação à nulidade pelo indeferimento de perguntas não relacionadas aos fatos, diga-se que a existência de negociação, apesar de admitida, até o presente momento não culminou com a celebração de acordo - como afirmado pelas partes - tampouco há especificações dos benefícios prometidos. Assim, ainda que cogitasse de pacto homologado, os corréus foram ouvidos na condição de interrogados, e não como colaboradores. Aos depoimentos dos corréus LÉO PINHEIRO e AGENOR FRANKLIN é inaplicável, portanto, o disposto no art. 4, § 14, da Lei 12.850/13, já que sabidamente não https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 116 de 317 têm acordo firmado e, evidentemente, não há homologação judicial. Ainda assim, suas declarações devem ser tomadas com as devidas reservas - como sempre se adotam em relação às confissões com atribuições de responsabilidade também a outro corréu (conhecida na doutrina e jurisprudência como chamada de corréu). No interrogatório de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO (evento 809), foi assim referido: Defesa:- Excelência, respondendo a indagação do eminente advogado, sim, existem conversas com o Ministério Público, não há a formalização de um acordo, muito menos a homologação deste acordo pelo Judiciário, mas há sim conversas estabelecidas por este advogado, e pelos advogados hoje que atuam em nome de Léo Pinheiro, com o Ministério Público, é isso, aliás isso seria dito textualmente pela defesa. Juiz Federal:- Alguma coisa a acrescentar o Ministério Público? Ministério Público Federal:- Não, excelência. Defesa:- Só uma questão, excelência. O eminente advogado leu uma matéria na Folha de São Paulo dizendo que, a matéria diz, segundo eu posso ter entendido, que a defesa teria negociado esse depoimento com o Ministério Público, isso de fato não ocorreu. Juiz Federal:- Mais algum esclarecimento? Defesa:- Na verdade, excelência, eu pediria então a suspensão porque não é possível um interrogando prestar um depoimento se está em processo de delação premiada como foi confirmado aqui, porque há negociações em curso, evidentemente que a acusação está tendo um tratamento que a defesa também não tem, porque se há uma negociação em curso, se há versões sendo negociadas, se há benefícios sendo estabelecidos, a defesa tem que saber claramente qual é a situação jurídica do interrogando para poder assim desenvolver o seu trabalho, não é possível que haja hoje uma situação não esclarecida, quer dizer, há, como foi confirmada pelo ilustre advogado, esse acordo sendo negociado, não se sabe o status, e a defesa se sente absolutamente prejudicada ao saber que as negociações estão ocorrendo sem que se tenha uma posição efetiva de qual é a situação jurídica do interrogando. Hoje ele pode, hoje o interrogando tem o direito constitucional de ficar calado e de mentir, agora se ele é um delator aí a situação jurídica se altera, então essa indefinição da situação jurídica me parece bastante prejudicial à defesa. Juiz Federal:- Certo. Veja, doutor, eu na verdade não vejo motivo para discussão, que no fundo o acusado pode vir aqui no momento do interrogatório e ele vai se defender, vai dar a versão dos fatos, quer seja verdadeira, quer não seja verdadeira, o fato de existir um acordo aí em andamento, alguma negociação, nem sequer se sabe se isso vai ser efetivado, não é causa de suspensão do processo. O mesmo sucedeu - sobre eventual negociação para acordo - por ocasião do interrogatório (evento 869) do réu AGENOR FRANKLIN, que foi enfático ao revelar a tentativa de negociar um acordo, mas que nunca teria prestado depoimento ao MPF, tampouco entabulado condições: Defesa:- Perfeito. Já foi inclusive reconhecido aqui pelo Ministério Público que o senhor está num processo de delação premiada, numa negociação, o senhor pode me dizer em que fase está essa negociação? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Olha, jamais eu estive com qualquer procurador e os meus advogados é que estão conversando, então o que eu estou revelando, não é revelando, o meu depoimento aqui hoje a princípio eu não tenho nenhum benefício definido até agora em relação ao que eu estou falando, zero de benefícios até agora, desconheço. Agora, os meus advogados estão conversando, conversando, isso é uma decisão minha e uma decisão dos meus advogados. Defesa:- Certo, mas já existe uma proposta então de benefícios? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Não existe proposta nenhuma. Defesa:- O senhor está negociando delação sem benefícios? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 117 de 317 Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Zero propostas, pelo menos até o momento que eu entrei aqui, agora, os meus advogados, conversando com eles, proposta não existe, existem conversas. A jurisprudência do Tribunal Excelso reconhece a validade e o valor da palavra do corréu, quando em sintonia com outros elementos de convicção, como se colhe da ementa a seguir: I - STF: competência originária para habeas-corpus contra decisão do STJ em recurso especial, limitada às questões nesse suscitadas. Firme a jurisprudência do Tribunal em que, à vista da devolução restrita do recurso especial, o fundamento do habeas-corpus contra o acórdão que o haja decidido há de conter-se no âmbito da matéria devolvida ao Tribunal coator (cf. HHCC 85.858-ED, 1ª T., Pertence, DJ 26.08.05; 81.414-QO, 1ª T., Pertence, DJ 14.12.01; 75.090, 1ª T., Pertence, DJ 01.08.97 e precedentes nele referidos. II. Pronúncia: motivação suficiente: C.Pr.Penal,art. 408. 1. Conforme a jurisprudência do STF, a chamada de co-réus, retratada ou não em juízo, não pode servir como fundamento exclusivo da condenação (v.g. HHCC 74.368, Pleno, 1º.7.97, Pertence, DJ 28.11.97; 81.172, 1ª T.,Pertence, DJ 07.3.03; RHC 81.740, 1ª T., 29.03.05, Pertence, DJ 22.04.05). 2. Os precedentes, no entanto, não negam a validade da chamada de co-réus como elemento ancilar da decisão: o fato de não se prestarem como testemunhos ou como fundamentos suficientes para a condenação não afastam a sua validade como indícios, provisórios que sejam. 3. O caso é de pronúncia, para a qual se contenta o art. 408 C.Pr.Penal com a existência do crime 'e de indícios de que o réu seja o seu autor', ou seja, de elementos bastantes a fundar suspeita de autoria. 4. De qualquer sorte, a pronúncia não se ampara exclusivamente na chamada de co-réus, mas também nos depoimentos nela referidos, de validade não contestada e cuja suficiência para mantê-la, por sua vez, dependeria de juízo de ponderação a que não se presta o procedimento sumário e documental do habeas corpus. (HC 90708, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 20/03/2007, DJ 13-04-2007 PP00103 EMENT VOL-02271-03 PP-00457 RTJ VOL-00203-01 PP-00282 LEXSTF v. 29, n. 343, 2007, p. 482-494) A doutrina segue na mesma linha: A jurisprudência italiana exige que a comprovação da chamada do corréu possa se dar por intermédio de quaisquer outros elementos de prova, desde que evidentemente sejam idôneos. Desta feita, deve o juiz analisar se a chamada preenche os requisitos: coerência, constância e espontaneidade (Cass. S.U., 22.2.93/192465). Não há sentido, assim, em se entender provada uma chamada do corréu apenas porque existe outra chamada do corréu paralela a confirmá-la, ainda que insofismavelmente ganhe a primeira, com isso, credibilidade (Gemaque, 2003:50). (...) A chamada do corréu que não está prevista expressamente no CPP, não é mais prova anômala, uma vez que já prevista em legislações especiais. (...) Um critério interessante que pode ser utilizado pelo juiz é o tríplice controle de Ferrajoli, referindo-se a indagações que devem ser feitas pelo juiz quanto à validade da prova: 1) como garantir a necessidade da prova ou verificação; 2) como garantir a possibilidade da contraprova ou refutação; 3) como garantir, contra a arbitrariedade e o erro, a decisão imparcial e motivada sobre a verdade processual fática (Ferrajoli, 2002:119). Assim, não deve o juiz fundar, sic et simpliciter, a condenação na chamada do corréu, mas sim avaliá-la à luz de complexos elementos que constituirão o ponto de orientação para a valoração judicial. Neste sentido, deverá atentar para: a) a personalidade do acusado que procedeu à chamada do corréu; b) pesquisar eventuais motivos particulares de acusação https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 118 de 317 contra um inocente; c) avaliação da posição defensiva do corréu apontado; d) correlação da chamada do corréu com outros aspectos que determinem uma coordenação de elementos que não deixem a chamada do corréu isolada (Leone, 1968:360). (GEMAQUE, Silvio César Arouck, disponível em https://www.conjur.com.br/2016-abr-27/eficienciadelacao-equilibrada-garantias-processuais). GRIFEI As palavras do corréu podem ser utilizadas se reveladas com espontaneidade e coerência, suportada por outros indícios, bem como sujeita ao contraditório. Tal exegese é extraída do disposto nos arts. 188 a 197 do Código de Processo Penal, destacando-se o direito de reperguntas às partes e a interpretação da confissão (com a chamada de corréu) segundo os demais elementos de convicção porventura existentes. Espontaneidade, esclareça-se, não significa dizer que o corréu não objetive, com a colaboração, obter benefícios de ordem processual, como, no mínimo, a redução da pena pela atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, 'd', CP) ou outro previsto na legislação (como nas Leis nºs 9.613/88 e 9.807/99). Dessa forma, são válidos os depoimentos prestados por colaboradores e por corréu, sendo que seu valor probatório está a depender da sintonia como os demais elementos de convicção existentes nos autos. 3.1.3. É certo que a regra do § 16 do art. 4º da Lei 12.850/2013 prevê reservas quanto à utilização exclusivamente da palavra de um colaborador para firmar o decreto condenatório, in verbis: § 16. Nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador. Isso porque as palavras do colaborador devem ser colhidas com redobradas cautelas, inclusive comparando-as com os depoimentos de testemunhas. Todavia, havendo diversos colaboradores asseverando, em processos, momentos e contextos distintos, fatos no mesmo sentido, entendo que a regra acima transcrita deixa de ser imperativa, haja vista que a possibilidade de eventual acerto de um depoimento por outro perde força. Sobre o tema da corroboração, destaca Frederico Valdez Pereira, para quem: Não há uma restrição quanto à natureza dos dados confirmativos, podendo se constituir em outras declarações e documentos, ou mesmo, em dados objetivos ou fatos confirmados que sirvam para conferir confiabilidade à narrativa do declarante. Tais elementos externos não necessitam fornecer a prova do thema probandum, mas apenas, confirmar a credibilidade das declarações realizadas pelo colaborador. E, acaso esteja-se diante de narrativa complexa, envolvendo a imputação de vários fatos, de um conjunto de copartícipes, ou vice-versa, poderá Sr que somente parte das revelações esteja corroborada por elementos de confirmação externos, sem que se possa daí concluir pela corroboração de todo o conjunto das revelações, e tampouco desconsiderá-las por inteiro. Duas conclusões lógicas importantes podem ser extraídas das ideias acima expostas: suportes lógicos derivados da inferência indiciária são admissíveis como elementos de corroboração e desses dados deve-se exigir que confirmem a veracidade da delação processual e não, obrigatoriamente, a dos fatos imputados ao acusado. O mesmo se diga em relação a documentos ou testemunhas que venham a corroborar as informações do denunciante; o que se deve exigir é que esses elementos de prova digam respeito ao que foi relato na delação processual, não importando, para esse efeito, que não se refiram ao fato criminoso em si.' (in Delação Premiada - Legitimidade e Procedimento. Curitiba: Juruá, 2016, 3ª ed., p. 207) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 119 de 317 Pouco adiante, em que pese reconhecer a complexidade do tema, Valdez discorre sobre a possibilidade de mutual corroboration, consistente na colaboração posterior servir como elemento de corroboração de delação anterior: 'Em tese poderia ser admitido, desde que as colaborações tenham vindo a conhecimento dos órgãos de acusação de modo independente e em procedimentos separados, em circunstâncias tais em que se excluíssem os riscos de acordos falsos ou de recíprocas inferências entre os colaboradores. Mas, como regra geral, dever-se-ia exigir que ao menos uma dessas declarações esteja corroborada por dados externos distintos aos arrependidos, o que pareceu ser a intenção do legislador italiano ao exigir a valoração da delação deva ocorrer com outros elementos que lhe atestem a veracidade, entendendo-se outros como distintos. A exigência de corroboração externa para se conferir crédito à cooperação pós-delitiva traz, ao menos, duas conseqüências muito importantes para a preservação dos direitos do acusado e que, portanto, merecem especial destaque. A primeira é que o magistrado deve apresentar fundamentadamente o seu convencimento em torno da credibilidade da declaração do arrependido processual; e, por segundo, essa justificativa não pode estar limitada somente a aspectos internos da colaboração, deve estar acompanhada de menção a elementos objetivos exteriores à delação.' (op. cit., p. 210). DESTAQUE NOSSO Não é o caso dos autos, todavia, pois não se pode falar em vedação a mutual corroboration, visto que os corréus não firmaram acordo de colaboração, embora tivessem mantido negociação. De toda maneira, os seus depoimentos devem ser lidos com o mesmo cuidado, sendo indispensável o exame dos demais elementos de prova para que seja, ou não, dada credibilidade. Assim, da pluralidade de depoimentos em consonância com a tese da acusação, há de se constatar a existência de provas outras com eles compatíveis. Feitas tais considerações gerais acerca da prova, direta ou indireta, e os níveis probatórios necessários para um decreto condenatório, passo à análise do mérito dos recursos de apelação, segundo os delitos imputados. 3.2. Dos fatos imputados Os fatos trazidos a julgamento nos presentes autos são múltiplos e complexos, o que certamente demanda detalhamento acerca das imputações, dos diversos argumentos deduzidos pelas partes, das provas existentes no caderno processual e seus anexos, e das circunstâncias pessoais de cada um dos acusados. Malgrado a envergadura e as dimensões amazônicas da 'Operação LavaJato', pode-se, neste primeiro momento, sintetizar a imputação em linhas gerais. Descreve a denúncia que alguns partidos políticos e alguns políticos passaram a 'apadrinhar' indicações de pessoas, servidores públicos de carreira ou não, para ocupar cargos de elevado escalão junto a órgãos da administração pública direta e indireta. Os indicados, por sua vez, deveriam envidar esforços para verter recursos para os cofres destes partidos e para os bolsos de alguns de seus dirigentes. Também os agentes nomeados recebiam propina. Tais recursos eram desviados por meio de licitações ou procedimentos administrativos realizados de modo ilícito, culminando em contratos bilionários superfaturados, firmados entre algumas das maiores empresas nacionais e o órgão da Administração envolvido. Um percentual do valor do contrato era transferido, por https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 120 de 317 intermédio de operações de lavagem de dinheiro e/ou evasão de divisas ou, ainda, por mero pagamento em espécie, para os partidos políticos, para seus dirigentes e para afilhados indicados para ocupar os cargos. É disso que tratam este e os outros processos conexos relativos à denominada 'Operação Lava-Jato', em suas dezenas de fases. Mudam apenas os nomes de partidos, de políticos, de 'afilhados', de empresas e seus administradores, os percentuais ou os detalhes de como os recursos públicos foram drenados para finalidades indevidas, mas na essência o histórico é o mesmo, ainda que a comprovação dos fatos imputados e a responsabilidade penal de cada um dos acusados dependam da detida análise das provas colhidas em cada ação penal. Segundo se extrai, esse grande esquema criminoso, que contava com a participação das empresas OAS, ODEBRECHT, UTC, CAMARGO CORREA, TECHINT, ANDRADE GUTIERREZ, MENDES JÚNIOR, PROMON, MPE, SKANSKA, QUEIROZ GALVÃO, IESA, ENGENIX, SETAL, GDK e GALVÃO ENGENHARIA, possibilitou fosse fraudada a competitividade dos procedimentos licitatórios referentes às maiores obras da Petrobras entre os anos 2004 e 2014. Essas empreiteiras formariam o que passaram a chamar de 'clube', ajustando previamente qual delas iria sagrar-se vencedora das licitações, manipulando preços, sem concorrência real, e contratada pelo maior valor admitido pela estatal. Aderindo a tal comportamento criminoso, a OAS, representada por seus diretores, teria vencido licitações referentes à Refinaria Getúlio Vargas (REPAR) e à Refinaria Abreu e Lima (RNEST). Em apertada síntese, a inicial acusatória aponta que, nesse complexo contexto, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA seria o principal articulador e avalista do esquema de corrupção que assolou a Petrobras, tendo em vista sua capacidade de decisão com relação aos agentes públicos nomeados para a estatal, assim como de influência e gestão junto a políticos da sua base aliada para manutenção do financiamento político com recursos escusos. Além disso, da mesma fonte que verteu contribuições para o Partido dos Trabalhadores, beneficiou-se com um imóvel, respectivas benfeitorias e mobiliário; bem como do pagamento pela OAS do armazenamento do acervo presidencial junto à empresa Granero. A inicial traz as seguintes imputações relacionadas aos contratos firmados no seio da Petrobras: (a) a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, pela prática, no período compreendido entre 11/10/2006 e 23/01/2012, por 7 vezes, em concurso material, do delito de corrupção passiva qualificada, em sua forma majorada, previsto no art. 317, caput e §1º, c/c art. 327, §2º, todos do Código Penal; (b) a JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS, pela prática, no período compreendido entre 11/10/2006 e 23/01/2012, por 9 vezes, em concurso material, do delito de corrupção ativa, em sua forma majorada, previsto no art. 333, caput e parágrafo único, do Código Penal. Com relação ao apartamento TRIPLEX no Guarujá/SP: (c) a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, PAULO ROBERTO VALENTE GORDILHO, FÁBIO HORI YONAMIME e ROBERTO MOREIRA FERREIRA, pela prática, no período https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 121 de 317 compreendido entre 08/10/2009 e a data do seu oferecimento, por 3 vezes, em concurso material, do delito de lavagem de capitais, previsto no art. 1º c/c o art. 1º § 4º, da Lei nº 9.613/98. Com relação ao armazenamento do acervo presidencial junto à empresa Granero: (d) a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, PAULO TARCISO OKAMOTTO e JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, pela prática, no período compreendido entre 01/01/2011 e 16/01/2016, por 61 vezes, em continuidade delitiva, do delito de lavagem de capitais, previsto no art. 1º c/c o art. 1º § 4º, da Lei nº 9.613/98. 3.3. DAS IMPUTAÇÕES DE CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA 3.3.1. Tipicidade - artigos 333 e 327 do Código Penal 3.3.1.1. Os delitos narrados estão previstos nos arts. 333, caput e parágrafo único, e 317, caput e §1º, c/c art. 327, § 2º, todos do Código Penal: Corrupção ativa. Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determinálo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional. Corrupção passiva Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional. Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. O crime do art. 317 do Código Penal ocorre com a solicitação ou recebimento de vantagem indevida pelo agente, em decorrência de cargo ou função, podendo ocorrer durante, antes da assunção ou mesmo depois do desligamento do cargo. Nas palavras de Heleno Fragoso: O crime é tipicamente formal e se consuma com a solicitação ou recebimento da vantagem indevida, ou a aceitação da promessa de tal vantagem, sem que se exija outro resultado. (...). Nos casos de recebimento e de promessa, há um entendimento e um acordo entre o agente e o corruptor (que será, por sua vez, agente da corrupção ativa). (Lições de Direito Penal. Parte Especial, v. II, 4ª ed., p. 419/420) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 122 de 317 No caso, há todo um contexto envolvendo a atuação dos agentes públicos, as empreiteiras e a Petrobras, com a identificação de uma sucessão de atos e omissões que culminam com o pagamento de vantagem indevida aos agentes políticos, aos servidores públicos e aos partidos políticos. Para fins de enquadramento na figura descrita no tipo, o art. 327 do Código Penal assim descreve a figura do funcionário público: Funcionário público Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público Tendo o Estado por sujeito passivo, o crime de corrupção passiva não depende do resultado almejado pelo agente, bastando a solicitação de vantagem indevida pelo funcionário público. É um crime de mera conduta, em que a solicitação da vantagem indevida, por si só, configura a ilegalidade, sendo o dolo seu elemento subjetivo. A Administração Pública deve sempre ser pautada pelos princípios constitucionais estampados no art. 37 da Constituição Federal (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência), de modo a coibir a troca mútua de favores entre o público e o privado. Tal premissa de probidade, quando desprezada ou deliberadamente esquecida culmina com a degradação da coisa pública e a sua apropriação por particulares. Como explica o Desembargador Federal Leandro Paulsen, deve-se supor 'que os servidores públicos e agentes políticos atuem de modo íntegro, com espírito público, inspirados por esses princípios e com vista ao bem comum é o que se espera. E há uma grande preocupação com isso, porquanto, quando outros interesses se sobrepõem, não apenas o servidor se corrompe, no sentido de se deteriorar moralmente, de se perverter, mas, com ele, também a Administração se deteriora e se perverte' (in Crimes Federais, São Paulo : Saraiva, 2017, p. 132). A compreensão comum da moralidade tem tanta relevância nessa discussão se não mais - quanto as regras internas da Administração Pública, em particular porque o ato praticado por agentes políticos tem por finalidade o atingimento do bem comum. Mário Sergio de Albuquerque Schirmer, com muita propriedade e chancelado pela mais abalizada doutrina, discorreu sobre tal concepção: ... não se pode resumir o conteúdo do moralidade administrativa a uma moralidade interna da Administração Pública, pois como percebido por Augustin Gordillo, pode existir uma moral paralela dentro da Administração Pública, que nem sempre coincida com o anseio dos administrados, que considere corretas condutas censuradas pela moral comum. Se a moralidade administrativa correspondesse apenas e tão somente a uma moral interna da Administração Pública, retirada de regras e costumes internos, da praxe administrativa, de nada teria valido a digressão feita sobre a contribuição da Ética para objetivar o conteúdo do princípio da moralidade. O conceito de moralidade administrativa também https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 123 de 317 deve ser integrado pela moral comum, no sentido do anseio popular a um governo honesto, que busque o bem comum. Como destaca Maurício Antonio Ribeiro Lopes, citando Maria Sylvia Zanella di Pietro: 'a moral administrativa,..., corresponde àquele tipo de comportamento que os administrados esperam da Administração Pública, para a consecução de fins de interesse coletivo, segundo uma comunidade moral de valores expressos por meio de standards, modelos ou pautas de condutas'. Como dito por Manoel de Oliveira Franco Sobrinho, 'mesmo os comportamentos ofensivos da moral comum implicam ofensa ao princípio da moralidade administrativa'. Hely Lopes Meirelles enfatiza que o conceito de moralidade administrativa deve estar ligado ao conceito de bom administrador, que segundo Manoel de Oliveira Franco Sobrinho, 'é aquele que usando de sua competência legal, se determina não só pelos preceitos vigentes, mas também pela moral comum'. Assim, o conceito do princípio da moralidade administrativa deve mesclar a moralidade interna da Administração Pública com a moralidade comum, compreendida como anseio popular a um governo honesto, os padrões de moralidade pública vigentes em determinada sociedade objetivando o atingimento do bem comum. (...) A violação a outros princípios da Administração Pública, como legalidade, publicidade, eficiência, proporcionalidade, razoabilidade, economicidade, supremacia e indisponibilidade do interesse público também podem apontar para uma ofensa ao princípio da moralidade administrativa, sendo que a violação da impessoalidade sempre apontará uma ofensa ao princípio da moralidade administrativa, na medida em que trará consigo um desvio de finalidade, um ato que visou um interesse particular e não o interesse público. (in Da Investidura de Servidores Públicos, dissertação de mestrado, Universidade Federal do Paraná, 2001, p. 130-144). Os crimes de corrupção, porquanto atentatórios a princípios constitucionais inafastáveis, como legalidade, publicidade, eficiência, proporcionalidade, razoabilidade, economicidade, supremacia e indisponibilidade do interesse público, ensejam ofensa ao princípio da moralidade administrativa, extraindo-se da sua essência a própria intenção lesiva do agente. 3.3.2. Do crime de corrupção e o ato de ofício Alega a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA que não foi indicado qual seria o ato de ofício praticado pelo ex-Presidente. Segundo entende, tal identificação seria imprescindível para a caracterização do crime do art. 317 do CP. Há equívoco na tese. O tipo penal, diversamente da prevaricação, dispensa a ocorrência de ato de ofício, exigindo-se somente a solicitação/recebimento de vantagem indevida em decorrência do cargo ou função. Trata-se de crime formal que se concretiza com a solicitação ou o recebimento da benesse, de modo que a prática efetiva de ato de ofício não consubstancia elementar do tipo penal, mas somente causa de aumento de pena (§ 1º do art. 317, CP). Igualmente responde pelo crime aquele que solicita/recebe vantagem antes mesmo de assumir o cargo ou após tê-lo deixado. Na correta acepção do termo 'ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela', o tipo penal não alcança exclusivamente aqueles que se encontram no exercício de cargos e funções, sendo certo que sobre estes deve recair maior censura. Sobre o tema, manifestação da Ministra Rosa Weber na Ação Penal Originária 695/MT (data de publicação DJE 12/12/2016 - ATA Nº 191/2016. DJE nº 263, divulgado em 09/12/2016): https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 124 de 317 32. Verticalizo a questão do ato de ofício. 33. Em alegações finais, a defesa aponta que a destinação de emendas parlamentares é um ato funcional lícito. Logo, no seu entendimento, inábil a tipificar a corrupção. 33.1. Equivoca-se uma vez mais, na minha compreensão. 33.2. A destinação de emendas parlamentares no caso concreto não consistiu em ato de ofício lícito na medida em que indexada ao interesse de obter vantagens indevidas. Viabilizar emendas parlamentares com o intuito de beneficiar determinado grupo empresarial e se associar a ele em busca de lucro constitui prática de ato de ofício com violação de dever funcional. A atuação parlamentar, nessas circunstâncias, viola a moralidade e impessoalidade administrativas (art. 37 da CF). 33.3. Por outro lado, desimportante à corrupção passiva que a vantagem indevida seja contrapartida da prática de um ato funcional lícito ou ilícito. O ato de ofício, aliás e a rigor, não é elementar do crime de corrupção passiva (art. 317 do CP), apenas causa de aumento dele (§ 1º), conforme fundamentarei adiante. DESTAQUEI, NO PONTO. 33.4. Distinguindo a corrupção própria da imprópria, explica HUNGRIA, citado por GRECO '(...) é irrelevante que o ato funcional (comissivo ou omissivo) sobre que versa a venalidade seja lícito ou ilícito, isto é, contrário ou não aos deveres do cargo ou função. No primeiro caso fala-se em corrupção própria, e no segundo, em corrupção imprópria'. (GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 2ª. ed. São Paulo: Impetus, 2009, p. 758). 33.5. Exige-se, para a configuração do delito, apenas o nexo causal entre a oferta (ou promessa) de vantagem indevida e a função pública exercida, sem que necessária a demonstração do mesmo nexo entre a oferta (ou promessa) e o ato de ofício esperado, seja ele lícito ou ilícito. Ou seja, não é necessário estabelecer uma subsunção precisa entre um específico ato de ofício e as vantagens indevidas, mas sim uma subsunção causal entre as atribuições do funcionário público e as vantagens indevidas, passando este a atuar não mais em prol do interesse público, mas em favor de seus interesses pessoais. 33.6. Na experiência do direito norte-americano, 'As leis e casos de corrupção política deixam alguns princípios dessa área claros (...). O acordo entre o funcionário público e a pessoa que oferece suborno não precisa explicitar quais pagamentos vinculam específicos atos desse funcionário. Ao contrário, é suficiente que o funcionário público tenha entendido que era dele ou dela esperado o exercício de alguma influência em favor daquele que paga o suborno caso tais oportunidades surgissem (United States v. Abbey, 560 F.3d 513, 518 (6th Cir. 2009); accord United States v. Jefferson, 674 F.3d 332, 358-59 (4th Cir. 2012); Ryan v. United States, 688 F.3d 845, 852 (7th Cir. 2012); United States v. Ganim, 510 F.3d 134, 147 (2d Cir. 2007). US v. Terry , (6th Cir. 2013)'. ('The Honest Services of Public Officials' (Criminal Law Series) (English Edition)' by LandMark Publications. Kindle: 2015, posição 2156) (tradução livre). No original: The politicalcorruption statutes and cases make a few principles in this area clear (...). The agreement between the public official and the person offering the bribe need not spell out which payments control which particular official acts. Rather, 'it is sufficient if the public official understood that he or she was expected to exercise some influence on the payor's behalf as opportunities arose.' (negritos no original). Outra não é a lição acadêmica. Segundo José Paulo Baltazar Júnior, há duas posições na jurisprudência acerca da necessidade de definição na denúncia de ato determinado a ser praticado pelo funcionário, em contrapartida à vantagem indevida. Prossegue o autor: Para a primeira, haveria a necessidade da indicação de ato determinado que seria praticado pelo agente, por ocasião do oferecimento da denúncia, embora o caput do art. 317 do CP não contenha a expressão ato de ofício, mencionada apenas no §1º, como causa de aumento, ao contrário do que se dá com o art. 333. Entendeu-se, porém, que a circunstância de mencionar o tipo, que a vantagem é solicitada em razão do exercício da função pública, a suficiente a demandar a indicação, já por ocasião da denúncia, do ato pretendido, o que torna mais fechado o tipo (STF, AP 307, Galvão, P1., u., DJ 13.10.95; STF, Inq. 785, Galvão, P1, m., DJ 7.12.00, caso Zélia Cardoso de Mello; STF, AP 470, Barbosa, P1., 17.12.12, caso Mensalão; STJ, HC13894, Fernando Gonçalves, 6ª T., u., https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 125 de 317 21.2.02; STJ, HC 13487, Fernando Gonçalves, 6ª T. u., DJ 27.5.02; TRF4, AC 20030401007503-4, Élcio, 8ª T., u., 10.12.03; Mirabete, 1993: 97; Thompson Flores: 99) (in Crimes Federais, 10 ed., São Paulo: Saraiva, 2015, p. 299) Nada obstante algumas divergências pontuais, o voto proferido pelo Ministro do Luiz Fux, na Ação Penal nº 470/STF é esclarecedor: O corruptor deseja influenciar, em seu próprio favor ou em benefício de outrem. O corrupto 'vende' o ato em resposta à vantagem indevidamente recebida. Se o ato de ofício 'vendido' foi praticado pouco importa. O crime de corrupção consuma-se com o mero tráfico da coisa pública. Vê-se, assim, que na corrupção passiva, o que é chamado de 'em razão da função pública' e, na corrupção ativa, 'ato de ofício', é, em outras palavras, o (potencial) desvio da impessoalidade e da moralidade da atuação estatal, atingindo o cerne dos valores republicanos definidos na CR/88. O conceito de ato de ofício, portanto, ao aproximar-se da expressão função pública, deixa de corresponder a um ato determinado e concreto, que corresponda sinalagmaticamente à vantagem indevida conferida, para assumir uma conotação ampla, menos palpável e, não raro, indefinível. Isto é mais evidente em face da natureza de algumas funções, quando os atos têm característica eminentemente política, especialmente quando praticados por detentores de cargos eletivos dos poderes Legislativo ou Executivo. Não é viável exigir-se, em tais casos, que o agente atue na realização de atos determinados e concretos típicos de alguns funcionários públicos, v.g., aplicação de multa, liberação de alvará, concessão de licença, etc. Na mesma Ação Penal nº 470 pelo STF, o Ministro Relator consignou que ''o ato de ofício' deve ser representado no sentido comum, como o representam os leigos, e não em sentido técnico-jurídico', concluindo assim, citando precedente daquela Corte (AP 307, Rel. Ilmar Galvão), que 'basta, para os fins dos tipos penais dos artigos 317 e 333 do Código Penal que o 'ato subornado caiba no âmbito dos poderes de fato inerentes ao exercício do cargo do agente' (RTJ 162, n. 1, p. 46/47)' (STF, AP 470, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, DJe 22/04/2013) (grifei). Na mesma oportunidade, o Ministro Dias Tóffoli foi bastante específico quanto à posição da Excelsa Corte sobre o tema: 'Como já decidido por este Plenário em capítulo anterior, no que inclusive fiquei vencido, a corrente majoritária formou-se no sentido de ser despicienda a existência do ato de ofício para a tipificação do crime de corrupção passiva, bastando, para tanto, que a vantagem seja oferecida em razão do exercício do cargo público. A partir desta premissa, curvo-me a essa orientação e, doravante, passo a orientar o teor deste meu voto nesse sentido.' (fl. 4225). E, pouco adiante, arrematada sobre a função pública, relativamente a parlamentares: 'Note-se que a conduta descrita, na interpretação agora dominante perante o Supremo Tribunal Federal (a orientar o comportamento de todos os agentes públicos e políticos indistintamente), se adéqua ao tipo imputado aos parlamentares, na medida em que a solicitação da vantagem, na espécie, estaria motivada pela função pública por eles https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 126 de 317 exercida, o que basta para configurar a relação de causalidade entre ela e o fato imputado.' (fl. 4229). Depreende-se, assim, que o Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de que, para a configuração do delito de corrupção, não se exige que o oferecimento da vantagem indevida guarde relação com as atividades formais do agente público, bastando que esteja relacionado com seus poderes de fato. E, no caso de agente político, esse poder de fato está na capacidade de indicar ou manter servidores públicos em cargos de altos níveis na estrutura direta ou indireta do Poder Executivo, influenciando ou direcionando suas decisões, conforme venham a atender interesses escusos, notadamente os financeiros. Outro não é o entendimento do e. STJ: RECURSO EM HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA. NULIDADE. MAGISTRADO SUBSTITUTO. RETORNO DOS AUTOS AO RELATOR ORIGINÁRIO. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. INOCORRÊNCIA. EXAURIMENTO DA COMPETÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. EFEITOS INFRINGENTES. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO OCORRÊNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. (...) 6. Não se pode falar em atipicidade da conduta apta a ensejar o trancamento da ação penal se a denúncia faz identificação dos atos de ofício eventualmente praticados pela magistrada bem como da vantagem indevida supostamente recebida. 7. O crime de corrupção passiva é formal e prescinde da efetiva prática do ato de ofício, sendo incabível a alegação de que o ato funcional deveria ser individualizado e indubitavelmente ligado à vantagem recebida, uma vez que a mercancia da função pública se dá de modo difuso, através de uma pluralidade de atos de difícil individualização. (...) (STJ - RHC 48400 Relator(a) GURGEL DE FARIA QUINTA TURMA DJE DATA:30/03/2015) Alamiro Velludo Salvador Netto, ao comentar os posicionamentos surgidos quando do julgamento da Ação Penal nº 470/STF, explicou a linha argumentativa que apontou no sentido de que quanto maior a margem de atuação e discricionariedade do funcionário corrompido, menor será a necessidade de se individualizar o ato negociado entre os agentes, dada a ampla gama de poderes de que funcionários de alto escalão dispõem: Sobre este ponto, talvez uma ideia possa ser lançada. A dependência existente entre o delito de corrupção e a prática de ato de ofício correlata é diretamente proporcional ao grau de discricionariedade que detém o cargo ocupado pelo servidor público. Isto é, nos casos de funcionários com estreitas margens de atuação, como, por exemplo, a prática de restritos atos administrativos vinculados, parece ser mais crucial a preocupação, até em nome da segurança jurídica, com a relação (o sinalagma) entre vantagem indevida e ato de ofício praticado. Já em cargos nitidamente políticos aflora com maior clareza esta ilícita mercancia com a função, em si mesma considerada, esvaindo-se a dependência pontual entre a benesse e o exercício de algum ato. (in Reflexões pontuais sobre a interpretação do crime de corrupção no Brasil à luz da APN 470/MG. Revista dos Tribunais: Vol. 933/2013. p. 47/59. jul/2013). Com efeito, as corrupções envolvendo agentes políticos ganham contornos próprios e a solução deve ser buscada caso a caso, tomando-se como norte o contexto da atividade criminosa, o modus operandi empregado, a capacidade de influência do agente e os desdobramentos da empreitada delitiva considerada em seu todo. Não há como se definir, portanto, uma fórmula de ouro aplicável a todo e qualquer processo, pois a https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 127 de 317 atividade política transborda muitas vezes os estritos limites do cargo - inclusive temporais -, podendo interferir nos mais variados órgãos da administração pública direta ou indireta. No caso, a corrupção passiva perpetrada pelo réu difere do padrão dos processos já julgados relacionados à 'Operação Lava-Jato'. Não se exige a demonstração de participação ativa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA em cada um dos contratos. O réu, em verdade, era o garantidor de um esquema maior, que tinha por finalidade incrementar de modo subreptício o financiamento de partidos, pelo que agia nos bastidores para nomeações e manutenções de agentes públicos em cargos chaves para a empreitada criminosa. Por pertinentes ao tema, agrego as considerações tecidas no EINUL nº 5023121-47.2015.4.04.7000/PR. Naquele julgamento, quando se discutia a causa de especial aumento de pena dos arts. 317, § 1º, e 333, parágrafo único, ambos do Código Penal, ressalvada a ligeiramente diversa posição política dos personagens, bem anotou o Desembargador Federal Márcio Antônio Rocha, ipsis litteris: Não localizando ato concreto de favorecimento das empresas, entendem os julgadores que não se poderia concluir, por isso mesmo, pela concreta existência de ato de ofício por parte da autoridade. Ocorre que essa linha de raciocínio parte da premissa de que caberia ao intérprete decidir onde estaria o ato da autoridade, escolhendo, no caso em apreço, a ação antecedente de influenciar a contratação das empresas de publicidade, olvidando que o ato a ser praticado pela autoridade pode se dar antes, depois, ou no curso da corrupção. Decorrente desse raciocínio, e presentes as infinitas possibilidades de agir, não é juridicamente válida a opção desse entendimento, ao exigir que o ato da autoridade fosse, apenas, e centrado nessa ocorrência, um ato de favorecimento da empresa para obtenção das contratações. Nesse sentido, há que se ter em mente, inicialmente, que o tipo do artigo 317 'caput' do Código Penal, ao prever como ato de corrupção a ação do funcionário público de 'solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal', não impõe que o ato da autoridade pública sequer seja ilícito, e, mais, sequer exige que seja praticado qualquer ato pela autoridade. O Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre o tema várias vezes, v.g.: 'Corrupção passiva. Tipifica o crime o recebimento de vantagem indevida. É irrelevante que o ato funcional sobre que versa a venalidade seja licito ou ilícito'. (RC. Nº 1290/RJ). Vale dizer, perseguindo o tipo do artigo 317 do Código Penal a probidade de funcionários e a vedação do enriquecimento em razão do exercício da função pública, o tipo penal pune a autoridade pública ainda quando não pratique qualquer ato, ou pratique ato aparentemente lícito, do qual decorra, em qualquer momento, o recebimento para si ou para outrem de vantagem não devida. O ponto fundamental é o uso das qualidades de autoridade pública para amealhar vantagem pecuniária indevida. No mesmo sentido, de não existir uma tarifação, de não existir uma especial qualidade, de não existir um momento específico, ou de não existir uma especial finalidade nos atos a serem praticados pelo funcionário público, também a causa de aumento de pena, ora em debate, prevista no Parágrafo 1º, estabelece expressamente que o ato não seja um ato específico, mas verbis 'qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional'. Ou, em seus exatos termos: 'A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.' Assim, no contexto dos autos, conforme embora se pudesse, apenas para argumentar, que seja uma conduta lícita de ANDRE VARGAS 'manter um relacionamento com Clauir Luiz do Santos (CEF) e com Ricardo Hoffmann, e jantar com eles' (parágrafos 254 e 255), a questão ganha relevo quando esse relacionamento, mesmo que fosse inocente, transmudase para o 'recebimento de valores a título de bonificação de volume pelas produtoras de https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 128 de 317 mídia à LSI e à Limiar tendo como destinatário Andre Vargas' (parágrafo 234, sentença); quando esse relacionamento passa a ser 'uma prospecção de clientes privados por Andre Vargas no Estado do Paraná' (parágrafo 236, sentença); ou quando 'os valores repassados a Vargas eram doações de campanha eleitoral, e que a alocação de bonificação de volume para as empresas LSI e LIMIAR, controladas por ANDRE VARGAS, foi o meio encontrado para o repasse de valores, já que a política empresarial da Borghi Lowe vedava doações a candidatos políticos'. Rememorando-se, ainda, que esses repasses à LSI e LIMIAR foram feitos sem contraprestação de serviços e com notas fiscais falsas, portanto com fraude a lei. Todas essas hipóteses de migração de valores à autoridade, em formas inapropriadas e fraudulentas, mesmo que baseadas em simples contatos profissionais e funcionais do deputado, em jantares e ligações telefônicas, vê-se, foram feitas, não por ANDRÉ ser uma pessoa interessante e sem influência, mas em função de ser um deputado federal com elevado poder de articulação política. Muito pelo contrário, e, além de um deputado federal, de 2011 a 2014, ANDRE VARGAS era Vice-Presidente da Câmara dos Deputados e ainda membro a Comissão de Regionalização da Mídia. Sendo todos esses repasses, envoltos em notas fiscais e tramas contábeis, feitos em função da função publica ostentada pelo deputado, dão margem à ocorrência da corrupção conforme fartamente reconhecido pelos magistrados que me antecederam. Por outro lado, o Código Penal, como visto, para incidência da causa de especial aumento de pena não exige que o ato que se deixa de praticar ou que se pratica tardiamente, tenha como mira sequer auxiliar o corruptor em um momento específico e determinado. O que se pune com a causa de especial aumento do artigo 317, parágrafo 1º, é efetiva deterioração do desempenho das funções do cargo por força da propina recebida. Daí porque prescreve o artigo 317, parágrafo 1º: 'A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de oficio ou o pratica infringindo dever funcional'. No mesmo sentido, precedentes desta 8ª Turma, por ocasião do julgamento de recursos da 'Operação Lava-Jato': ACrim nº 5022179-78.2016.4.04.7000/PR; ACrim nº 5023162-14.2015.4.04.7000/PR, ACrim nº 5023121-47.2015.4.04.7000, dentre outros. 3.3.3. Do contexto probatório - materialidade e autoria 3.3.3.1. Os processos conexos já julgados permitem que se encaminhe conclusão irrefutável no sentido da existência de um cartel com objetivo de fraudar licitações na estatal petrolífera. De tudo o que já foi apurado até hoje, refira-se a pertinência do tema com os processos abaixo relacionados: (1) 5025687-03.2014.4.04.7000/PR (lavagem de dinheiro, evasão de divisas, tráfico de drogas e associação para o tráfico de entorpecentes: caso Posto da Torre/RENÊ, CHATER e outros); (2) 5026243-05.2014.4.04.7000/PR (organização criminosa, operação de instituição financeira não autorizada, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, corrupção: NELMA e outros); (3) 5007326-98.2015.4.04.7000/PR (lavagem de dinheiro: aquisição de apartamento por diretor da Petrobras através de recursos decorrentes de corrupção/CERVERÓ e outros); https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 129 de 317 (4) 5083838-59.2014.4.04.7000/PR (corrupção e lavagem de dinheiro: aquisição dos navios-sonda Petrobras 1000 e Vitória 1000 pela Petrobras/JÚLIO CAMARGO, CERVERÓ e outros); (5) 5083376-05.2014.4.04.7000/PR (organização criminosa, corrupção e lavagem de dinheiro: Caso OAS/JOSÉ ADELMÁRIO e outros); (6) 5047229-77.2014.4.04.7000/PR (lavagem de dinheiro, associação criminosa e uso de documento ideologicamente falso: Caso DUNEL/CHATER e outros); (7) 5026212-82.2014.4.04.7000/PR (lavagem de capitais e organização criminosa: Caso CNCC, SANKO SIDER e SANKO SERVIÇOS/ MÁRCIO BONILHO e outros); (8) 5023162-14.2015.4.04.7000/PR (lavagem de dinheiro, corrupção e peculato: Caso ARGOLO/ JOÃO ARGOLO e outros); (9) 5083258-29.2014.4.04.7000/PR (lavagem de dinheiro, organização criminosa, corrupção e uso de documento falso: Caso Camargo Corrêa/DALTON AVANCINI, EDUARDO LEITE e outros); (10) 5023121-47.2015.4.04.7000/PR (organização criminosa, corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro: Caso BORGHI LOWE/ ANDRÉ VARGAS e outros); (11) 5012331-04.2015.4.04.7000/PR (corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa: Caso SETAL ÓLEO E GÁS (SOG)/ AUGUSTO MENDONÇA e outros); (12) 5083351-89.2014.4.04.7000/PR (corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, uso de documento falso e pertinência à organização criminosa: Caso ENGEVIX/GERSON ALMADA e outros); (13) 5083401-18.2014.4.04.7000/PR (corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, uso de documento falso e pertinência à organização criminosa: Caso MENDES JÚNIOR e GFD/ SÉRGIO MENDES, YOUSSEF e outros); (14) 5039475-50.2015.4.04.7000/PR (corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro: Caso NAVIO-SONDA TITANIUM EXPLORER/JORGE ZELADA, EDUARDO MUSA e outros); (15) 5025692-25.2014.4.04.7000/PR (atribuição de falsa identidade para realização de operação de câmbio e lavagem de dinheiro: Caso DISTRICASH/RAUL SROUR e outros); (16) 5027422-37.2015.4.04.7000/PR (corrupção ativa e passiva: Caso UTCCOMPERJ/RICARDO PESSOA e outros); https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 130 de 317 (17) 5045241-84.2015.4.04.7000/PR (corrupção, lavagem de dinheiro, pertinência à organização criminosa e fraude processual: Caso JOSÉ DIRCEU); (18) 5023135-31.2015.4.04.7000/PR (corrupção, lavagem de dinheiro e pertinência à organização criminosa: Caso PEDRO CORRÊA/PEDRO CORRÊA e outros); (19) 5030424-78.2016.4.04.7000/PR (corrupção, lavagem de dinheiro e pertinência à organização criminosa: Caso GENU/JOÃO CLÁUDIO GENU e outros); (20) 5022179-78.2016.4.04.7000/PR (corrupção, lavagem de dinheiro, pertinência à organização criminosa e obstrução de investigação de organização criminosa: Caso GIM ARGELLO/JORGE ARGELLO e outros). (21) 5083360-51.2014.4.04.7000/PR (organização criminosa, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e uso de documento falso: Caso GALVÃO ENGENHARIA/DARIO GALVÃO e outros). (22) 5013405-59.2016.4.04.7000 (organização criminosa, corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro: Caso SETE BRASIL/MÔNICA MOURA, JOÃO SANTANA e outros). (23) 5051606-23.2016.4.04.7000(corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas: Caso EDUARDO CUNHA). 3.3.3.2. O rol não é exaustivo, mas estes mais de vinte processos, com destaque para aquele tombado sob o nº 5083376-05.2014.4.04.7000/PR (associado ao relacionamento contratual da OAS com a Petrobras), permitem verificar o ambiente de corrupção sistêmica que se instaurou no seio da maior companhia brasileira, onde a influência política, aliada à ambição e ganância de empresários, agentes do mercado paralelo de câmbio e 'lavadores' profissionais de dinheiro, culminaram com desvios de elevada monta em prejuízo não apenas da estatal e também da sociedade. Naquele feito precedente, relacionado à empresa OAS, afora algumas divergências pontuais no Colegiado, foi reconhecida, acima de dúvida razoável, a existência do concerto fraudulento nas obras das refinarias do Nordeste Abreu e Lima RNEST e Presidente Getúlio Vargas - REPAR. No presente caso, uma parte da acusação coincide com os fatos descritos naqueles autos, com a diferença de que aqui há correlação com as verbas que foram destinadas ao Partido dos Trabalhadores. Colho da sentença o seguinte resumo: 158. Segundo a denúncia, vantagens indevidas acertadas em contratos da Petrobrás com o Grupo OAS teriam sido direcionadas ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em razão de seu cargo. 159. Não importa que a Petrobrás seja sociedade de economia mista quando as propinas, segundo a acusação, eram direcionadas a agente público federal. 160. Fosse ainda Luiz Inácio Lula da Silva Presidente da República a competência seria do Egrégio Supremo Tribunal Federal. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 131 de 317 161. Não mais ele exercendo o mandato, a competência passa a ser da Justiça Federal, pois, como objeto da denúncia, tem-se corrupção de agente público federal. 162. Por outro lado, o crime teria sido praticado, segundo a denúncia, no âmbito do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, no qual contratos da Petrobrás com suas principais fornecedoras, como a Construtora OAS, geravam vantagem indevida que eram repartidos entre agentes da Petrobrás e agentes e partidos políticos. 163. O esquema criminoso também envolveria ajustes fraudulentos de licitações entre as fornecedoras da Petrobrás. 164. Há todo um contexto e que já foi reconhecido pelo Tribunal de Apelação e pelos Tribunais Superiores de que esses casos são conexos e demandam análise conjunta, por um mesmo Juízo, sob risco de dispersão da prova. 165. Ilustrativamente, o Egrégio Supremo Tribunal Federal tem sistematicamente enviado para este Juízo processos desmembrados ou provas colhidas relativas a este mesmo esquema criminoso. Para ficar em um só exemplo, cite-se a ação penal proposta contra o ex-Deputado Federal Eduardo Cosentino da Cunha no Inquérito 4146 e que, após a cassação do mandato, foi remetida a este Juízo, onde tomou o nº 505160623.2016.404.7000. 166. Por outro lado, este Juízo tornou-se prevento para estes casos pois a investigação iniciou-se a partir de crime de lavagem de dinheiro consumado em Londrina/PR e que, supervenientemente, foi objeto da ação penal 5047229-77.2014.404.7000 (copia da sentença no evento 847). 167. Destaque-se ainda a conexão estreita da presente ação penal com os crimes que foram objeto da ação penal 5083376-05.2014.404.7000 na qual foram condenados por corrupção e lavagem de dinheiro os dirigentes da OAS JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e Agenor Franklin Magalhães Medeiros pelo pagamento de vantagem indevida e ocultação e dissimulação dela ao Diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa em contratos do Consórcio CONPAR e do Consócio RNEST/CONEST (cópia da sentença no evento 847). Segundo a denúncia, essa mesma contratação e os mesmos acertos de propina teriam gerado créditos que teriam beneficiado o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sendo, portanto, a conexão ainda mais estreita do que a verificada em relação aos demais casos abrangidos na denominada Operação Lavajato. 168. Não tem relevância, para competência, os questionamentos das Defesas de Luiz Inácio Lula da Silva e de Paulo Tarciso Okamoto de que os crimes não teriam ocorrido ou não estariam relacionados ao esquema criminoso que vitimou a Petrobrás. Na definição da competência, não cabe análise de mérito, mas somente dos termos da imputação. 169. Portanto, a competência é da Justiça Federal, pela existência de crimes federais, e especificamente deste Juízo pela prevenção e pela conexão e continência entre os processos que têm por objeto o esquema criminoso que vitimou a Petrobrás investigado no âmbito da assim denominada Operação Lavajato, entre eles a referida ação penal 5083376-05.2014.404.7000, mas também outras em andamento. Contribuíram decisivamente questões políticas relacionadas ao processo eleitoral, porque não apenas o enriquecimento pessoal era buscado pelos diversos réus já condenados - inclusive em segundo grau de jurisdição -, mas também a obtenção de recursos para financiamento de campanhas político-partidárias e para apoio político de um projeto de governo. Isso é o que foi possível apreender de todos esses processos, onde restou demonstrado o financiamento de partidos e agentes políticos com recursos obtidos ilicitamente (contratos celebrados a partir de licitação fraudada), recheando os cofres de várias agremiações partidárias (com doações oficiais - caixa 1 - ou doações inoficiosas caixa 2), violando o caráter republicano e democrático dos pleitos eleitorais. 3.3.3.3. Em diversos dos enumerados processos, ficou comprovada a ocorrência de doações eleitorais feitas por empreiteiras ou por empresas intermediárias. O https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 132 de 317 fato acabou assumido por acusados que firmaram termo de colaboração. Há outros condenados que confessaram ter feito doações em favor de partidos políticos, justificando suas condutas como sendo vítimas de concussão. Ainda, há outros réus que restaram condenados em face de doações ilícitas. O exame das diversas provas existentes deve ser compreendido dentro deste ambiente, inclusive no tocante aos atos administrativos praticados pelos servidores públicos. Sobre o tema, destaco trecho do interrogatório do corréu JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, que confirma parte daquilo que restou acima asseverado: JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu fui procurado pelo senhor João Vaccari e ele me falou que tinha um pagamento de 1% para o PT, isso foi diretamente comigo. Juiz Federal:- Nessa obra da Rnest? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Na obra da Rnest. Na Repar, excelência, eu não me recordo, mas pode ter sido também. Juiz Federal:- Esse dinheiro ia para o senhor João Vaccari pessoalmente ou ele intermediava pagamentos a alguém? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Esse dinheiro, existia uma metodologia de quando em quando, de vez em quando nós estávamos devendo para pagar e ele determinava de que forma seria feito esse pagamento, várias vezes via doações oficiais tanto ao diretório nacional do partido dos trabalhadores como a outros diretórios, ou, em alguns casos, para alguns políticos. Juiz Federal:- Não sei se eu entendi, havia uma espécie de conta corrente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sim. Juiz Federal:- Conta corrente não bancária, uma conta corrente... JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não, informal, de débitos e créditos. Juiz Federal:- E o que gerava créditos nessa conta corrente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Os créditos eram a cada faturamento recebido, a cada fatura recebida, se aplicava o percentual de 1% e isso era contabilizado informalmente, e de quando em quando era feito um acerto com o senhor João Vaccari e ele nos dizia, nos orientava a forma que devíamos pagar. Juiz Federal:- Somente essas obras da Petrobras, Conpar e do Rnest, geraram esses créditos ou outras também? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, outras também. Da Petrobras? Juiz Federal:- É. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Outras também. Juiz Federal:- Fora da Petrobras também? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Fora da Petrobras também. Juiz Federal:- Isso o senhor tem, mais ou menos, sabe dizer quando isso começou, quando esse procedimento começou, aproximadamente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- 2004, 2003, 2004, excelência, acredito que em 2004 no nosso caso. No que interessa no ponto, há prova acima de dúvida razoável de que a empresa OAS pagava propina para dirigentes da PETROBRAS, bem como destinava parte desses recursos para o Partido dos Trabalhadores (PT), utilizando-se, para tanto, de conta corrente informal dos valores que seriam destinados para aquela agremiação política, segundo a orientação de seus dirigentes. AGENOR FRANKLIN, dentro deste mesmo contexto, confessou a sua atuação ilícita e explicou como e quando o grupo OAS iniciou sua participação nos contratos com a PETROBRAS, em particular a partir do estreito vínculo que JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO mantinha com o ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA (evento 869 - termotranscdep2): https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 133 de 317 Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Eu não sei, excelência, eu não sei, só sei que Léo tinha uma forte ligação, eu diria uma ligação estreita com o ex-presidente Lula, que isso remonta dos tempos de sindicato, então era uma relação muito forte, e todos nós na empresa sabemos dessa relação forte, agora, ele deve ter procurado certamente os cardeais do partido, não sei quem foi, ele não me falou, ele não me falou. Juiz Federal:- Seguindo em frente, pelo que eu entendi o senhor está falando aí da obra Repar, aquele que virou o consórcio Compar, é isso? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Compar. Juiz Federal:- Tá. Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Eu quero também registrar que nós não tratamos, não oferecemos nada de vantagens indevidas para qualquer agente público ou político, até porque nós estávamos iniciando naquele momento, não é um defesa, mas é um registro. Juiz Federal:- E, seguindo em frente, a OAS começou a participar em outras licitações desses ajustes? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Aí o que acontece, esse grupo de 9 empresas a partir desse momento passou a ser 10 com a inclusão da OAS, e a partir daí, logo em seguida, virou um grupo de 16 empresas, por que esse grupo aumentou tanto? Pelo volume de investimentos que a Petrobras tinha no seu planejamento estratégico para investir na área de refino, as refinarias brasileiras estavam há mais de 20 anos sem investimentos, então em função disso houve um fluxo, uma demanda muito grande de obras, e esse clube que era de 10 empresas, era 9, passou a 10, então 16. Juiz Federal:- E o senhor passou a participar ou alguém da OAS passou a participar desses acertos em licitação em outros contratos? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Olha, nós tivemos, eu participei de algumas, alguns ajustes, e teve um colega meu também que dava sequência a esses ajustes, eu me lembro que logo em seguida teve um grande pacote de obras, de obras tanto no Comperj quanto na Rnest, e se quisermos já mudar para a Rnest, se o senhor me permitir... Juiz Federal:- Sim. Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Completar a minha descrição. Isso foi em 2007. Em 2008 teve algumas reuniões desse grupo de empresas, de 16 empresas, eu me lembro que eu conversei, tive uma conversa prévia com o Márcio Faria no sentido de que nós nos habilitássemos para irmos juntos, nós e a Odebrecht, em alguns pacotes a serem definidos na Rnest, estaria mais distante. Juiz Federal:- Na Rnest, sim. Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- E, assim, decidimos que se tivesse algum pacote na Rnest nós iríamos juntos, por que definimos com a Odebrecht? Porque na verdade existia naquela oportunidade uma afinidade empresarial e até de pessoas também. AGENOR FRANKLIN também confirmou o pagamento de propinas, dando coerência ao afirmado por JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e ratificou aquilo que acima restou afirmado: Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Rnest 2% também, ficou contingenciado. Juiz Federal:- E em relação a esse contrato, o senhor já tinha mais informação a respeito de como isso era, quem eram os destinatários, como era dividido? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Excelência, o que ficou claro a partir do momento que nós assinamos o contrato da Repar é que os agentes da Petrobras que atuavam nesse trabalho eram as diretorias de serviço e abastecimento, no caso o senhor Renato Duque, diretor de serviços, e o senhor Paulo Roberto, abastecimento, aliado ao Pedro Barusco que era uma pessoa de gerência executiva, quase ao nível de diretor, que atuava na área de serviços, então esses três aí ficou claro, embora nesses dois contratos nós da OAS não tratamos com nenhum deles esses valores, por quê? Porque tinha uma liderança forte que era a liderança da Odebrecht, a Odebrecht é uma empresa que já atuava nesse setor há muito mais tempo do que nós, então esses agentes tinham a https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 134 de 317 preferência de atuarem com a Odebrecht do que com uma empresa iniciante, que éramos nós, não estou querendo tirar a nossa responsabilidade do fato. Juiz Federal:- O senhor mencionou que havia uma destinação política também. Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Tinha. Juiz Federal:- O senhor pode esclarecer? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- No caso da Rnest ficou muito claro e foi dito por Márcio Faria, e assim foi feito, que ele havia estabelecido um valor absoluto, ao invés de ele falar em percentual por se tratar de uma obra de grande valor, esses dois contratos da Rnest totalizaram 4,7 bilhões aproximadamente, nós tínhamos 50%, mas a liderança era da Odebrecht, e ele, Márcio, havia acertado um valor de 72 milhões para pagamento de vantagens indevidas onde cada empresa arcaria com 36 milhões; desses 72 o consórcio, através de distribuição de dividendos, distribuiu para a Odebrecht 36, para a OAS 36, onde quais seriam as responsabilidades de cada empresa? A Odebrecht se encarregou das responsabilidades com relação aos agentes da Petrobras, onde se chamava que tinha casa 1, casa 2, eu entendi, não me foi dito, mas era muito perceptível que casa 1 era a diretoria de serviços e casa 2 a diretoria de abastecimento, que já tinha uma relação antiga de confiança, de segurança, e por conforto tanto da parte da Odebrecht por conta desses agentes da Petrobras, eles continuaram preservando da forma que vinha sendo feito. (...) Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Então eu estou falando dos 36 milhões que ficou a nosso cargo, então 13 milhões e meio foi determinado pelo líder do consórcio, depois da conversa com o Janene, que seria para o PP, 6 milhões e meio seria para o PSB, campanha de Eduardo Campos, 2010, ao governo de Pernambuco. Márcio me apresentou ao Aldo Guedes na sede da Odebrecht que fica nessa torre anexa ao shopping Eldorado, e naquela oportunidade ficou acertado que nós pagaríamos, a OAS pagaria 6 milhões e meio através de fornecedores para a campanha de 2010 do Eduardo Campos, PSB. Em conversa com Léo ele me disse 'Olha, eu vou estar com Fernando Bezerra e vou ratificar isso aí, vou ver como é que é', a informação que eu tive depois, de Léo, que ele falou 'É para proceder dessa forma realmente', então procede a orientação dada por Márcio Faria, então... Juiz Federal:- E para a diretoria de serviços, o senhor tem conhecimento se teve pagamento? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Aí é onde está, 13 milhões e meio mais 6 milhões e meio totalizam 20, para os 36 sobraram 16 milhões para o PT, e assim foi feito, Léo esteve em contato com João Vaccari e ficou decidido que 16 milhões de reais, por conta da nossa parte na Rnest, seriam para o PT. É forçoso reconhecer a existência de fraude a licitações e o pagamento de propinas pela empresa OAS Empreendimentos em favor de partidos políticos, de agentes e servidores públicos, bem como a participação de intermediados (lavadores profissionais de dinheiro), seja porque estes réus são confessos no ponto, seja porque outros envolvidos em diversas ações penais relacionadas também confessaram a prática dos crimes mediante cartelização de empreiteiras, como pagamento de vantagens indevidas para partidos políticos, funcionários públicos (na acepção penal do termo - art. 327, CP), agentes do mercado ilícito de câmbio, agentes políticos, entre outros. O presente feito tem como objeto fatos específicos. Os crimes de cartel e de fraude às licitações não são ora apurados, sendo imputados apenas os delitos de corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 3.3.3.4. Cabe destacar, do julgamento anterior (Apelação Criminal nº 5083376-05.2014.4.04.7000/PR), as breves referências ao cartel formado por grandes empreiteiras, destinado a fraudar licitações na Petrobras. Segue no ponto o voto condutor, aplicável inteiramente no presente feito: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 135 de 317 3.1.1. Especificamente em relação ao presente feito, a denúncia narra que os administradores e agentes de empresas integrantes do Grupo OAS e de consórcios de que participaram promoveram, constituíram e integraram organização criminosa, associandose entre si e com administradores de outras empreiteiras, de forma estruturalmente ordenada, de modo permanente e com divisão de tarefas, com o objetivo de praticar crimes e obter vantagens ilícitas. Tais agentes teriam formado acordos, ajustes e alianças entre os ofertantes, com o objetivo de fixarem artificialmente preços e obterem o controle do mercado de fornecedores da Petrobras, praticando, assim, o crime de cartel previsto no artigo 4º, II, 'a' e 'b', da Lei nº 8.137/90. Os integrantes da organização criminosa teriam, também, segundo a inicial, praticado crimes contra as licitações, pois, mediante tais condutas, frustraram e fraudaram, por intermédio de ajustes e combinações, o caráter competitivo de diversos procedimentos licitatórios da estatal com o intuito de obter vantagens decorrentes da adjudicação do objeto da licitação. Para facilitar a prática de tais delitos, os administradores e agentes de empresas integrantes do Grupo OAS teriam, também, oferecido e prometido vantagens indevidas aos então Diretores de Abastecimento e de Serviços da Petrobras, notadamente Paulo Roberto Costa e Renato Duque, para determiná-los a praticar e omitir atos de ofício, o que efetivamente teria ocorrido (corrupção ativa e passiva). Os administradores e agentes de empresas integrantes do Grupo OAS teriam, ainda, de acordo com a denúncia, se valido dos serviços do operador ALBERTO YOUSSEF e de WALDOMIRO DE OLIVEIRA para praticar crimes de lavagem de dinheiro, mediante a simulação de contratos de prestação de serviços com as empresas MO Consultoria, Empreiteira Rigidez e RCI Software e repassando os recursos ilícitos obtidos com os crimes antecedentes de cartel e fraude às licitações. 3.1.2. Os crimes de cartel e de fraude às licitações não são objeto do presente feito, no qual são imputados apenas os delitos de organização criminosa, corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro. Quanto ao crime de uso de documento falso, embora imputado na denúncia, os acusados foram absolvidos em sentença e não houve insurgência específica do Ministério Público Federal. Cabe tecer, no entanto, para a melhor compreensão dos fatos, alguns esclarecimentos sobre o suposto cartel. De acordo com a denúncia, desvelou-se a existência de um grande esquema criminoso envolvendo a prática de crimes contra a ordem econômica, corrupção e lavagem de dinheiro, com a formação de um grande e poderoso Cartel do qual participaram as empresas OAS, ODEBRECHT, UTC, CAMARGO CORREA, TECHINT, ANDRADE GUTIERREZ, MENDES JÚNIOR, PROMON, MPE, SKANSKA, QUEIROZ GALVÃO, IESA, ENGENIX, SETAL, GDK e GALVÃO ENGENHARIA. Esse esquema possibilitou que fosse fraudada a competitividade dos procedimentos licitatórios referentes às maiores obras contratadas pela PETROBRAS entre os anos 2004 e 2014, majorando ilegalmente os lucros das empresas em centenas de milhões de reais. Essas empreiteiras, assim, formariam o que passaram a chamar de 'clube', ajustando previamente qual delas iria sagrar-se vencedora das licitações da Petrobras, manipulando preços apresentados nos certames, sem concorrência real, para serem contratadas pelo maior preço possível admitido pela estatal. Através dessas condutas, a OAS teria vencido licitações referentes à Refinaria Getúlio Vargas (REPAR) e à Refinaria Abreu e Lima (RNEST). O colaborador Augusto Ribeiro de Mendonça Neto confessou a existência do 'clube', as regras do jogo, a distribuição de obras segundo os interesses das diferentes empreiteiras e o arranjo não apenas de quem venceria, mas também dos preços que seriam ofertados. Augusto testemunhou em juízo (áudio nos eventos 177, VÍDEO6 a VIDEO8, e 786), relatando que o 'clube' surgiu no final dos anos 1990, quando foi reunido um grupo de empreiteiras que visavam obter melhores condições contratuais perante a Petrobras. Inicialmente, o grupo era formado por nove empresas (Camargo Correa, UTC, Mendes https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 136 de 317 Júnior, Odebrecht, Technint, Andrade Gutierrez, Promon, MPE e Setal-SOG), que criaram um sistema de proteção e fizeram uma combinação de não competirem entre si. Segundo o depoente, nessa fase inicial, o objetivo é que se criasse um sistema de proteção e combinaram de não competir entre si. Então que se havia uma licitação 8 não competiriam com aquela que estava elegida para participar daquela licitação, vencer aquela licitação. Esta ação começou a ter efetividade a partir do ano de 2004, quando este grupo conseguiu fazer um acordo com as diretorias da Petrobrás, de modo que as licitações fossem mais dirigidas somente ao grupo. A partir daí, as ações passaram a ter efetividade (destaquei). O acordo teria sido feito com os diretores das áreas de abastecimento e de serviços da Petrobras, respectivamente, Paulo Roberto Costa e Renato Duque, que receberiam vantagens indevidas mediante o compromisso deles de convidarem apenas as empresas participantes do grupo. O coordenador era Ricardo Pessoa. Referiu que a OAS passou a integrar o 'clube' em 2006, assim como a Skanska, a Queiroz Galvão, a IESA, a Engevix, a GDK e a Galvão Engenharia. O grupo teria, inclusive, por volta dos anos de 2007/2008 redigido as regras do grupo como se fosse um regulamento de um campeonato esportivo (acostado no evento 01, OUT12, da ação penal originária), distribuído às companhias. Quanto ao seu conhecimento da participação da OAS em alguns dos certames, relatou (transcrição no evento 248): [...] 219. Ministério Público Federal:- Aqui consta na parte superior, na direita dele, reunião de vinte e nove do oito. Depoente:- Sim. Ministério Público Federal:- Vinte nove do oito, o senhor saberia dizer o ano? Depoente:-Eu acredito que seja 2007. Ministério Público Federal:- Certo. Consta lá no final da página, HCC e uma anotação grifada, para Setal e OAS, o que seria essa anotação, senhor Augusto? Depoente:- Eu acredito que seria uma obra da... não, é uma obra do Comperj, que nós entraríamos com a OAS. Ministério Público Federal:- Essas ordens ali seriam as ordens para vencer os certames ou não teria esse comprometimento ainda? Depoente:- Sim, aqui no nosso caso, nós seríamos o primeiro HCC e essas empresas dariam cobertura. Ministério Público Federal:- Seriam propostas fictícias só? Depoente:- Exatamente. Ministério Público Federal:- Ali do lado também, consta a OAS no HDT, como 4ª opção, a quarta na ordem de... Depoente:-Isso. Ministério Público Federal:- Seria ali para OAS e Setal, forneceriam uma proposta de cobertura só? Depoente:- Exato. [...] 415. Ministério Público Federal:- O senhor em algum momento deixou de concorrer efetivamente com a OAS em virtude de reuniões do clube ou apresentou propostas de cobertura em virtude da reunião do clube com a OAS? Depoente:- Sim. Nós, como participantes, respeitamos as vezes que a OAS estaria participando para vencer, então é provável que isso tenha acontecido. [...] 469. Juiz Federal:- Na folha 19 da denúncia há referência aqui ao consórcio Odebrecht, OAS, UTC, que também teria participado do certame, com uma proposta de valor superior à do consórcio que o senhor integrava, e também aqui uma referência ao consórcio Queiroz e IESA, que também apresentou uma proposta com valor superior ao que o seu consórcio apresentou, essas propostas visavam dar cobertura à sua empresa? Depoente:- Sim, senhor. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 137 de 317 Tais declarações, como se verá, foram corroboradas pelos demais colaboradores, especialmente Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef e Júlio Gerin de Almeida Camargo, que esclareceram outros aspectos das atividades relacionadas ao 'Clube' e às obras da Petrobras. Também foram apreendidos e apresentados elementos que se somam à prova testemunhal, como, por exemplo, os contratos das obras, os dados fornecidos pelo TCU e pela Estatal, os documentos elaborados nas reuniões de ajuste entre as empreiteiras e suas preferências, bem como a folha com as regras do funcionamento do cartel redigidas na forma de um campeonato esportivo. Por tudo isso e pelo que foi considerado na sentença condenatória (ponto II.15), é possível firmar um juízo de certeza quanto à ocorrência destes fatos e o contexto em que se deram os crimes de corrupção ativa e passiva. 3.3.4. Da corrupção em favor do Partido dos Trabalhadores 3.3.4.1. Como demonstrado, a existência de desvio de valores da Petrobras, por meio de licitações fraudadas e contratações dirigidas, é fato inequívoco, inclusive em relação à destinação de parte dos valores para financiar o Partido dos Trabalhadores ou cobrir despesas anteriores. A atuação do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA decorreu do amplo apoio que deu para o funcionamento deste sistema ilícito de captação de recursos, com a interferência direta na nomeação de dirigentes da estatal, os quais deveriam obter recursos em favor dos partidos aliados e, mais especificamente, ao Partido dos Trabalhadores. Há cristalina comprovação da capacidade de influência do ex-Presidente no processo de nomeação dos agentes políticos da Petrobras e sua ciência a respeito do esquema criminoso. Apesar de sua negativa com relação a isso, há clara delineação dos bastidores de indicações e os movimentos de agremiações partidárias na tarefa de manter pessoas de 'confiança' que pudessem levar adiante o projeto de financiamento político. O tema foi muito bem abordado na sentença recorrida, a cujos fundamentos, no que importa, faço expressa referência: 720. Provado, nos termos da sentença, o pagamento de propina de R$ 108.809.565,00 e USD 35 milhões pelo Grupo Odebrecht à Diretoria de Abastecimento e à Diretoria de Engenharia e Serviços da Petrobrás, envolvendo vários contratos entre a Odebrecht e a Petrobrás. 721. Como ali se verifica, especialmente nos itens 113 a 174 da sentença, foi possível rastrear documentalmente parte da vantagem indevida para os agentes da Petrobrás pelo Grupo Odebrecth. 722. Com efeito, o Grupo Odebrecht pagou vantagem indevida, entre 06/2007 a 08/2011, de USD 14.386.890,04 mais 1.925.100,00 francos suíços aos agentes da Petrobrás, especificamente USD 9.495.645,70 mais 1.925.100,00 francos suíços a Paulo Roberto Costa, USD 2.709.875,87 a Renato de Souza Duque e USD 2.181.369,34 a Pedro José Barusco Filho. Para tanto, servia-se de contas secretas em nome de off-shores e que controlava direta ou indiretamente em diversos países no exterior. De tais contas, foram realizadas transferências milionárias para contas secretas em nome de off-shores controladas pelos Diretores da Petrobrás Renato de Souza Duque e Paulo Roberto Costa e pelo gerente Pedro José Barusco Filho. 723. Como se verifica na sentença (itens 408-564), entre os contratos que deram origem aos pagamentos de propina, encontram-se os contratos da Petrobrás com os Consórcios CONPAR e RNEST/CONEST na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST). https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 138 de 317 724. Embora se trate de pagamentos da Odebrecht, era a empresa consorciada com a OAS nos dois empreendimentos. 725. Além das provas materiais do pagamento de vantagem indevida nos contratos da Petrobras com os Consórcios CONPAR e RNEST/CONEST na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), foi produzida prova oral nestes autos. 726. Com efeito, foram ouvidos em Juízo algumas testemunhas que confirmaram a existência do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás e que envolvia os ajustes fraudulentos de licitações e o pagamento de vantagem indevida a agentes da Petrobrás, a agentes políticos e a partidos políticos. Prosseguiu o magistrado, então, com a prova testemunhal produzida. Iniciou com os relatos dos colaboradores Delcídio do Amaral Gomez, Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, Dalton dos Santos Avancini e Eduardo Hermelino Leite: 729. Delcídio do Amaral Gomez, Senador da República, ao tempo dos fatos, celebrou acordo de colaboração que foi homologado pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal. Em Juízo (evento 388), declarou, em síntese, que havia uma distribuição de cargos pelo Governo Federal no âmbito da Administração Pública Federal direta ou indireta. Tal distribuição abrangia a Petrobrás. Segundo a testemunha, os indicados aos cargos na Petrobrás tinham uma obrigação de arrecadar propina para os partidos políticos, o que era do conhecimento, embora não em detalhes, do então Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. Apesar das afirmações do ex-Senador, ele também declarou que não chegou a tratar diretamente deste assunto com o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva pois 'não tinha essa relação próxima com o presidente para ter esse tipo de diálogo com ele'. 730. Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, gestor das empresas que compunham o Grupo Setal ao tempo dos fatos, também prestou depoimento em Juízo (evento 388). Também ele celebrou acordo de colaboração e que foi homologado por este Juízo. Foi ele condenado por crimes de corrupção e lavagem na ação penal 5012331-04.2015.4.04.7000, pelo pagamento de vantagem indevida e ocultação e dissimulação de produto do crime, em contratos com a Petrobrás nos Consórcios Interpar e CMMS envolvendo obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e na Refinaria de Paulínia (REPLAN), com cópia da sentença no evento 847. 731. Em Juízo, confirmou que havia um grupo de empreiteiras, da qual a Setal e a OAS faziam parte, que periodicamente se reuniam e ajustavam fraudulentamente entre elas quem teria a preferência em cada licitação da Petrobrás. As empresas destituídas da preferência se comprometiam a não participar das licitações ou em apresentar propostas não competitivas. 732. Também confirmou o pagamento de vantagem indevida nos contratos da Petrobrás a agentes da Petrobras, especificamente ao Diretor Renato de Souza Duque e ao gerente Pedro José Barusco Filho, da Área de Serviços e Engenharia, e ao Diretor Paulo Roberto Costa, da Área de Abastecimento. Declarou que parte dos recursos acertados com o Diretor Renato de Souza Duque foram destinados ao Partido dos Trabalhadores ('eram valores que o Duque, em vez de pagar a ele, eu paguei ao Partido dos Trabalhadores a pedido dele'). 733. O dirigente do Grupo Setal negou, porém, ter conhecimento de solicitação ou pagamento de vantagem indevida ao então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 734. Dalton dos Santos Avancini era Presidente da Construtora Camargo Correa ao tempo dos fatos e também celebrou acordo de colaboração e que foi homologado por este Juízo. Foi ele condenado por crimes de corrupção e lavagem na ação penal 508325829.2014.4.04.7000, pelo pagamento de vantagem indevida e ocultação e dissimulação de produto de crime, em contratos com a Petrobrás para obras na Refinaria Getúlio Vargas (REPAR) e na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), com cópia da sentença no evento 847. 735. Em depoimento em Juízo (evento 388), confirmou que havia um grupo de empreiteiras, da qual a Camargo Correa e a OAS faziam parte, que periodicamente se https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 139 de 317 reuniam e ajustavam fraudulentamente entre elas quem teria a preferência em cada licitação da Petrobrás. As empresas destituídas da preferência se comprometiam a não participar das licitações ou em apresentar propostas não competitivas. 736. Também confirmou o pagamento de vantagem indevida nos contratos da Petrobrás a agentes da Petrobras, especificamente ao Diretor Renato de Souza Duque e ao gerente Pedro José Barusco Filho, da Área de Serviços e Engenharia, e ao Diretor Paulo Roberto Costa, da Área de Abastecimento. O montante seria de 1% sobre o valor dos contratos para cada Área. Afirmou que era dito que parte dos valores era destinado a agremiações políticas que sustentavam os diretores, no caso o Partido dos Trabalhadores e o Partido Progressista, respectivamente, mas que ele não tinha conhecimento direto sobre esse fato ('não tinha uma pessoa específica, excelência, como tínhamos acordo se falava pelo próprio mercado, pessoas do mercado, que existia, esse valor era distribuído, até pelos nossos, pelas pessoas que a gente usava como os agentes, quer dizer, o Youssef falava que era em nome do PP que ele falava e o Júlio Camargo que os valores iam para o Partido dos Trabalhadores, que era da diretoria de serviços'). 737. Eduardo Hermelino Leite, Diretor de Óleo e Gás da Camargo Correa, na época dos fatos, e em situação similiar a Dalton dos Santos Avancini, com acordo de colaboração e condenação criminal na ação penal 5083258-29.2014.4.04.7000, confirmou, em síntese, os mesmos fatos por ele, Dalton dos Santos Avancini, declarados em Juízo, ou seja, os acertos fraudulentos de licitação e os pagamentos de vantagens indevidas em contratos da Petrobrás aos agentes da Petrobrás e a destinação parcial delas aos partidos políticos (evento 388). 738. Nenhum dos executivos da Camargo Correa afirmou, porém, ter conhecimento de solicitação ou pagamento de vantagem indevida ao então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A sentença destacou, na sequência, o depoimento da testemunha Pedro da Silva Correa de Oliveira Andrade Neto, o qual, assim como Delcídio do Amaral, fez referência mais direta ao papel do ex-Presidente: 739. Pedro da Silva Correa de Oliveira Andrade Neto foi ouvido em Juízo como testemunha (evento 394). Ele foi condenado por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro na ação penal 5023135-31.2015.4.04.7000 (cópia da sentença no evento 847). 740. Exerceu o mandato de deputado federal até a cassação dele em 15/03/2006 em decorrência das investigações da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios. Era um dos líderes do Partido Progressista. Em Juízo, afirmou que, mesmo sem um acordo de colaboração, pretendia dizer a verdade e colaborar com a Justiça. 741. Em seu depoimento, ele descreveu o processo de nomeação de Paulo Roberto Costa para a Diretoria de Abastecimento da Petrobrás. Declarou que ele foi indicado pelo Partido Progressista ao cargo e que houve muita resistência do Conselho de Administração da Petrobrás, o que teria sido vencido somente mediante a intervenção pessoal do então Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e após o Partido Progressista, com aliados, ter concordado em desobstruir a pauta da Câmara. De passagem, destaque-se que o Ministério Público Federal juntou diversas matérias de jornais sobre a obstrução da pauta de votação do Congresso na época da nomeação de Paulo Roberto Costa (evento 724, anexo12 e anexo13). 742. Ainda admitiu que o objeto do Partido Progressista com a nomeação era o de arrecadar recursos para ele. Confirmou a repartição de recursos entre os agentes da Petrobrás e agentes políticos do Partido Progressista. Declarou que, em uma oportunidade, na campanha de 2006, teria ouvido do então Presidente da República afirmação no sentido de que Paulo Roberto Costa estaria atendendo às necessidades financeiras do partido. 743. Transcreve-se trecho: 'Pedro Correa:- Então está bom, tá certo. Então nós fizemos esse entendimento e começamos então a pedir os cargos ao ministro José Dirceu, o que havia consenso, quer dizer, se a gente pedia, diferentemente do que tinha em outro governo, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 140 de 317 delegacias, ministério nos estados, autarquias, gerências, as superintendências, foram ocupadas de uma maneira geral pela CUT, a CUT tinha interesse e foi ocupando, todos esses companheiros do PT que estavam muitos anos fora do governo foram ocupando esses cargos que são normalmente indicados por parlamentares. E aí ficou então os cargos nacionais e nós pleiteamos a diretoria de abastecimento da Petrobras, a diretoria de abastecimento, a gente pediu ministérios, pediu secretaria nacional de assuntos estratégicos do ministério da saúde, pedimos a TBG, pedimos uma diretoria no (inaudível), a diretoria da Anvisa, um fundo de pensão, evidentemente que o interesse sempre foi que nós tivéssemos gente no governo para ajudar o partido a manter o seu poderio político, e aí chegamos no assunto da diretoria de abastecimento da Petrobras; inicialmente o doutor Paulo Roberto, que nós tínhamos conhecido no aeroporto, eu e Janene tínhamos conhecido no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, indicamos ele para a diretoria de abastecimento, mas havia um compromisso do ministro Antônio Palocci com o governo de transição de Fernando Henrique Cardoso de manter o doutor Rogério Manso na diretoria de abastecimento da Petrobras pelo menos 1 ano, então ficou acertado de que daria a uma TBG ao Paulo Roberto e nós íamos conversar sobre a diretoria de abastecimento. A diretoria de abastecimento, o ministro José Dirceu tentou fazer com que nós apadrinhássemos, fizesse parte da cota do nosso partido o doutor Rogério Manso, nós tivemos algumas conversas com o doutor Rogério Manso, mas ele tinha já um compromisso com o José Eduardo Dutra, se dizia que ele tinha um compromisso com ele, então nós não conseguimos fazer um entendimento com ele e pedimos então a saída dele, e conseguimos emplacar o nome de Paulo Roberto Costa. O José Dirceu, como eu disse, o ministro José Dirceu resolvia os assuntos que tinham consenso nas indicações dos partidos aliados, os dissensos só quem resolvia era o presidente Lula, então nós chegamos na diretoria da Petrobras, já tínhamos acertado com o José Dirceu que a indicação seria nossa, que nós íamos indicar o doutor Paulo Roberto Costa, e ele então foi claro em dizer que já tinha esgotado todo o poder que ele tinha, que não tinha mais como ele nomear o Paulo Roberto Costa, e ficou isso definido para que o Lula, o presidente Lula, chegasse a uma conclusão nisso. Aí essa coisa estava demorando 6 meses, nós fizemos uma obstrução na câmara, nós do PP, o PTB e o PL que hoje é o PR, fizemos uma obstrução porque também os partidos estavam sendo cozinhados, como a gente diz, enrolados, não saiam as nomeações, e chegamos a obstruir a pauta da câmara dos deputados com 17 medidas provisórias, durante 3 meses a câmara não funcionava enquanto não se resolvesse a situação das nossas indicações. Juiz Federal:- Só antes de o senhor prosseguir, desculpe, só um esclarecimento, que período foi esse, esses 3 meses? Pedro Correa:- Isso, em 2004. Juiz Federal:- Em 2004? Pedro Correa:- No princípio de 2004, final de 2003, princípio de 2004, o Paulo Roberto foi nomeado em maio de 2004. Então, José Dirceu disse que não tinha como resolver isso e que tinha que ser uma conversa com o presidente Lula, no gabinete dele, e que seria necessária a presença do presidente da Petrobras, doutor José Eduardo Dutra, e foi então quando houve um diálogo, que já foi transmitido diversas vezes, em que o presidente Lula perguntou ao José Eduardo Dutra, que era o presidente da Petrobras, por que o Paulo Roberto não estava sendo nomeado, não tinha sido nomeado, e ele disse que não era ele que nomeava, era o conselho de administração, então Lula perguntou 'E o conselho de administração, por que não nomeia ele?' ele disse 'Porque o conselho de administração é independente', ele disse 'Quem nomeou esse conselho?', ele disse 'A maioria desse conselho foi você, presidente', ele chamava 'você' até porque não tinha essa liturgia do cargo, 'Você Lula que nomeou', ele disse 'Eu posso demitir?', 'Pode', 'Pois diga a eles que se eles não admitirem o Paulo Roberto Costa, não fizerem a nomeação, eu vou demitir o conselho', e aí o José Eduardo Dutra, que tinha uma ligação com o Rogério Manso, disse 'Olha, Lula, não é da tradição da Petrobras estar se trocando diretor', e aí ele disse 'Olha, Dutra, se fosse da tradição nem você era presidente da Petrobras, nem https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 141 de 317 eu o presidente do Brasil, então eu vou dar um prazo de uma semana, se ele não for nomeado nós vamos trocar o conselho e vamos nomear o doutor Paulo Roberto', e ele foi nomeado, 15 dias depois Paulo Roberto era o diretor de abastecimento. Ministério Público Federal:- Nessa reunião, doutor Pedro, com o presidente Lula estava presente o senhor... Pedro Correa:- O ministro José Dirceu, o ministro Aldo Rebelo, o doutor José Eduardo Dutra, eu, o deputado José Janene e o deputado Pedro Henry, e o presidente Lula. Ministério Público Federal:- Certo. De fato ocorreu a nomeação do Paulo Roberto Costa? Pedro Correa:- Ocorreu a nomeação 15 dias depois, nós saímos de lá, já desobstruimos a pauta e as coisas começaram a tramitar, e isso é muito claro, só é pegar o período do... Isso tem registro, tem registro dessa conversa no gabinete do presidente da república como também tem o registro das obstruções que nós fizemos durante 3 meses na comissão, quando 17 medidas provisórias ficaram obstruindo a pauta, não se votava nada, nem fazia nada na câmara enquanto não se desobstruísse a pauta. Ministério Público Federal:- Certo. Qual era a pretensão, qual era o objetivo do partido com a nomeação do Paulo Roberto Costa na diretoria de abastecimento? Pedro Correa:- O objetivo do partido era de fazer favor a empresários para cobrar recursos, para que a gente pudesse manter o partido. Hoje o fundo partidário já está com uma arrecadação bem maior, mas naquela época o fundo partidário era pequeno e o fundo partidário não cobria as despesas do partido, despesa com programa de televisão, despesas... Os encontros dos parlamentares, os encontros do partido, com convenção, então não cobria, então nós tínhamos que procurar os empresários para poder nos ajudar, e na verdade uma diretoria de abastecimento com um orçamento que tinha, 30, 40 bilhões de dólares, evidentemente que isso ia facilitar muito a nossa vida partidária. Ministério Público Federal:- O senhor tem conhecimento se as outras diretorias da Petrobras, a diretoria de serviços e a diretoria internacional foram destinadas a algum outro partido? Pedro Correa:- Todas tinham sido destinadas sim, a diretoria de serviços do doutor Renato Duque foi destinada ao PT, a diretoria internacional... Antes nós tínhamos participado, ainda no governo Fernando Henrique, da indicação do ex-senador Delcídio do Amaral na diretoria de gás e óleo, foi o PMDB quem indicou, depois Delcídio saiu da diretoria, foi ser secretário do governador Zeca do PT no Mato Grosso do Sul e se tornou senador pelo PT; depois, o Renato Duque era indicação do PT, o Nestor Cerveró tinha uma indicação do PMDB com o PT, porque tinha o Delcídio do Amaral mais o Zeca, governador do PT, e mais uma parte do PMDB indicavam o Delcídio do Amaral, então todas as diretorias da Petrobras tinham sempre... A escolha do José Eduardo Dutra tinha sido uma escolha pessoal do presidente Lula, então todas as diretorias tinham sempre o apoio de um partido político, ou de vários partidos. (...) Ministério Público Federal:- Doutor Pedro, nas eleições de 2006, Paulo Roberto Costa já era diretor de abastecimento, houve uma nova pretensão do partido em ter novos cargos no governo? Pedro Correa:- Na verdade em 2005 o partido progressista foi atingido fortemente, o PT e o partido progressista foram atingidos fortemente pelo mensalão, tanto é que eu, o deputado José Janene e o deputado Pedro Henry terminamos como réus e condenados, Janene não foi condenado porque faleceu antes, mas nós perdemos o mandato, eu e Pedro Henry, e fomos condenados na ação 470. Embora eu seja uma testemunha que se questione a credibilidade minha, eu quero dizer que eu fiz política esses anos todos e não tive uma conta no exterior, não aumentei meu patrimônio, ao contrário, eu diminui o patrimônio que o que tenho na vida foi de herança, mas mesmo assim isso não interessa só estou fazendo um adendo, e peço desculpa ao senhor. Mas, o que houve, então em 2005 nós estávamos enfraquecidos e Paulo Roberto Costa viajou, foi à Ásia, Coréia, não sei onde ele esteve, e ele https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 142 de 317 voltou e teve uma pneumonia que ele passou quase 30 dias na UTI, e tinha um gerente executivo dele chamado Alan Kardec que quis tomar o lugar dele e começou a trabalhar então nesse sentido, nós fomos ao presidente Lula, eu, Janene e, para segurar o Paulo Roberto Costa, eu, Janene e Pedro Henry, e inclusive fomos reclamar do presidente a interferência do PMDB, porque o PMDB estava se aproveitando dessa fraqueza nossa, nós éramos companheiros da base aliada, estávamos ajudando o governo, enfrentando o mensalão por conta do governo, e se sabia que não era caixa 2, que sabia que era dinheiro de propina, mas nós fomos lá e fomos reclamar da invasão do PMDB na nossa diretoria, foi quando então o presidente disse 'Olha, essa diretoria é uma diretoria muito grande, tem um orçamento muito grande, e Paulinho...', que ele chamava Paulo Roberto de Paulinho, 'E Paulinho tem me dito que vocês estão muito bem atendidos e que vocês não podem reclamar do que ele está fazendo, estão bem atendidos financeiramente'. Em 2006, na eleição, eu e Janene fomos ao presidente Lula, porque como ele era candidato à reeleição, em toda eleição quem faz política, doutor, o doutor José Roberto Batocchio foi deputado duas vezes, sabe o que é isso, foi companheiro na câmara dos deputados, foi membro da mesma comissão, ele sabe que quando chega na eleição você procura o candidato majoritário para fazer as despesas do partido, e como o candidato majoritário era o Lula, candidato à reeleição em 2006, nós fomos lá atrás de dinheiro, atrás de mascado, para poder elegermos uma bancada maior e, evidentemente, o partido crescer politicamente e ter mais poder, então o Lula voltou a dizer 'Vocês não podem reclamar porque o Paulinho tem me dito que vocês estão muito bem amparados financeiramente e que vão fazer uma eleição muito tranquila, e vão reeleger todos os seus deputados'. Então nós tivemos esse assunto em 2006 e 2005, e houve então uma entrada maior do PMDB, daí o Paulo Roberto Costa ter inclusive desviado uma série de recursos, dessa propina, recursos de propina, que era para ser nosso, ele desvio isso para o PMDB.' Após, foram mencionados os depoimentos dos colaboradores Paulo Roberto Costa, Pedro José Barusco Filho, Nestor Cuñat Cerveró, Alberto Youssef, Fernando Antônio Falcão Soares e Milton Pascowitch: 744. Paulo Roberto Costa, Diretor de Abastecimento da Petrobrás entre 2004 e 2012, também celebrou acordo de colaboração e que foi homologado pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal. Já foi condenado em diversas ações penais perante este Juízo por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro (cópia das sentenças no evento 847). Prestou depoimento em Juízo como testemunha (evento 394). 745. Em seu depoimento em Juízo, confirmou o esquema criminoso sintetizado pelo Juízo nos itens 266-274, retro, com recebimento de vantagem indevida em contratos da Petrobrás com grandes empreiteiras e a repartição dela entre ele e agentes políticos do Partido Progressista. Também declarou que teve conhecimento de que propinas também eram pagas para a Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobrás, desta feita com direcionamento de parte para o Partido dos Trabalhadores. 746. As propinas eram calculadas nos percentuais de 1% a 3% sobre o valor dos contratos ('Não, como eu já mencionei, para o PP era 1% para o PT, às vezes 2%, 1%, dependendo do valor que era dado na licitação, às vezes o PP recebia menos de 1%'). 747. Confirmou ter recebido vantagem indevida da Construtora OAS, inclusive nos contratos relativos à Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e à Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), e que teria tratado inclusive desta questão com os acusados Agenor Franklin Magalhães Medeiros e JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO: 'Ministério Público Federal:- Especificamente no caso da empresa OAS, o senhor se recorda quais eram os executivos responsáveis pela negociação de propinas? Paulo Costa:- Eu tive algumas reuniões aí com o senhor Agenor e poucas reuniões, não sei se uma ou duas, com o Léo Pinheiro, mas o maior contato que eu tinha era com o senhor Agenor. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 143 de 317 Ministério Público Federal:- E com ambos havia a negociação, tratativas de propina, sendo mais precisa, o termo, o assunto propina era mencionado? Paulo Costa:- Eu lembro de reunião com o senhor Agenor, eu lembro de reunião, uma ou mais reuniões que a gente teve lá em São Paulo, eu participei, quem comandou essa reunião foi o José Janene, então o tratamento direto era feito através dele. (...) Ministério Público Federal:- Essa ação trata de alguns contratos, eu vou questionar só se o senhor se recorda se houve pagamento de propina nesses contratos, obra de SBL e carteira gasolina da Repar. Paulo Costa:- Quais são as empresas que participaram? Ministério Público Federal:- OAS e Odebrecht. Paulo Costa:- Essas empresas do cartel sempre teve. Ministério Público Federal:- Sempre teve, mas eu vou, só para detalhar, especificamente nos casos denunciados. Implantação de UHDT e UGH da Refinaria Abreu e Lima, consórcio Rnest/Conest, formado por OAS e Odebrecht. Paulo Costa:- Sim. Ministério Público Federal:- Obra de UDA da Refinaria Abreu e Lima, Rnest também, OAS. Paulo Costa:- Sim. Ministério Público Federal:- Certo.' 748. Admitiu ter conhecido o então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e tratado, em reuniões com ele, de assuntos da Petrobrás: 'Assistente de Acusação:- Rapidamente, excelência, são poucas perguntas. Qual era a relação da testemunha com o ex-presidente Lula? Paulo Costa:- Bom, o presidente Lula era o representante maior aí do país, tivemos algumas reuniões em Brasília sempre acompanhado do presidente da Petrobras ou da diretoria toda, quando tinha algum projeto específico que ele mostrava interesse para desenvolvimento de estado e etc., eu fui algumas vezes lá em Brasília, inicialmente com o presidente José Eduardo Dutra, que já faleceu, e depois também tive algumas reuniões com a participação do José Sergio Gabrielli junto com o presidente Lula, então eram assuntos da corporação que ele tinha interesse de ver em alguns estados, para desenvolvimento dos estados. Assistente de Acusação:- Existem algumas testemunhas, e mesmo a imprensa fala que o presidente Lula chamava o senhor de Paulinho, qual era a sua relação com ele, era próxima, não era, por que ele tinha esse apelido carinhoso para o senhor? Paulo Costa:- Eu nunca tive intimidade com o presidente da república, o presidente Lula, eu não me recordo, posso dizer, afirmar que não existiu de ele usar esse termo em relação a mim diretamente, se ele usou com terceiros aí eu não posso dizer, mas eu pessoalmente, primeiro que eu nunca tive nenhuma reunião eu só com o presidente Lula, como falei sempre tive reuniões com participação do presidente da Petrobras ou da diretoria da Petrobras, e eu não tinha intimidade com o presidente Lula, mas se ele chamava de Paulinho na frente de outros eu não posso lhe dizer, não tenho esse conhecimento.' 749. Negou ter conhecimento, porém, de solicitação ou pagamento de vantagem indevida ao então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 750. Pedro José Barusco Filho, gerente executivo da Área de Serviços e Engenharia da Petrobrás entre 2003 e 2011, também celebrou acordo de colaboração e que foi homologado por este Juízo. Já foi condenado em diversas ações penais perante este Juízo por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro (cópia das sentenças no evento 847). Prestou depoimento em Juízo como testemunha (evento 394). 751. Em seu depoimento em Juízo, confirmou o esquema criminoso sintetizado pelo Juízo nos itens 266-274, retro, com recebimento de vantagem indevida em contratos da Petrobrás com grandes empreiteiras e a repartição dela entre ele, o Diretor Renato de Souza Duque e agentes políticos do Partido dos Trabalhadores ou para o próprio partido https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 144 de 317 representado por João Vaccari. Também declarou que teve conhecimento de que propinas também eram pagas para a Diretoria de Abastecimento da Petrobrás. 752. As propinas eram calculadas nos percentuais de 1% a 2% sobre o valor dos contratos: 'Ministério Público Federal:- E quando havia essa cobrança de propina, qual era o percentual que incidia? Pedro Barusco:- Bom, aí já começa a detalhar, mas, por exemplo, porque a Petrobras tem três áreas de negócios, gás e energia, exploração e produção, chamada EP, e a área de abastecimento, cujo diretor era o diretor Paulo Roberto Costa na época, então quando a diretoria de serviços trabalhava em contratos para a área de abastecimento a propina era normalmente ou quase sempre 2%, até onde eu sabia, até onde eu saiba era 2%, 1% era encaminhado para o diretor Paulo Roberto Costa, e ele que dava andamento a esse 1%, dizia como era a distribuição, e outro 1% vinha para a área de serviços, e aí quem dava, vamos dizer, quem orientava como deveria ser dividido era o diretor Duque, e normalmente esse 1% que vinha para a área de serviços metade era para o partido dos trabalhadores e metade ficava para quem a gente chamava 'casa', que normalmente era o doutor Duque e eu mesmo. Quando os contratos eram para a área de outros diretores, como gás e energia, EP e às vezes através da própria área de serviços, esse percentual de 2% era totalmente, vamos dizer, gerenciado pelo diretor Duque, aí era 1% para o PT e 1% para a casa.' 753. Confirmou ter recebido vantagem indevida da Construtora OAS, inclusive no contratos relativos à Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR). Afirmou ter havido acerto de propina nos contratos da Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), mas que saiu da empresa antes de recebê-la. Declarou que tratava de propina com o acusado Agenor Franklin Magalhães Medeiros e que tinha conhecimento de que João Vaccari tratava a parte do partido com JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO: 'Ministério Público Federal:- Especificamente no caso da empresa OAS, o senhor se recorda quem eram os executivos que tratavam de propina? Pedro Barusco:- É, agora então tem que separar um pouco, tinha empresas cujo agente que tratava, vamos dizer, comigo também tratava com o partido, e tinham empresas que o agente que tratava comigo era diferente e quem tratava com o partido era outro agente, a OAS, eu tratava com o senhor Agenor Medeiros, e acredito que o, porque eu não tenho certeza, não sabia exatamente como, que o João Vaccari tratasse com o senhor Léo Pinheiro direto. Ministério Público Federal:- Mas esse 'acredito' do senhor é baseado em que? Pedro Barusco:- Em conversas, em... Ministério Público Federal:- Alguém relatou para o senhor, o que aconteceu para o senhor acreditar nisso? Pedro Barusco:- Não, porque o Vaccari conversava com os donos das empresas, ele tinha normalmente dentro do escalão das empresas uma interlocução um pouquinho superior à minha. Ministério Público Federal:- Certo. Bom, essa denúncia trata de três contratos, eu gostaria de saber se o senhor negociou propina nesses contratos, HDT - carteira coque da Repar, consórcio Compar formado por OAS e Odebrecht, consta daquela... Pedro Barusco:- Eu acho que teve combinação sim, esse é o típico contrato em que havia combinação. Ministério Público Federal:- Eu vou fazendo outra pergunta aqui enquanto pego a planilha e mostro a planilha com as três. UHDT e UGH da Rnest? Pedro Barusco:- Esse teve combinação, mas eu acabei não recebendo porque quando começou a implementar eu logo depois saí da Petrobras. Ministério Público Federal:- Mas houve o acerto? Pedro Barusco:- Houve. Ministério Público Federal:- Certo. UDA da Rnest. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 145 de 317 Pedro Barusco:- Também houve acerto, UDA.' 754. Nestor Cuñat Cerveró, Diretor da Área Internacional da Petrobrás entre 2003 a 2008, também celebrou acordo de colaboração e que foi homologado pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal. Já foi condenado em diversas ações penais perante este Juízo por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, como na ação penal 508383859.2014.404.7000 (cópia da sentença no evento 847). Prestou depoimento em Juízo como testemunha (evento 395). 755. Em seu depoimento em Juízo, declarou que foi nomeado diretor por indicação política do então Governador Zeca do PT e pela influência do Senador Delcídio do Amaral Gomez. Confirmou que, no cargo de diretor, teve que arrecadar recursos em contratos da Petrobrás para agentes políticos. Também confirmou que recebeu propinas em proveito próprio. Afirmou que, por volta de 2006, por conta do enfraquecimento do Partido dos Trabalhadores pelo escândalo do Mensalão, teve que passar a atender as necessidades do Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB do Senado. Na ocasião, lhe foi informado que o então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha conhecimento e assentido com essa alteração. Posteriormente, perdeu o cargo por influência do PMDB da Câmara, que teria passado a influenciar a área e porque não conseguiria atender compromissos de arrecadação que lhe foram solicitados. Ainda assim foi nomeado Diretor da BR Distribuidora. Segundo informações que lhe foram passadas então por José Eduardo Dutra a sua saída do cargo de Diretor da Área Internacional e a sua nomeação como Diretor da BR Distribuidora seriam de conhecimento do então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Recebeu informações de terceiros de que a nomeação para a BR Distribuidora teria ocorrido pois o acusado teria logrado no passado resolver uma dívida eleitoral do Partido dos Trabalhadores com o Grupo Schahin com a contratação deste para operar um navio-sonda. Já na BR Distribuidora, continuou atendendo compromissos de arrecadação para grupos políticos, tendo citado o Senador Fernando Collor de Mello. 756. Destaque-se que este o episódio envolvendo a quitação de dívida de agentes do Partido dos Trabalhadores mediante a contratação pela Petrobras do Grupo Schahin foi objeto da sentença prolatada na ação penal 5061578-51.2015.4.04.7000 (cópia da sentença no evento 847). 757. Transcreve-se o trecho no qual ele detalha a alteração, em 2006, do partido responsável por seu suporte político e no qual ele declara ter sido informado que era de conhecimento do então Presidente da República: 'Juiz Federal:- E o senhor mencionou que a partir lá de 2006 o senhor foi informado então que o senhor teria que atender também os interesses do PMDB da câmara, isso? Nestor Cerveró:- Do senado. Juiz Federal:- Do senado, perdão, e quem foi o portador dessa informação, o senhor pode repetir? Nestor Cerveró:- Foi na época o ministro Silas Rondeau. Juiz Federal:- Algum parlamentar também? Nestor Cerveró:- Não, aí o ministro Silas Rondeau me levou, me apresentou a quem eu não conhecia pessoalmente, ao grupo do senado que comandava, que era basicamente o senador Renan e o deputado Jader Barbalho. Juiz Federal:- E o senhor mencionou quando o senhor respondeu aqui ao Ministério Público que teriam levado essa informação e não ficou claro, levado essa informação a quem? Nestor Cerveró:- Teriam levado? Juiz Federal:- É, o senhor mencionou que foi lhe indagado se o poder executivo tinha conhecimento desse, que o senhor teria que atender esses compromissos e o senhor mencionou que teria sido lhe dito que teriam levado informação? Nestor Cerveró:- Ah sim, esse grupo me disse que o presidente Lula sabia que eles estavam, passavam a fazer parte do meu apoio também. Juiz Federal:- Isso foi dito ao senhor mesmo? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 146 de 317 Nestor Cerveró:- Foi dito por esse pessoal, esse grupo que eu falei. E me disseram também que o senador Delcídio também já tinha conversado com ele sobre essa divisão de patrocínio. Juiz Federal:- E o que lhe dava segurança, por exemplo, que havia realmente essa divisão de patrocínio? Nestor Cerveró:- Não há nada, é muito na questão de palavra mais da atuação política, mas não há, quer dizer, não existe um compromisso firmado, não há nenhuma garantia desse tipo. Juiz Federal:- O senhor chegou depois a conversar sobre isso, por exemplo, com o senador Delcídio para ver se era isso mesmo, se era (inaudível) com o pessoal? Nestor Cerveró:- Falei, falei. Juiz Federal:- E ele confirmou que havia esse. E eles mencionaram o nome do expresidente? Nestor Cerveró:- Eles mencionaram que já tinha sido comunicado ao presidente que eu era parte do patrocínio deles, gozava do patrocínio, do apoio desses... Juiz Federal:- Quando o senhor fala em patrocínio, o senhor fala em apoio político ou o senhor fala em apoio financeiro também? Nestor Cerveró:- Não, apoio político. Juiz Federal:- Apoio político? Nestor Cerveró:- Apoio financeiro eu é que tinha que dar.' 758. Transcreve-se o trecho do depoimento relativo à sua saída da Diretoria da Área Internacional: 'Ministério Público Federal:- Eu gostaria que o senhor narrasse, senhor Nestor, como que se deu sua saída da diretoria internacional, por que se deu sua saída da diretoria internacional? Nestor Cerveró:- A minha saída se deu porque houve uma pressão muito grande, um grupo de parlamentares de deputados da Câmara, como eu falei, nessa época havia o PMDB, essa época e continua, PMDB da Câmara e PMDB do Senado, o PMDB do Senado foi fortemente enfraquecido com a questão do senador Renan Calheiros, questão da filha dele, ele teve que renunciar ao mandato ao cargo de presidente do senado e o PMDB da Câmara já ganhou uma musculatura muito grande e coincidiu com a questão que foi muito palpitante na época da aprovação da continuação do CPMF, e um grupo de 50 parlamentares, isso me dito até pelo presidente Michel Temer, na época eu tive conversando com ele, do PMDB liderados pelo falecido deputado Fernando Diniz do PMDB de Minas Gerais que resolveram ocupar a diretoria internacional, embora eu tivesse o apoio do PT e do PMDB do Senado, esses 50 deputados que era um grupo muito forte colocou como condição sine qua non que só votariam a favor da votação do CPMF se a diretoria internacional fosse ocupada por um indicado desse grupo, então isso levou, porque isso não é assim, é toda uma negociação, tem os apoios, eu estive conversando com uma série de até deputados desse grupo que me disseram claramente que pra eles não fazia diferença que fosse qualquer um desde que se comprometesse, ainda sim, houve uma demanda em que eu poderia ser indicado por esse grupo desde que eu me comprometesse ao pagamento mensal da ordem de 700 mil dólares para esse grupo, assegurasse o mínimo, um piso, vamos chamar assim, que com isso eles manteriam, quer dizer, mudariam, passaria a ser apoio também pelo PMDB da Câmara, eu não aceitei esse tipo de compromisso, agradeci pelo apoio e tal, mas com isso a pressão foi crescendo que eles iam votar contra, que eles iam votar contra e o presidente embora houvesse um apoio do PMDB que até do senado que tentou, mas como estava enfraquecido, foi e cedeu e o conselho, seguindo instruções do governo, o governo é majoritário no conselho, indicou o meu substituto na diretoria internacional em março de 2008. Ministério Público Federal:- O senhor se recorda se houve alguma obstrução de pauta nessa época? Nestor Cerveró:- Houve o que, desculpe? Ministério Público Federal:- Obstrução de pauta nessa época? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 147 de 317 Nestor Cerveró:- Obstrução de pauta? Ministério Público Federal:- Sim. Nestor Cerveró:- Não, não, me recordo que havia um compromisso de o PMDB da Câmara de caso não fosse feita essa substituição eles votariam contra a CPMF, como foi feita a indicação, votaram a favor da CPMF e depois o senado derrubou a CPMF. Ministério Público Federal:- E depois o senhor passou para a BR distribuidora? Nestor Cerveró:- No mesmo dia. Ministério Público Federal:- Certo. Nestor Cerveró:- No mesmo dia que eu fui nomeado. Ministério Público Federal:- Como que foi essa sua nomeação para a BR distribuidora? Nestor Cerveró:- Eu fui nomeado pela manhã, o conselho de administração da Petrobras que é o mesmo naquela época, era o mesmo, exatamente os mesmos componentes do conselho de administração da BR distribuidora, então a reunião do conselho se fazia de manhã da Petrobras e os mesmos conselheiros à tarde faziam a reunião do conselho da BR, então de manhã eu fui substituído pelo doutor Jorge Zelada na diretoria internacional e a tarde eu fui nomeado diretor financeiro da BR distribuidora por esse conselho. Ministério Público Federal:- Também aqui no seu, enfim, o senhor teve algum apadrinhamento político para ter essa indicação da BR distribuidora? Nestor Cerveró:- Não, aí o que houve foi, eu soube disso pelo falecido presidente da BR, havia sido presidente da Petrobras, o José Eduardo Dutra, que pela manhã eu fui comunicado pelo presidente Gabrielli que eu estaria sendo substituído, que tinha havido uma reunião no dia anterior, essa reunião foi numa segunda feira, essa reunião do conselho, então o Gabrielli me disse que tinha havido uma reunião em Brasília no domingo, acho que foi domingo, no sábado, fim de semana, em que o presidente Lula tenha dito 'Ó, não tem como, tem que substituir amanhã, então o Nestor vai ser substituído' e perguntou, bom, mas isso foi me relatado pelo presidente Dutra, falecido Dutra, por que, porque eu só soube dessa indicação, ninguém me consultou a respeito, quer dizer, não houve nenhum convite, não houve nenhuma consulta se eu queria ser ou não, foi mais ou menos uma compensação por eu ter saído da diretoria internacional e o presidente Lula teria dito, no relato do José, desculpe no presidente Dutra, teria dito 'Bom, mas como é que fica o Nestor?' e nessa época a diretoria, da diretoria financeira da BR estava sem titular, que tinha havido a saída do diretor financeiro, tinha entrado em choque com a Graça Foster que era a presidente da Petrobras e tinha renunciado ao cargo, tinha saído da Petrobras inclusive, então ficou alguns meses a posição vazia, e o Dutra informou 'Olha presidente, a diretoria financeira da BR está sem ocupante' o que o Lula teria dito 'Bom, então se o Nestor estiver de acordo, amanhã o conselho indica o Nestor como diretor financeiro da BR', por isso que a tarde, logo pela manhã o Gabrielli me comunicou que eu estava saindo da diretoria internacional e a tarde para minha surpresa o Dutra foi lá na minha sala, minha secretária falou 'Ó, o presidente Dutra quer falar com o senhor' e ele entrou na minha sala e falou assim 'Vamo bora' e eu falei assim 'Vamo bora para onde, que história é essa?' e ele falou 'Não, vamos, você vai para a BR', porque a BR é no outro prédio, na época era perto do Maracanã, 'Você vai, pô, você foi nomeado, você não está sabendo, diretor financeiro da BR?' eu falei 'Não, ninguém me falou nada' 'Não, ontem o Lula já acertou, você vai hoje a tarde vai ser indicado' e efetivamente à tarde o conselho confirmou meu nome como diretor financeiro. Então no mesmo dia eu deixei de ser diretor internacional da holding e passei a ser diretor financeiro da BR distribuidora. (...) Ministério Público Federal:- É se o senhor tomou conhecimento se esse, conforme consta aqui no depoimento, se essa sua indicação pra BR distribuidora teria alguma relação com o empréstimo, com a questão da sonda vitória 10000 que foi contratada pela Schahin? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 148 de 317 Nestor Cerveró:- Não, desculpe, eu vou contextualizar, o que eu digo no meu depoimento é que eu tive informações, o doutor não falou sobre isso, que isso teria sido uma compensação, um agradecimento pelo fato de em 2006, final de 2006, início de 2007 eu ter conseguido liquidar através da contratação da Schahin Óleo e Gás para operadora da vitória 10000, da segunda sonda que a área internacional contratou e havia uma dívida de campanha em 2006, do PT, isso me foi pedido pelo Gabrielli para que eu resolvesse esse problema, porque eu fui levar ao Gabrielli um problema que o Silas estava me pressionando para liquidar uma dívida do PMDB de 10 ou 15 milhões de reais da campanha de 2006, eu fui pedir ajuda ao Gabrielli e o Gabrielli falou, vamos fazer uma troca, eu me lembro dessa conversa, foi uma conversa só nós dois em que o Gabrielli falou, vamos fazer uma troca, deixa que eu resolvo o problema do Silas e você resolve o problema do PT, eu desconhecia esse problema, aí ele me disse 'O PT tem uma dívida de 50 milhões de reais que foi empréstimo tomado junto ao banco Schahin e você vê o que você pode fazer, eu sei que vocês estão negociando com a Schahin', aí eu chamei o filho dos donos da Schahin, o Fernando Schahin que é diretor da Schahin Óleo e Gás e eu sabia que eles estavam com essa pretensão e falei 'Olha, nós podemos fechar, colocar vocês como operadores da sonda' porque eles já operavam uma sonda aqui na bacia de Campos, 'Desde que a dívida de 50 milhões seja liquidada' ele até reclamou 'Não, mas isso é o banco' eu falei 'Bom, isso aí é problema de vocês, não é problema meu, eu sei que o grupo é o mesmo' e 2 dias depois ou 2 ou 3 dias depois o Gabrielli me ligou e me disse 'Olha, o problema está resolvido, pode ir em frente, e aí me foi dito que essa liquidação, ou seja, ter conseguido liquidar essa dívida teria sido o motivo, ou um dos motivos uma compensação, ou seja, teria sido uma forma de agradecimento pelo fato de eu ter conseguido liquidar essa dívida do PT.' 759. Alberto Youssef também prestou depoimento em Juízo (evento 417). Também ele celebrou acordo de colaboração homologado pelo Supremo Tribunal Federal. Em seu depoimento, declarou que intermediava o pagamento de vantagem indevida entre as empreiteiras e o Diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa e também para agentes políticos do Partido Progressista. Também confirmou os ajustes fraudulentos de licitação entre empreiteiras fornecedoras da Petrobrás. 760. Também ele já foi condenado por corrupção e lavagem por este Juízo (cópia das sentenças no evento 847). 761. A propina era em regra fixada em 1% do valor do contrato. A OAS participava dos ajustes de licitação e também do pagamento da propina. A testemunha tratava com Agenor Franklin Magalhães Medeiros pela OAS. Declarou ter conhecimento de que também havia pagamento de propina à Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobrás e que parte dos valores eram destinados ao Partido dos Trabalhadores. 762. Confirmou ainda o pagamento de propinas nos contratos mencionados na denúncia, envolvendo a Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e a Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST). 763. Confirmou que utilizou as empresas de fachada MO Consultoria e Empreiteira Rigidez para receber e repassar os recursos de propinas, inclusive nesses contratos. 764. Declarou não ter conhecimento de solicitação ou pagamento de vantagem indevida ao ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. 765. Transcreve-se trecho: 'Ministério Público Federal:- Essa presente ação penal faz referência a três contratos específicos, o primeiro deles um contrato assinado em 2007 com aditivos pelo menos até 2012, que é o contrato da Petrobras com o consórcio Compar, formado por OAS, Odebrecht e UTC, a execução de obras na Repar. O senhor se recorda se nesse contrato específico houve pagamento de propina? Alberto Youssef:- Sim, eu me recordo, nessa obra específica quem tratou diretamente foi o senhor José Janene e eu me lembro que eu recebi esses valores na UTC Engenharia. Ministério Público Federal:- Qual foi o percentual que incidiu? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 149 de 317 Alberto Youssef:- Não lembro, mas acho que ficou acertado acho que em 10 milhões ou 20 milhões, alguma coisa assim nesse sentido. Ministério Público Federal:- O segundo e o terceiro contrato tratados nessa denúncia foram assinados em 2009 com aditivos até pelo menos 2012, contratos da Petrobras com o consórcio Rnest/Conest, formado por OAS e Odebrecht, para obras na Refinaria Abreu e Lima, Rnest. O senhor se recorda se neste contrato específico houve pagamento de propina? Alberto Youssef:- Houve. Nesses contratos inicialmente começou com o senhor José, ele ainda estava bem de saúde, e aí acabou terminando comigo, e aí foi onde eu me reuni com o Agenor Medeiros e o Márcio Faria para resolver essa situação desse consórcio, desse contrato. Ministério Público Federal:- E o senhor se recorda qual foi o percentual que incidiu nesse contrato de pagamento de propina? Alberto Youssef:- Olha, isso teve um abatimento, mas parece que entre as duas foi coisa de 30 milhões. Ministério Público Federal:- Como que o senhor recebia esses valores, para receber esses valores o senhor se utilizou de empresas que o senhor controlava? Alberto Youssef:- Da Odebrecht eu recebi esses valores em efetivo e da OAS eu cheguei a fazer alguns contratos para recebimento. Ministério Público Federal:- Esses contratos com empresas como a Empreiteira Rigidez, RCI Software, MO Consultoria? Alberto Youssef:- Sim senhor. Ministério Público Federal:- E esses contratos foram celebrados pela própria Construtora OAS, por empresas controladas pela OAS? Alberto Youssef:- Sim senhor. Ministério Público Federal:- Essas empresas então foram utilizadas especificamente para receber esses valores desses consórcios que eu mencionei há pouco? Alberto Youssef:- Ok. Ministério Público Federal:- E essas empresas prestavam algum tipo de serviço? Alberto Youssef:- Não senhor. Ministério Público Federal:- Existem até contratos, laudos que foram apresentados pela MO Consultoria, laudos técnicos em favor da OAS, esses laudos então são falsos? Alberto Youssef:- São falsos. Ministério Público Federal:- Perfeito. Recebidos esses valores, a quem o senhor repassava, eu sei que o senhor já disse, mas especificamente em relação a esses contratos? Alberto Youssef:- 60% ia para o partido, 30% para o doutor Paulo Roberto e os outros 10% ficavam entre eu e o Genu.' 766. Fernando Antônio Falcão Soares também prestou depoimento em Juízo (evento 417). Também ele celebrou acordo de colaboração homologado pelo Supremo Tribunal Federal. Em seu depoimento, declarou que intermediava o pagamento de vantagem indevida entre fornecedoras da Petrobras e o Diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa e também para o Diretor da Área Internacional da Petrobrás Nestor Cuñat Cerveró. Também ele já foi condenado por corrupção e lavagem por este Juízo, como, por exemplo, na ação penal 5083838-59.2014.4.04.7000 (cópia da sentença no evento 847). 767. Também admitiu que parte da vantagem indevida era repassada a agentes políticos do Partido dos Trabalhadores e do Partido do Movimento Democrático Brasileiro. 768. Confirmou o episódio já relatado por Nestor Cuñat Cerveró acerca da saída dele da Diretoria da Área Internacional da Petrobrás e da sua nomeação para Diretoria na BR Distribuidora. Confirmou inclusive que a nomeação para a BR Distribuidora teria sido uma compensação pelo trabalho de Nestor Cuñat Cerveró por ajudar na quitação da dívida de agentes do Partido dos Trabalhadores com o Grupo Schahin. Declarou que, para tentar auxiliar Nestor Cuñat Cerveró, a permanecer na Diretoria Internacional recorreu a José Carlos Costa Marques Bumlai, tendo este lhe informado que teria tratado com o então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas que não teria sido bem sucedido. 769. Transcreve-se trecho: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 150 de 317 'Ministério Público Federal:- Em alguma oportunidade o senhor Nestor Cerveró procurou o senhor por receio de perder o cargo? Fernando Soares:- Sim. Ministério Público Federal:- Como foi isso, por que motivo ele lhe procurou? Fernando Soares:- Em dois mil e, após a segunda, o segundo mandato do presidente Lula, quando ele se reelegeu, começou uma movimentação dentro da Petrobras porque o PMDB estava querendo ter uma diretoria na Petrobras, que até então não tinha uma diretoria do PMDB, era o que eu sabia na época, e começou uma disputa por cargos lá dentro da Petrobras e, em determinado momento, começou a se falar fortemente que a diretoria internacional teria sido dada ao PMDB, que o PMDB iria assumir essa diretoria; o Nestor me procurou falando o que estava acontecendo e pediu para eu me movimentar com as pessoas que eu conhecia para ver se podia ajudar na permanência dele, na época, assim, a pessoa mais próxima e que eu via com maior possibilidade de ajudar foi o José Carlos Bumlai, eu conversei com ele, falei o que estava acontecendo, ele me disse que ia procurar saber, e isso se desenrolou por algum tempo, alguns meses, ele me retornou dizendo que realmente havia um compromisso de dar a diretoria internacional para o PMDB e eu perguntei se ele não tinha como ajudar, ele disse que ia se movimentar, e depois ele me retornou dizendo que havia conversado com o presidente Lula e que o presidente Lula tinha orientado a ele a conversar na época com o Michel Temer, que era presidente do PMDB. Ele marcou uma conversa com o Michel Temer, inclusive o Nestor esteve presente nessa conversa, e realmente o Michel Temer disse que existia um compromisso com a bancada do PMDB mineiro e que ele não tinha como ajudar nisso, que teria que, quem estava liderando essa bancada na época era o deputado Fernando Diniz e seria a pessoa indicada para conversar, que ele não tinha como pressionar pela permanência do Nestor. Foi isso que aconteceu. Juiz Federal:- Mas só pra esclarecer, desculpe doutor a intervenção, a sua fonte de informação nesse caso é o senhor Nestor Cerveró? Fernando Soares:- Não, foi o José Carlos Bumlai. Eu e o José Carlos Bumlai, eu conversei com ele e, a partir da minha conversa com ele, ele marcou e levou o Nestor ao Temer, então essa reunião a mim foi reportada por ele e pelo Nestor que estava presente na reunião também. Ministério Público Federal:- Perfeito. O senhor foi instado pelo Cerveró a tomar essas, a tentar resolver essa situação, o senhor retornou a ele e disse que de fato ele teria que sair da diretoria internacional? Fernando Soares:- Falei, quer dizer, ele mesmo voltou para mim depois dessa reunião e falou como é que tinha sido a conversa, e me disse que pelo que ele estava vendo a coisa já estava mais ou menos definida, mesmo assim se levou algum tempo ainda nessa quebra de braço aí, vamos dizer, a gente tentando manter o Nestor e o pessoal lá, a bancada mineira, pressionando para que fosse trocado. Algum tempo depois, eu recebi uma ligação do Bumlai, ele me dizendo que, foi um dia de domingo, ele me dizendo que realmente ele tinha feito tudo pra que o Nestor permanecesse no cargo porque existia uma gratidão pela ajuda que o Nestor havia dado em um determinado assunto, não sei o que lá, mas que ele não tinha conseguido, a informação que ele me deu foi que havia uma pressão grande e que inclusive a bancada da câmara tinha falado que se não houvesse uma solução imediata eles romperiam com o governo, esse foi o relato que eu tive, e ele disse que realmente não tinha conseguido segurar, que tinha sido uma decisão, que no dia seguinte o Nestor ia ser comunicado da saída dele, mas que para compensar, em função de toda a ajuda que o Nestor já tinha dado a eles lá, ele estaria indo para a diretoria financeira da BR Distribuidora, essa foi a informação que eu tive. Ministério Público Federal:- Perfeito. O senhor mencionou 'pela ajuda a eles lá', eles quem? Fernando Soares:- No caso foi um assunto que inclusive está num dos meus termos de colaboração, que é uma dívida que o partido dos trabalhadores tinha com o Banco Schahin, a respeito de um empréstimo que tinha sido tomado, a informação que eu tive na época que isso foi conversado comigo é que esse empréstimo tinha https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 151 de 317 sido tomado para poder pagar dívidas de campanha do PT e eles não estavam, e o partido não conseguia quitar essa dívida, estava fazendo um acerto de contas aí através de uma tentativa de contratação de duas sondas para águas rasas na Petrobras, só que esse assunto vinha se desenrolando já há algum tempo dentro da Petrobras, aproximadamente mais de 1 ano já, e a coisa não andava, não se resolvia, então o Banco Schahin estava pressionando muito para que a coisa fosse resolvida ou que a dívida fosse quitada. Eu fui procurado pelo Bumlai, me contaram o que estava acontecendo perguntando se tinha como eu ajudar, não sei que, eu disse a ele, que esse era um assunto que estava na diretoria de exploração e produção, eu disse a ele 'Olha, não conheço ninguém na diretoria de exploração e produção, não tenho como te ajudar, mas tem um assunto que está andando, que é a contratação de uma segunda sonda que ainda não se tem sócio, nem operador...' Ministério Público Federal:- Desculpe interromper, o senhor pode ser mais sintético nesse ponto? Fernando Soares:- Foi esse assunto das sondas. Ministério Público Federal:- Então a ajuda foi, só para ver se eu entendi corretamente, foi ajuda para resolver essa sonda? Fernando Soares:- Exatamente. Ministério Público Federal:- Perfeito. E quando o senhor se refere a eles, 'Ajuda a eles', eles quem? Fernando Soares:- No caso ao PT, ao PT, ao Bumlai, porque o Bumlai era fiador desse empréstimo. Ministério Público Federal:- Certo. E uma outra pergunta, por que o senhor procurou o Bumlai para resolver uma possível demissão de diretor da Petrobras, qual era a interferência que ele poderia ter? Fernando Soares:- O Bumlai era uma pessoa muito bem relacionada com o presidente Lula, era uma pessoa que gozava de uma intimidade com o presidente Lula, pelo que eu, pelo meu conhecimento. Ministério Público Federal:- E nessa resolução dessa questão da demissão do Nestor Cerveró e indicação para a BR Distribuidora o Bumlai mencionou a interferência do ex-presidente Luiz Inácio? Fernando Soares:- Sim. Segundo ele, inclusive está no meu depoimento, ele diz que estava me ligando do palácio do planalto.' 770. Milton Pascowitch também prestou depoimento em Juízo (evento 417). Antes, celebrou acordo de colaboração com o MPF e que foi homologado pelo Juízo. Em seu depoimento, declarou que intermediava o pagamento de vantagem indevida entre fornecedoras da Petrobras e agentes da Área de Serviços e Engenharia da Petrobrás, Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho, bem como para agentes do Partido dos Trabalhadores, entre eles o ex-Ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu de Oliveira e Silva. As propinas eram calculadas em 1% sobre o valor do contrato e divididas entre os agentes da Petrobrás e os agentes políticos. Milton Pascowitch, assim como José Dirceu de Oliveira e Silva, foram condenados por crimes de corrupção e lavagem na ação penal 5045241-84.2015.4.04.7000, com cópia da sentença no evento 847. Afirmou não ter conhecimento da participação do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O magistrado destacou, ainda a respeito do esquema criminoso que vitimou a Petrobras, os interrogatórios dos corréus LÉO PINHEIRO e AGENOR MEDEIROS: 771. Também, como já adiantado nos itens 516-537 e 568-578, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, Presidente da OAS, e Agenor Franklin Magalhães Medeiros, reconheceram a existência do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, os ajustes fraudulentos de licitação e o pagamento de vantagem indevida em contratos com a Petrobrás para agentes da Petrobrás, agentes políticos e partidos políticos. 772. Também reconheceram especificamente o pagamento de vantagem indevida nos contratos da Petrobrás com o Consórcio CONPAR e no Consórcio RNEST/CONEST nas https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 152 de 317 obras da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST). 773. Para ser mais preciso, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO declarou não se recordar especificamente dos acertos na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), mas que, quanto ao contrato na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), foi procurado diretamente por João Vaccari para o pagamento de 1% sobre o valor do contrato ao Partido dos Trabalhadores ('Eu fui procurado pelo senhor João Vaccari e ele me falou que tinha um pagamento de 1% para o PT, isso foi diretamente comigo'). Concordou com a solicitação e o valor foi incorporado na aludida conta corrente geral de propinas, depois debitada para, entre outros propósitos, abater a diferença do preço do apartamento 164-A, triplex, do Condomínio Solaris, e o custo da reforma do aludido apartamento. Declarou que o pagamento foi inicialmente motivado para que a Construtora OAS passasse a ser convidada pela Petrobrás para participar de grandes obras, o que viabilizou o seu ingresso no grupo das empreiteiras que ajustavam fraudulentamente as licitações. 774. Agenor Franklin Magalhães Medeiros, encarregado especificamente dos contratos da Construtora OAS com a Petrobrás, confirmou que JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO interferiu junto ao Governo Federal para que a OAS passasse, ao final de 2006, a ser convidada para grandes obras na estatal. Também declarou que os contratos envolviam pagamento de propinas de 2% a agentes públicos e agentes políticos e que os contratos na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST) foram obtidos mediante ajuste fraudulento de licitação. 775. Declarou que no contrato da CONPAR, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), a vantagem indevida aos agentes públicos e políticos ficou a cargo da Odebrecht e da UTC Engenharia, desconhecendo o depoente os detalhes de como isso foi feito. 776. No caso dos contratos da CONEST/RNEST, na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), confirmou que houve ajuste de 2% de propinas sobre o valor dos dois contratos, que elas se destinavam aos agentes da Petrobrás e aos agentes políticos e que parte dos valores foram pagos pela Odebrecht e parte pela OAS. 777. Do total das propinas, dezesseis milhões de reais foram destinados ao Partido dos Trabalhadores, através de João Vaccari ('Aí é onde está, 13 milhões e meio mais 6 milhões e meio totalizam 20, para os 36 sobraram 16 milhões para o PT, e assim foi feito, Léo esteve em contato com João e ficou decidido que 16 milhões de reais, por conta da nossa parte na Rnest, seriam para o PT'). Concluiu o magistrado: 778. Há que se reconhecer como provado, acima de qualquer dúvida razoável, considerando cumulativamente a prova material e a quantidade de depoimentos, incluindo dos pagadores de propinas e dos beneficiários, que os contratos discriminados na denúncia, entre a Petrobrás e os Consórcios CONPAR e CONEST/RNEST, integrados pela Construtora OAS, seguiram as regras do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, ou seja, foram obtidos com ajuste fraudulento de licitações e envolveram o pagamento de vantagem indevida de cerca de 2% sobre o seu valor e que foram destinados aos agentes da Petrobras, mas especificamente à Diretoria de Abastecimento e à Diretoria de Serviços e igualmente a agentes políticos e a partidos políticos. 779. Dos valores, da parte cujo pagamento ficou sob a responsabilidade da OAS, cerca de dezesseis milhões de reais foram destinados exclusivamente à conta corrente geral de propinas mantida entre o Grupo OAS e agentes políticos do Partido dos Trabalhadores. 3.3.4.2. Não passa despercebida, portanto, a capacidade de influência do exPresidente no processo de nomeação dos agentes políticos da Petrobras e sua ciência a respeito do esquema criminoso. Apesar da sua negativa, há singular delineação dos bastidores de indicações e os movimentos de agremiações partidárias na tarefa de manter pessoas de 'confiança' que pudessem levar adiante o projeto de financiamento político. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 153 de 317 Há prova acima de dúvida razoável de que o ex-Presidente foi um dos articuladores - senão o principal - do amplo esquema de corrupção. As provas aqui colhidas levam à conclusão de que, no mínimo, tinha ciência e dava suporte àquilo que ocorria no seio da Petrobras, destacadamente a destinação de boa parte da propina ao Partido dos Trabalhadores para financiamento de campanhas políticas. Episódios como a nomeação dos diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró e Jorge Zelada, entre outros, não deixam margem de dúvidas de sua intensa ação dolosa no esquema de propinas. Delcídio do Amaral (evento 388) confirmou o estreito relacionamento do réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA com empreiteiras e, mais especificamente, com a OAS e com o corréu JOSÉ ADELMÁRIO: Ministério Público Federal:- Certo. Como era o relacionamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com os empreiteiros que tinham obras na Petrobras? Depoente:- Ele tinha um bom relacionamento com a grande maioria dos empresários, ou dos grandes empresários que faziam obra na Petrobras. Ministério Público Federal:- Especificamente em relação à OAS, o senhor Léo Pinheiro, como era essa interlocução? Depoente:- Relacionamento muito próximo, o Léo era uma pessoa que conversava sistematicamente com o presidente Lula. Ministério Público Federal:- O senhor Agenor Franklin Magalhães? Depoente:- Esses eu não conheço, eu conheço o Léo Pinheiro. Ministério Público Federal:- Certo. Esse relacionamento próximo do ex-presidente com o Léo Pinheiro envolveu algum pagamento de vantagens, o senhor se utilizou de um depoimento seu dizendo que uma reforma do sítio de Atibaia teria sido contraprestação pelo conjunto da obra, o que o senhor quis dizer com essa expressão? Depoente:- Na verdade, eu acompanhei, primeiro eu nunca fui nesse sítio, não conheço esse sítio, mas ele era bastante frequentado por pessoas mais próximas do presidente Lula e, ao que me consta, esse sítio era, inclusive convidados que passavam os finais de semana nesse sítio sempre identificaram esse sítio como sendo do ex-presidente. E, com relação especificamente a esse tema, onde é que eu tive informações sobre essas obras do sítio? Através do José Carlos Bumlai; José Carlos Bumlai, só para deixar claro, doutor Moro, ele é do meu estado, é nascido na minha cidade, as nossas famílias são famílias que sempre conviveram muito proximamente, e numa das conversas que tive com o doutor José Carlos Bumlai ele me relatou sobre as reformas desse sítio e que estava aliviado porque tinha contratado arquiteto, engenheiro, assim por diante, mas aí sobreveio uma orientação de que ele sairia do processo porque a OAS faria essa obra do sítio, e dentro do prazo estabelecido ou o prazo desejado, então essa história do sítio eu conheço dessa maneira, quem ia fazer inicialmente era o José, José Carlos Bumlai, e depois ele saiu do processo porque a OAS assumiu esse compromisso. (...) Defesa:- O senhor disse no seu depoimento aqui que o ex-presidente Lula recebia uma espécie de follow-up, recebia de quem, do senhor? Depoente:- Não, ele recebia da própria estrutura normal, do presidente da Petrobras, ele se reunia com diretores da Petrobras sistematicamente, ele tinha as informações não do dia a dia da companhia, mas dos principais projetos, inegavelmente, até fotografias; eu que convivi com vários presidentes, o presidente Lula tinha uma assiduidade de reunião com diretores da Petrobras muito maior do que qualquer outro presidente. Defesa:- Assiduidade é uma coisa, eu quero saber o seguinte, se o senhor tem prova de que nessas reuniões foi falado algo relacionado a ilícitos na Petrobras? Depoente:- Primeiro eu não participava dessas reuniões, agora, segundo, todos sabiam muito bem o papel que iam cumprir dentro da diretoria da Petrobras. Defesa:- O senhor não participava, o senhor não tem provas, e o senhor diz só que todos tinham conhecimento, o senhor não tem nada para provar isso que o senhor está dizendo? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 154 de 317 Depoente:- Está aí a lava jato, as informações todas. Quando eu fiz o meu depoimento, meu depoimento é um depoimento de político, eu não tenho planilha, eu tenho os fatos de alguém que foi líder do governo, que participava ativamente do dia a dia do congresso e que conversava não só com a maioria dos partidos, mas conversava com os diretores, com a própria nomenclatura da Petrobras, portanto, se não me contassem as conversas de palácio do planalto eu sabia por outras vias sempre, e a lava jato está provando isso. Pedro Corrêa (evento 394) também contextualizou os fatos e a participação do ex-Presidente no sistema ilícito de financiamento: Juiz Federal:- O senhor pode continuar, mas eu peço que o senhor responda mais diretamente, então. Depoente:- Então está bom, tá certo. Então nós fizemos esse entendimento e começamos então a pedir os cargos ao ministro José Dirceu, o que havia consenso, quer dizer, se a gente pedia, diferentemente do que tinha em outro governo, delegacias, ministério nos estados, autarquias, gerências, as superintendências, foram ocupadas de uma maneira geral pela CUT, a CUT tinha interesse e foi ocupando, todos esses companheiros do PT que estavam muitos anos fora do governo foram ocupando esses cargos que são normalmente indicados por parlamentares. E aí ficou então os cargos nacionais e nós pleiteamos a diretoria de abastecimento da Petrobras, a diretoria de abastecimento, a gente pediu ministérios, pediu secretaria nacional de assuntos estratégicos do ministério da saúde, pedimos a TBG, pedimos uma diretoria no (inaudível), a diretoria da Anvisa, um fundo de pensão, evidentemente que o interesse sempre foi que nós tivéssemos gente no governo para ajudar o partido a manter o seu poderio político, e aí chegamos no assunto da diretoria de abastecimento da Petrobras; inicialmente o doutor Paulo Roberto, que nós tínhamos conhecido no aeroporto, eu e Janene tínhamos conhecido no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, indicamos ele para a diretoria de abastecimento, mas havia um compromisso do ministro Antônio Palocci com o governo de transição de Fernando Henrique Cardoso de manter o doutor Rogério Manso na diretoria de abastecimento da Petrobras pelo menos 1 ano, então ficou acertado de que daria a uma TBG ao Paulo Roberto e nós íamos conversar sobre a diretoria de abastecimento. A diretoria de abastecimento, o ministro José Dirceu tentou fazer com que nós apadrinhássemos, fizesse parte da cota do nosso partido o doutor Rogério Manso, nós tivemos algumas conversas com o doutor Rogério Manso, mas ele tinha já um compromisso com o José Eduardo Dutra, se dizia que ele tinha um compromisso com ele, então nós não conseguimos fazer um entendimento com ele e pedimos então a saída dele, e conseguimos emplacar o nome de Paulo Roberto Costa. O José Dirceu, como eu disse, o ministro José Dirceu resolvia os assuntos que tinham consenso nas indicações dos partidos aliados, os dissensos só quem resolvia era o presidente Lula, então nós chegamos na diretoria da Petrobras, já tínhamos acertado com o José Dirceu que a indicação seria nossa, que nós íamos indicar o doutor Paulo Roberto Costa, e ele então foi claro em dizer que já tinha esgotado todo o poder que ele tinha, que não tinha mais como ele nomear o Paulo Roberto Costa, e ficou isso definido para que o Lula, o presidente Lula, chegasse a uma conclusão nisso. Aí essa coisa estava demorando 6 meses, nós fizemos uma obstrução na câmara, nós do PP, o PTB e o PL que hoje é o PR, fizemos uma obstrução porque também os partidos estavam sendo cozinhados, como a gente diz, enrolados, não saiam as nomeações, e chegamos a obstruir a pauta da câmara dos deputados com 17 medidas provisórias, durante 3 meses a câmara não funcionava enquanto não se resolvesse a situação das nossas indicações. Juiz Federal:- Só antes de o senhor prosseguir, desculpe, só um esclarecimento, que período foi esse, esses 3 meses? Depoente:- Isso, em 2004. Juiz Federal:- Em 2004? Depoente:- No princípio de 2004, final de 2003, princípio de 2004, o Paulo Roberto foi nomeado em maio de 2004. Então, José Dirceu disse que não tinha como resolver isso e que tinha que ser uma conversa com o presidente Lula, no gabinete dele, e que seria necessária a presença do presidente da Petrobras, doutor José Eduardo Dutra, e foi então quando houve um diálogo, que já foi transmitido diversas vezes, em que o presidente Lula https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 155 de 317 perguntou ao José Eduardo Dutra, que era o presidente da Petrobras, por que o Paulo Roberto não estava sendo nomeado, não tinha sido nomeado, e ele disse que não era ele que nomeava, era o conselho de administração, então Lula perguntou 'E o conselho de administração, por que não nomeia ele?', ele disse 'Porque o conselho de administração é independente', ele disse 'Quem nomeou esse conselho?', ele disse 'A maioria desse conselho foi você, presidente', ele chamava 'você' até porque não tinha essa liturgia do cargo, 'Você Lula que nomeou', ele disse 'Eu posso demitir?', 'Pode', 'Pois diga a eles que se eles não admitirem o Paulo Roberto Costa, não fizerem a nomeação, eu vou demitir o conselho', e aí o José Eduardo Dutra, que tinha uma ligação com o Rogério Manso, disse 'Olha, Lula, não é da tradição da Petrobras estar se trocando diretor', e aí ele disse 'Olha, Dutra, se fosse da tradição nem você era presidente da Petrobras, nem eu o presidente do Brasil, então eu vou dar um prazo de uma semana, se ele não for nomeado nós vamos trocar o conselho e vamos nomear o doutor Paulo Roberto', e ele foi nomeado, 15 dias depois Paulo Roberto era o diretor de abastecimento. Ministério Público Federal:- Nessa reunião, doutor Pedro, com o presidente Lula estava presente o senhor... Depoente:- O ministro José Dirceu, o ministro Aldo Rebelo, o doutor José Eduardo Dutra, eu, o deputado José Janene e o deputado Pedro Henry, e o presidente Lula. Ministério Público Federal:- Certo. De fato ocorreu a nomeação do Paulo Roberto Costa? Depoente:- Ocorreu a nomeação 15 dias depois, nós saímos de lá, já desobstruimos a pauta e as coisas começaram a tramitar, e isso é muito claro, só é pegar o período do... Isso tem registro, tem registro dessa conversa no gabinete do presidente da república como também tem o registro das obstruções que nós fizemos durante 3 meses na comissão, quando 17 medidas provisórias ficaram obstruindo a pauta, não se votava nada, nem fazia nada na câmara enquanto não se desobstruísse a pauta. Ministério Público Federal:- Certo. Qual era a pretensão, qual era o objetivo do partido com a nomeação do Paulo Roberto Costa na diretoria de abastecimento? Depoente:- O objetivo do partido era de fazer favor a empresários para cobrar recursos, para que a gente pudesse manter o partido. Hoje o fundo partidário já está com uma arrecadação bem maior, mas naquela época o fundo partidário era pequeno e o fundo partidário não cobria as despesas do partido, despesa com programa de televisão, despesas... Os encontros dos parlamentares, os encontros do partido, com convenção, então não cobria, então nós tínhamos que procurar os empresários para poder nos ajudar, e na verdade uma diretoria de abastecimento com um orçamento que tinha, 30, 40 bilhões de dólares, evidentemente que isso ia facilitar muito a nossa vida partidária. (...) Depoente:- Porque havia promessa do governo Lula que ia nos dar a diretoria de abastecimento. Defesa:- Perfeito. E quem nomeava formalmente o ato de investidura deste diretor da Petrobras, a quem cabia? Depoente:- Ao conselho de administração da Petrobras. Defesa:- Ao conselho de administração, não o presidente da república? Depoente:- Não, o presidente da república autorizava e o conselho... Defesa:- Como a majoritária é a União é claro que pode fazer as indicações, mas a deliberação que pode ser favorável ou contrária, em tese, é do conselho, é isso? Depoente:- O conselho é demissível ad nutum, se ele não obedecer as ordens do presidente, evidentemente o conselho vai ser demitido. Paulo Roberto Costa (evento 394), após confirmar a existência de propinas nos contratos da Petrobras e a participação da OAS, confessando inclusive que recebeu valores, esclareceu como ocorreu a sua indicação para a Diretoria: Juiz Federal:- Uns esclarecimentos do juízo, o senhor mencionou respondendo a perguntas que houve uma demora entre quando o senhor foi convidado pelos políticos a assumir esse cargo e a sua efetiva nomeação, é isso? Depoente:- Correto, perfeito, é isso mesmo. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 156 de 317 Juiz Federal:- E também respondendo o senhor mencionou que aparentemente havia alguma resistência à nomeação do seu nome? Depoente:- Sim. Juiz Federal:- E o senhor tem conhecimento como foi vencida essa resistência? Depoente:- Se não me falha a memória, o Janene me comentou, ou o Pedro Correa, um dos dois ou os dois, que o PP iria bloquear algumas votações lá no congresso se isso não fosse feito, acho que foi isso, que eu me recordo agora. Juiz Federal:- Mas isso eles disseram ao senhor lá na época? Depoente:- Eles me disseram lá na época porque que estava demorando. Juiz Federal:- E o senhor tem conhecimento se houve alguma interferência de algum político de alto escalão do governo federal naquela época para vencer essa resistência a sua nomeação? Depoente:- Bom, eles me falaram, que eu me recordo, que depois saiu também na imprensa aí, mas me falaram isso, que teria tido uma reunião do presidente Lula com o presidente José Eduardo Dutra, que o presidente Lula teria falado que ele que tinha nomeado o Dutra e, como ele nomeou, ele podia tirar, isso eles me falaram sim, me falaram. Juiz Federal:- Mas falaram isso na época ou o senhor obteve conhecimento agora, recentemente, pela imprensa? Depoente:- Não, eu acho que foi na época, excelência. Juiz Federal:- Acha ou... Depoente:- Eu não tenho certeza, eu não posso, não tenho, não me recordo. Nestor Cerveró (evento 395) também depôs como testemunha-colaboradora nestes autos. Asseverou desconhecer que o então Presidente LULA tivesse pedido propina, embora narrasse a sua intensa participação nos negócios a estatal. Todavia, destacou o modo como se deu sua saída da Diretoria da Petrobras e sua nomeação, na mesma data, para a BR Distribuidora: Ministério Público Federal:- Como que foi essa sua nomeação para a BR distribuidora? Depoente:- Eu fui nomeado pela manhã, o conselho de administração da Petrobras que é o mesmo naquela época, era o mesmo, exatamente os mesmos componentes do conselho de administração da BR distribuidora, então a reunião do conselho se fazia de manhã da Petrobras e os mesmos conselheiros à tarde faziam a reunião do conselho da BR, então de manhã eu fui substituído pelo doutor Jorge Zelada na diretoria internacional e a tarde eu fui nomeado diretor financeiro da BR distribuidora por esse conselho. Ministério Público Federal:- Também aqui no seu, enfim, o senhor teve algum apadrinhamento político para ter essa indicação da BR distribuidora? Depoente:- Não, aí o que houve foi, eu soube disso pelo falecido presidente da BR, havia sido presidente da Petrobras, o José Eduardo Dutra, que pela manhã eu fui comunicado pelo presidente Gabrielli que eu estaria sendo substituído, que tinha havido uma reunião no dia anterior, essa reunião foi numa segunda feira, essa reunião do conselho, então o Gabrielli me disse que tinha havido uma reunião em Brasília no domingo, acho que foi domingo, no sábado, fim de semana, em que o presidente Lula tenha dito 'Ó, não tem como, tem que substituir amanhã, então o Nestor vai ser substituído' e perguntou, bom, mas isso foi me relatado pelo presidente Dutra, falecido Dutra, por que, porque eu só soube dessa indicação, ninguém me consultou a respeito, quer dizer, não houve nenhum convite, não houve nenhuma consulta se eu queria ser ou não, foi mais ou menos uma compensação por eu ter saído da diretoria internacional e o presidente Lula teria dito, no relato do José, desculpe no presidente Dutra, teria dito 'Bom, mas como é que fica o Nestor?' e nessa época a diretoria, da diretoria financeira da BR estava sem titular, que tinha havido a saída do diretor financeiro, tinha entrado em choque com a Graça Foster que era a presidente da Petrobras e tinha renunciado ao cargo, tinha saído da Petrobras inclusive, então ficou alguns meses a posição vazia, e o Dutra informou 'Olha presidente, a diretoria financeira da BR está sem ocupante' o que o Lula teria dito 'Bom, então se o Nestor estiver de acordo, amanhã o conselho indica o Nestor como diretor financeiro da BR', por isso que a tarde, logo pela manhã o Gabrielli me comunicou que eu estava saindo https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 157 de 317 da diretoria internacional e a tarde para minha surpresa o Dutra foi lá na minha sala, minha secretária falou 'Ó, o presidente Dutra quer falar com o senhor' e ele entrou na minha sala e falou assim 'Vamo bora' e eu falei assim 'Vamo bora para onde, que história é essa?' e ele falou 'Não, vamos, você vai para a BR', porque a BR é no outro prédio, na época era perto do Maracanã, 'Você vai, pô, você foi nomeado, você não está sabendo, diretor financeiro da BR?' eu falei 'Não, ninguém me falou nada' 'Não, ontem o Lula já acertou, você vai hoje a tarde vai ser indicado' e efetivamente à tarde o conselho confirmou meu nome como diretor financeiro. Então no mesmo dia eu deixei de ser diretor internacional da holding e passei a ser diretor financeiro da BR distribuidora. Ministério Público Federal:- Em um depoimento que o senhor prestou ao Ministério Público, o senhor faz referência que teria tomado conhecimento que a sua indicação teria relação com um empréstimo que havia sido concedido a, teria... Defesa:- A doutora pode indicar por gentileza, qual o... Ministério Público Federal:- É o mesmo depoimento, doutor. Defesa:- Qual que é, pode? Ministério Público Federal:- Evento 3, comp90. Defesa:- Anexo a senhora tem, qual que seria? Ministério Público Federal:- É isso doutor, evento 3, comp90, é esse? Juiz Federal:- Qual que é a pergunta então? Ministério Público Federal:- É se o senhor tomou conhecimento se esse, conforme consta aqui no depoimento, se essa sua indicação pra BR distribuidora teria alguma relação com o empréstimo, com a questão da sonda vitória 10000 que foi contratada pela Schahin? Depoente:- Não, desculpe, eu vou contextualizar, o que eu digo no meu depoimento é que eu tive informações, o doutor não falou sobre isso, que isso teria sido uma compensação, um agradecimento pelo fato de em 2006, final de 2006, início de 2007 eu ter conseguido liquidar através da contratação da Schahin Óleo e Gás para operadora da vitória 10000, da segunda sonda que a área internacional contratou e havia uma dívida de campanha em 2006, do PT, isso me foi pedido pelo Gabrielli para que eu resolvesse esse problema, porque eu fui levar ao Gabrielli um problema que o Silas estava me pressionando para liquidar uma dívida do PMDB de 10 ou 15 milhões de reais da campanha de 2006, eu fui pedir ajuda ao Gabrielli e o Gabrielli falou, vamos fazer uma troca, eu me lembro dessa conversa, foi uma conversa só nós dois em que o Gabrielli falou, vamos fazer uma troca, deixa que eu resolvo o problema do Silas e você resolve o problema do PT, eu desconhecia esse problema, aí ele me disse 'O PT tem uma dívida de 50 milhões de reais que foi empréstimo tomado junto ao banco Schahin e você vê o que você pode fazer, eu sei que vocês estão negociando com a Schahin', aí eu chamei o filho dos donos da Schahin, o Fernando Schahin que é diretor da Schahin Óleo e Gás e eu sabia que eles estavam com essa pretensão e falei 'Olha, nós podemos fechar, colocar vocês como operadores da sonda' porque eles já operavam uma sonda aqui na bacia de Campos, 'Desde que a dívida de 50 milhões seja liquidada' ele até reclamou 'Não, mas isso é o banco' eu falei 'Bom, isso aí é problema de vocês, não é problema meu, eu sei que o grupo é o mesmo' e 2 dias depois ou 2 ou 3 dias depois o Gabrielli me ligou e me disse 'Olha, o problema está resolvido, pode ir em frente, e aí me foi dito que essa liquidação, ou seja, ter conseguido liquidar essa dívida teria sido o motivo, ou um dos motivos uma compensação, ou seja, teria sido uma forma de agradecimento pelo fato de eu ter conseguido liquidar essa dívida do PT. DESTAQUEI Os fatos são corroborados por Fernando Soares (evento 417), ao afirmar que a indicação de Nestor Cerveró para a BR Distribuidora decorreu de uma composição política, bem como por um sentimento de compensação pelo auxílio que Nestor Cerveró teria dado ao Partido dos Trabalhadores, in verbis: Ministério Público Federal:- Perfeito. O senhor foi instado pelo Cerveró a tomar essas, a tentar resolver essa situação, o senhor retornou a ele e disse que de fato ele teria que sair da diretoria internacional? Depoente:- Falei, quer dizer, ele mesmo voltou para mim depois dessa reunião e falou como é que tinha sido a conversa, e me disse que pelo que ele estava vendo a coisa já https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 158 de 317 estava mais ou menos definida, mesmo assim se levou algum tempo ainda nessa quebra de braço aí, vamos dizer, a gente tentando manter o Nestor e o pessoal lá, a bancada mineira, pressionando para que fosse trocado. Algum tempo depois, eu recebi uma ligação do Bumlai, ele me dizendo que, foi um dia de domingo, ele me dizendo que realmente ele tinha feito tudo pra que o Nestor permanecesse no cargo porque existia uma gratidão pela ajuda que o Nestor havia dado em um determinado assunto, não sei o que lá, mas que ele não tinha conseguido, a informação que ele me deu foi que havia uma pressão grande e que inclusive a bancada da câmara tinha falado que se não houvesse uma solução imediata eles romperiam com o governo, esse foi o relato que eu tive, e ele disse que realmente não tinha conseguido segurar, que tinha sido uma decisão, que no dia seguinte o Nestor ia ser comunicado da saída dele, mas que para compensar, em função de toda a ajuda que o Nestor já tinha dado a eles lá, ele estaria indo para a diretoria financeira da BR Distribuidora, essa foi a informação que eu tive. Ministério Público Federal:- Perfeito. O senhor mencionou 'pela ajuda a eles lá', eles quem? Depoente:- No caso foi um assunto que inclusive está num dos meus termos de colaboração, que é uma dívida que o partido dos trabalhadores tinha com o Banco Schahin, a respeito de um empréstimo que tinha sido tomado, a informação que eu tive na época que isso foi conversado comigo é que esse empréstimo tinha sido tomado para poder pagar dívidas de campanha do PT e eles não estavam, e o partido não conseguia quitar essa dívida, estava fazendo um acerto de contas aí através de uma tentativa de contratação de duas sondas para águas rasas na Petrobras, só que esse assunto vinha se desenrolando já há algum tempo dentro da Petrobras, aproximadamente mais de 1 ano já, e a coisa não andava, não se resolvia, então o Banco Schahin estava pressionando muito para que a coisa fosse resolvida ou que a dívida fosse quitada. Eu fui procurado pelo Bumlai, me contaram o que estava acontecendo perguntando se tinha como eu ajudar, não sei que, eu disse a ele, que esse era um assunto que estava na diretoria de exploração e produção, eu disse a ele 'Olha, não conheço ninguém na diretoria de exploração e produção, não tenho como te ajudar, mas tem um assunto que está andando, que é a contratação de uma segunda sonda que ainda não se tem sócio, nem operador... (...) Ministério Público Federal:- Perfeito. E quando o senhor se refere a eles, 'Ajuda a eles', eles quem? Depoente:- No caso ao PT, ao PT, ao Bumlai, porque o Bumlai era fiador desse empréstimo. Ministério Público Federal:- Certo. E uma outra pergunta, por que o senhor procurou o Bumlai para resolver uma possível demissão de diretor da Petrobras, qual era a interferência que ele poderia ter? Depoente:- O Bumlai era uma pessoa muito bem relacionada com o presidente Lula, era uma pessoa que gozava de uma intimidade com o presidente Lula, pelo que eu, pelo meu conhecimento. Ministério Público Federal:- E nessa resolução dessa questão da demissão do Nestor Cerveró e indicação para a BR Distribuidora o Bumlai mencionou a interferência do expresidente Luiz Inácio? Depoente:- Sim. Segundo ele, inclusive está no meu depoimento, ele diz que estava me ligando do palácio do planalto. Ministério Público Federal:- Certo, perfeito. Existe um outro episódio envolvendo o senhor Paulo Roberto Costa, é fato notório, foi nomeado no início dos anos 2000, o senhor sabe se depois de nomeado houve algum período em que o cargo dele esteve também em risco? Depoente:- Em 2006. Ministério Público Federal:- O senhor pode nos narrar o que aconteceu e por quê, se foi em 2006, ele pôde continuar no cargo? Depoente:- O Paulo teve um problema de saúde muito grave, chegou a ficar na UTI um bom tempo, chegou a ser desenganado, então praticamente davam como se o Paulo não fosse conseguir se recuperar, por um milagre o Paulo conseguiu se recuperar, mas nesse período em que ele ficou internado e depois um longo período em que ele ficou em cada em recuperação, houve uma movimentação muito grande de pessoas querendo assumir o https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 159 de 317 cargo dele, querendo sentar na cadeira lá da diretoria de abastecimento, e logo que o Paulo começou a receber visita, eu fui visitar ele, ele conversou comigo, falou o que estava acontecendo, não sei o que, e perguntou se teria como a gente se movimentar para fazer alguma coisa, porque o Paulo tinha sido indicado pelo PP, só que o PP também estava na época muito enfraquecido por causa da questão do mensalão e havia uma disputa interna até dentro do próprio PP para ver quem ia comandar a diretoria de abastecimento, essa coisa toda; ele me falou isso, perguntou se teria como eu ajudar a ele, eu disse 'Olha, Paulo, eu vou ver quem são as pessoas que eu poderia conversar sobre isso', aí eu lembrei de uma pessoa que era ligada ao PMDB, conversei com ele, ele disse que teria como ajudar, então eu retornei para o Paulo, falei sobre a conversa, perguntei se ele teria interesse que fosse feito dessa forma, ter o apoio do PMDB, ele disse que sim, que poderia seguir dessa forma. Então eu marquei uma conversa dele, levei essa pessoa, que é o Jorge Luz, e a partir daí se coordenou um apoio mútuo entre PMDB e PP para a permanência do Paulo. Ministério Público Federal:- E quando o senhor disse essa coordenação de apoio mútuo, envolvia também a arrecadação de valores para essas agremiações por parte da diretoria do Paulo Roberto? Depoente:- Sim, que era como funcionava na época. DESTAQUEI Milton Pascowich (evento 417) igualmente reconhece a existência de esquema de propina no seio da Petrobras, afirmando ter sido um dos intermediadores dos pagamentos de vantagens indevidas. Declarou que de fato intermediava o pagamento entre fornecedoras da Petrobras e agentes da Área de Serviços e Engenharia, Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho, assim como para agentes do Partido dos Trabalhadores. Dentre eles, José Dirceu de Oliveira e Silva. O depoimento de Milton segue no caminho de que a propina era calculada em 1% sobre o valor do contrato e dividida entre os agentes da Petrobras e os agentes políticos. Milton Pascowitch e José Dirceu de Oliveira e Silva foram condenados por crimes de corrupção e lavagem na Ação Penal nº 5045241-84.2015.4.04.7000/PR, cuja responsabilidade criminal, afora algumas questões pontuais, já foi confirmada pela 8ª Turma. 3.3.4.3. Na Ação Penal nº 5083376-05.2014.4.04.7000/PR, LÉO PINHEIRO e AGENOR FRANKLIN, dentre outros, foram condenados por crime de pertinência à organização criminosa em razão da participação no esquema de corrupção que assolou a Petrobras. Há prova acima de dúvida razoável de pagamentos realizados pelo grupo OAS em favor de vários operadores, que tinham por finalidade distribuir a propina. A Construtora OAS passou a participar de ajustes fraudulentos de licitação na Petrobras por volta de 2007 ou 2008, tendo pago, de maneira frequente, vantagem indevida aos Diretores da Petrobras, inclusive nos contratos da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e da Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST). Parte desses pagamentos era direcionada a agentes ou partidos políticos. Quanto ao contrato na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), LÉO PINHEIRO teria sido procurado diretamente por João Vaccari Neto para ajustar o pagamento de 1% do valor do contrato para o Partido dos Trabalhadores. Reporta-se a denúncia aos seguintes contratos obtidos junto à Petrobras por cartel e ajuste de licitações ou que teriam gerado propinas aos dirigentes da Petrobras e a agentes e partidos políticos: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 160 de 317 - contrato da Petrobrás com o Consórcio CONPAR (Odebrecht, UTC Engenharia e OAS) para execução de obras do ISBL da Carteira de Gasolina e UGHE HDT da Carteira de Coque da Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, na região metropolitana de Curitiba, no montante de 3% do valor total do contrato para dirigentes da Petrobras na Diretoria de Abastecimento e na Diretoria de Serviços; - contratos da Petrobrás com o Consórcio RNEST-CONEST (Odebrecht e OAS) para implantação das UDAs e UHDT e UGH da Refinaria do Nordeste Abreu e Lima, em Ipojuca/PE, no montante de 3% do valor total do contrato para dirigentes da Petrobras na Diretoria de Abastecimento e na Diretoria de Serviços; De resto, a sentença examinou com exaustão a prova documental e testemunhal, sobretudo em seu ponto II.15. Por tudo, faço referência ao item 712 e seguintes: 712. O pagamento de vantagem indevida à Área de Abastecimento da Petrobrás, tendo entre os beneficiários específicos o Diretor Paulo Roberto Costa já foi reconhecido na sentença prolatada na ação penal 5083376-05.2014.4.04.7000 (cópia da sentença no evento 847). Como ali consignado: '356. Conforme apontado nos itens 224-226, retro, o contrato da RNEST para implantação das UHDT e UGH teve o preço de R$ 3.190.646.501,15, com aditivo em 12/01/2012 de R$ 38.562.031,42, totalizando R$ 3.229.208.532,57. A propina seria, portanto de cerca de R$ 32.292.085,00. O MPF, entretanto, considerando que a OAS tinha 50% de participação no Consórcio RNEST/CONEST, calculou a propina de sua responsabilidade para esse contrato em R$ 16.146.042,00. 357. Conforme apontado nos itens 236-238, retro, o contrato da RNEST para implantação das UDAs teve o preço de R$ 1.485.103.583,21, com aditivo em 28/12/2011 de R$ 8.032.340,38, totalizando R$ 1.493.135.923,59. A propina seria, portanto de cerca de R$ 14.931.359,00. O MPF, entretanto, considerando que a OAS tinha 50% de participação no Consórcio RNEST/CONEST, calculou a propina de sua responsabilidade para esse contrato em R$ 7.465.679,50. 358. Conforme apontado nos itens 247-249, retro, o contrato da REPAR teve o preço de R$ 1.821.012.130,93, com aditivos entre 06/2008 a 01/2012, que majoraram o seu valor em R$ 517.421.286,84, totalizando R$ 2.338.433.417,77. A propina seria, portanto de cerca R$ 23.384.334,17. O MPF, entretanto, considerando que a OAS tinha 24% de participação no Consórcio CONPAR, calculou a propina de sua responsabilidade para esse contrato em R$ 5.612.240,00. 359. O total de propina pago para as três obras pela OAS à Diretoria de Abastecimento da Petrobrás, comandada por Paulo Roberto Costa, foi, portanto, de R$ 29.223.961,00.' 713. Não só houve sentença reconhecendo o fato, mas também foi ela confirmada integralmente, nesse aspecto, no julgamento da apelação pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, tendo por Relator o ilustre Desembargador Federal João Pedro Gebran Neto. Transcreve-se a ementa: 714. Registre-se que a divergência havida entre os ilustres Desembargadores diz respeito a aspectos da aplicação da pena e que depois foram sanadas em embargos infringentes julgados pela mesma Corte de Apelação (Embargos Infringentes e de Nulidade nº 5083376-05.2014.4.04.7000 - Rel. para o acórdão Des. Federal João Pedro Gebran Neto 4ª Seção do TRF4 - por maioria - j. 01/06/2017), não tendo havido qualquer divergência quanto ao reconhecimento dos crimes de corrupção, especificamente que dirigentes da OAS pagaram vantagem indevidas a agentes da Petrobrás, no caso especificamente para a Diretoria de Abastecimento da Petrobrás. 715. Naquele feito, foi destacado que a vantagem indevida acordada com o Diretor Paulo Roberto Costa foi transferida pelo Grupo OAS através do operador Alberto Youssef mediante depósitos em contas de empresas de fachada que eram por ele utlizadas, especificamente a MO Consultoria, a Empreiteira Rigidez (itens 338-350 da sentença). https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 161 de 317 716. Esses mesmos contratos, além de cópia dos extratos bancários, prova material da corrupção e lavagem envolvendo a parte da Diretoria de Abastecimento, foram juntados nestes autos (evento 3, comp 127, comp128 e comp129). 717. Já quanto aos pagamentos de vantagem indevida nos contratos dos Consórcios CONPAR e RNEST/CONEST na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST) para a Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobrás, não houve ainda denúncia contra os dirigentes da OAS. 718. Houve, porém, sentença a respeito do pagamento de vantagens indevidas nesses contratos por dirigentes da consorciada Odebrecht na ação penal 503652823.2015.4.04.7000. 719. Nela, foram condenados, por sentença de primeira instância, com cópia no evento 3, comp131, por crimes de corrupção ativa, lavagem de dinheiro e associação criminosa, os dirigentes do Grupo Odebrecht Alexandrino de Salles Ramos de Alencar, Cesar Ramos Rocha, Márcio Faria da Silva, Rogério Santos de Araújo e Marcelo Bahia Odebrecht, e, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Paulo Roberto Costa, Pedro José Barusco Filho, Renato de Souza Duque e Alberto Youssef. 720. Provado, nos termos da sentença, o pagamento de propina de R$ 108.809.565,00 e USD 35 milhões pelo Grupo Odebrecht à Diretoria de Abastecimento e à Diretoria de Engenharia e Serviços da Petrobrás, envolvendo vários contratos entre a Odebrecht e a Petrobrás. 721. Como ali se verifica, especialmente nos itens 113 a 174 da sentença, foi possível rastrear documentalmente parte da vantagem indevida para os agentes da Petrobrás pelo Grupo Odebrecth. 722. Com efeito, o Grupo Odebrecht pagou vantagem indevida, entre 06/2007 a 08/2011, de USD 14.386.890,04 mais 1.925.100,00 francos suíços aos agentes da Petrobrás, especificamente USD 9.495.645,70 mais 1.925.100,00 francos suíços a Paulo Roberto Costa, USD 2.709.875,87 a Renato de Souza Duque e USD 2.181.369,34 a Pedro José Barusco Filho. Para tanto, servia-se de contas secretas em nome de off-shores e que controlava direta ou indiretamente em diversos países no exterior. De tais contas, foram realizadas transferências milionárias para contas secretas em nome de off-shores controladas pelos Diretores da Petrobrás Renato de Souza Duque e Paulo Roberto Costa e pelo gerente Pedro José Barusco Filho. 723. Como se verifica na sentença (itens 408-564), entre os contratos que deram origem aos pagamentos de propina, encontram-se os contratos da Petrobrás com os Consórcios CONPAR e RNEST/CONEST na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST). 724. Embora se trate de pagamentos da Odebrecht, era a empresa consorciada com a OAS nos dois empreendimentos. 725. Além das provas materiais do pagamento de vantagem indevida nos contratos da Petrobras com os Consórcios CONPAR e RNEST/CONEST na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), foi produzida prova oral nestes autos. Por tudo isso e todo o mais que consta nos autos e foi anotado na sentença recorrida, há prova documental e testemunhal a respeito da participação do Grupo OAS, representado por seus principais dirigentes, no esquema de corrupção para direcionamento de contratações na Petrobras e pagamento de propinas a agentes públicos e políticos, no caso especial dos autos, a dirigentes do Partido dos Trabalhadores; e com o ex-Presidente como mantenedor/fiador desse esquema de corrupção. 3.3.5. Do apartamento triplex A presente ação penal também tem por objeto uma fração de condutas derivadas direta ou indiretamente desses crimes. Diz o Ministério Público Federal que o ex-Presidente da República LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA teria participado ou anuído https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 162 de 317 com o esquema criminoso, inclusive ciente de que os Diretores da Petrobras utilizavam seus cargos para recebimento de vantagem indevida em favor de agentes e partidos políticos. O Grupo OAS, especificamente no tocante ao Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, realizou o pagamento de propina no valor estimado de R$ 87.624.971,26, correspondente a 3% sobre a parte correspondente da Construtora OAS nos empreendimentos referidos. Cerca de 1% desse valor teria sido destinado especificamente a agentes políticos do Partido dos Trabalhadores, pagos por um caixa geral de propinas que computava crédito em favor da agremiação. Do total reservado ao partido, R$ 3.738.738,00 teriam sido destinados especificamente ao ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, representados pelo apartamento 164-A, triplex, do Condomínio Solaris, de matrícula nº 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP, sem que houvesse pagamento da totalidade do preço correspondente. Há, com isso, ainda que desprezados os mobiliários, no mínimo vantagem indevida decorrente da diferença de preço entre uma e outra unidade. Historiando os fatos, quando o empreendimento imobiliário pertencia à BANCOOP - Cooperativa Habitacional dos Bancários, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA teria pago parte por um apartamento simples (nº 141-A), cerca de R$ 209.119,73, mas o Grupo OAS disponibilizou a ele, ainda em 2009, o apartamento 164-A, triplex, sem que fosse cobrado qualquer acréscimo. Posteriormente, em 2014, o apartamento passou por benfeitorias, a cargo do Grupo OAS para atender ao ex-Presidente, sem que houvesse igualmente pagamento de preço. Estima o MPF o valor da vantagem indevida em cerca de R$ 2.424.991,00, assim discriminada: R$ 1.147.770,00 correspondente à diferença entre o valor pago e o preço do apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em reformas e na aquisição de bens para o apartamento. Em razão dos fatos, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA responde pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro; LÉO PINHEIRO, responde por corrupção ativa e lavagem de dinheiro; AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS responde por corrupção ativa; FÁBIO YONAMINE, PAULO GORDILHO e ROBERTO FERREIRA, todos executivos do Grupo OAS, respondem por lavagem de dinheiro relacionada ao repasse do imóvel; PAULO OKAMOTTO responde por lavagem de dinheiro pelo armazenamento do acervo presidencial. Com relação à denunciada MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA, foi proferida decisão pela qual foi extinta a punibilidade (evento 527 e 624). 3.3.5.1. Em que pese o caso esteja interligado com o esquema de corrupção que vitimou a Petrobras, especificamente no tocante ao pagamento de vantagens espúrias a agentes políticos pela OAS, o caso dos autos tem contornos peculiares. Diz-se que, do total de propina originária dos contratos RNEST e REPAR, R$ 13,5 milhões eram https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 163 de 317 destinados ao PP, R$ 6 milhões ao PSDB e R$ 16 milhões ao PT - Partido dos Trabalhadores. O depoimento de AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS esclarece (evento 869): Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- No caso da Rnest ficou muito claro e foi dito por Márcio Faria, e assim foi feito, que ele havia estabelecido um valor absoluto, ao invés de ele falar em percentual por se tratar de uma obra de grande valor, esses dois contratos da Rnest totalizaram 4,7 bilhões aproximadamente, nós tínhamos 50%, mas a liderança era da Odebrecht, e ele, Márcio, havia acertado um valor de 72 milhões para pagamento de vantagens indevidas onde cada empresa arcaria com 36 milhões; desses 72 o consórcio, através de distribuição de dividendos, distribuiu para a Odebrecht 36, para a OAS 36, onde quais seriam as responsabilidades de cada empresa? A Odebrecht se encarregou das responsabilidades com relação aos agentes da Petrobras, onde se chamava que tinha casa 1, casa 2, eu entendi, não me foi dito, mas era muito perceptível que casa 1 era a diretoria de serviços e casa 2 a diretoria de abastecimento, que já tinha uma relação antiga de confiança, de segurança, e por conforto tanto da parte da Odebrecht por conta desses agentes da Petrobras, eles continuaram preservando da forma que vinha sendo feito. Os R$ 16 milhões administrados pelo caixa único da OAS foram direcionados ao Partido dos Trabalhadores. Parcela deste total foi redirecionada ao pagamento do triplex destinado ao ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Tal clareza é fundamental, pois há consequências jurídicas importantes, dentre elas, a constatação do momento em que de fato teria ocorrido o recebimento de vantagem para finalidades pessoais do apelante. As importâncias repassadas estão adequadamente indicadas na inicial. Materialmente estão associadas ao custo do apartamento - com respectivas benfeitorias - e ao pagamento da mensalidade pelo armazenamento junto à empresa Granero do chamado acervo presidencial (correspondente aos bens, cartas e demais objetos recebidos durante e após o exercício do cargo). Diz a denúncia que o Grupo OAS concedeu ao ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA o apartamento 164-A, triplex, no Condomínio Solaris, com endereço à Avenida General Monteiro de Barros, 656 - Guarujá/SP, bem como a respectiva reforma para adaptá-lo aos interesses do beneficiário. Consta, ainda, que o Grupo OAS custeou a aquisição de mobiliário feito sob medida para o referido imóvel, tudo de acordo com os interesses da família do ex-Presidente. Aqui, convém anotar que as expressões 'concessão' ou 'destinação' não devem ser interpretadas dentro de qualquer concepção jurídica, mas sim como indicativos da sequência de fatos que culminaram com os atos de corrupção passiva, assim entendida como o recebimento de vantagem indevida materializada no próprio imóvel. Da leitura do caderno processual constata-se veemente negativa do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA quanto à aquisição do apartamento, asseverando que a partir de agosto de 2014, após a segunda visita de MARISA LETICIA ao imóvel, houve expressa desistência de aquisição. De outra banda, a sentença acolheu a tese acusatória de que a titularidade de fato do imóvel seria do ex-Presidente e de sua falecida esposa. Em seu interrogatório, disse (evento 885): Juiz Federal:- Ela relatou ao senhor ex-presidente como ela teria feito essa aquisição? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 164 de 317 Luiz Inácio Lula da Silva:- Ela me disse que comprou da cooperativa dos bancários uma cota de um apartamento. Juiz Federal:- De um apartamento, uma unidade simples nesse prédio no Guarujá? Luiz Inácio Lula da Silva:- Deve ser uma unidade simples que ela comprou. Juiz Federal:- O senhor ex-presidente pode esclarecer se havia a intenção desde o início de adquirir um triplex no prédio ao invés de uma unidade simples? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não havia no início e não havia no fim. Juiz Federal:- Nunca houve a intenção de adquirir esse triplex? Luiz Inácio Lula da Silva:- Nunca houve a intenção de adquirir o triplex. Juiz Federal:- Em algum momento dessa relação com a BANCOOP, e depois com a OAS, houve manifestação de intenção de trocar esse apartamento simples por um apartamento triplex? Luiz Inácio Lula da Silva:- Nunca, nunca. No mesmo sentido está a afirmação do corréu PAULO OKAMOTTO (evento 869), asseverando, sobre o ponto, em seu interrogatório: Paulo Tarciso Okamotto:- Não, mas na sucessão, antes de 2014 tem 2013. Em 2013 alguns momentos eu encontro com Léo por conta das nossas palestras ou encontro com ele em algum lugar e ele fala 'Precisa avisar lá à família do presidente se eles têm interesse em ficar com algum imóvel lá no prédio, porque está em acabamento o prédio, se tiver interesse a hora é agora', bom, aí me parece que o presidente Lula marcou com o Léo uma conversa e estava em conversando em dezembro, final de 2013, deve ser, ou novembro ou dezembro de 2013, eu não tenho muito certo porque tinha uma palestra em novembro, mas foi nessa ocasião, nessa ocasião eles tiveram uma reunião lá no Instituto, no final da reunião o doutor Léo convidou ele para conhecer o empreendimento, eu estava ali na reunião eu vi, comecei a presenciar a conversa deles lá, então o Léo estava explicando para o presidente Lula o seguinte, o prédio tinha ficado bonito, uma fachada bonita, amarela, não sei o que lá e não sei que, e que o apartamento tinha ficado maravilhoso e tal, que tinha um tríplex que tinha uma vista extraordinária para a praia do Guarujá e que era uma coisa muito bonita, que o presidente precisava conhecer, que 'O senhor precisava conhecer' e tudo mais, e o presidente ouvindo aquilo lá ele 'Léo, mas o que tem nesse triplex?', ele descreveu que no triplex tinha parece que no primeiro, nas salas, embaixo tinha sala, acho que no segundo andar tinha quarto e talvez, lá em cima tinha piscina, não sei que lá, mas que era muito bonito; bom, aí descrevendo, e o Lula até me comentou 'Mas como é que eu vou frequentar um apartamento de Guarujá, como é que eu vou frequentar?', ele até comentou que há muitos anos ele não vai em restaurante, há muitos anos ele não vai ao cinema, muitos anos ele não vai a um teatro, quer dizer, há muitos anos ele né, passou todo o tempo lá no governo sem poder frequentar esses lugares porque sempre que frequenta ele acaba trazendo transtorno para quem está no evento e tal, e ele falou 'Eu fico imaginando eu indo num...', mas o fato é que o doutor Léo acho que convenceu a ele a conhecer o empreendimento. Na oportunidade, eu perguntei para ele 'Doutor Léo, quanto que está o metro quadrado do apartamento lá em Guarujá?', ele falou 'Olha, está por volta de 7 a 8 mil reais, eu não sei muito bem o valor, mas está...', eu falei 'Mas está caro, né?', ele falou 'É, está caro porque está tendo muita procura, porque você não sabe, mas vai ter muito investimento do pré-sal lá na baixada e está valorizando muitos imóveis lá', que esse imóvel seria muito bom inclusive para fazer investimento, aí eu peguei e falei 'Bom, mas está caro né, de qualquer forma', eu falei pra ele 'Mas, doutor Léo, se o presidente Lula quiser adquirir qualquer imóvel, qualquer apartamento, o presidente tem que pagar o preço de mercado', 'Ah, claro, claro, claro'. Bom, aí foram embora, aí acho que em fevereiro de 2014, uma coisa assim, eu soube, ele me falou que foi visitar lá o empreendimento e depois que ele foi visitar o empreendimento eu perguntei se ele tinha gostado desse empreendimento ele falou 'Olha, realmente não tem como...', ele reclamou lá de sauna, que tinha um buraco na sauna, reclamou que tinha um espaço que ninguém usava, enfim, ele falou 'Mas realmente não tem como eu ficar no apartamento porque não tem como... Como é que eu vou usar aquele apartamento, só se eu for na praia dia de quarta-feira', eu tinha subentendido de que esse apartamento não seria mais, não https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 165 de 317 teria mais interesse, aí fui surpreendido depois pelas histórias que foram no apartamento, que o apartamento ia ser entregue, que era um triplex, coisas desse tipo. É incontroverso que a esposa do ex-Presidente, Marisa Letícia Lula da Silva, firmou termo de adesão ao empreendimento com a BANCOOP, relativamente à unidade 141 do edifício. A questão reside na unidade triplex, que, segundo a denúncia, teria sido destinada, reformada e mobiliada para o apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, às custas da OAS Empreendimentos, a pedido deste, com recursos ilícitos auferidos pela empreiteira em contratos com a PETROBRAS, fato enfaticamente negado. De logo consigno que, do ponto de vista formal, o imóvel esteve e está averbado no cartório de registro de imóveis em nome da OAS Empreendimentos S/A (evento 3, comp228), inclusive na unidade especificada (apto 164-A, Edifício Salinas, Condomínio Solaris). E isso se dá porque, além de não ter havido a transferência formal para nenhum outro proprietário até a expedição do habite-se, o regime jurídico das incorporações imobiliárias exige que o empreendedor mantenha o imóvel registrado em seu nome, até que a transferência se ultime na forma do art. 32 da Lei nº 4.591/64. O histórico da construção do edifício é fundamental para a compreensão dos fatos. O empreendimento foi originariamente titularizado pela BANCOOP e posteriormente transferido para a OAS Empreendimentos por força de dificuldades financeiras enfrentadas pela primeira (reforçadas pelo ajuizamento de ação por associação de cooperados de outro empreendimento, no qual a OAS interveio em face da assunção da construção - evento 3, comp226). Aliás, foram justamente as dificuldades financeiras que fomentaram o contato entre a BANCOOP e a OAS, para que a construtora viesse a assumir diversas obras, dentre elas a do edifício no Guarujá. A transferência do empreendimento está provada e o contrato de compromisso de compra e venda acha-se encartado aos autos (evento 3 - comp213), onde não há apenas a transferência do empreendimento, mas da própria titularidade do terreno, que se achava matriculado sob nº 68.085, no respectivo Cartório do Guarujá/SP. A OAS, além de adquirir o terreno onde estava sediado o empreendimento, expressamente anuiu em transformar-se em incorporadora do edifício, na forma da Lei das Incorporações (Lei nº 4.591/64). Referido acordo, datado de 08 de outubro de 2009, estabelecia a realização de assembleia dos condôminos para aprovação da avença, bem como prazo para a 'demissão' para aqueles que pretendessem rescindir o contrato (capítulo VIII, do contrato). JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, em seu interrogatório (evento 809), contextualizou os fatos narrados na denúncia: Juiz Federal:- Pois bem, vamos aqui agora para essa questão do tal do triplex. Consta no processo que a OAS assumiu esses empreendimentos imobiliários do BANCOOP, o senhor participou desse procedimento, dessa negociação? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 166 de 317 JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Participei sim. Juiz Federal:- O senhor pode me descrever o que aconteceu? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- No ano de 2009 eu fui procurado pelo senhor João Vaccari, que tinha sido ou era ainda, não me recordo, presidente do BANCOOP, e ele me colocou que a situação do BANCOOP de quase insolvência, eles não estavam conseguindo dar andamento a empreendimentos, alguns estavam paralisados, já tinham começado, e outros não tinham sido ainda encerrados, ele me mostrou 6 ou 7 empreendimentos que o BANCOOP teria uma intenção de negociação conosco, eu disse a ele que algumas premissas teriam que ser estabelecidas, que nos interessava naquele momento, a área imobiliária nossa atuava, nós atuávamos na Bahia, estavam começando alguns empreendimentos em Brasília, e São Paulo era um local que nós tínhamos o maior interesse, e facilitaria muito para a gente também o fato de alguns empreendimentos já estarem com comercialização praticamente feita, então isso ajudava muito, naquele momento também os terrenos estavam muito supervalorizados em função do boom do mercado imobiliário, então ficou combinado, ele me mostrou a situação física de cada empreendimento e geográfica, quando ele me mostrou esses dois prédios do Guarujá eu fiz uma ressalva a ele que não nos interessava atuar, tinha uma política empresarial nossa na área imobiliária, inclusive adotada por mim, de só atuar, que a empresa só atuaria em grandes capitais, os nossos alvos eram Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e Porto Alegre por causa de um empreendimento grande que nós estávamos fazendo lá, e tinha um projeto imobiliário, fora disso nós não tínhamos interesse. Ele me disse 'Olha, aqui temos uma coisa diferente, existe um empreendimento que pertence à família do presidente Lula, diante do seu relacionamento com o presidente, o relacionamento da empresa, eu acho que, nós estamos lhe convidando para participar disso por conta de todo esse relacionamento e do grau de confiança que nós depositamos na sua empresa e na sua pessoa', diante disso eu disse 'Olha, se tratando de uma coisa dessa monta eu vou...', de qualquer forma eu teria que mandar fazer um estudo de viabilidade de cada empreendimento, eu disse a ele 'Olha, não vejo problema, eu vou passar isso para a nossa área imobiliária, que é uma empresa independente, a empresa fará os estudos, eu volto com você e a gente vê se é viável, se não é viável, e com que podemos negociar'. Juiz Federal:- Essa conversa foi em 2009, é isso? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Em 2009, 2009. Juiz Federal:- Bom, quando essa conversa foi concluída eu procurei o Paulo Okamotto, que era uma pessoa do estreito relacionamento do presidente e também do meu relacionamento, então eu procurei o Paulo Okamotto e disse 'Paulo, o João Vaccari me procurou e me disse isso e isso, o que você me recomenda, o que você me orienta?', ele disse 'Não, nós temos conhecimento disso e isso tem um significado muito grande, primeiro o BANCOOP é um sindicato que tem muita ligação conosco, com o partido e, segundo, porque tem um apartamento do presidente, e eu acho que você é uma pessoa indicada para fazer isso pela confiança que nós temos em vocês,' eu disse 'Então pode, tá bom', 'Pode fazer', 'Tá bom'; eu voltei ao Vaccari e, com os estudos feitos, as duas empresas, ele indicou as pessoas do BANCOOP que teriam autoridade para fazer, os membros da diretoria, e eu indiquei as pessoas da OAS que podiam negociar empresarialmente, porque realmente era uma negociação muito difícil, empreendimentos que não tinham começado, outros que estavam no meio, tinha problemas já de ações do Ministério Público, tinha um quadro bem complexo, mas isso tudo acabou ocorrendo bem e foram iniciadas as obras de cada empreendimento, nem todas simultâneas por causa de uma questão de uma liberava antes do que a outra. No acordo, foi previsto que ele seria submetido à assembleia dos cooperados do Empreendimento Mar Cantábrico (denominação anterior). Caso aprovado, os cooperados ficariam obrigados a (evento 3 - COMP213): a) requerer, de forma expressa e individual, sua demissão dos quadros de associados da Seccional Residencial Mar Cantábrico da BANCOOP, preenchendo o Requerimento de demissão, modelo anexo (Anexo IV), no prazo de até dez dias a contar da aprovação deste Termo pela Assembléia Seccional; https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 167 de 317 b) deverão comparecer à BANCOOP e firmar o termo de restituição de crédito, onde constará os valores e a forma de restituição os cooperados eliminados, para fazer jus ao recebimento de seus haveres pela OAS; c) assinar com a OAS em até trinta dias, contados após a aprovação deste Termo em Assembléia da Seccional Mar Cantábrico, uma Temo de Aceitação da Proposta Comercial (TAC) - (Anexo V), onde estarão contidas, dentre outras todas as condições descritas neste Termo; c.1) O cooperado terá reconhecido pela OAS, o valor integral pago para a BANCOOP, devidamente descrito no Termo de demissão a ser firmado pelo cooperado, após a aprovação deste Termo e Acordo pela Assembléia Seccional. Sobre este valor será calculada a multa prevista no item h.1 da cláusula 7.1.1 deste termo, a ser abatido do 'empréstimo solidário'; (...) h) assinar com a OAS Contrato de Promessa de Compra e Venda da unidade habitacional, após o registro da incorporação, subordinado as condições dispostas no presente Termo, aceitando formalmente a alteração do total a ser pago pela unidade habitacional, conforme valores discriminados no Anexo VI, estabelecendo as formas de pagamento do novo saldo devedor, ficando facultado o pagamento direto para a OAS ou através de financiamento bancário, quando o interesse do cooperado for o de permanecer com a unidade primitivamente designada pela BANCOOP; h.1) Quando não houver interesse em permanecer no empreendimento, o cooperado deverá assinar com a OAS um Termo de Acordo para recebimento dos valores pagos e devidamente corrigidos de acordo com as regras estatutárias, observado o item h.1 da cláusula 7.1.1.; (...) O ajuste previa o chamamento de todos os associados para uma assembleia, onde cada condômino deveria fazer uma das opções possíveis sobre o destino do empreendimento: aderir à nova forma de conclusão da obra, assinando termo de acordo, ou optar por rescindir o contrato. A ausência de manifestação do cooperado, na forma dos itens 8.2 e 8.3 do acordo firmado, implicaria em violação de decisão assemblear e, por consequência, a 'demissão' do cooperado do grupo. Ocorre que, da assembleia realizada em 27/10/2009, convocada pelo Diretor Presidente da BANCOOP (evento 3 - comp214) e na qual foi aprovado o acordo, não redundou nenhuma ação positiva por parte do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e de sua esposa Marisa Letícia. Isto é, não requereram a 'demissão' como cooperados, como também não assinaram termo de adesão ao novo empreendimento. Todavia, há prova da adesão, na medida em que também ali consta informação da adquirente do empreendimento (OAS Empreendimentos) prestada ao Ministério Público de São Paulo, em sede de ação civil pública, que, das 112 unidades, 'foram vendidas 111 (cento e onze) unidades do empreendimento para ex-cooperados da BANCOOP, bem como 1 (uma) unidade do empreendimento para novo adquirente' (evento 3 - comp226 - p. 4-5). Equivale dizer, todas as unidades estavam vendidas, inclusive a implicitamente destinada ao ex-Presidente. 3.3.5.2. A defesa sustenta, porém, que teria havido rescisão do contrato, porque o apelante e sua esposa nunca firmaram qualquer compromisso de transferência de uma unidade para outra, tampouco optaram em reaver os valores aplicados na compra da unidade a tempo e modo firmado na assembleia de condomínio. Posteriormente, no https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 168 de 317 entanto, Marisa Letícia Lula da Silva ingressou com ação cível contra a BANCOOP e a OAS Empreendimentos pleiteando a devolução dos valores pagos; aponte-se, somente em 19/07/2016 (evento 85, out12). Como ressaltado acima, não há prova de qualquer manifestação de vontade expressa do apelante ou de sua esposa por ocasião da assembleia que disciplinou a assunção do empreendimento pela OAS Empreendimentos, malgrado os condôminos/cooperados tenham sido chamados a fazê-la. A consequência jurídica de silêncio seria a exclusão ('demissão') do cooperado (itens 8.2 e 8.3). Ocorre que não há nos autos qualquer iniciativa, por parte do cooperado ou da empreiteira, quanto à exclusão, podendo-se concluir, dos indícios, que a relação jurídica se manteve. Tanto é assim, que os compromissários adquirentes continuaram vertendo mensalidades até setembro/2009. Mais do que isso, o imóvel constou expressamente na declaração de imposto de renda conjunta do casal LULA DA SILVA até o exercício de 2015, ano-calendário 2014. Somente na declaração seguinte (ano-calendário 2015) houve a exclusão do referido compromisso de compra e venda da declaração de ajuste anual. Sobre o tema, considerou o juízo de primeiro grau: 355. Foram localizados dois pedidos de devolução do dinheiro pago e desistência do empreendimento, isso na referida busca e apreensão realizada no processo 506174483.2015.4.04.7000 (evento 9) na BANCOOP e que foram juntados no inquérito 500349690.2016.4.04.7000. 356. Com efeito nas fls. 19-20 do arquivo ap-inqpol13, do evento 33, consta 'Termo de declaração, compromisso e requerimento de demissão do quadro de sócios da seccional Mar Cantábrico da Bancoop' em nome de Marisa Letícia Lula da Silva, relativamente à unidade 141, e que se encontra por ela subscrito. 357. Ali consta que valor total pago seria de R$ 209.119,73, o que corresponderia aos pagamentos corrigidos até agosto de 2009, com início de devolução prevista para 27/10/2010. 358. A data do termo não se encontra, porém, preenchida, havendo apenas referência ao ano de 2009. 359. No arquivo ap-inqpol14, do evento 33, fls. 1-3, do inquérito 500349690.2016.4.04.7000, consta outra via do mesmo termo, desta feita acompanhado com os cálculos dos valores pagos corrigidos (fls. 3-4 do arquivo ap-inqpol14 do inquérito 5003496-90.2016.4.04.7000). Pelos cálculos ali constantes, verifica-se que o ex-Presidente e Marisa Letícia Lula da Silva pagaram cinquenta de setenta prestações, no total de R$ 179.650,80. A última parcela teria sido paga em 15/09/2009. 360. Na fl. 5 do arquivo ap-inqpol14, do evento 33, do inquérito 500349690.2016.4.04.7000, consta outro 'Termo de declaração, compromisso e requerimento de demissão do quadro de sócios da Bancoop', também assinado por Marisa Letícia Lula da Silva, mas desta vez datado de 02/12/2013. Abaixo, no mesmo documento, consta trecho preenchido pela BANCOOP informando que a 'demissão' teria sido acatada em 26/11/2015. 361. As datas constantes nos referidos documentos, 2009 e 02/12/2013, podem ser fraudulentas, pois sequer conferem com o álibi apresentado pela própria Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, de que só teria havido desistência da aquisição em 2014, como verse-á adiante. Aliás, em ação cível proposta em 2016, por Marisa Letícia Lula da Silva contra a OAS Empreendimentos e a BANCOOP consta a afirmação de que tais documentos teriam sido subscritos somente em novembro de 2015 (item 415). 362. É certo, porém, que, apesar desses documentos, não houve a devolução de valores pagos ao ex-Presidente e Marisa Letícia Lula da Silva, nem pela OAS Empreendimentos, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 169 de 317 nem pela BANCOOP, o que é indicativo de que os referidos termos de desistência foram assinados extemporaneamente. 363. No processo 5005896-77.2016.4.04.7000, houve, a pedido do MPF, quebra judicial de sigilo fiscal do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (decisão de 23/02/2016, evento 6). Cópias das declarações de rendimento foram juntadas no evento 3, comp227. Ali, verifica-se que Luiz Inácio Lula da Silva apresentava declaração de rendimentos conjunta com Marisa Letícia Lula da Silva. Nas declarações de 2010 a 2015, anos calendários 2009 a 2014, consta a declaração da titularidade de direitos sobre a unidade habitacional nº 141, Edifício Navia, Residencial Mar Cantábrico, no valor de R$ 179.298,96, sem qualquer alteração de valor no período. 364. Apenas na declaração de 2016, ano calendário 2015, apresentada em 27/04/2016, portanto, posterior ao início das investigações, consta alteração quanto ao referido bem, sendo informado que teria havido desistência e requerimento de devolução dos valores pagos em novembro de 2015 junto à BANCOOP, sem efetiva devolução (fl. 114 do arquivo comp227, evento3). 365. Então, pelas próprias declarações de rendimentos apresentadas pelo ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem-se que não houve alteração formal da contratação junto à BANCOOP ou à OAS Empreendimentos antes do início das investigações. GRIFO NOSSO Desse modo, os indícios conspiram em favor de uma manifestação (certamente informal e em data incerta), uma vez que os documentos não permitem precisar com exatidão em que momento ocorreu. É indubitável, porém, que teria se dado antes da propositura da referida ação cível (evento 85, out12), dada a inércia de ambas as partes até então. Ou seja, no mínimo, deve ser analisada com reservas a alegação de desinteresse no imóvel a partir de 2014, uma vez que a opção deveria ter ocorrido em 2009 e o ajuizamento da ação somente se deu em 2016. Aliás, mostram-se incompatíveis com a versão de desinteresse no imóvel os fatos decorridos após a referida assembleia, como as duas visitas ao apartamento e as reformas que lhe sucederam, como adiante será analisado. Em razão de busca e apreensões, foram apreendidos documentos relativos a termos de 'demissão' do empreendimento (autos nº 5061744-83.2015.4.04.7000 - evento 9) na BANCOOP, juntados no Inquérito nº 5003496-90.2016.4.04.7000. Todavia, tais documentos são imprestáveis para demonstrar a correta data de sua confecção, trazendo poucas luzes para esclarecimento dos fatos. 3.3.5.3. O conjunto probatório existente nos autos corrobora a versão acusatória. Sobre isso, sintetizou o juízo de origem na sentença (evento 948): 593. Assim, há depoimentos no sentido de que o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua esposa Marisa Letícia Lula da Silva eram os proprietários ou eram tratados como proprietários do apartamento 164-A, triplex, do Condomínio Solaris, e há depoimentos no sentido de que eram potenciais compradores. 594. No primeiro sentido, encontram-se os depoimentos de Mariuza Aparecida da Silva Marques, José Afonso Pinheiro, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, Paulo Roberto Valente Gordilho, Roberto Moreira Ferreira e Agenor Franklin Magalhães Medeiros. Em certa medida, também o de Rosivane Soares Cândido, embora ela tenha ouvido comentários de terceiros a esse respeito. 595. No segundo sentido, encontram-se os depoimentos de Luiz Inácio Lula da Silva, Igor Ramos Pontes, Genésio da Silva Paraíso, Valmir Soares da Silva, Fábio Hori Yonamine e Paulo Tarciso Okamoto. Ressalve-se, porém, que mesmo Igor Ramos Pontes, Genésio da Silva Paraíso e Fábio Hori Yonamine reconhecem, utilizando as palavras do último, que as reformas do apartamento eram atípicas. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 170 de 317 596. Há outros depoimentos que não são conclusivos em um sentido ou no outro, uma vez que o depoente teria somente um conhecimento limitado dos fatos ou afirmou que não conheceria detalhes deles. Nessa linha, os depoimentos de Ricardo Marques Imbassy, Carmine de Siervi Neto, Rodrigo Garcia da Silva, Mario da Silva Amaro, Arthus Hermógenes Sampaio Neto, Armando Dagre Magri, Hernani Guimarães Júnior, Alberto Ratola de Azevedo, e daqueles relacionados no item 509. Importa examinar, no essencial e porque coincidentes com os demais elementos de prova, alguns depoimentos de pessoas que tiveram conhecimento dos fatos. A testemunha Mariuza Aparecida da Silva Marques disse em juízo (evento 425): Ministério Público Federal:- A senhora acompanhou, apenas desde maio de 2014 que a senhora acompanhou a entrega do Condomínio Solaris, é isso? Depoente:- Sim. Ministério Público Federal:- Em relação ao tríplex 164-A, a senhora participou tanto das obras que foram feitas no apartamento, quanto de entrega? Depoente:- A minha função referente ao tríplex 164 foi somente fiscalizar uma empresa que foi contratada para fazer uma reforma. Ministério Público Federal:- Fiscalizar uma empresa contratada? Depoente:- Isso. Ministério Público Federal:- A senhora podia explicar melhor que empresa era essa, que reforma era essa? Depoente:- A empresa Tallento que foi contratada pela OAS para fazer melhorias, reforma, e eu tenho uma agenda semanal no Edifício Solaris, então como toda semana eu estava no condomínio eu fiquei encarregada de fiscalizar, de verificar se estava, a obra estava correndo tudo bem, se estava faltando alguma coisa, era essa a minha função. Ministério Público Federal:- Por que a OAS contratou essa empresa para fazer essa reforma, senhora Mariuza? Depoente:- Não sei. Ministério Público Federal:- A senhora sabe dizer se essa unidade possuía um proprietário? Depoente:- Não, eu não sei lhe informar se ela possuía um proprietário, se dizia que tinha, iria, assim, reformar, melhorar porque tinha, assim, um cliente em potencial para comprar essa unidade, que tinha interesse nessa unidade. Ministério Público Federal:- Esse cliente era o ex-presidente Lula e sua esposa Marisa Letícia? Depoente:- Isso. Ministério Público Federal:- Senhora Mariuza, esse tipo de serviço, fazer uma obra, a OAS que é uma empresa de engenharia contratar uma outra empresa para fazer uma reforma dentro de um imóvel novo, a senhora já viu isso acontecer outras vezes na OAS? Depoente:- Na OAS não. Ministério Público Federal:- Na OAS não. A senhora já viu o ex-presidente Lula, a senhora Mariza Letícia, algum familiar, alguma pessoa ligada a eles, fazer uma visita a esse imóvel? Depoente:- Eu estive presente numa visita feita pela senhora Marisa e pelo filho dela, eu não sei o nome, acho que ela chamava ele de Fábio. Ministério Público Federal:- Essa visita a senhora sabe quando ocorreu? Depoente:- Olha, foi final de agosto de 2014. Ministério Público Federal:- Quem mais estava presente? Depoente:- Estavam presentes o Igor, o meu gerente, o doutor Paulo, Roberto Moreira, doutor Léo, senhora Marisa e o filho dela, tinha duas pessoas da Tallento, um que era o Luciano que era o que a gente tinha mais contato, que era da parte técnica, o outro era um sócio, e a Rose que era a engenheira responsável lá pela reforma. Ministério Público Federal:- Doutor Paulo é Paulo Gordilho, é isso? Depoente:- Isso. Ministério Público Federal:- Nessa visita, agosto de 2014, a reforma já estava pronta ou ainda estava em execução? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 171 de 317 Depoente:- Ainda estava em andamento, uns 70% da reforma executada. Ministério Público Federal:- A senhora podia dar um pouquinho mais de detalhe, o que faltava ainda, o que já tinha sido feito? Depoente:- Faltava uma parte de pintura, algumas, o elevador estava sendo instalado, era basicamente isso. Ministério Público Federal:- A senhora acompanhou então essa visita, qual era o objetivo dessa visita? Depoente:- Olha, verificar o andamento da reforma, acredito que isso. Ministério Público Federal:- Mas era, digamos assim, era colocar o imóvel para venda ou era verificar se essas pessoas que visitaram estavam de acordo com a reforma, gostaram da reforma, essa reforma era, a senhora conseguiu perceber se essa reforma era o que eles, se haviam pedido, era o que eles tinham pedido, é isso? Depoente:- Sim, era o que eles haviam pedido. Ministério Público Federal:- Só para a senhora detalhar um pouco mais, ficou claro que essa reforma então, nessa visita, estava de acordo com o que o ex-presidente Lula e a senhora Marisa Letícia haviam pedido, é isso? Defesa:- Excelência, não houve essa afirmação, o doutor procurador está fazendo uma afirmação que não foi dita pela testemunha, o que a testemunha disse é que havia um potencial comprador. Ministério Público Federal:- É por isso mesmo que eu estou pedindo para ela esclarecer. Defesa:- Então, mas o senhor faça pergunta, doutor, o senhor não pode fazer uma afirmação. Juiz Federal:- Doutor, está indeferido. Ministério Público Federal:- Senhora Mariuza, a senhora ouviu a pergunta, senhora Mariuza? Depoente:- Na verdade, assim, o que eles pediram foi de acabamento, a colocação, o acabamento do piso, uma pintura, se estava de acordo, assim. Ministério Público Federal:- A senhora acompanhou o ex-presidente Lula e a senhora Marisa Letícia falando sobre esses itens? Depoente:- Não, não, eu não estive presente com o ex-presidente Lula. Ministério Público Federal:- Desculpa, a senhora Marisa Letícia e o filho, é isso? Depoente:- Isso. Ministério Público Federal:- E a senhora viu eles falando, perguntando sobre essa questão que a senhora falou lá de piso? Depoente:- Não, a única coisa que eu ouvi ela falando, eu fiquei bem pouco perto deles, foi que 'Ah, está ficando bom', aí dá-se a entender que foi o que eles pediram. Ministério Público Federal:- Nessa visita o senhor Léo Pinheiro estava presente por quê, o que ele fez, a senhora sabe dizer? Depoente:- Ele estava presente, mas em nenhum momento eu fiquei próxima deles, quando eles estavam num ambiente do apartamento eu estava sempre na sala, próximo à porta de entrada do apartamento, então não sei lhe dizer o que... Ministério Público Federal:- Então, mas eles entraram, o senhor Léo Pinheiro entrou com a senhora Marisa Letícia e o filho para visitar os quartos, o interior do apartamento, é isso, e a senhora não acompanhou de perto? Depoente:- Sim. Não, eu não acompanhei. Ministério Público Federal:- Então quem acompanhou com detalhes a entrada em todos os ambientes foi o senhor Léo Pinheiro, senhora Marisa, o senhor Fábio e mais quem? Depoente:- O Roberto e o Igor. Ministério Público Federal:- E o Paulo Gordilho também? Depoente:- E o doutor Paulo, isso. Ministério Público Federal:- O Roberto Moreira, qual a função dele mesmo? Depoente:- Ele faz parte da diretoria comercial e incorporação. Ministério Público Federal:- Senhora Mariuza, é comum, assim, que o diretor, Léo Pinheiro, senhor Roberto Moreira, senhor Paulo Gordilho, fizessem visitas a imóvel na companhia de clientes, a senhora já viu isso outras vezes? Depoente:- Não. Ministério Público Federal:- Foi só essa vez? Depoente:- Foi só essa vez. DESTAQUES https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 172 de 317 Armando Drage Magri, ouvido como testemunha (evento 424), afirmou ser sócio da Construtora Tallento desde 2007 e que a empresa fora contratada para realizar as reformas de uma unidade no Condomínio Solaris, no Guarujá, segundo contrato firmado com o ROBERTO MOREIRA FERREIRA. Disse a testemunha: Ministério Público Federal:- O senhor se recorda quem fez a contratação desse serviço? A pessoa que entrou em contato com a Tallento pra fazer a contratação do serviço? Depoente:- A gente tinha muito contato com o OAS e o procedimento era sempre padrão. A gente recebia um projeto da Paula, geralmente, e íamos afinando aí o orçamento até fechar o contrato com o Igor e com o Roberto. Ministério Público Federal:- O senhor se recorda o nome do Igor? Depoente:- Igor Pontes e Roberto Moreira. Ministério Público Federal:- Essa contratação para esse serviço no Guarujá aconteceu quando? Depoente:- Eu acredito que em meados de abril ou maio de 2014. Ministério Público Federal:- E o que envolvia esse serviço, qual foi o objeto da contratação? Depoente:- Uma reformulação geral no apartamento triplex, troca de acabamento, adequação de layout, mudanças de paredes, novas paredes, a colocação de um elevador, mudança na piscina, colocar cobertura com impermeabilização geral. A princípio isso. Ministério Público Federal:- Envolveu também pintura, troca de acabamento, troca de escada? Depoente:- Sim, perfeito, também. Ministério Público Federal:- E o senhor recebeu um projeto do que deveria ser feito? Depoente:- Recebemos um projeto inicialmente e orçamos em cima dele. Ministério Público Federal:- Nesse projeto inicial já constava a previsão de um elevador privativo? Depoente:- Já, já constava. Ministério Público Federal:- Em alguma outra oportunidade a Tallento já havia sido contratada pela OAS pra executar esse tipo de serviço? Depoente:- De apartamento, não. (...) Ministério Público Federal:- O senhor se recorda o valor dessa contratação? Depoente:- Aproximadamente 770 mil. Ministério Público Federal:- E quem pagou? Depoente:- A OAS. Ministério Público Federal:- O serviço foi prestado de quando até quando? Depoente:- De abril, maio... de maio a, mais ou menos, final de setembro. Ministério Público Federal:- De 2014? Depoente:- Isso. (...) Ministério Público Federal:- Além do senhor, quem mais compareceu a essa reunião pela Tallento? Depoente:- A Rosi e o Luciano. Ministério Público Federal:- Pela OAS quem compareceu a essa reunião? Depoente:- Estava a Marilza, o Roberto e o Igor. Ministério Público Federal:- Nessa ocasião, alguém mais chegou, o senhor pode descrever o que aconteceu? Depoente:- A gente estava na reunião, no início da reunião, adentrou dois senhores, uma senhora e um rapaz. Na hora, eu não sabia quem eram os dois senhores, a senhora eu conhecia e o rapaz também, de televisão, de internet. Ministério Público Federal:- Quem eram essas pessoas? Depoente:- Hoje eu sei que era o doutor Léo Pinheiro, o engenheiro Paulo Gordilho, a dona Marisa Letícia e o Fábio Luiz, filho dela. Ministério Público Federal:- Eles chegaram até o apartamento e o senhor estava lá? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 173 de 317 Depoente:- Estávamos, estávamos também no térreo, estávamos iniciando a nossa reunião. Ministério Público Federal:- E o que aconteceu depois que eles chegaram no apartamento? Depoente:- Eles chegaram no apartamento e praticamente participaram ali da reunião, eles foram vendo o apartamento, foram vendo todo o apartamento, tudo que estava acontecendo, e a gente foi junto com eles. Ministério Público Federal:- Eles circularam por todo o apartamento? Depoente:- Sim, circularam. Ministério Público Federal:- O senhor os viu circulando pelo apartamento? Depoente:- Sim, todos circulamos juntos. Ministério Público Federal:- O senhor pôde perceber se havia algum deles que era o responsável pela obra, que cuidava da parte técnica, a quem as pessoas que estavam no apartamento prestavam contas? Depoente:- Eu percebi que o Paulo Gordilho era o mais técnico, era o engenheiro que entendia, era o que mais questionava, perguntava para o Roberto e transmitia isso para os outros. Ministério Público Federal:- O senhor percebeu se havia alguma relação de proximidade entre o senhor Léo Pinheiro e a senhora Marisa Letícia e o senhor Fábio? Depoente:- Sim, bastante, bastante proximidade. Ministério Público Federal:- Nesse momento da visita já havia armários instalados nos quartos? Depoente:- Nada, nada, nada. (...) Ministério Público Federal:- Certo. O senhor disse que nessa reunião houve uma conversa, foi marcada com o senhor pra tratar de cronograma? Em algum momento o senhor ouviu sobre a compatibilidade desse cronograma com a necessidade contratar a Kitchens para fornecer algum tipo de bem? Depoente:- Sim, na hora que a gente falou que a nossa parte estava praticamente acabando, que o elevador acabaria em mais uns 15, 20 dias, depois era só dar retoque de pintura, aí, entre eles, eles falaram, assim, que precisavam agora agilizar a colocação dos móveis com a Kitchens. Ministério Público Federal:- Então, depois dessa visita, a reforma contratada junto à Tallento foi finalizada? Depoente:- Foi, foi finalizada. Ministério Público Federal:- O projeto inicial foi todo executado? Depoente:- Todo executado. Ministério Público Federal:- Quanto tempo depois dessa visita a parte da Tallento foi finalizada? Depoente:- Exatamente como combinado, no fim de setembro. Ministério Público Federal:- O senhor comentou sobre essa visita, em que o senhor encontrou com a senhora Marisa Letícia, com outros sócios da empresa, da Tallento? Depoente:- Lógico, sim, chegando na Tallento, a tarde, comentei. Ministério Público Federal:- Esse trabalho de reforma do apartamento do Condomínio Solaris foi o único desse tipo, a reforma de um apartamento triplex que a Tallento fez pra OAS? Depoente:- Sim, para a OAS e triplex, sim. DESTAQUEI A testemunha Igor Ramos Pontes, gerente regional de contratos da OAS Empreendimentos desde julho de 2013 (evento 425), afirmou ter sido contratado para administrar a obra de reforma da unidade; acreditando, contudo, que a mesma fosse realizada para fins de melhorar a possibilidade de venda. Confirmou sua presença em visita que o apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA fez à unidade com sua esposa, segundo entendeu, como potencial comprador. Relatou, ainda, ter participado da segunda visita feita ao imóvel, desta feita pela esposa do apelante, Marisa Letícia, e seu filho Fábio. Reafirmou que acreditava que a unidade estava sendo apresentada para potencial https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 174 de 317 comprador, depois das reformas realizadas. Sobre a instalação da cozinha e armários, disse que não se tratava de atividade usual, como é feito usualmente em unidade decoradas para fins comerciais, in verbis: Ministério Público Federal:- Durante a execução dessa obra houve outras visitas pelo expresidente Lula ou sua esposa, senhora Marisa Letícia? Depoente:- Do ex-presidente não, teve da ex-primeira dama, em agosto, no final do mês de agosto teve uma outra visita, a obra já estava na fase já quase de término, e teve uma outra visita. Aconteceu muito parecida com a primeira, ou seja, foi solicitado que eu estivesse presente na unidade e me direcionei para lá, e lá chegou, as pessoas que estavam lá não eram as mesmas exatamente, mas, no caso o ex-presidente, foi só a ex-primeira dama com o filho, era Fábio, ela chamava ele de Fábio. Ministério Público Federal:- E da OAS as mesmas pessoas? Depoente:- Da OAS estava presente o doutor Léo Pinheiro acompanhando, estava presente também o diretor Roberto, meu chefe, o doutor Paulo Gordilho que era diretor técnico na época na empresa, eu estive presente, a Mariuza que era a engenheira de assistência técnica, estava presente, e também se fez presente o pessoal da Tallento. Ministério Público Federal:- Em que condições estava o apartamento nessa visita, já estava quase pronto ou não? Depoente:- A parte civil do apartamento já estava bem adiantada, já tinha piso, o quarto do pavimento térreo já estava executado, a cozinha também já tinha sido feita a alteração do acesso, o elevador estava na montagem, estava no início ainda do elevador, mas já tinha a estrutura do elevador lá no local, e em cima, no pavimento da piscina já tinha sido feita a ampliação do deck, mas ainda não tinha sido feita a instalação da cobertura, mais ou menos, o que, final de agosto, questão de 1 mês e meio, 2 meses depois que concluiu a parte civil. Ministério Público Federal:- Nessa visita o senhor estava presente, a senhora Marisa Letícia, o senhor Fábio, disseram alguma coisa sobre o estado do imóvel? Depoente:- Não, na verdade não teve, assim, um comentário específico do estado, a gente, era muita gente nessa ocasião que estava no apartamento, o doutor Léo Pinheiro conduziu mais ou menos a coordenação da visita, aí atrás, junto com ele ia a senhora Marisa e o filho, mas não teve, assim, um discurso sobre o apartamento, sobre o que estava sendo feito, era mais uma verificação, enfim. Ministério Público Federal:- O senhor viu se houve uma aprovação, gostaram do apartamento, alguma coisa assim? Depoente:- Não foi dito, até eu comentei num depoimento anterior meu, não tive, não presenciei nenhuma situação de ela comentar se ficou bom, se não ficou bom, se estava certo, se estava errado, não tinha aparentemente nenhuma constatação de que estava ok. Ministério Público Federal:- Esse tipo de visita com a presença do presidente Léo Pinheiro, do Roberto Moreira, do Fábio Yonamine, é algo comum, que costuma acontecer ou foi só dessa vez? Depoente:- Não, não, nunca aconteceu, acredito que pela figura de quem estava acompanhando, uma pessoa ilustre, talvez por isso tenha tido tanta repercussão na empresa. Ministério Público Federal:- Senhor Igor, nessa visita, a justificativa para essa visita foi a mesma da visita anterior ou nessa visita a justificativa era diferente, era para uma aprovação da reforma, alguma coisa assim? Depoente:- Não, não teve nenhuma mudança no que foi dito, na verdade a ideia da visita acho que era apresentar, eu acho que eles tinham conhecido o apartamento numa condição e ia se apresentar o apartamento agora com num formato, é bem verdade que o apartamento não estava pronto, estava ainda em obra, mas não sei porque se propôs a apresentar naquela ocasião, mas já dava para ter uma boa ideia de como o apartamento iria ficar. Ministério Público Federal:- O senhor tem conhecimento depois de contratação da empresa Kitchens para elaboração de armários e instalação? Depoente:- Sim. Sim, na verdade no finalzinho ali da obra foi feita uma solicitação de alguma alteração de pontos hidráulicos na cozinha, que seria feita a montagem dos https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 175 de 317 armários da cozinha, então a gente na obra teve acesso que ia ter essa informação na cozinha e ponto, mais nada. Posteriormente, um tempo depois já da obra paralisada em função de tudo que já foi divulgado em mídia, aí foi parado 100%, teve uma infiltração grande nesse apartamento, inclusive vazou água no prédio e tal por conta disso, eu tive que ir lá para verificar, e nessa verificação eu constatei que tinham móveis nos quartos, enfim, e em outros ambientes também. Ministério Público Federal:- Deixa eu pedir para o senhor detalhar um pouco mais, nessa visita que o senhor disse que foi feita em agosto não havia móveis da Kitchens, e o senhor não sabe dizer se tinham sido contratados ainda, ou já tinha? Depoente:- Não, eu acredito que sim porque nessa ocasião eu já sabia sobre as alterações dos pontos da cozinha, então já teria que fazer algumas mudanças nos pontos da cozinha por conta da contratação, agora em outros ambientes eu não sabia, não tinha sido feito nada ainda, nessa época ainda era obra civil. Ministério Público Federal:- Quem passou essa orientação da alteração nos pontos da cozinha? Depoente:- Essa alteração veio da área de incorporação da empresa, o próprio Roberto que fazia o acúmulo das duas funções, da área de engenharia e da área de incorporação, foi quem solicitou que a equipe receberia um projeto, um croqui da Kitchens com a solicitação de pontos, esse projeto eu não me recordo quando foi passado, enfim, não foi nem por minha mão na verdade, já foi direto para a equipe, talvez para a Mariuza que encaminhou para a Tallento fazer a alteração. Ministério Público Federal:- Em algum outro imóvel o senhor viu isso de a OAS entregar com armários, fazer esse tipo de alteração? Depoente:- Não, essa situação de armário só acontecia em apartamentos modelos, geralmente era um apartamento no prédio para fomentar a venda, facilitar a venda, estratégia de vendas. Ministério Público Federal:- Apartamento modelo é aquele apartamento decorado, é isso? Depoente:- Isso, apartamento decorado, que aí geralmente é feito no prédio para divulgação. Ministério Público Federal:- Geralmente tem um andar específico que é feito esse apartamento decorado? Depoente:- É, geralmente são pavimentos baixos para facilitar o acesso, depender o mínimo possível de elevador, o apartamento geralmente é no primeiro ou segundo andar. Ministério Público Federal:- O senhor então não acompanhou a contratação da Kitchens, só ficou sabendo quando entrou no imóvel, é isso? Depoente:- Isso. Não, a contratação eu não acompanhei, não fazia parte do escopo da área técnica, era da área de incorporação. SUBLINHEI As testemunhas Arthur Hermógenes Sampaio Neto e Mário da Silva Amaro (ambos no evento 425), na qualidade de representantes da empresa Kitchens, confirmaram a aquisição de cozinhas e armários para a unidade triplex, embora ignorassem quem seria o destinatário da aquisição. Todavia, confirmam que a contratação e pagamento ocorreram por meio da empresa OAS Empreendimentos. Rosivane Soares Cândido, empregada da Construtora Tallento (evento 426), disse ter trabalhado na reforma da unidade triplex do Condomínio Solaris, Edifício Salinas, em obra contratada pela OAS Empreendimentos, e participado da reunião em que estavam presentes a ex-primeira dama Marisa Letícia e seu filho Fábio. Afirmou que as pessoas em geral tinham ciência de que a unidade era do ex-Presidente, embora não soubesse dos fatos por conhecimento próprio, mas por boatos: Ministério Público Federal:- E teve algum episódio de que houve algum tipo de visita lá por pessoas da OAS, da Talento, de cúpula das empresas? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 176 de 317 Depoente:- Eu recebia visitas semanais da engenheira Mariuza, a qual trabalhava junto comigo, e ela também era responsável pela manutenção predial do prédio, então ela vinha sempre uma vez por semana para cuidar dessa parte de assistência técnica, e eu recebia a visita dela também como, ela seria o meu contato com a OAS. Fora a Mariuza, esporadicamente ia também o engenheiro Igor, agora não lembro o sobrenome dele, o Igor e os meus gestores também sempre iam, que é o Luciano Manginelle, o Armando Magri, mas nessa parte esporádica, e uma única vez tivemos umas visitas diferenciadas no apartamento também. Ministério Público Federal:- Me explique, por favor, essa questão da visita diferenciada, por gentileza. Depoente:- Num dia de obra chegaram alguns da OAS, eu não conhecia eles pessoalmente, mas depois eu vim a saber que era o senhor Léo Pinheiro, o Roberto, que eu também não lembro o sobrenome dele, estava o Igor Pontes, o meu gestor no dia já estava lá, o Armando Magri, e também a visita da dona Marisa e o filho dela, que depois eu vim a saber também que o nome dele é Fábio. Ministério Público Federal:- E essa visita, como que foi, o que eles fizeram lá no apartamento? Depoente:- Eles fizeram uma visita à unidade, junto com o meu gestor e o pessoal da OAS eles andaram no apartamento, foram ver a unidade em si, ver a obra, não sei, eu recebi essa visita no decorrer do dia, até, tipo, uma grande surpresa, eu não sabia, quando eu cheguei pra trabalhar eu não sabia dessa visita. Ministério Público Federal:- No momento dessa visita já existia a instalação do elevador privativo? Depoente:- Olha, eu acredito que sim, eu não sei lhe informar precisamente, mas alguma coisa da estrutura já estava pronta, não o elevador em funcionamento, isso não. Ministério Público Federal:- Mas já estava colocado possivelmente? Depoente:- Não, não, o elevador foi montado no fim da obra, em meados de novembro, eu acredito, porque é um processo demorado, tem que, tem toda uma estrutura que é montada antes, não é rápido. Ministério Público Federal:- Em algum momento alguém disse para a senhora que esse apartamento seria, poderia ser da família do ex-presidente Lula? Depoente:- Sim, a maioria dos moradores do condomínio, os comércios na região, eu achei até surpresa quando eu comecei a trabalhar lá, que eu não sabia dessa informação, e eu fui informada, até a primeira eu tive com um comerciante que eu fui fazer um cadastro da empresa para poder faturar, para poder comprar materiais básicos de construção, e foi ele justamente que veio falar 'Ah, é o apartamento do Lula, né', mas não fui informada desde o início não, assim, documentalmente, eu não tenho nenhum tipo de documento que me foi formalizada essa informação. Ministério Público Federal:- Além do comerciante, outras pessoas comentaram isso com a senhora? Depoente:- O pessoal do condomínio, os funcionários do condomínio. Ministério Público Federal:- O que eles falavam? Defesa:- Só uma questão de ordem, aí é uma questão, quer dizer, por boatos, me parece que nós estamos fugindo da questão, se é propriedade ou não, boato é uma coisa que me parece estranha na colheita da prova. Juiz Federal:- Indefiro, doutor, tem relevância saber de quem ouviu esse comentário, é a pergunta que está sendo feita. Ministério Público Federal:- Retomando, senhora Rosivane, o que as pessoas comentaram, os vizinhos, o que a senhora ouvia? Depoente:- Que o apartamento era do presidente Lula. Ministério Público Federal:- Ok. A senhora teve ciência de que o ex-presidente teria visitado o apartamento em algum momento? Depoente:- Eu tive sim, que essa visita foi antes de a gente iniciar a obra. Ministério Público Federal:- Antes da obra? Depoente:- É. (...) Defesa:- E algum deles narrou à senhora ter encontrado o ex-presidente Lula alguma vez no prédio, alguma dessas pessoas da Tallento que também frequentavam o imóvel? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 177 de 317 Depoente:- Não. Defesa:- A senhora, respondendo aqui a uma questão do doutor procurador da república, afirmou que um comerciante teria dito à senhora que o apartamento seria do ex-presidente Lula, ele apresentou algum elemento para justificar à senhora essa afirmação ou era só um boato? Depoente:- Todos eles não me apresentaram nenhum documento que comprovasse isso. Defesa:- Mas apresentaram algum elemento, sem ser documento? Depoente:- Não. Defesa:- Justificaram à senhora porque eles estavam afirmando aquilo? Depoente:- Acho que deve ser realmente igual o senhor falou, é boato, é vizinhança falando sobre essa informação, não tem justificativa, né. SUBLINHEI José Afonso Pinheiro (evento 426) igualmente testemunhou. Devidamente compromissado, embora a defesa tenha apresentado contradita, disse que era zelador do Condomínio Solaris ao tempo do fatos e que a unidade nunca fora colocada à venda para terceiros, sendo de conhecimento geral que ela era destinada ao ex-Presidente, ora apelante, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Destacou, ainda, que apresentou as áreas comuns da unidade à ex-Primeira Dama Marisa Letícia e que vários corretores, ao tentarem vender unidades, apresentavam o edifício como sendo o local onde o ex-Presidente tinha uma unidade. Todavia, o mais relevante no seu depoimento foi narrar ter sido pressionado para não mencionar a ninguém que a unidade pertenceria ao ex-Presidente, conforme relatou ao Ministério Público de São Paulo: Ministério Público Federal:- Esse apartamento, em algum momento ele foi colocado para visita de pessoas que iam lá querendo comprar o apartamento, ou esse apartamento não tinha esse tipo de gente indo lá, terceiras pessoas? Depoente:- Não, não, esse apartamento nunca foi visitado, visitado com corretor ou outra pessoa para venda, ele era dado como o apartamento do senhor Luiz Inácio. Ministério Público Federal:- O senhor prestou um depoimento no Ministério Público do Estado de São Paulo, a documentação está juntada aos autos, e informou que o funcionário Igor, da OAS, pediu para que o senhor não falasse nada sobre o apartamento senhor do Lula ou da sua esposa, mas sim dizer que era da OAS, e ele falou explicitamente para o senhor dizer que o apartamento era da OAS e que Lula e Marisa nunca estiveram lá, o senhor confirma isso, por gentileza? Depoente:- Confirmo, sim senhor, ele pediu para mim, foi até enérgico comigo ao falar que não era para falar que o apartamento pertencia ao senhor Luiz Inácio e a dona Marisa, nem que eles compareceram ao apartamento, era para falar que o apartamento pertencia à OAS, isso ele foi bem enérgico comigo. DESTAQUEI Das transcrições acima, constata-se que as testemunhas eram pessoas que atuaram na reforma da unidade como contratados. Infere-se, também, com toda a certeza, que, ao longo do ano de 2014, foram feitas visitas ao apartamento pelo apelante e seus familiares, bem como foram realizadas reformas custeadas pela OAS Empreendimentos. Ainda que não sejam uníssonos os depoimentos acerca da titularidade do imóvel até o momento das visitas, tampouco dos responsáveis pelas escolhas na obra, fica bastante claro que toda a empreitada era comandada pelos altos dirigentes da OAS Empreendimentos. Assim, a prova testemunhal traz segura orientação sobre as pessoas que poderiam apresentar respostas conclusivas. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 178 de 317 O fato de alguns depoentes não saberem das circunstâncias do 'negócio' ou suporem que se tratava de operação regular é comum ao seu distanciamento com relação aos fatos. Dentro da OAS Empreendimentos apenas poucos diretores sabiam dos detalhes da negociação, ainda que, depois de algum tempo, aqueles tenham tido ciência do real destinatário do apartamento. O réu PAULO ROBERTO GORDILHO (evento 816), em seu interrogatório, informa que, ao tempo dos fatos era Diretor Técnico da OAS Empreendimentos, tendo conhecimento desde uma determinada reunião de Diretoria da empresa que o apartamento triplex, unidade 164-A, do Edifício Solaris, era destinado ao ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA ('Não, numa reunião de diretoria em 2011, por aí, foi mostrado o apartamento, esse está reservado para o ex-presidente.'). Afirma que todos dentro da diretoria da OAS Empreendimentos sabiam da reserva do apartamento. Relatou que a customização do apartamento somente ocorreu em 2014, embora o imóvel já estivesse reservado antes disso. Disse que esteve na segunda visita ao apartamento, da qual participaram Marisa Letícia e Fábio Lula da Silva (esposa e filho do ex-Presidente). Indagado acerca de mensagem que teria trocado em seu aparelho de telefone celular, esclareceu: Juiz Federal:- No processo aqui, eu só vou identificar, evento 3, anexo comp. 178, tem um laudo, não, desculpe, tem uns documentos que têm algumas mensagens que o senhor teria trocado relativamente, segundo a acusação, sobre esse apartamento, eu vou lhe mostrar aqui, eu peço para o senhor dar uma olhadinha, se o senhor puder dar uma olhada no que está na folha 6, o documento está lá, uma troca de mensagens ocorrida em 12 de fevereiro de 2014, começa lá 'O projeto da cozinha do chefe está pronto, se marcar com a madame pode ser a hora que quiser', peço para o senhor dar uma olhada. Paulo Roberto Valente Gordilho:- Então, isso aí, doutor, eu tive essas mensagens e na mensagem em que o doutor Léo pergunta 'E Guarujá está pronto?', eu estava na sala porque lá na OAS Empreendimentos, diferentemente da OAS Construtora, os diretores ficavam numa sala só, então na hora que ele me perguntou sobre o Guarujá, se estava pronto, o Roberto ficava como aqui a ele ali, aí eu perguntei 'Roberto, o Guarujá está pronto?', ele disse 'Está', aí eu cheguei e respondi para o doutor Léo 'O Guarujá também está pronto', porque eu não cuidava do Guarujá, desse projeto, essas coisas, eu não cuidava do Guarujá, eu fui levado lá muito, assim, por alguma proximidade que eu tinha, Roberto tinha 1 ano de empresa e eu estive muitos anos na empresa, então eu conhecia Léo, então ele sempre me arrastava para uns negócios desses que precisava dar opinião técnica, 'Pô, vai arrancar uma parede aqui, pô, mas tem um pilar, não pode, tem uma viga, não pode', coisas desse tipo na área técnica, entendeu? Juiz Federal:- Entendi. Quando faz referência ali ao Guarujá é referência ao que, o que é o Guarujá? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Guarujá é o Solaris. Juiz Federal:- A referência aqui ao apartamento do ex-presidente? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Sim, que seria o estipulado para ele, ele perguntou pra gente 'O Guarujá está pronto?', aí eu perguntei 'Roberto, o Guarujá está pronto?', 'Está', aí eu respondi 'Está também'. Juiz Federal:- Quando se fala projeto de Guarujá se refere ao projeto da unidade do expresidente? Paulo Roberto Valente Gordilho:- É porque era a única obra que a OAS tinha na região. Juiz Federal:- Mas não ao prédio, mas se refere ao projeto da unidade, é isso? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Aqui se refere ao projeto da unidade. Juiz Federal:- O projeto da cozinha dessa unidade, como está ali, o projeto da cozinha do chefe? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Bom, o projeto de cozinha do chefe foi o de Atibaia. Juiz Federal:- Ah sim, certo. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 179 de 317 Paulo Roberto Valente Gordilho:- Inclusive eu vi o depoimento do doutor Léo aqui e tinha uma coisa que eu acho que ele não se lembra, mas a cozinha de Atibaia foi comprada na época em fevereiro e a cozinha do Guarujá, do Solaris, foi comprada 4 ou 5 meses depois, foi comprada inclusive, se eu não me engano, depois da visita de dona Marisa, não foi comprado junto as duas cozinhas, isso inclusive eu esclareci num depoimento que eu dei em Salvador, entendeu? Porque eles me mostraram uma nota fiscal de 2010, eu disse 'De 2010?', que a OAS não tinha comprado nada em 2010, aí eles desligaram a câmera e tal, e aí nós fomos esclarecer, você estava, não foi? As informações de PAULO ROBERTO GORDILHO ganham maior relevância quando esclarece os codinomes pelos quais eram tratados o ex-Presidente e a ex-Primeira Dama, bem como o fato de ter apresentado pessoalmente os projetos de reforma e da cozinha em visita havida em São Bernardo do Campo, na residência do apelante LUIZ INÁCIO. O fato foi corroborado por JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO: Juiz Federal:- Mas aí então quando se fala aqui 'O projeto da cozinha do chefe' é o projeto então da cozinha do sítio de Atibaia? Paulo Roberto Valente Gordilho:- É. Juiz Federal:- E o chefe quem era? Paulo Roberto Valente Gordilho:- O ex-presidente. Juiz Federal:- E quando se fala aqui 'Madame', 'Pode marcar com a madame'... Paulo Roberto Valente Gordilho:- A primeira dama, a ex-primeira dama. Juiz Federal:- E depois quando fala ali 'Vou confirmar, seria bom também ver se o de Guarujá está pronto', o de Guarujá daí é o projeto da cozinha do Guarujá? Paulo Roberto Valente Gordilho:- É... Não... Juiz Federal:- Não? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Era o projeto de customização do Guarujá. Porque é o seguinte, tem uma visita que foi feita em fevereiro, que eu não participei, que participaram alguns personagens da OAS Empreendimentos junto com o ex-presidente e junto com o doutor Léo, num sábado, e nesse dia ele foi ver o apartamento, o apartamento ainda estava em osso, como a gente chama na engenharia, quer dizer, não tinha acabamento de piso e tal, que é costume todo construtor entregar o apartamento assim, aí se resolveu nessa reunião, quando chegou na segunda-feira na reunião nossa, da OAS Empreendimentos, o pessoal que foi aí veio com a notícia de que tinha que customizar, uma mudança numa parede ou duas paredes dentro do edifício, dentro do apartamento, e botar um piso, quando a dona Marisa foi ao apartamento ela já foi ver com esse piso colocado. Juiz Federal:- E essa questão de colocação de elevador, por exemplo, privativo? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Isso foi no decorrer do caminho. Juiz Federal:- Quem cuidou desse projeto de customização desse apartamento do Guarujá? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Em Guarujá, a área de Roberto Moreira. Juiz Federal:- O senhor não se envolveu diretamente nesse assunto? Paulo Roberto Valente Gordilho:- No projeto não. Juiz Federal:- Também nesse mesmo documento que eu mencionei, no evento 3 COMP178, tem aqui na folha 7 diálogos de 13/02/2014, eu vou mostrar para o senhor, eu peço para o senhor dar uma olhadinha aqui em cima. É no começo ali. 'Léo, está confirmado, vamos sair de onde, a que horas?', o senhor se recorda dessa troca de mensagens? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Eu me recordo sim. Juiz Federal:- Pode explicar ela? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Isso aqui, quando o Léo queria os dois projetos prontos ele queria passar para o ex-presidente e a ex-primeira dama os projetos, eram três folhas de papel com a foto de Atibaia, da cozinha de Atibaia, e um caderninho do projeto de customização do Guarujá, e ele queria passar, só que ele viajou e não pôde levar isso, aí https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 180 de 317 ele pediu para o motorista me pegar no sábado de manhã e nós fomos até São Bernardo do Campo, fui eu e ele... Juiz Federal:- Desculpe, o senhor e quem? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Eu e Léo. Juiz Federal:- Certo. Paulo Roberto Valente Gordilho:- Fomos lá e explicamos os dois projetos, eu peguei com o Roberto o projeto para analisar, pra ver o que era, para poder chegar lá e explicar. Juiz Federal:- Do Guarujá e do Sítio de Atibaia? Paulo Roberto Valente Gordilho:- O sítio de Atibaia na realidade não era nem um projeto, porque o projeto a Kitchens fez, mas ela fez umas plantas decoradas que até um leigo completo saberia ver, que vê uma foto de uma cozinha pronta apesar de não estar pronta, estar desenhada, colorida, com prato, talher, tudo em cima, mas uma foto de arquitetura, não era um projeto em si. Juiz Federal:- Mas nessa ocasião foi mostrado, vamos dizer, o plano então para o sítio de Atibaia e o projeto do apartamento do Guarujá? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Nesse dia lá em São Bernardo do Campo foram mostrados os dois. Juiz Federal:- Para o ex-presidente? Paulo Roberto Valente Gordilho:- É. Juiz Federal:- E houve concordância com o projeto? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Eu diria que houve, tanto que foi feito, mas, vamos dizer assim, eles não entenderam bem, porque a cozinha de Atibaia que era uma foto, não pode também exigir que dona Marisa e o ex-presidente conheçam projeto de planta baixa, corte de um projeto de arquitetura, então... Juiz Federal:- Entendi. No evento 3, anexo COMP303, tem outras trocas de mensagens, segundo o ministério público envolveriam o senhor, eu vou lhe mostrar aqui, daí vou fazer algumas perguntas a esse respeito. Na folha 34, aí começa 'Acho que o maciço se deslocou'. Paulo Roberto Valente Gordilho:- Então, a minha visita ao sítio foi para ver, porque na época da Cantareira, que estavam pegando volume morto, o lençol freático do sítio baixou e com isso ele tem um lago na parte de cima e um lago na parte de baixo, então o lago de cima estava esvaziando todo, aí o Léo me levou lá para dar uma solução técnica, não se conseguiu resolver esse problema 100%, resolveu oitenta por cento, foi feito um tapa buraco, esvaziou o lago, aí o lago estava em cima de uma camada de lama e de uma camada de manta butílica, e a água estava passando por debaixo da alvenaria de pedra e saindo pelo vertedouro e saindo para o lago debaixo, as soluções técnicas para isso aí eram soluções de obra pesada, você tinha várias soluções, você tinha uma solução de derrubar e fazer outro, você tinha a solução de esvaziar o lago todo, tirar a lama e meter uma manta butílica no lago todo e você tinha a solução de levar bate estacas grandes para fazer uma cortina de concreto para evitar que essa água, ir com essa fundação até um terreno sólido, senão até a rocha, para poder evitar que a água passasse do lago de cima para o lago de baixo, e foram soluções que não foram feitas porque estragava muito o sítio, as ruas, toda a região lá, porque são equipamentos pesados de... Juiz Federal:- Mas, assim, o que quer dizer essa afirmação aqui 'Ok, vamos começar quando? Vamos abrir dois centros de custos, primeiro Zeca Pagodinho - Sítio, segundo Zeca Pagodinho - Praia'. Paulo Roberto Valente Gordilho:- Eu não abria centro de custo, aí o Léo falou para abrir isso aqui, dois centros de custos, porque ia ter despesas e toda despesa, até de obra, vai abrir uma obra, despesa, abre um centro de custo 'Obra tal', então outra obra em Salvador, Brasília, tudo tem um centro de custo, então ele queria o centro de custo para controlar, saber com o que estava gastando nesse tipo de coisa. Juiz Federal:- Sítio é o sítio de Atibaia? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Sítio é sítio de Atibaia. Juiz Federal:- Praia é o apartamento do Guarujá? Paulo Roberto Valente Gordilho:- Hã? Juiz Federal:- E praia é o apartamento triplex? Paulo Roberto Valente Gordilho:- É, é. Aí chegou que quando eu fui para o diretor administrativo para dizer 'Olha, doutor Léo está pedindo para abrir dois centros de custo, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 181 de 317 Zeca Pagodinho 1 e Zeca Pagodinho 2', ele disse 'Paulo, os centros de custo já estão abertos', aí abrimos os centros de custos praia e sítio, tanto que esses centros de custos Zeca Pagodinho não existiu, só existiu aqui nesse papel. O réu ROBERTO MOREIRA FERREIRA (evento 869) declarou em seu interrogatório ter assumido a função de Diretor Regional de Incorporação da OAS no início de 2014. Confirmou que a cota adquirida por Marisa Letícia era referente à unidade 141, mas que o apartamento triplex, nº 164, do Edifício Salinas, do Condomínio Solaris, estava reservada para o ex-Presidente. Segundo relatou, esteve presente na visita que o réu e sua falecida esposa fizeram à unidade, após o que foram feitos projetos de reforma e respectivos orçamentos, bem como projeto de cozinha e armários, contratados junto à empresa Kitchens. Disse, ainda, que foram comprados eletrodomésticos e que fazia tudo sob as ordens de FÁBIO YONAMINE. Confirmou ter participado das reformas, sabendo que seriam destinadas à unidade do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA: Juiz Federal:- Era praxe da OAS fazer esse tipo de reforma ou colocação de cozinha, armário, essas coisas? Roberto Moreira Ferreira:- Desse tamanho do jeito que foi feito não era praxe, existia, a gente fez em algumas outras oportunidades, mas colocação de cozinhas comuns, desse tamanho de obra nunca tinha sido feito. Juiz Federal:- E quais eram as justificativas, se é que era passado alguma justificativa ao senhor, para a OAS estar fazendo isso em relação a essa unidade específica? Roberto Moreira Ferreira:- Não era passada nenhuma justificativa, era para que fizesse para entregar para o ex-presidente, não me foi passado nenhuma outra... Juiz Federal:- O senhor se recorda aproximadamente quanto foi gasto nessas reformas e nessas cozinhas, nesses armários? Roberto Moreira Ferreira:- Em torno de 1 milhão e 100. Juiz Federal:- Tem alguns documentos no processo, projetos em que consta a assinatura do senhor, o senhor deve ter visto esses documentos. Roberto Moreira Ferreira:- Sim. Juiz Federal:- Reconhece a autenticidade deles? Roberto Moreira Ferreira:- Sim, fui eu que assinei. Juiz Federal:- Certo, e o senhor chegou a participar de alguma segunda visita nesse apartamento? Roberto Moreira Ferreira:- Por volta do segundo semestre, em torno de agosto, o Fábio me chamou novamente na sala dele, disse que teria uma nova visita na unidade para ver como estava indo a reforma, que dessa vez ele não iria e que eu combinasse de ir junto com o Paulo Gordilho. Juiz Federal:- E o senhor foi? Roberto Moreira Ferreira:- E assim fui, combinei com o Paulo Gordilho, ele combinou tudo e nós fomos novamente. Juiz Federal:- Por volta de quando o senhor falou? Roberto Moreira Ferreira:- Agosto, fim de agosto de 2014. Juiz Federal:- E quem o senhor encontrou lá na unidade? Roberto Moreira Ferreira:- Dessa vez eu encontrei dona Marisa e um filho dela, que eu não sabia à época quem era, nem o nome dele, vim a saber depois que era o Fábio. Juiz Federal:- E o que foi conversado nessa visita? Roberto Moreira Ferreira:- Eu também não acompanhei, da mesma forma que a primeira visita, excelência, eu fiquei junto, nessa segunda visita tinha mais gente, inclusive tinha os engenheiros da Tallento também, outras pessoas que trabalhavam comigo, o próprio Igor que eu pedi sempre que estivesse comigo, e eu fiquei junto com eles e o doutor Léo foi fazendo a apresentação da unidade do jeito que estavam as obras. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 182 de 317 Juiz Federal:- E em que estágio estavam essas reformas, a instalação de cozinha, essas coisas? Roberto Moreira Ferreira:- As obras ainda não estavam concluídas, já estavam bem perto da conclusão, não tinha, creio que não tinha armários ainda nessa época porque ainda estava em obra, ainda estava fazendo a estrutura do elevador, mas já estava bem no final da reforma. Juiz Federal:- A cozinha tinha sido colocada já, não? Roberto Moreira Ferreira:- Não, que eu me recorde não. Juiz Federal:- E os eletrodomésticos? Roberto Moreira Ferreira:- Também não, isso foi para o final. Juiz Federal:- E houve alguma discussão, o senhor presenciou alguma discussão sobre a questão do preço dessas reformas, dessas cozinhas? Roberto Moreira Ferreira:- Não, nunca. Juiz Federal:- O senhor tem conhecimento se houve algum pagamento de valores da parte do ex-presidente ou da senhora Marisa Letícia, relativamente aos custos dessas reformas ou dessa cozinha? Roberto Moreira Ferreira:- Não foi feito nenhum pagamento. Juiz Federal:- Quem pagou essas reformas? Roberto Moreira Ferreira:- A própria OAS Empreendimentos, dentro do próprio centro de custo do próprio empreendimento como foi feito durante a execução do prédio mesmo, do próprio empreendimento Solaris. Juiz Federal:- O senhor presenciou alguma conversa, ouviu alguma coisa de que o expresidente ou a senhora Marisa Letícia não iriam ficar com esse imóvel? Roberto Moreira Ferreira:- Não. Juiz Federal:- O senhor Léo Pinheiro depôs aqui dias atrás e afirmou que a reforma e a diferença de preço dessa unidade seriam abatidos num acerto de vantagem indevida entre a OAS e o partido dos trabalhadores, o senhor tem algum conhecimento a esse respeito? Roberto Moreira Ferreira:- Nenhum, excelência, nenhum. Confirmou também a reserva da unidade 164 para o ex-Presidente, pelo menos desde o final de 2013 e que a unidade anterior (141) sequer foi visitada. Suas palavras: Roberto Moreira Ferreira:- Enquanto gerente de incorporação eu me reportava ao Telmo Tonoli, que era o diretor à época, e depois, quando eu assumi a diretoria em São Paulo em 2014, ao Fábio Yonamine. Ministério Público Federal:- Perfeito. O senhor mencionou que soube por intermédio de Telmo acerca da reserva do apartamento? Roberto Moreira Ferreira:- Sim, o Telmo que me contou no fim de 2013 que tinha a reserva do apartamento e que não podia ser vendido. Ministério Público Federal:- O senhor saberia dizer qual foi o método para que não houvesse essa venda, era o senhor o responsável por colocar à venda, como funcionou essa reserva? Roberto Moreira Ferreira:- Não, não, eu recebi dele, recebi uma planilha das unidades que estavam livres ou não para vender, e as que estavam livres eu cuidava de, a partir de 2014, vender as unidades, só. Ministério Público Federal:- E essa unidade 164 nunca esteve à venda nessas planilhas? Roberto Moreira Ferreira:- Nunca. Ministério Público Federal:- Ela era reservada, o senhor soube dessa reserva como uma reserva específica para o ex-presidente e sua esposa ou uma reserva geral? Roberto Moreira Ferreira:- Não, reserva específica para ele, da unidade 164. Ministério Público Federal:- Perfeito. O senhor mencionou ter participado de uma primeira visita ao apartamento triplex na presença do ex-presidente e sua esposa, o senhor recordaria os detalhes dessa visita, como o senhor se deslocou para o Guarujá, com quem foi? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 183 de 317 Roberto Moreira Ferreira:- Eu me desloquei na primeira visita com o Igor Pontes, fui com ele antes da visita e ficamos lá esperando chegarem os carros com o ex-presidente, doutor Léo e Fábio. Ministério Público Federal:- O senhor mencionou que nessa visita houve uma separação entre grupos, um grupo que ficava com o senhor Léo, o ex-presidente e sua esposa, mais alguém nesse primeiro grupo? Roberto Moreira Ferreira:- Principalmente eles. Ministério Público Federal:- E o outro grupo era o senhor... Roberto Moreira Ferreira:- Era eu, na primeira visita, eu, Igor e Fábio perto da gente também. (...) Ministério Público Federal:- O senhor recorda se nessa oportunidade também foi visitada a unidade 141? Roberto Moreira Ferreira:- Não foi visitada, visitamos o apartamento 164, descemos, visitou as áreas comuns e foi embora. Ministério Público Federal:- E aí o senhor mencionou que algum tempo depois houve o pedido do projeto, o senhor poderia especificar como veio? O senhor disse que foi Fábio que lhe procurou, como veio esse pedido da realização do projeto? Roberto Moreira Ferreira:- O Fábio me chamou, pediu para fazer essas adequações e fazer um orçamento para ver quanto isso ia ficar, para entregar tudo para ele, foi assim que foi feito. Ministério Público Federal:- Essa decisão relativa às modificações no apartamento era uma decisão sua ou era uma decisão sua, era uma decisão do Fábio, ou era uma decisão de outra pessoa? Roberto Moreira Ferreira:- Era uma decisão do Fábio, ele me passou, creio que foi um pedido que doutor Léo passou pra ele, e ele me repassou, não era uma decisão minha, a minha obrigação era executar. Ministério Público Federal:- Certo. Depois que houve esse pedido do projeto, da realização do projeto, o senhor recorda quanto tempo demorou para aprovação do projeto? Roberto Moreira Ferreira:- Não sei dizer, não sei dizer, algumas semanas talvez, sei que só se iniciou depois que foi aprovado. Ministério Público Federal:- O senhor sabe se esse projeto foi apresentado a alguma outra pessoa, especificamente ao próprio presidente e sua esposa? Roberto Moreira Ferreira:- Não, sei que Fábio levou para o doutor Léo, só. (...) Defesa:- Certo. O senhor prestou algum depoimento no Ministério Público federal anteriormente a este depoimento de hoje? Roberto Moreira Ferreira:- Sim, acho que para vocês, para vocês mesmos. Defesa:- Certo. Quando o senhor prestou esse depoimento o senhor disse que esta reforma realizada na unidade 164-A serviria para qualquer pessoa interessada na unidade, o senhor confirma isso? Roberto Moreira Ferreira:- Confirmo, ele, a reforma foi feita para o ex-presidente, se ele não adquirisse, enfim, a unidade poderia ser, depois dele poderia ser vendida a alguma outra pessoa. Defesa:- Quem tem as chaves hoje da unidade 164-A? Roberto Moreira Ferreira:- A OAS Empreendimentos. Defesa:- O senhor, respondendo a perguntas do juízo e do Ministério Público, disse que recebeu uma planilha de vendas, correto? Roberto Moreira Ferreira:- Sim. Defesa:- Essa planilha, como era essa planilha? Roberto Moreira Ferreira:- Era um espelho de vendas que tinha as unidades todas disponíveis e não disponíveis à venda, isso em 2014. Defesa:- Correto, e aquelas que não estavam disponíveis tinham a indicação do motivo porque não estavam disponíveis? Roberto Moreira Ferreira:- Elas estavam vendidas ou reservadas. Defesa:- Mas tinha indicação das pessoas que haviam adquirido essas unidades? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 184 de 317 Roberto Moreira Ferreira:- Não, não tinha, mas quando me foi entregue pelo Telmo, ele foi específico de falar a respeito dessa unidade 164. Defesa:- Qual era relação do senhor com o senhor Igor Pontes, o senhor era subordinado a ele ou era outra área, qual era a relação profissional do senhor com o senhor Igor Pontes? Roberto Moreira Ferreira:- Em 2013 ele era meu par, éramos 3 gerentes, eu, Danilo que era o gerente de vendas e Igor que era o gerente de engenharia que cuidava da execução dos prédios, posteriormente, em janeiro de 2014, eu fui promovido a diretor e ele passou a ser meu subordinado. FÁBIO YONAMINE (evento 816) era superior hierárquico de ROBERTO MOREIRA FERREIRA. Ambos subordinados de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. Quando interrogado, FÁBIO prestou esclarecimentos sobre o modo como a OAS Empreendimentos assumiu as obras do Condomínio Solaris, bem como a respeito do relacionamento que se desenvolveu com os clientes de cada unidade desde a assembleia que deliberou sobre a adesão dos 'ex-cotistas' à incorporação. No tocante específico da unidade do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, disse, com os destaques que faço: Juiz Federal:- Há um contrato com, um termo de adesão e compromisso de participação do ex-presidente e da senhora Marisa Letícia com a BANCOOP, em que há uma referência a aquisição dessa cota de apartamento, preço de 195 mil, com referência ao apartamento 141, o senhor tem conhecimento se essa unidade foi destinado a eles depois? Fábio Hori Yonamine:- Como ele não exerceu a opção, uma das duas opções que eu descrevi, a unidade foi colocada à venda e foi vendida posteriormente. Juiz Federal:- Posteriormente, pelo menos aqui a acusação do Ministério Público, que teria sido destinado ao ex-presidente esse apartamento triplex, que seria até um outra unidade, a 174-A, a 164-A, o senhor tem conhecimento a esse respeito? Fábio Hori Yonamine:- Pode repetir só a pergunta? Juiz Federal:- A afirmação que consta na acusação é que teria sido destinado ao expresidente o triplex 164-A ou 174-A desse Edifício Solaris. Fábio Hori Yonamine:- A única, eu nunca recebi a informação ou pedido de entregar essa unidade para o ex-presidente Lula, o único pedido que houve no meu caso foi um pedido para que se fizesse uma reforma, uma decoração desse apartamento, para o presidente. Juiz Federal:- Quando foi feito esse pedido? Fábio Hori Yonamine:- Esse pedido foi feito assim que eu assumi a presidência, tão logo assumi, eu assumi a presidência da OAS Empreendimentos em janeiro, esse pedido veio em fevereiro. Juiz Federal:- Em fevereiro? Fábio Hori Yonamine:- Em fevereiro. Juiz Federal:- Quem fez esse pedido ao senhor? Fábio Hori Yonamine:- O doutor Léo Pinheiro. Juiz Federal:- Ele falou para o senhor pessoalmente ou por telefone? Fábio Hori Yonamine:- Ele me falou pessoalmente. Juiz Federal:- Como foi? Fábio Hori Yonamine:- Foi pessoalmente, eu não recordo, mas eu fui informado que antes do pedido houve uma visita. Não, estou confundindo, houve o pedido do doutor Léo para que organizasse essa visita ao triplex. Juiz Federal:- E ele falou para o senhor pessoalmente? Fábio Hori Yonamine:- Foi um pedido pessoal. Juiz Federal:- Tinha mais alguém junto no momento? Fábio Hori Yonamine:- Do pedido da... Juiz Federal:- Quando ele fez o pedido para organizar a visita. Fábio Hori Yonamine:- Foi um pedido que tinha outros diretores da empresa, da OAS, mas foi um pedido para justamente encontrar com ele para poder organizar essa visita, foi dessa forma. Juiz Federal:- Isso foi aproximadamente quando? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 185 de 317 Fábio Hori Yonamine:- Eu imagino que tenha sido em fevereiro também, um pouco antes da visita, não teve muito lapso de tempo entre pedido e a... Juiz Federal:- De que ano? Fábio Hori Yonamine:- Foi em 2014. Juiz Federal:- E o que o senhor Léo Pinheiro disse ao senhor nessa ocasião especificamente? Fábio Hori Yonamine:- Não, ele apenas... Juiz Federal:- Qual foi a explicação? Fábio Hori Yonamine:- Não, ele não me deu explicação, ele disse, me pediu para organizar uma visita onde estaria presente o ex-presidente e a dona Marisa. Juiz Federal:- E o senhor organizou essa visita? Fábio Hori Yonamine:- Organizei a visita. Juiz Federal:- O senhor esteve no local no dia? Fábio Hori Yonamine:- Eu estive no dia da visita. Juiz Federal:- E quem estava presente nesse dia da visita? Fábio Hori Yonamine:- No dia da visita, além do doutor Léo Pinheiro, tinha o Roberto Moreira que é o diretor de incorporação de São Paulo, que era o diretor responsável pelo projeto, e a equipe dele, então tinha, eu não lembro das pessoas exatamente, mas estava o Igor Pontes e tinha mais o pessoal que cuidava do projeto, e o casal. Juiz Federal:- E o senhor acompanhou as conversações nessa data? Fábio Hori Yonamine:- Olha, quem conduziu toda a visita foi o doutor Léo Pinheiro, que é quem tinha relação com o ex-presidente, eu fiquei na retaguarda junto com a equipe para qualquer eventualidade. Juiz Federal:- E o que foi discutido, o que foi afirmado durante essa visita? Fábio Hori Yonamine:- A minha impressão é que era muito mais uma apresentação do apartamento, não houve discussão, não houve nenhuma definição naquele momento que seja relevante ou que eu tenha recordação, então foi uma apresentação, apresentando todos os cômodos do apartamento e, posteriormente, foi feita uma visita também nas áreas comuns. Juiz Federal:- Houve solicitação de alterações no imóvel? Fábio Hori Yonamine:- Nesse momento eram feitas somente observações, não era pedido, então o que eu tenho lembrança que teve a questão da escada, era uma escada muito estreita, tinha a preocupação da exposição do ex-presidente em relação a ter um apartamento, a exposição com a vizinhança e tudo mais, mas não foi feito nenhum comentário, algum pedido, que eu tenha lembrança nesse momento. Juiz Federal:- Sei, e o apartamento foi reformado, daí? Fábio Hori Yonamine:- Posteriormente houve um pedido do doutor Léo para que... Juiz Federal:- Pedido ao senhor? Fábio Hori Yonamine:- Um pedido para mim para preparar um projeto de decoração nesse apartamento e eu passei isso para a minha equipe. Juiz Federal:- Que tipo de mudanças, que tipo de decoração, o que seria feito no apartamento? Fábio Hori Yonamine:- Na verdade ele não entrou em muitos detalhes comigo nesse primeiro momento, o que ele me pediu 'Olha, vamos deixar o apartamento mais bonito', e bonito eu acho que no conceito da OAS à época era primar pela excelência, pela qualidade, fazer alguma coisa bem feita, então isso aí estava subentendido apesar de ele não ter falado com todas as letras que queria... Juiz Federal:- Foi instalada cozinha no apartamento? Fábio Hori Yonamine:- Posteriormente foi, fazia parte do projeto. Juiz Federal:- Mas, eu não entendi bem, fazia parte dessas decorações que o senhor está dizendo ou não? Fábio Hori Yonamine:- O que constou o projeto final, para não ficar um mal entendido em relação ao que é reforma ou o que é decoração, foi pedido para ter um novo quarto, parece, no primeiro andar lá do apartamento, também tinha um problema de deck da piscina para também melhorar a localização e o design, havia também algumas questões que eram vícios de obra da própria construção, estava havendo vazamentos, se não estou enganado, entre outras coisas, e também tinha, constava no projeto um elevador que era para superar a questão da escada, que era muito estreita, entre os andares; além disso, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 186 de 317 teve também toda a mobília da cozinha, foi feita, e também os utensílios que foram comprados também para equipar o apartamento. Juiz Federal:- Quanto aproximadamente foi gasto nisso? Fábio Hori Yonamine:- Ao redor de 1 milhão e 200 mil reais. Juiz Federal:- O senhor que coordenou essas mudanças, essas reformas, essas decorações? Fábio Hori Yonamine:- O que eu, eu era responsável no final do dia, mas eu deleguei isso para o diretor responsável pela diretoria de São Paulo, que era o responsável pelo projeto, e ele que fez as contratações, o desenvolvimento do projeto e tudo mais, eu fiz a aprovação do orçamento e busquei essa aprovação junto ao doutor Léo para que ele aprovasse tanto o orçamento quanto o projeto que estava sendo proposto. Juiz Federal:- Esses projetos foram submetidos também ao ex-presidente ou à senhora Marisa Letícia? Fábio Hori Yonamine:- Isso foi com o doutor Léo, eu não sei se ele submeteu o projeto ao casal, como foi a discussão que ele teve, mas o pedido foi de entregar o projeto para ele, então imagino que isso tenha sido passado pelo casal também, eu não estive presente mais em nenhuma oportunidade com o casal, então não posso lhe dizer. Juiz Federal:- E houve algum pagamento da parte do senhor Luiz Inácio ou da senhora Marisa Letícia relativamente ao custo dessas reformas? Fábio Hori Yonamine:- Não, nenhum pagamento, porque até então eles não eram clientes, cliente assina a promessa de compra e venda que eu acabei de descrever. Juiz Federal:- A OAS tinha por prática fazer reformas dessa espécie nas suas unidades (inaudível)? Fábio Hori Yonamine:- Não, isso foi uma reforma totalmente atípica, um pedido atípico e o único pedido que o doutor Léo me fez em relação a qualquer outra unidade. Juiz Federal:- E qual foi a explicação que ele deu ao senhor? Fábio Hori Yonamine:- Ele não deu explicação, ele fez um pedido. Juiz Federal:- Eu mencionei agora há pouco que eles tinham assinado uma cota do apartamento 141 e depois esse apartamento aparentemente diferente, esse 174 ou 164-A, era um triplex isso? Fábio Hori Yonamine:- O apartamento que a gente visitou era um triplex, e a cota que ele tinha era referente a um apartamento tipo, não era... Juiz Federal:- O preço deles é o mesmo? Desses apartamentos? Fábio Hori Yonamine:- Não, não, difere pelo tamanho. Juiz Federal:- O triplex é mais caro? Fábio Hori Yonamine:- O triplex é maior e mais caro. Juiz Federal:- Houve algum contrato ou algum pagamento de algum preço adicional por esse triplex pelo senhor ex-presidente e pela senhora Marisa Letícia? Fábio Hori Yonamine:- Não houve, não tinha nenhum contrato entre a OAS Empreendimentos e a dona Marisa ou o ex-presidente. (...) Ministério Público Federal:- Certo. Vou ser mais específico então, senhor Fábio, o senhor mencionou aqui que houve uma reunião em 2014 onde o senhor Léo Pinheiro, senhor JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, pediu para o senhor 'deixar o apartamento mais bonito', ele pediu para o senhor deixar o apartamento mais bonito para torná-lo mais fácil para venda ou ele pediu para deixar mais bonito para atender aos interesses do expresidente Lula e de Marisa Letícia? Fábio Hori Yonamine:- A reforma e o pedido foi para o ex-presidente Lula e para Marisa. Ministério Público Federal:- Então não era para investimento naquele apartamento, era pra personalizá-lo? Fábio Hori Yonamine:- Correto, foi um pedido atípico, nunca havia feito um pedido dessa forma, e foi um pedido específico para fazer o projeto, a reforma, a decoração, deixar ele mais bonito para o presidente Lula. Ministério Público Federal:- Então a OAS não buscava ali simplesmente torná-lo mais vendável, simplesmente torná-lo ajustado aos interesses do ex-presidente, é isso? Fábio Hori Yonamine:- Sim, sim. Ministério Público Federal:- Perfeito. Agora, especificamente sobre essa personalização, esse ajuste, eu gostaria de citar aqui à folha 115 da denúncia, constam algumas https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 187 de 317 modificações que foram feitas, em primeiro lugar, houve a contratação de uma empresa chamada Tallento para executar essas reformas? Fábio Hori Yonamine:- Houve. Ministério Público Federal:- O senhor pode dizer quem foi responsável pela contratação? Fábio Hori Yonamine:- Foi a diretoria de incorporação de São Paulo. Ministério Público Federal:- Eu ia pedir para o senhor que sempre quando se direcionasse à diretoria se o senhor pudesse especificar a pessoa mesmo responsável, foi o senhor Roberto Moreira nesse caso? Fábio Hori Yonamine:- Então, o diretor responsável era o Roberto, não sei se foi o Roberto que entrou em contato com a Tallento pra fazer a contratação. Ministério Público Federal:- Mas a responsabilidade pelo assunto era dele? Fábio Hori Yonamine:- Da diretoria de incorporação de São Paulo, sim. Ministério Público Federal:- Certo. Então essa contratação contemplou aqui alguns fatores, segundo apurado, cozinha, retirada de azulejos, instalação de bancadas, sala de estar, execução de uma nova escada de acesso, mezanino, dormitórios, aparação à construção de, a adaptação de uma sauna com a retirada das portas e retirada do kit de sauna, fornecimento de azulejo, piso, adaptação do terraço para constar uma churrasqueira, e piscina também, a troca de algumas peças, fornecimento de instalação de infraestrutura. Essas adaptações foram feitas a partir de pedidos específicos ou da onde surgiu essa adaptação? Fábio Hori Yonamine:- Olha, o único pedido que o doutor Léo fez para mim era para fazer o projeto, eu não participei do desenvolvimento do projeto, não entrei nesse detalhamento, mas, sim, eu levei o projeto, o que tinha sido proposto pela diretoria, pelo doutor Roberto Moreira, eu levei à aprovação do doutor Léo, se houve modificações ao longo, desde a aprovação até qualquer período, eu não me envolvi diretamente, até porque eu não tinha muito a contribuir, o meu envolvimento foi restrito à aprovação do orçamento, discutir com o Roberto o orçamento, e ele me apresentou o projeto também, só que eu não consigo contribuir. Ministério Público Federal:- Então o senhor discutiu com o Roberto de fato, o senhor estava falando antes... Defesa:- Excelência, pela ordem, pela defesa de Roberto, o interrogando já respondeu, já afirmou aqui, quando perguntado por vossa excelência, ele já informou aqui que o projeto, foi passado pelo doutor Léo Pinheiro, senhor Léo Pinheiro, as orientações sobre o projeto, que ele pegou esse projeto, o projeto foi feito pela área de incorporação e que ele submeteu, ele levou esse projeto ao doutor Léo Pinheiro e doutor Léo Pinheiro aprovou esse projeto, então... Ministério Público Federal:- Doutor, na verdade não, doutor... Defesa:- Acho que a acusação está insistindo na mesma pergunta de forma indireta, transversa, então eu não sei para, não sei para quê. Ministério Público Federal:- Na verdade, com a devida vênia, doutor, eu só estou buscando aqui apurar as perguntas e deixá-las mais específicas para verificar a responsabilidade de cada um dos denunciados, o senhor... Defesa:- Vossa excelência já fez as mesmas perguntas. Juiz Federal:- Mas, assim, enfim, é um esclarecimento, fica deferida a pergunta, pode fazer a pergunta de novo, então? Ministério Público Federal:- Pois não, excelência, então a pergunta é a seguinte senhor Fábio: o senhor discutia especificamente com o senhor Roberto Moreira aspectos específicos, aprovava orçamentos e projetos que ele lhe apresentava sobre o triplex? Fábio Hori Yonamine:- Não, o que houve foi uma aprovação, ele fez uma proposta de um projeto com um orçamento respectivo e o projeto em si, isso foi levado à aprovação do doutor Léo, quando o doutor Léo aprovou eu pedi para executar a obra. AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS (evento 869) disse não ter participado das negociações ou reforma do apartamento, mas revelou saber que havia uma conta do Partido dos Trabalhadores com valores decorrentes, além de outros, de contratos da OAS com a Petrobras. Disse, ainda, que o imóvel seria destinado ao exPresidente LULA, sendo que as reformas seriam custeadas com esses valores: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 188 de 317 Juiz Federal:- E o senhor tinha conhecimento se o senhor Léo Pinheiro tratava desses assuntos com o ex-presidente, com o senhor Luiz Inácio? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Olha, excelência... Juiz Federal:- Se o senhor não sabe o senhor diga que não sabe, não faça... Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Eu não sei, eu não sei, mas poderia dar alguns exemplos que não são uma resposta direta à pergunta que o senhor está me fazendo. Defesa:- Não é permitido que o depoente fale questões que não são fatos, já me parece que ele já respondeu. Juiz Federal:- Sim. Defesa:- Certo, se vossa excelência já advertiu para ele não se perder em relação, se não sabe, não sabe. Juiz Federal:- Exemplos, como exemplos, de fatos concretos que o senhor tem? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Não, era conhecido internamente na empresa que o Brahma era uma referência ao presidente Lula, isso todos conhecem dentro da empresa, e que... O senhor me perguntou sobre o triplex não é? Juiz Federal:- Sim. Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Eu me lembro numa viagem internacional a trabalho que eu tive com o Léo, em meados de 2014, eu já era da área internacional, e numa dessas viagens ele me relatou que tinha tido um acerto com João Vaccari no sentido de compensar prejuízos que a empresa estava tendo, a OAS estava tendo, com alguns eventos, 4 eventos, ele me relacionou na época, que foram eventos da, os prejuízos tido com as obras do BANCOOP que a OAS Empreendimentos, não me falou que prejuízos eram esses, me falou da reserva de um apartamento triplex no Guarujá para o expresidente Lula, me falou de reformas que estava executando nesse apartamento triplex, me falou também de reformas que estava fazendo no sítio de Atibaia que também seria do presidente Lula, e que isso tinha causado prejuízos milionários e como ele, Léo, administrava uma conta do PT como um todo, não só obras da Petrobras, mas como outras obras, aí não me vem ao caso, ele tinha feito uma compensação com relação a esses prejuízos causados nesses 4 eventos, como eu já estava fora, em 14 de fevereiro eu assumi a área internacional, isso já tinha mais de 6 meses, então eu ouvi aquilo e não entrei no mérito, até porque fugia a... Juiz Federal:- Mas quem lhe deu essa informação foi o senhor Léo Pinheiro? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Não, isso foi na viagem que nós fizemos internacional e ele me reportou isso aí, que tinha feito essa compensação, os prejuízos eram milionários que houve o acerto, se fossem valores menores não teriam feito. Juiz Federal:- E tinha mais alguém quando teve essa conversa? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Não, nós estávamos viajando, uma viagem, viajava muito na área internacional, África, Caribe... Juiz Federal:- Já está implícito nas suas respostas anteriores, mas a indagação que eu vou lhe fazer, então esses mecanismos de transferência do BANCOOP, do empreendimento, da OAS Empreendimentos, os detalhes da reforma, essas coisas desse apartamento, isso o senhor não tem conhecimento desses fatos? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Excelência, eu não conheço nada da área imobiliária, não sei como se faz uma incorporação, desconheço totalmente esse assunto. Juiz Federal:- Perfeito. Também aqui parte da denúncia diz respeito a armazenamento de bens do ex-presidente por custeio da OAS, sobre isso também o senhor não tem conhecimento? Não se ignora que PAULO ROBERTO OKAMOTTO (evento 869) prestou esclarecimentos sobre as tratativas e que, segundo afirma, o imóvel teria sido simplesmente oferecido ao ex-Presidente LULA, mas que ele não teria demonstrado interesse na sua aquisição, in verbis: Paulo Tarciso Okamotto:- Acho que era bom tentar esclarecer um pouquinho antes de chegar nessa data, doutor. É o seguinte, bom, eu acho que é público e notório que eu sou amigo do presidente Lula e da família do presidente Lula, e além de amigo eu sou https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 189 de 317 militante também do partido dos trabalhadores há muitos anos, enfim, fui sindicalista, eu tenho uma jornada aí de luta política durante muitos anos, então eu gostaria de colocar que quando é eu tenho notícia pela primeira vez desse apartamento do Lula, que depois virou esse chamado tríplex, quando o morre um companheiro nosso, chamado Satall, que fazia o imposto de renda do presidente, dona Marisa, que me conhecia e sabia que eu fazia imposto de várias pessoas, fazia de amigos né, então ela me pede pra ajudar no imposto de renda dela, isso já em 2000, então de 2000 até 2010, durante muitos anos eu fiz o imposto de renda da dona Maria ou do casal Luiz Inácio Lula da Silva, e quando se fazia o imposto em 2006 aparece pela primeira vez então o lançamento no imposto de renda dessa cota, que a dona Marisa tinha adquirido em 2005 uma cota de participação do apartamento tipo 141 e tudo mais, e durante vários anos, a gente lança todo ano, junta os documentos, vai atrás daqueles negócios que todo mundo já sabe como que faz imposto de renda e lança esse negócio; bom, isso vai até 2010, estamos lançando isso no imposto de renda, quando é que eu tenho notícia, eu tenho notícia do apartamento, por volta de 2011, final de 2011 ao final de 2012 o Lula se encontrava doente, o presidente já estava doente, eu lembro que ele estava doente, alguém da OAS ligado à área comercial da OAS me procura dizendo 'Olha, eu queria um contato com a dona Marisa', eu falei 'Para que vocês querem contato com a dona Marisa?', 'Não, nós queremos tirar uma orientação, queremos discutir com ela algumas orientações', aí eu recebi a pessoa e então essa pessoa me explicou o seguinte, de que a dona Marisa não tinha assinado o termo de adesão para continuar com o apartamento que ela tinha anteriormente adquirido e que se ela não... Mas, como ela não tinha assinado, queria saber se ela mantinha interesse em comprar o apartamento que ela tinha anteriormente adquirido, e ele me explicou mais, ele falou 'Olha, esse apartamento não é nem o apartamento melhor no prédio, a vista dele não é uma vista que está voltada para o mar, mas você conversa com ela porque nós queremos saber se ela tem, apesar de não ter assinado, se ela mantém o interesse de comprar esse apartamento', eu perguntei 'Mas ela não assinou, e o que acontece?', ele explicou que os valores que ela teria pago estavam corrigidos, que ela poderia receber esse valor de volta, na época ia esperar 12 meses para receber de volta, ia receber em 36 meses, mas como ela não tinha assinado se mantinha o direito dela, e que ela poderia aproveitar esse crédito para comprar o próprio apartamento que estava disponível ainda ou outro apartamento que ela quisesse no prédio, ou mais ainda, ele falou que ela poderia usar esse crédito para comprar um outro apartamento em qualquer outro empreendimento da OAS Empreendimentos, bom, eu falei 'Eu vou tentar falar com a dona Marisa'. Fui falar com a dona Marisa, aí falei 'Dona Marisa, tem um rapaz da OAS que deseja conversar com senhora para pegar uma orientação, que a senhora não assinou...', repetindo, 'A senhora não assinou, e se a senhora não assinar a senhora perde o direito, e ele quer saber agora se a senhora mantém interesse, mesmo não tendo assinado o apartamento está vago, se a senhora quiser eles ainda garantem que a senhora pode comprar' e tudo mais, naquela ocasião ela falou que ela já tinha pago até 2006, se eu não me engano, e depois que já tinha pago mais 20 parcelas de não sei que lá que era complementação, que o prédio era pra ser entregue em 2008, que aquele prédio já tinha, sabe, toda hora o pessoal enrolava ela, e que, eu falei 'Mas a senhora tem que ir lá assinar', ela falou 'Não vou assinar nada, não vou assinar mais nada, vou deixar assim, depois a gente vê como resolve, estou com a cabeça quente', e realmente, era um momento que o marido estava enfrentando uma luta contra o câncer, não era o caso de falar, então 'A senhora não quer conversar com ele, não quer fazer um acordo?', 'Não', 'A senhora libera, então a senhora tem que liberar o apartamento para os caras venderem, porque não pode guardar esse negócio se não tiver o termo de adesão', ela falou 'Pode liberar então, se o apartamento não é melhor pode liberar', eu peguei e dei o informe para a pessoa que me foi procurar da OAS Empreendimentos, então essa foi uma coisa que aconteceu em final de 2011, 2012, certo? Ministério Público Federal:- Em 2014, para a gente chegar à pergunta, senhor Paulo... Paulo Tarciso Okamotto:- Não, mas na sucessão, antes de 2014 tem 2013. Em 2013 alguns momentos eu encontro com Léo por conta das nossas palestras ou encontro com ele em algum lugar e ele fala 'Precisa avisar lá à família do presidente se eles têm interesse em ficar com algum imóvel lá no prédio, porque está em acabamento o prédio, se tiver interesse a hora é agora', bom, aí me parece que o presidente Lula marcou com o Léo uma conversa e estava em conversando em dezembro, final de 2013, deve ser, ou novembro ou https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 190 de 317 dezembro de 2013, eu não tenho muito certo porque tinha uma palestra em novembro, mas foi nessa ocasião, nessa ocasião eles tiveram uma reunião lá no Instituto, no final da reunião o doutor Léo convidou ele para conhecer o empreendimento, eu estava ali na reunião eu vi, comecei a presenciar a conversa deles lá, então o Léo estava explicando para o presidente Lula o seguinte, o prédio tinha ficado bonito, uma fachada bonita, amarela, não sei o que lá e não sei que, e que o apartamento tinha ficado maravilhoso e tal, que tinha um tríplex que tinha uma vista extraordinária para a praia do Guarujá e que era uma coisa muito bonita, que o presidente precisava conhecer, que 'O senhor precisava conhecer' e tudo mais, e o presidente ouvindo aquilo lá ele 'Léo, mas o que tem nesse triplex?', ele descreveu que no triplex tinha parece que no primeiro, nas salas, embaixo tinha sala, acho que no segundo andar tinha quarto e talvez, lá em cima tinha piscina, não sei que lá, mas que era muito bonito; bom, aí descrevendo, e o Lula até me comentou 'Mas como é que eu vou frequentar um apartamento de Guarujá, como é que eu vou frequentar?', ele até comentou que há muitos anos ele não vai em restaurante, há muitos anos ele não vai ao cinema, muitos anos ele não vai a um teatro, quer dizer, há muitos anos ele né, passou todo o tempo lá no governo sem poder frequentar esses lugares porque sempre que frequenta ele acaba trazendo transtorno para quem está no evento e tal, e ele falou 'Eu fico imaginando eu indo num...', mas o fato é que o doutor Léo acho que convenceu a ele a conhecer o empreendimento. Na oportunidade, eu perguntei para ele 'Doutor Léo, quanto que está o metro quadrado do apartamento lá em Guarujá?', ele falou 'Olha, está por volta de 7 a 8 mil reais, eu não sei muito bem o valor, mas está...', eu falei 'Mas está caro, né?', ele falou 'É, está caro porque está tendo muita procura, porque você não sabe, mas vai ter muito investimento do pré-sal lá na baixada e está valorizando muitos imóveis lá', que esse imóvel seria muito bom inclusive para fazer investimento, aí eu peguei e falei 'Bom, mas está caro né, de qualquer forma', eu falei pra ele 'Mas, doutor Léo, se o presidente Lula quiser adquirir qualquer imóvel, qualquer apartamento, o presidente tem que pagar o preço de mercado', 'Ah, claro, claro, claro'. Bom, aí foram embora, aí acho que em fevereiro de 2014, uma coisa assim, eu soube, ele me falou que foi visitar lá o empreendimento e depois que ele foi visitar o empreendimento eu perguntei se ele tinha gostado desse empreendimento ele falou 'Olha, realmente não tem como...', ele reclamou lá de sauna, que tinha um buraco na sauna, reclamou que tinha um espaço que ninguém usava, enfim, ele falou 'Mas realmente não tem como eu ficar no apartamento porque não tem como... Como é que eu vou usar aquele apartamento, só se eu for na praia dia de quarta-feira', eu tinha subentendido de que esse apartamento não seria mais, não teria mais interesse, aí fui surpreendido depois pelas histórias que foram no apartamento, que o apartamento ia ser entregue, que era um triplex, coisas desse tipo. Ministério Público Federal:- Certo. O senhor Léo... Paulo Tarciso Okamotto:- Então sobre esse negócio eu não lembro, até provavelmente deve ter entrado em contato comigo, mas eu não, porque nem sempre eu o vejo, mas nessa ocasião não cheguei a falar com ele, acho que ele deve ter achado outra alternativa. Ministério Público Federal:- O senhor Léo mencionou aqui, e eu pergunto ao senhor se o senhor tinha conhecimento da reserva desse apartamento para o presidente Lula de uma data anterior, desde 2010, 2011? Paulo Tarciso Okamotto:- Então, isso que eu acho estranho porque, como eu falei anteriormente, eu fazia imposto de renda do presidente e da dona Marisa, eu não sou preposto, não sou assessor dele, não sou administrador, era mais como amigo né, a gente faz imposto de alguns amigos, da vizinha, do filho, da nora... Ministério Público Federal:- Mas, especificamente, o senhor não tinha conhecimento ou tinha? Paulo Tarciso Okamotto:- Não tinha conhecimento, nunca ouvi falar que esse triplex, no caso está falando do tríplex, o que tinha uma reserva, o que ela tinha adquirido era um apartamento simples. A versão coincide com a palavra do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA (evento 885), que nega ser o titular (proprietário ou possuidor) do apartamento, dizendo que o mesmo havia sido oferecido para ele, mas que não demonstrou interesse em ficar com o imóvel. Transcrevo trechos do depoimento: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 191 de 317 Juiz Federal:- Perfeito. Senhor ex-presidente, essa acusação do Ministério Público tem basicamente duas partes, numa primeira parte o Ministério Público argumenta que o senhor teria conhecimento e participação em um esquema de corrupção que teria vitimado a Petrobras, com divisão de propinas entre diretores da Petrobras e agentes políticos. Numa segunda parte o Ministério Público argumenta que o senhor ex-presidente teria sido beneficiado pelo grupo OAS com vantagem indevida de cerca de 2 milhões e 424 mil reais, essas propinas seriam constituídas no repasse ao senhor de um imóvel consistente em um apartamento triplex 164-A no Condomínio Solaris, no Guarujá, e a realização de reformas nesse apartamento. Segundo a acusação, o senhor ex-presidente teria pago nesse edifício por uma unidade simples, mas foi destinado pela OAS um apartamento triplex para o senhor, com três pavimentos, de preço superior, além do que teriam sido feitas reformas para incrementar esse apartamento sem que o senhor ex-presidente arcasse com a diferença de preço do imóvel e com o custo das reformas, essa vantagem indevida, segundo o Ministério Público, cerca de 2 milhões e 424 mil, estaria relacionada a acertos de corrupção em contratos públicos, inclusive da OAS com a Petrobras. Eu vou fazer algumas perguntas bem específicas ao senhor ex-presidente sobre esse apartamento triplex 164-A do Condomínio Solaris. (...) Juiz Federal:- Está bom, fica consignado o seu ponto, doutor, agora vamos para as perguntas, então, certo? No processo, senhor ex-presidente, e aqui eu só vou fazer uma referência de localização, evento 3, arquivo COMP12, consta um termo de adesão com data de 01/04/2005 que teria sido assinado pela senhora sua esposa, Marisa Letícia, com a BANCOOP, relativamente à aquisição de uma cota correspondente a um apartamento, de unidade simples de 3 dormitórios, num Edifício no Guarujá, no Condomínio Solaris, nessa época identificado como Mar Cantábrico, eu vou mostrar para o senhor esse documento, se o senhor quiser dar uma olhadinha. Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu sei, está no outro imposto de renda. Juiz Federal:- Certo, o senhor quer dá uma olhada nele? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, não. Juiz Federal:- O preço total desse imóvel é 195 mil reais, a identificação é de apartamento de dormitórios... Defesa:- Excelência, cota, não é o imóvel, o documento não diz imóvel, o documento fala em cota. Juiz Federal:- O preço total da cota que levaria à aquisição do imóvel seria 195 mil e a identificação do apartamento, dormitórios, como sendo apartamento 141 do Edifício Návea, depois virou Edifício Salinas quando o empreendimento passou à OAS. O senhor ex-presidente poderia me descrever as circunstâncias da aquisição dessa cota correspondente a esse apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Era, simplesmente, a minha mulher resolveu comprar uma cota da cooperativa BANCOOP, e comprou. Juiz Federal:- O senhor acompanhou a sua esposa nessa ocasião? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não. Não. Juiz Federal:- Ela relatou ao senhor ex-presidente como ela teria feito essa aquisição? Luiz Inácio Lula da Silva:- Ela me disse que comprou da cooperativa dos bancários uma cota de um apartamento. Juiz Federal:- De um apartamento, uma unidade simples nesse prédio no Guarujá? Luiz Inácio Lula da Silva:- Deve ser uma unidade simples que ela comprou. Juiz Federal:- O senhor ex-presidente pode esclarecer se havia a intenção desde o início de adquirir um triplex no prédio ao invés de uma unidade simples? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não havia no início e não havia no fim. Juiz Federal:- Nunca houve a intenção de adquirir esse triplex? Luiz Inácio Lula da Silva:- Nunca houve a intenção de adquirir o triplex. Juiz Federal:- Em algum momento dessa relação com a BANCOOP, e depois com a OAS, houve manifestação de intenção de trocar esse apartamento simples por um apartamento triplex? Luiz Inácio Lula da Silva:- Nunca, nunca. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 192 de 317 Juiz Federal:- Na mesma localização dos autos tem uma proposta de adesão sujeita à aprovação relativamente ao mesmo imóvel, isso foi assinado pela senhora Marisa Letícia, eu vou mostrar aqui ao senhor para o senhor dar uma olhadinha... Luiz Inácio Lula da Silva:- Quando que é essa data aqui? Juiz Federal:- Isso é de 01/04/2005. Consta nesse documento, não sei se o senhor chegou a verificar, uma rasura, número 174 correspondendo a um triplex nesse mesmo edifício, que foi rasurado e em cima dele foi colocado o número 141, isso foi objeto de um laudo pericial da Polícia Federal, eu posso lhe mostrar o laudo aqui, se o senhor quiser dar uma olhada. Luiz Inácio Lula da Silva:- Quem rasurou? Juiz Federal:- É, isso não foi identificado. Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu também gostaria de identificar quem rasurou. Juiz Federal:- A indagação que eu faço ao senhor ex-presidente é, o senhor tinha conhecimento dessa proposta e dessa rasura e saberia explicá-la? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, doutor Moro, eu tomei conhecimento desse apartamento em 2005, e fui tomar e voltar a discutir esse apartamento em 2013, só isso. Juiz Federal:- E sempre a referência era a unidade simples do... Luiz Inácio Lula da Silva:- Sempre, somente em 2013 é que eu fui ver o tal triplex. Juiz Federal:- Antes de 2013 a senhora sua esposa nunca mencionou essa intenção de... Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, nunca mencionou. Juiz Federal:- Na mesma localização dos autos, evento 3, COMP12, consta um termo de adesão datado de 01/01/2004, sem assinatura, com a BANCOOP, relativamente à aquisição de uma cota correspondente a um apartamento de unidade duplex de 3 dormitórios nesse edifício em Guarujá, unidade 174-A, e depois, com a transferência do empreendimento à OAS, acabou se transformando no triplex 164-A, posso lhe mostrar o documento para o senhor dar uma olhadinha. Luiz Inácio Lula da Silva:- Em 2004, assinado por quem? Juiz Federal:- Não, esse não está assinado. Luiz Inácio Lula da Silva:- Então não sei. Juiz Federal:- Consta que esse documento foi apreendido no seu endereço, no apartamento em São Bernardo do Campo. Luiz Inácio Lula da Silva:- Não me mostraram isso. Juiz Federal:- O senhor quer dar uma olhada? Luiz Inácio Lula da Silva:- Quem apreendeu não me mostrou no apartamento em São Bernardo do Campo. Está assinado por quem? Juiz Federal:- Não está assinado. Luiz Inácio Lula da Silva:- Então, se não está assinado, doutor... Juiz Federal:- Mas o senhor teria alguma explicação para esse documento ter sido apreendido no seu apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não sei, talvez quem acusa saiba como é que foi parar lá, eu não como é que tem um documento lá em casa, sem adesão, de 2004, quando a minha mulher comprou o apartamento em 2005. Juiz Federal:- Consta ainda na acusação que esse empreendimento do Condomínio Solaris foi transferido da BANCOOP para a OAS Empreendimentos, o senhor expresidente teve conhecimento do fato e participou de alguma forma nessas negociações? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não. Juiz Federal:- Consta na acusação e em documentos que a OAS assumiu formalmente esse empreendimento em 08/10/2009, nessa mesma época a OAS concedeu aos cooperados da BANCOOP o direito sobre o empreendimento Mar Cantábrico, prazo de 30 dias para optar pelo ressarcimento dos valores até então pagos à BANCOOP ou celebrar compromisso de compra e venda da unidade e prosseguir no pagamento do saldo devedor, isso foi objeto de uma assembleia dos cooperados em 27/10/2009, esses documentos estão nos autos, evento 3, anexo 213 e anexo 214, não sei se o senhor gostaria de ver... Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu não preciso ver não, doutor, eu só quero repetir o seguinte, eu fiquei sabendo do apartamento em 2005 quando comprou, que declarou no imposto de renda de 2006, e fiquei sabendo em 2003 quando Léo Pinheiro me procurou. Defesa:- Em 2013. Luiz Inácio Lula da Silva:- Em 2013. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 193 de 317 Juiz Federal:- Perfeito. O senhor ex-presidente e sua esposa realizaram alguma opção nesse prazo fixado de 30 dias, contados dessa assembleia de 27/10/2009? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, não. Juiz Federal:- Não? O senhor ex-presidente se recorda quanto foi pago pelo senhor expresidente e pela senhora sua esposa no total por esse apartamento contratado, unidade simples? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não lembro, doutor Moro, mas também está tudo declarado no imposto de renda, e já deve ter aqui no processo, o que tem sido falado é mais do que notícia ruim. Juiz Federal:- Perfeito. O Ministério Público federal afirma que foram pagos cerca de 209 mil reais até setembro de 2009, o senhor ex-presidente saberia dizer se foi aproximadamente isso? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não sei. Juiz Federal:- O senhor ex-presidente sabe me dizer se depois que a OAS assumiu o empreendimento em outubro de 2009, foram feitos novos pagamentos pelo apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Acho que não. Juiz Federal:- O senhor ex-presidente sabe explicar porque, diferentemente de todos os demais cooperados da BANCOOP que tiveram que em 2009 optar pela continuidade da compra, celebrando contratos com a OAS, ou pedir a devolução do dinheiro, inclusive com prazo de 30 dias contados da assembleia em 27/10/2009, o senhor e a senhora sua esposa não tiveram que fazer essa escolha? Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu tenho uma hipótese, a dona Marisa pode não ter recebido o convite para participar da assembleia. (...) Juiz Federal:- O senhor ex-presidente esteve em visita no apartamento triplex 164-A, Condomínio Solaris? Luiz Inácio Lula da Silva:- Estive em 2014. Juiz Federal:- Quantas vezes o senhor esteve no local? Luiz Inácio Lula da Silva:- Uma vez. Juiz Federal:- O senhor pode me descrever as circunstâncias, o motivo dessa visita? Luiz Inácio Lula da Silva:- O Léo esteve, eu já disse aqui também, o Léo esteve lá no escritório dizendo que o apartamento tinha sido vendido e que ele tinha acho que mais um apartamento dos normais e o triplex, eu fui lá ver o apartamento, fui lá ver o apartamento, coloquei quinhentos defeitos no apartamento, voltei e nunca mais conversei com o Léo sobre o apartamento. Juiz Federal:- O senhor se recorda quem foi junto ao senhor nessa visita? Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu e minha mulher, só. Juiz Federal:- E quem estava presente da OAS? Luiz Inácio Lula da Silva:- Ah, não sei, sei que estava o Léo. Juiz Federal:- O Léo Pinheiro estava? Luiz Inácio Lula da Silva:- Estava. Juiz Federal:- E qual foi o conteúdo da conversa dessa visita, senhor ex-presidente, o senhor se recorda? Luiz Inácio Lula da Silva:- O conteúdo da conversa é que o Léo estava querendo vender o apartamento, e o senhor sabe que como todo e qualquer vendedor quer vender de qualquer jeito, não sei se o doutor já procurou alguma casa para comprar para saber como é que o vendedor quer fazer, e eu disse ao Léo que o apartamento tinha quinhentos defeitos, sabe? Juiz Federal:- O senhor recusou de plano a aquisição desse apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, eu não recusei de pronto porque o Léo falou 'Eu vou dar uma olhada e depois falo com você'. Juiz Federal:- O senhor Léo Pinheiro disse que iria fazer alguma reforma nesse apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, no dia em que eu fui lá não disse. Juiz Federal:- Depois ele disse? Luiz Inácio Lula da Silva:- Ele disse que ia olhar e que depois me procurava para conversar. Juiz Federal:- Sei... Luiz Inácio Lula da Silva:- Isso foi em fevereiro de 2014, se não me falha a memória. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 194 de 317 Juiz Federal:- 2014, certo. O senhor ou a senhora sua esposa solicitaram alguma espécie de reforma nesse apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não. Juiz Federal:- Não? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não. Juiz Federal:- O senhor esteve uma única vez, o senhor ex-presidente tem conhecimento se a senhora sua esposa ou familiares, ou pessoas a seu serviço, estiveram novamente nesse imóvel? Luiz Inácio Lula da Silva:- Me parece que a minha esposa esteve mais uma vez. Juiz Federal:- O senhor ex-presidente diz 'Me parece' ou o senhor ex-presidente tem certeza? Luiz Inácio Lula da Silva:- Me parece, me parece que ela foi, me parece que ela foi com o meu filho Fábio e chegou lá o apartamento me parece que estava desmontado, estava totalmente desmontado, é a informação que eu tenho pelo meu filho e não por ela. Juiz Federal:- Com qual propósito, senhor ex-presidente, ela teria feito essa visita? Luiz Inácio Lula da Silva:- Hein? Juiz Federal:- Com qual propósito a senhora sua esposa teria feito essa visita? Luiz Inácio Lula da Silva:- Certamente ela iria dizer que eu não queria mais o apartamento, porque quando eu fui ao apartamento eu percebi que aquele apartamento era praticamente inutilizável por mim pelo fato de eu ser, independente da minha vontade, uma figura pública e eu só poderia ir naquela praia ou segunda-feira ou quarta-feira de cinzas. Juiz Federal:- Certo. Consta no processo que essa segunda visita da senhora sua esposa teria sido por volta de 21 ou 22 de agosto de 2014... Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu não sei a data, doutor Moro. Juiz Federal:- Saberia de foi aproximadamente isso? Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu não sei, foi em agosto, foi em agosto. Juiz Federal:- Eu já perguntei isso ao senhor, mas só para ficar claro, o senhor expresidente e sua esposa, ou familiares, orientaram a realização de reformas no apartamento triplex, a instalação de cozinha ou elevador privativo? Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu não orientei, o que eu sei é que no dia que eu fui houve muitos defeitos mostrados no prédio, muitos, defeitos de escada, defeito de cozinha. Juiz Federal:- O senhor ex-presidente, quando exatamente o senhor decidiu que não ficaria com esse imóvel, com esse triplex? Luiz Inácio Lula da Silva:- Na verdade no dia que eu fui ver eu me dei conta de que não era possível que eu tivesse um apartamento na Praia das Astúrias, naquele local, eu não teria como visitar a praia. Segundo: o apartamento era muito pequeno para uma família de cinco filhos, oito Netos, e agora uma bisneta. Juiz Federal:- Então logo na sua primeira visita o senhor já entendeu que não ficaria? Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu fiquei consciente que não poderia. Juiz Federal:- O senhor transmitiu essa informação... Luiz Inácio Lula da Silva:- Nós discutimos isso, porque até dona Marisa tinha uma coisa importante, ela não gostava de praia, ela nunca gostou de praia, certamente ela queria o apartamento para fazer investimento. Juiz Federal:- E o senhor comunicou ao senhor Léo Pinheiro que o senhor não ficaria com o apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, não, não sei porque, mas não comuniquei. Juiz Federal:- O senhor entendeu que o senhor não ia ficar com o apartamento, mas o senhor não comunicou a ele, não sei se eu entendi? Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu não entendi, eu não ia ficar com o apartamento, mas a dona Marisa ainda tinha dúvida se ia ficar para fazer negócio ou não. Juiz Federal:- E ela em algum momento decidiu não ficar com o apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, ela não discutiu isso comigo mais, não discutiu. Juiz Federal:- O senhor tem conhecimento se depois daquela segunda visita ela resolveu ficar com o apartamento? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 195 de 317 Em outras passagens, o ex-Presidente reafirmou que não tinha conhecimento dos fatos, que as tratativas eram feitas sempre com Marisa Letícia e que teria pensando em fazer o negócio a título de investimento. Transcrevo, novamente, para conferir precisão ao depoimento: Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu tinha dito a mesma coisa, eu apenas não tenho clareza, a dona Marisa não me disse no mesmo dia que ela foi lá e que ela não ia ficar com o apartamento, eu tinha mostrado para ela que era inadequado o apartamento, ela foi lá, acho que ela queria ver se podia ficar para vender, porque o apartamento na verdade é o seguinte, o apartamento nunca, nunca me foi oferecido antes da data que eu fui lá ver, e quando eu fui ver eu não gostei, é isso. Juiz Federal:- E o senhor Léo não falou ao senhor que ia reformar o apartamento para ver se o senhor se interessava? Luiz Inácio Lula da Silva:- O Léo me disse que depois ia voltar a conversar comigo, depois de todos os defeitos que eu vi ele falou 'Olha, vou te fazer uma proposta' e nunca mais conversei com o Léo. Juiz Federal:- Quando a senhora sua esposa foi ao apartamento pela segunda vez e voltou dessa visita, ela lhe relatou ou o senhor perguntou sobre as reformas... Defesa:- Excelência, ele já acabou de explicar, excelência, ele já respondeu essa pergunta algumas vezes a vossa excelência. Luiz Inácio Lula da Silva:- (inaudível) e ela disse que não tinha gostado do apartamento mais uma vez, e como eu tinha insistido pra ela que ela não gostava de praia e que eu gostava, mas que era inadequado para mim, eu acho que ela tomou a decisão de não comprar. Juiz Federal:- Certo, mas a indagação que eu faço é se ela relatou ao senhor sobre as reformas? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não, não relatou e lamentavelmente ela não está viva para perguntar. Juiz Federal:- Consta no depoimento que o senhor prestou também nessa condução coercitiva, o delegado perguntou ao senhor 'A dona Marisa, quando foi eventualmente para ver se tinha interesse, como o senhor explicou, já tinha instalado a tal cozinha e elevador?', o senhor respondeu 'Não tinha nada, segundo ela não tinha nada', aí ele perguntou novamente 'Na segunda visita, nada, nenhum móvel?', aí o senhor respondeu 'Nada, nada'. Ela relatou ao senhor ou não o estado das reformas? Luiz Inácio Lula da Silva:- Não. Não. Juiz Federal:- E como o senhor explica essa resposta que o senhor deu no depoimento da condução coercitiva? Luiz Inácio Lula da Silva:- Que ela disse que não tinha nada? Juiz Federal:- É. Luiz Inácio Lula da Silva:- Ela disse que não tinha nada... Juiz Federal:- Ela mencionou então... Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu já falei que depois de uns 10 dias, eu não precisei a data, que a Marisa disse que não tinha nada e que não queria mais o apartamento. Juiz Federal:- Certo, mas ela relatou ao senhor então que as reformas não tinham sido feitas, que a cozinha não tinha sido instalada? Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu não sei se é reforma, ela disse que não tinha nada no apartamento, estava do mesmo jeito que nós fomos lá. Juiz Federal:- O senhor ex-presidente sabe dizer se a falta de realização dessas reformas ou de instalação de cozinha, ou de instalação de elevador, em agosto de 2014, foi um dos motivos pelos quais o senhor ex-presidente resolveu não ficar com o imóvel? Luiz Inácio Lula da Silva:- Eu não ia ficar porque não tinha como ficar. Juiz Federal:- Esse foi o motivo também que influiu na decisão ou não? Luiz Inácio Lula da Silva:- Esse motivo foi que eu não tinha solicitado e não quis o apartamento. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 196 de 317 Das provas testemunhais e dos interrogatórios acima reproduzidos é possível apurar o contraste entre as versões da acusação e da defesa. Um único ponto, todavia, deve ficar desde logo demarcado. As provas são seguras quanto à inexistência de transferência da propriedade no registro imobiliário em favor do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA ou sua esposa e quanto à não ocorrência da transferência da posse. Reside a controvérsia em definir se a unidade residencial estava efetivamente reservada e fora reformada com recursos da OAS Empreendimentos, para e a pedido do ex-Presidente, ou se os melhoramentos na unidade decorriam de voluntariedade da empresa empreendedora, ainda que para tentar vender ao ex-Presidente ou para terceiros. 3.3.5.4. Tenho que o conjunto probatório permite um juízo afirmativo sobre a existência de prova acima de dúvida razoável de que o apartamento triplex, desde o início, inclusive antes mesmo da assunção das obras pela empreiteira OAS, foi reservado ao apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e assim permaneceu após a OAS assumir o empreendimento. Ainda, também há prova acima de dúvida razoável de que as reformas, compra da cozinha e utensílios foram feitas em favor do ex-Presidente, em customização feita a pedido e consoante projeto aprovado por este e sua esposa. Destaque-se que o recebimento pessoal dessa vantagem, ao meu sentir, decorre de desígnio autônomo em relação à corrupção havida em favor do Partido dos Trabalhadores. Esta se deu mediante o extenso esquema de corrupção havido no seio da Petrobras, com destinação de recursos de contratos obtidos mediante ajuste de vontades dos concorrentes, em benefícios de diversas pessoas e partidos políticos. Já em relação ao apartamento e suas melhorias, a vantagem está deslocada no tempo e no espaço em relação ao recebimento anterior. Há nova linha de nexo causal, no mínimo relativamente à diferença de preço entre a unidade adquirida (141) e aquela que lhe fora destinada (164-A) e os custeios das reformas e mobiliários, ainda que o dinheiro tenha a mesma origem espúria. Trata-se, a toda evidência, de crimes distintos. Se houvesse quaisquer hesitações quanto a estas assertivas, elas sucumbiram ao reinterrogatório de JOSE ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO (evento 809). Tendo inicialmente optado por ficar em silêncio em seu interrogatório anterior, o réu pediu para ser ouvido novamente, quando prestou esclarecimentos fundamentais sobre os fatos e reconheceu a sua própria responsabilidade. Em que pese ser extremamente longo, mostra-se imprescindível a sua transcrição: Juiz Federal:- Pois bem, vamos aqui agora para essa questão do tal do triplex. Consta no processo que a OAS assumiu esses empreendimentos imobiliários do BANCOOP, o senhor participou desse procedimento, dessa negociação? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Participei sim. Juiz Federal:- O senhor pode me descrever o que aconteceu? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- No ano de 2009 eu fui procurado pelo senhor João Vaccari, que tinha sido ou era ainda, não me recordo, presidente do BANCOOP, e ele me colocou que a situação do BANCOOP de quase insolvência, eles não estavam conseguindo dar andamento a empreendimentos, alguns estavam paralisados, já tinham começado, e outros não tinham sido ainda encerrados, ele me mostrou 6 ou 7 empreendimentos que o BANCOOP teria uma intenção de negociação conosco, eu disse a ele que algumas premissas teriam que ser estabelecidas, que nos interessava naquele momento, a área imobiliária nossa atuava, nós atuávamos na Bahia, estavam começando https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 197 de 317 alguns empreendimentos em Brasília, e São Paulo era um local que nós tínhamos o maior interesse, e facilitaria muito para a gente também o fato de alguns empreendimentos já estarem com comercialização praticamente feita, então isso ajudava muito, naquele momento também os terrenos estavam muito supervalorizados em função do boom do mercado imobiliário, então ficou combinado, ele me mostrou a situação física de cada empreendimento e geográfica, quando ele me mostrou esses dois prédios do Guarujá eu fiz uma ressalva a ele que não nos interessava atuar, tinha uma política empresarial nossa na área imobiliária, inclusive adotada por mim, de só atuar, que a empresa só atuaria em grandes capitais, os nossos alvos eram Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e Porto Alegre por causa de um empreendimento grande que nós estávamos fazendo lá, e tinha um projeto imobiliário, fora disso nós não tínhamos interesse. Ele me disse 'Olha, aqui temos uma coisa diferente, existe um empreendimento que pertence à família do presidente Lula, diante do seu relacionamento com o presidente, o relacionamento da empresa, eu acho que, nós estamos lhe convidando para participar disso por conta de todo esse relacionamento e do grau de confiança que nós depositamos na sua empresa e na sua pessoa', diante disso eu disse 'Olha, se tratando de uma coisa dessa monta eu vou...', de qualquer forma eu teria que mandar fazer um estudo de viabilidade de cada empreendimento, eu disse a ele 'Olha, não vejo problema, eu vou passar isso para a nossa área imobiliária, que é uma empresa independente, a empresa fará os estudos, eu volto com você e a gente vê se é viável, se não é viável, e com que podemos negociar'. Juiz Federal:- Essa conversa foi em 2009, é isso? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Em 2009, 2009. Juiz Federal:- Bom, quando essa conversa foi concluída eu procurei o Paulo Okamotto, que era uma pessoa do estreito relacionamento do presidente e também do meu relacionamento, então eu procurei o Paulo Okamotto e disse 'Paulo, o João Vaccari me procurou e me disse isso e isso, o que você me recomenda, o que você me orienta?', ele disse 'Não, nós temos conhecimento disso e isso tem um significado muito grande, primeiro o BANCOOP é um sindicato que tem muita ligação conosco, com o partido e, segundo, porque tem um apartamento do presidente, e eu acho que você é uma pessoa indicada para fazer isso pela confiança que nós temos em vocês,' eu disse 'Então pode, tá bom', 'Pode fazer', 'Tá bom'; eu voltei ao Vaccari e, com os estudos feitos, as duas empresas, ele indicou as pessoas do BANCOOP que teriam autoridade para fazer, os membros da diretoria, e eu indiquei as pessoas da OAS que podiam negociar empresarialmente, porque realmente era uma negociação muito difícil, empreendimentos que não tinham começado, outros que estavam no meio, tinha problemas já de ações do Ministério Público, tinha um quadro bem complexo, mas isso tudo acabou ocorrendo bem e foram iniciadas as obras de cada empreendimento, nem todas simultâneas por causa de uma questão de uma liberava antes do que a outra. Juiz Federal:- Certo. Como é que isso se desdobrou depois? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Bom, em 2010, aproximadamente... Aproximadamente não, desculpe, em 2010, o jornal O Globo trouxe uma reportagem enorme sobre esse empreendimento, e dizendo que o triplex pertenceria ao presidente, na época o presidente Lula, eu fiquei preocupado pela exposição do assunto, tornei a procurar o Paulo Okamotto, eu estive com João Vaccari e depois procurei o Paulo Okamotto, dizendo como é que nós devíamos proceder já que o triplex estava em nosso nome e a aquisição por parte da família do presidente era de cotas e não tinha havido a adesão para que o empreendimento, eu tinha uma autorização inclusive pra vender o que estava reservado anteriormente, que era um apartamento tipo, a informação, a orientação que foi me passada naquela época foi de que 'Toque o assunto do mesmo jeito que você vinha conduzindo, o apartamento não pode ser comercializado, o apartamento continua em nome da OAS e depois a gente vê como é que nós vamos fazer para fazer a transferência ou o que for', e assim foi feito. Isso, voltamos a tratar do assunto em 2013, se não me falha a memória. Juiz Federal:- Mas antes de entrar em 2013, alguns detalhamentos aqui que eu gostaria, tem uns documentos no processo que segundo o Ministério Público apontariam que a aquisição do apartamento pelo ex-presidente e pela esposa dele, diriam respeito ao apartamento 141... JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Isso. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 198 de 317 Juiz Federal:- Enquanto que esse triplex parece que teria outro número, originalmente 174? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- 164. Juiz Federal:- 164. É a isso que o senhor se referiu agora há pouco? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Exatamente. Juiz Federal:- Essa cota dizia respeito a outra unidade? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A cota dizia respeito a essa outra unidade, que era um apartamento tipo, e nós quando negociamos com o BANCOOP todos os empreendimentos tinha um procedimento padrão de que as pessoas que tinham adquirido anteriormente diretamente da BANCOOP poderiam aderir a nossa incorporação ou simplesmente ter o recurso devolvido, corrigido por uma regra que foi estabelecida, eram criadas comissões em cada empreendimento, dos adquirentes, e isso era negociado cada empreendimento com cada adquirente, no caso desse apartamento não foi, não houve assinatura do termo de adesão. Juiz Federal:- Mas qual foi a explicação? Por que todos não tinham que fazer essa adesão? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Todos tinham que ou ficarem com a unidade ou terem os recursos devolvidos, de uma regra pré-fixada, nesse apartamento eu fui orientado que não, que eu poderia negociá-lo porque o apartamento da família seria o triplex. Juiz Federal:- O que o senhor poderia negociar então seria o 141? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- 141, exatamente, e foi negociado. Juiz Federal:- O triplex não? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não. Juiz Federal:- Não poderia negociar? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não poderia. Juiz Federal:- Mas quem lhe orientou isso? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Pelo senhor João Vaccari e o Paulo Okamotto. Juiz Federal:- Consta aqui esse apartamento 141, teria havido pagamentos do expresidente e sua esposa da ordem de 200 mil reais ainda ao tempo da BANCOOP, mas isso diria respeito a esse apartamento 141, era o mesmo preço o triplex e esse apartamento 141? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não, o apartamento tipo, excelência, se eu... É algum número, é porque tem muito tempo e também a gente tinha 150 negócios ao mesmo tempo na empresa, o detalhe é difícil, mas se tratava de um empreendimento que tinha um presidente, é lógico que eu tinha um conhecimento melhor. Juiz Federal:- E foi feito algum, depois que foi lhe informado que eles ficariam com o triplex, não com o 141, foi lhe informado alguma coisa sobre o preço, a diferença de preço a ser pago, então, pelo ex-presidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Respondendo a sua pergunta, que eu acabei não... O apartamento tipo era da ordem de 80 metros quadrados, o apartamento triplex era 3 vezes essa área, claro que a conta não é bem multiplicando por 3 porque tem a parte do terraço, que tem a áreas descobertas, mas como se fosse duas vezes e meia o preço mais ou menos. Juiz Federal:- Mas nessa época, em 2009, alguém lhe falou assim 'Não se preocupe que o preço vai ser pago pelo ex-presidente por fora'? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, isso não. Juiz Federal:- E o senhor também não quis cobrar o preço? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu não, naquela época, em 2009, foi dito para mim 'O apartamento triplex, essa unidade é uma unidade específica, você não faça nenhuma comercialização sobre ela, pertence à família do presidente, a unidade tipo você pode vender porque eles não vão ficar com essa unidade, a unidade seria o triplex', eu disse 'E como nós vamos resolver essa questão?'. Não, vamos iniciar em 2010. Eu procurei o Vaccari pra conversar com ele como eu devia fazer, ele 'Não, não vamos mexer nesse assunto, tem campanha presidencial, não mexe nesse assunto agora, vamos deixar, depois das eleições a gente vê a forma, eu vejo com o presidente como vai ser feito isso'. Bom, depois das eleições, não sei em que período mais ou menos, o ex-presidente teve uma https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 199 de 317 doença grave e eu não me sentia confortável de tratar de um assunto desses, eu só vim voltar a tratar posteriormente com o João Vaccari e com o Paulo Okamotto, sempre eu tratava com o João Vaccari e depois eu procurava o Paulo, que era a forma de... O presidente estava hospitalizado, depois um tratamento de quimioterapia, e só vim tratar desse assunto com o presidente em 2013, eu pessoalmente com ele. Juiz Federal:- E como é que foi isso, ou melhor, antes só de prosseguir eu vou interromper aqui pelo tamanho do áudio. Juiz Federal:- Então nessa ação penal 5046512-94.2016.404.7000, continuidade do depoimento do senhor JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, ainda perguntas do juízo. Antes só de entrar nessa questão de 2013, o Ministério Público afirma, juntou documentos que supostamente diriam isso, que esse apartamento, esse triplex, não teria sido colocado à venda jamais pela OAS. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Nunca foi colocado à venda pela OAS. Juiz Federal:- Desde lá de 2009? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Desde 2009, eu tinha orientação para não colocar à venda, que pertenceria à família do presidente. Juiz Federal:- E o senhor dizia então que em 2013, o senhor poderia retomar então? Na sequência de seu depoimento, LÉO PINHEIRO esclarece em que circunstâncias foram tratadas as questões atinentes aos passivos que a BANCOOP possuía pendentes com a OAS, assim como a respeito das reformas necessárias e do agendamento de visita ao apartamento triplex pelo casal LULA DA SILVA. Com os destaques pertinentes, diz o interrogando: JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Em 2013 eu procurei o João Vaccari e disse a ele 'Ô João, nós estamos com alguns problemas, a diretoria da OAS Empreendimentos me posicionou de que alguns dos empreendimentos estavam tendo problemas de passivos que nós não conhecíamos na época da negociação, e nós temos também o problema do triplex, como vamos resolver, problema de titularidade, problema da diferença de preço, nós temos que resolver essas questões, o Vaccari me orientou o seguinte, 'Olhe, quanto ao problema do triplex eu aconselho você a procurar o presidente, ele já está atuando no instituto, você pedir um encontro com ele para saber dele exatamente o que deveria ser feito, quanto aos demais empreendimentos me apresente um estudo completo disso, o que houve e tal, para a gente dar uma olhada', 'Tudo bem'; eu procurei o presidente, acredito que em novembro ou dezembro de 2013, expus a ele o estágio que já estava o prédio lá de Guarujá, já estava num estágio muito avançado, e queria saber dele como que nós deveríamos proceder, se havia alguma pretensão da família em fazer alguma modificação, como proceder na questão da titularidade e tal, o presidente disse 'Olhe, eu vou ver com a família e lhe retorno'. Bom, no mês de janeiro... Juiz Federal:- Só um minuto. Esse encontro foi onde? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- No Instituto Lula, lá no Ipiranga. Juiz Federal:- Certo. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Em janeiro de 2014 o presidente me chamou no instituto, eu estive com ele, e ele disse 'Olha, eu gostaria de ir com a minha esposa visitar o apartamento, você pode designar alguém?' e tal, eu disse 'Não, absolutamente, presidente, eu vou pessoalmente', e marcamos uma ida, foi ele, a esposa, ele foi, marcamos na Via Anchieta, ele deu o número de um portão de uma fábrica, que eu ficasse ali que ele sairia de casa e no horário combinado ele passaria, ele iria no carro dele e eu no nosso carro, e assim foi feito, nos encontramos, fomos para o Guarujá, entramos pela garagem, fomos ao apartamento; foi uma visita, excelência, de aproximadamente duas horas, acredito eu, uma hora e meia, duas horas. Juiz Federal:- Quem estava nessa data nessa visita? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Estava o presidente, a dona Marisa, estava eu, estava o recém, quem tinha recém assumido a presidência da OAS Empreendimentos, Fábio Yonamine, tinha o diretor regional da OAS Empreendimentos, o Roberto, tinha um gerente também da área imobiliária, o Igor, e tinha uma outra pessoa que eu, me desculpe, não estou me lembrando do nome, que estava presente também. Bom, nós fomos, o https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 200 de 317 presidente quis conhecer, no primeiro andar a esposa do presidente fez um comentário, disse 'Olhe, vai ser necessário mais um quarto aqui no primeiro andar', porque por uma questão da logística familiar precisaria de mais um quarto, tinha uma questão também da cozinha que deveria ser feita algumas modificações para melhor aproveitamento do espaço, e me lembro que tinha uma escada helicoidal, que realmente o presidente tinha acabado de vir de um processo, eu fiquei até preocupado, eu disse 'Olha, presidente, se o senhor quiser não subir pode...', ele disse 'Não, não, não tem problema nenhum não, eu posso subir', nós subimos, e aí já ficou definido que a escada também nós teríamos que fazer uma alteração, que posteriormente fizemos uma outra, além da escada, colocamos um elevador, no andar intermediário tinha algumas mudanças pontuais indicadas pela esposa do presidente e na cobertura propriamente dita, aí eles ficaram preocupados com a questão da privacidade, tinha um prédio ao lado que não era do empreendimento Solaris e devassava um pouco a privacidade que realmente a gente tinha como arquitetonicamente produzir alguma coisa que desse privacidade, então aí foi deslocada a posição da piscina, foi feito um novo deck, foi modificado os acessos porque eles me falaram por causa dos Netos, tinha um problema de um (inaudível) de vidro que realmente era perigoso, tinha que, foi pedido uma churrasqueira, uma sauna, que depois acho que acabou virando um depósito, bom, uma série de modificações que eram não, como é dito, que era um projeto de decoração, não, era um projeto personalizado, nenhum outro triplex, eram 8 nos dois prédios, 4 em cada um, teria aquelas especificações, nem aquele espaço que foi criado, um quarto a mais, mudanças e tudo, então não serviria para servir de modelo para nenhum outro, ele era diferente dos outros. Bom, isso ficou combinado, eles gostariam de conhecer as áreas comuns do prédio, eu desci com eles, fomos no playground, nos espaços comuns, salão de festas, fomos na parte externa de piscina, quando concluído eu acompanhei o casal a até à garagem e o presidente então me disse 'Olha, você poderia vir conosco no carro, seu carro vai seguindo, chegando no meio do caminho você passa para o seu carro para seguir o seu roteiro e nós vamos para outro local', 'Pois não, presidente', tinha um assessor acompanhando ele, esse assessor foi para o nosso carro e eu fui com o presidente e dona Marisa, nessa conversa no carro ficou definido o seguinte, 'Presidente, são muitas modificações, eu precisaria passar isso para o setor de arquitetura para que isso fosse feito um projeto e depois levar para apreciação dos senhores, agora tem algumas coisas que eu aconselharia a gente fazer logo porque o prédio já ia começar a receber moradores, se tratando da sua figura de ex-presidente da república eu acho que vai causar algum transtorno', porque tinha um problema de infiltração, tinha que quebrar coisa, tinha modificação de parede e tal, que ia causar transtorno para os outros moradores quando viessem a chegar, então combinamos de que começasse imediatamente isso e logo em seguida eu levaria para eles para eles darem uma olhada se estava tudo ok, da forma como eles tinham nos pedido, e assim foi feito. Isso foi em fevereiro, janeiro ou fevereiro de 2014, logo em seguida eu recebi uma comunicação que o presidente queria falar comigo lá no instituto, eu retornei ao instituto, antes o Paulo Okamotto me explicou que o assunto que ele queria tratar comigo era sobre um sítio, para fazer umas modificações no sítio em Atibaia, eu 'Tudo bem'; subi, o presidente me explicou que eles queriam fazer uma mudança na entrada principal da casa sede, isso... (...) Juiz Federal:- Certo. Vamos continuar então com o ato processual aqui, que é o interrogatório do acusado, fica registrada aqui a questão de ordem e fica indeferida por sucessivas vezes. O senhor pode retomar a explicação? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Então, chegando no Instituto Lula, o Paulo Okamotto me informou que ele queria tratar comigo a questão do sítio, eu subi, ele conversou que queria fazer uma modificação na sede e tinha um problema, segundo ele um problema grave, dois lagos e tinha uma barragenzinha que tinha um problema, eu disse 'Olha, presidente, nós temos que olhar', ele disse 'Olha, você podia mandar alguém no sábado lá, eu vou estar lá', eu disse 'Olha, presidente, eu vou', e fui, eu e o Paulo Gordilho, que era o diretor de engenharia e diretor técnico da OAS Empreendimentos, e nós fomos num dia de sábado, o presidente combinou comigo, eu não sabia onde é que ficava, que no primeiro pedágio da rodovia Fernão Dias eu aguardasse ali que quando ele passasse eu seguiria o carro em que ele estava, isso foi o que aconteceu; fizemos uma visita à sede do sítio... https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 201 de 317 Juiz Federal:- Não, mas eu acho que a questão do sítio realmente o senhor não precisa entrar em detalhes, eu entendi que o senhor estava continuando uma explicação sobre a questão do condomínio... JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Elas vão ser... Juiz Federal:- Basicamente o senhor pode sintetizar essa parte do sítio, então, e ir para a parte que elas se comunicam. Ponto importante do interrogatório diz respeito à prévia apresentação dos projetos de melhoria ao ex-Presidente e sua esposa, em encontro ocorrido na residência do casal em São Bernardo do Campo. As declarações, neste aspecto, são coincidentes com aquelas prestadas por PAULO GORDILHO (evento 816). Disse LÉO PINHEIRO (com os destaques necessários): JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Pois não. Nós vimos lá o que precisava ser feito e tinha que fazer um projeto, não tinha como mandar técnicos para ver a parte da barragem. Saímos de lá e Paulo Gordilho, então, foi produzir o que precisava ser feito e marcamos um, quando estavam prontos, eu marquei com o presidente e estivemos na residência dele em São Bernardo do Campo, num dia de sábado, eu, Paulo Gordilho, estava o presidente e a sua esposa, onde nós discutimos alguns detalhes que faltavam do triplex e os detalhes do sítio, nessa data ficou acordado que tudo aquilo que estava sendo pedido, estava atendido, que nós podíamos prosseguir no triplex com todas as reformas que tinham sido acordadas, que tinham sido solicitadas por eles, e assim foi feito. Em julho ou agosto de 2014, eu não sei se foi por iniciativa nossa ou por iniciativa da família do presidente, que queriam retornar para visitar o apartamento triplex, eu comuniquei, eu fui lá no instituto e o presidente me disse 'Olha, tem campanha eleitoral, não vai ficar bom, não vai ficar bem eu comparecer, está muito próximo da campanha, isso vai ser explorado, teria algum problema de ir, meu filho iria com a dona Marisa e você mandaria alguém' e tal, eu de novo me ofereci e fui, e visitamos, estava tudo ok, eles aprovaram tudo que estava... Já estava numa fase bem adiantada a reforma, eles falaram 'Está tudo ok', então dona Marisa me fez um pedido, disse 'Olhe, nós gostaríamos de passar as festas de final de ano aqui no apartamento, teria condições de estar pronto?', eu digo 'Olhe, pode ficar certa que antes disso nós vamos entregar tudo pronto', e foi o que ocorreu. Se o senhor me permitir, o senhor me perdoe, eu pulei um detalhe que eu acho muito importante que era o retorno que eu fiquei de dar ao João Vaccari do encontro de contas, eu acabei não falando, se o senhor me permitir eu... Juiz Federal:- Claro. Em outro momento, LÉO PINHEIRO esclarece o método utilizado para contabilização das despesas relativas à diferença de preço entre a unidade padrão e o triplex, nelas computados igualmente os custos de reforma e fornecimento de mobiliário e equipamentos. Na audiência, ficou esclarecido que a LÉO PINHEIRO foi expressamente determinada por João Vaccari Neto a compensação de tais valores com o montante de propina destinado ao Partido dos Trabalhadores: JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Em maio ou Junho de 2014, com os custos já de todos os empreendimentos BANCOOP já bem aferidos e também toda a especificação, tudo que ia ser feito tanto no sítio como no triplex, eu procurei o João Vaccari e disse a ele 'Olhe, estou com os elementos todos em mãos e queria discutir', ele marcou, ele disse 'Olhe, o clima entre a sua empresa e o BANCOOP não está bom, eu vou sugerir a gente fazer um jantar, eu vou chamar a diretoria do BANCOOP, você chama o pessoal seu, e vamos sentar antes, então ele marcou comigo no mesmo local, no restaurante, um encontro com ele, onde eu levei esses créditos e esses débitos, eu levei para ele o que nós, OAS, estava devendo por conta desses pagamentos de vantagens indevidas ao PT naquele momento, o que já estava atrasado e o que ainda ia acontecer, e os custos dos empreendimentos que nós estávamos fazendo, desses passivos, que eu estou chamando de https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 202 de 317 passivos ocultos, o termo usado de coisas que nós não tínhamos conhecimento, e mais os custos do triplex e do sítio, o João Vaccari disse 'Olhe, está tudo ok, está dentro de um princípio que nós sempre adotamos, porque sempre, de quando em quando, que abria um encontro de contas com ele tinha 'Não, você paga isso ao diretório tal, paga isso ao político tal', isso era feito e era uma coisa já corriqueira, então 'Não vamos mudar a metodologia, vamos continuar com a metodologia, agora como tem coisas aqui de cunho pessoal, que trata do presidente, eu vou conversar com ele sobre isso e lhe retorno. Agora nesse encontro que nós vamos ter com a diretoria do BANCOOP e com o seu pessoal eu gostaria que você não tratasse desse encontro de contas, eu queria que a empresa desse uma tranquilizada na diretoria do BANCOOP que os empreendimentos iam prosseguir, que não haveria nenhuma solução de continuidade', e assim foi feito, houve isso. Passaram alguns dias, talvez uma semana ou duas no máximo, o Vaccari me retornou dizendo que estava tudo ok, que poderíamos adotar o sistema de encontro de contas entre créditos e débitos que nós tínhamos com ele. Juiz Federal:- Inclusive em relação a esses débitos havidos pela OAS no triplex? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- No triplex, no sítio e nos outros empreendimentos, a soma total disso me parece que era em torno de 15 milhões de reais. Juiz Federal:- E depois, como é que isso se desdobrou depois de agosto, o senhor disse que o apartamento ficaria pronto até o final do ano, ele ficou pronto? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Ficou pronto. Juiz Federal:- Mas ele foi entregue daí à família do ex-presidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu fui preso em 14 de novembro de 2014, aí eu já não acompanhei mais. Juiz Federal:- E quando iria ser feita a transferência do registro do imóvel da OAS? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Esse assunto nós provocamos muitas vezes porque tem a questão de averbação da construção, tem que estabelecer o condomínio, outras pessoas tinham que, esses dois empreendimentos, se não me falha a memória, são cento e poucas unidades, os dois, e a orientação que nós tivemos é que permanecesse em nosso nome, que no momento certo ia ver a forma como isso ia ser feito. Juiz Federal:- Não chegou a ser discutido com o senhor essa forma de fazer isso, como poderia ser feito isso? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Nunca foi. Juiz Federal:- Alguns esclarecimentos aqui, quando houve aquela transferência dos imóveis da BANCOOP não finalizados para a OAS e foi dada aquela opção aos cooperados, ou desistem ou continuam com a OAS, isso foi em 2009? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- 2009, 2010. Juiz Federal:- Os cooperados que continuavam, que resolveram continuar com a OAS tinham que fazer pagamentos adicionais? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu acredito que em alguns empreendimentos sim, eu não tenho esse detalhe, excelência, mas acredito que sim. Juiz Federal:- O senhor disse que as obras não estavam finalizadas. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, nenhum empreendimento tinha obra finalizada em 2009, tinha empreendimento ainda que não tinha nem sido iniciado, tinha os condôminos que tinham se inscrito para participar do empreendimento, outros empreendimentos as obras estavam paralisadas, uma estrutura sem acabamento, são 6 empreendimentos, de várias formas, alguns foram renegociados; qual era o nosso compromisso, de assumir o passado do ponto de vista físico que estava lá feito, assumir os adquirentes e renegociar com cada um deles, a metodologia que foi adotada naquela época, era muita gente, era de cada empreendimento criar uma comissão e essa comissão falando em nome de todos assinaria os termos de adesão ou não adesão, quem não aderisse procuraria a nossa incorporadora para receber de volta os valores que tinham pago corrigidos numa uma regra que existia na época. Juiz Federal:- Perfeito. Mas os contratos que continuavam, os prédios que não estavam acabados iam ter um custo de finalização, eles que iriam arcar com esses custos? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eles arcaram com esse custo, foi combinado, acordado com todos eles. Juiz Federal:- O ex-presidente e a família dele pagou algum valor desde 2009, 2010, relativamente a esse apartamento de uma forma... https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 203 de 317 JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não. Juiz Federal:- Relativamente a essas reformas que foram efetuadas no apartamento, não creio que o senhor mencionou, mas tinha também a instalação de um elevador privativo? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Teve, nós colocamos um elevador privativo, faz parte, também fez parte da reforma. Juiz Federal:- O senhor se recorda aproximadamente quanto foi o custo de todas essas reformas que foram feitas nesse apartamento? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- No triplex acredito que mais de 1 milhão e 100, 700, 800 mil foram pagos a uma empresa que nós contratamos para fazer as reformas e o restante com compra de alguns equipamentos que não foram adquiridos diretamente com empresas e sim diretamente pela OAS. Juiz Federal:- O Ministério Público aponta na denúncia um valor de cerca de 1 milhão e 277 mil, seria talvez alguma coisa por aí? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sim. Juiz Federal:- E a questão da diferença do preço entre o imóvel que eles compraram lá atrás e o preço que era do triplex, também foi abatido de alguma forma? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Também foi abatido nesse encontro de contas que eu tive com o João Vaccari. Juiz Federal:- O senhor lembra qual seria a diferença, aproximadamente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Uns 800 mil reais, 750 a 800 mil. Juiz Federal:- Quem da OAS, quem dentro do grupo OAS tratou desse assunto além do senhor? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Do assunto que envolvia... Juiz Federal:- Do triplex. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Do triplex, eu. A empresa OAS Empreendimentos só executou o que foi deliberado por mim. Juiz Federal:- Os outros executivos da OAS Empreendimentos tinham ciência de que havia um, que esses valores não iam ser pagos ou que isso ia ser abatido de um caixa geral que a OAS tinha com o partido dos trabalhadores? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, dentro da OAS Empreendimentos, como ela não tinha e não tem envolvimento nenhum com nenhum órgão público, é uma empresa que presta serviços de incorporação, não tinha porque estar envolvida nisso, apenas sabiam, os executivos da OAS sabiam que não seriam prejudicados, que isso era um custo da construtora. Sobre a transferência da unidade, LÉO PINHEIRO esclareceu perante o juízo: Juiz Federal:- Não sei se eu entendi muito bem, o senhor disse que lá desde o início, em 2009 e 2010, esse apartamento não foi formalmente transferido para o ex-presidente por qual motivo mesmo? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O Vaccari me pediu que não fizesse, me liberou para venda da unidade que teria sido escolhida, a unidade tipo, e que a unidade que pertenceria à família do presidente ficaria em nosso nome, eu teria uma orientação; em 2010 eu o procurei, tinha problema de campanha política, esperou-se, por causa da matéria do... Juiz Federal:- Ele falou isso ao senhor? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O João Vaccari falou comigo e o Paulo Okamotto. Juiz Federal:- Que não era para fazer a transferência? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Que não era para fazer transferência, e assim ficou até o final, como nós íamos resolver eu lhe confesso que a partir de novembro eu não... Juiz Federal:- Qual era a explicação que o senhor dava para o pessoal da OAS Empreendimentos de porque não fazer a transferência desse imóvel, porque fazer essas reformas todas? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 204 de 317 JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Ainda existia nesse empreendimento em 2014 mais de 20 e poucas unidades que não tinham ainda sido comercializadas, mas era claro que ficava evidente porque tinha uma determinação de não comercializar essa unidade, e é norma, é padrão numa incorporadora ela não ficar com unidades depois de entregue, inclusive é por isso que tem essas feiras, essas coisas de imóveis, que ninguém, isso é um transtorno dentro do negócio como um todo. Juiz Federal:- Mas qual era a explicação então que o senhor dava para os executivos da OAS Empreendimentos? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Que depois ia ser encontrada uma forma de transferência para alguém que o presidente determinasse ou para a família dele mesmo. Juiz Federal:- Eles sabiam que o imóvel era do ex-presidente, que estava destinado ao expresidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sabiam, em 2010 isso ficou muito claro e público pelo jornal. Juiz Federal:- Certo. Mas eles não sabiam da parte, que o senhor mencionou depois, que isso foi abatido num acerto com o senhor João Vaccari? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não sabiam. Juiz Federal:- Quem sabia dentro da OAS Empreendimentos, por exemplo, aqui dos acusados, o senhor Fábio Yonamine, o senhor Paulo Roberto Gordilho, o senhor Roberto Moreira Ferreira. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Como eu disse ao senhor, dentro da OAS Empreendimentos a gente evitou muito, eu evitei muito tratar desse tema, dentro da construtora não porque quando fomos autorizados a fazer o encontro de contas eu tive que informar a cada diretor superintendente que não fizesse pagamentos na conta da propina do PT, porque isso seria um encontro de contas feito e que não era para fazer o pagamento, não entrei em detalhes com eles que os pagamentos não foram feitos, eu falava em torno de um entendimento do BANCOOP como um todo. JOSÉ ADELMÁRIO, para além de assumir pessoalmente toda a responsabilidade pelas tratativas envolvendo a troca de unidade do imóvel, respectivas reformas e mobiliários, também confirmou e explicou aquilo que está suficiente e materialmente demonstrado por mensagens eletrônicas e de celular trocadas com seus subordinados. Esclareceu ele: Juiz Federal:- Tem no processo, foram juntados alguns extratos de conversas por meio eletrônico que o senhor teria tido com alguns executivos, consta vinculado a essas conversas um e-mail lpinheiro@oas.com, o senhor usava esse endereço eletrônico? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Esse é meu e-mail. Juiz Federal:- Consta também um telefone, 11-981491952. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Era o meu celular. Juiz Federal:- Era o seu celular. No evento 3, anexo comp. 303, há uns extratos de uma conversa na folha 34, que supostamente envolveria o senhor e o senhor Paulo Gordilho, eu vou lhe mostrar aqui, é no laudo 1.475, eu peço para o senhor dar uma olhadinha nessa troca de, é isso? Eu vou interromper o áudio um minutinho pelo tamanho. Juiz Federal:- Então nessa ação penal 5046512-94.2016.404.7000, continuidade do depoimento do senhor JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. Eu mostrei ao senhor aqui o laudo, o extrato de conversas eletrônicas, laudo 1.475, evento 3, arquivo comp. 303, eu até vou lhe passar porque eu tenho uma cópia aqui, essa conversa da folha 34, começa ali 'Acho o maciço se deslocou e partiu o tubo do ladrão', há uma continuidade disso no laudo que seria uma conversa envolvendo o senhor, o senhor se recorda dessa conversa? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Recordo. Juiz Federal:- Consta lá 'Ok, vamos começar quando, vamos abrir dois centros de custo, 1º Zeca Pagodinho (Sítio), 2º Zeca Pagodinho (Praia)', o senhor pode me esclarecer isso? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O teor desses e-mails lá quando 'O maciço se deslocou' é a questão da barragem entre os dois lagos do sítio, a questão da cozinha é porque essas compras foram feitas pela OAS Empreendimentos e tinha sido aguardado que https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 205 de 317 fosse aprovada aquela conversa que eu me referi anteriormente, com a aprovação dos projetos do sítio e do triplex, centro de custo é uma prática da empresa que qualquer despesa tem que ser lançada em algum centro de custo, a orientação que foi dada nesse caso do triplex é que as despesas seriam lançadas no empreendimento Solaris, mas tinha que ter um centro de custo, por isso o nome Zeca Pagodinho, que se refere a um apelido que se tinha do presidente, que a gente tem umas mensagens de Brahma, que o Zeca Pagodinho fazia a propaganda da Brahma. Juiz Federal:- Sítio aqui é sítio de Atibaia? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- É o sítio de Atibaia. Juiz Federal:- Praia aqui é o apartamento do Guarujá? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- É o apartamento do Guarujá. Juiz Federal:- Depois consta ali também, em seguida, 'Dr. Léo, o Fernando Bittar aprovou junto à Dama os projetos, tanto de Guarujá como do sítio, só a cozinha Kitchens completa pediram 149 mil, ainda sem negociação, posso começar na semana que vem. É isto mesmo?', aí o senhor respondeu 'Manda bala'. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Isso, o projeto das cozinhas do sítio, que foi feita uma nova cozinha... Juiz Federal:- Do sítio de Atibaia? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- De Atibaia e do apartamento triplex, como era o mesmo fornecedor o Paulo apenas estava me perguntando se podia fazer, eu autorizei. Juiz Federal:- E Dama quem seria? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A primeira dama, a ex-primeira dama. Juiz Federal:- A senhora Marisa? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Isso. Juiz Federal:- Depois consta ali ainda adiante 'Conversando com Joilson, ele criou 2 centros na investimentos. 1. Sítio, 2. Praia, a equipe vem de SSA...' JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- De Salvador. Juiz Federal:- '...São pessoas de confiança que fazem reformas na OAS, ficou resolvido eles ficarem no sítio morando, a dama me pediu isso para não ficarem na cidade', o senhor pode me esclarecer? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- É o Paulo Gordilho me explicando, preocupado quem ia fazer esses serviços lá no sítio, no triplex nós contratamos uma empresa que já trabalhava conosco há muito tempo fazendo stand de vendas e ela fez toda a reforma no sítio, no caso da cozinha, como era uma compra direta com o fornecedor, a Kitchens faz direto, não precisa de intermediário nisso. Juiz Federal:- Não sei se eu entendi, mas as cozinhas foram instaladas pela OAS tanto no sítio como no apartamento? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- São dois projetos de cozinha, do triplex e do sítio. Juiz Federal:- Foram contratados ao mesmo tempo? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu acredito que se não foi ao mesmo tempo, negociadas ao mesmo tempo, mas a gente tem uma vantagem de negociação. Juiz Federal:- Quem pagou as cozinhas? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Nós. Juiz Federal:- Nós quem? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A OAS Empreendimentos. Juiz Federal:- No evento 3, arquivo comp. 178, tem uma troca de mensagens em 12 de fevereiro de 2014, vou lhe mostrar aqui, isso está nos autos... JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Posso pegar? Juiz Federal:- Sim, sim. Só depois retorne. O senhor reconhece essas mensagens trocadas com o senhor Paulo Gordilho? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sim. Juiz Federal:- Consta ali 'O projeto da cozinha do chefe está pronto, se marcar com a madame pode ser a hora que quiser', ao que ele se referia? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Ele estava se referindo aqui ao projeto da cozinha do sítio, eu aí retorno para ele dizendo 'Vou confirmar se eles poderiam nos https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 206 de 317 atender, seria bom também ver se o do Guarujá está pronto', que era do triplex, para a gente ter a aprovação conjunta dos dois projetos para poder fazer. Juiz Federal:- E daí ele respondeu ali? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- 'Em princípio amanhã às 19 horas', eu tinha marcado para Paulo ir, eu não estive nesse encontro. Juiz Federal:- Mas ele respondeu ali 'Guarujá também está pronto'. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Pronto, e aí ele levou os dois, os das cozinhas. Juiz Federal:- Isso se referia então à cozinha tanto do apartamento do Guarujá, do triplex, como a cozinha do sítio? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Exatamente. Juiz Federal:- Quem é que é madame aqui, que foi referido? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A ex-primeira dama. Juiz Federal:- Na folha 7 desse mesmo documento do evento 3, comp. 178, existem outros extratos aqui de uma conversa em 13 de fevereiro de 2014, eu vou mostrar aqui para o senhor. Consta lá 'Léo, está confirmado, vamos sair de onde e a que horas?'. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Isso, essa deveria ser a visita ao sítio. Juiz Federal:- Ao sítio? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- É. Juiz Federal:- 'O Fábio ligou desmarcando', que Fábio é esse? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não sei se é o filho do presidente. Deve ser o filho do presidente. Juiz Federal:- Nesse mesmo documento tem na folha 11 uma outra troca de mensagens que teria ocorrido em 21 de agosto de 2014, começa assim 'Doutor Léo, a previsão de pouso será por volta das 9:40'. Eu peço para o senhor dar uma olhadinha. O senhor recorda dessa conversa? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Essa conversa tratava-se do encontro que a dona Marisa e o filho estiveram no triplex. Juiz Federal:- Foi por volta dessa época? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Foi. Juiz Federal:- Foi em 21 de agosto? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Foi em agosto, que ela retornou ao triplex para ver a finalização das obras que tinham sido feitas. Juiz Federal:- Consta lá na última mensagem 'Doutor Léo, alterado para as 10:30, falei com Cláudio e agora falei com Fábio (Filho)'. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- É o filho. Juiz Federal:- Filho de quem? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O filho do ex-presidente. Juiz Federal:- Depois, continuando nessa conversa, na folha 12 dessa mesma. Dessa conversa, tem lá 'Doutor Léo, segue o celular do doutor Fábio', aí tem o número aqui, 999739606, esse é o Fábio quem? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Esse é o Fábio, filho do presidente. Juiz Federal:- Depois 'Avisa para o doutor Paulo Gordilho', depois 'Avisado para o doutor Paulo Gordilho', essa é relativa à visita ao... JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Ao triplex, no Guarujá. Juiz Federal:- Quando houve essa transferência do empreendimento BANCOOP, e relativamente a esse imóvel que lhe foi informado, segundo o senhor disse, que seria do expresidente, o imóvel dele no contrato era 141, mas foi lhe dito que o imóvel dele era o triplex? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Exatamente, que eu poderia dispor do 141 para comercializar, e foi feito assim. Já no ponto final de seu interrogatório, LÉO PINHEIRO ratifica a informação de que todas as despesas de reforma, mobiliário e equipamentos foram debitados na contabilidade informal de créditos que o Partido dos Trabalhadores possuía junto a OAS Engenharia, decorrentes de obras contratadas inclusive junto à Petrobras: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 207 de 317 Juiz Federal:- Mas qual foi a explicação que foi dada ao senhor? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A explicação que foi me dada na época é que já estava acordado entre o João Vaccari e o presidente que eles ficariam com o triplex. Juiz Federal:- Mas, e por que foi então feito contrato do 141? Que não era triplex? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu não sei lhe dizer, eu não sei... Juiz Federal:- O senhor não chegou a perguntar? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não cheguei. Juiz Federal:- Por que a OAS pagava esses valores a João Vaccari, ao partido dos trabalhadores ou, no caso aqui, ao ex-presidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Porque tinha... Defesa:- Excelência, me desculpe, (inaudível). Juiz Federal:- A questão dos imóveis, né? Defesa:- (inaudível). Juiz Federal:- Bem, então vamos retificar a pergunta, por que a OAS pagava esses valores, essa conta corrente de créditos ao PT e para o João Vaccari, nos quais, segundo o senhor afirmou, teriam ali compreendidos os valores pagos em benefício do imóvel do expresidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A OAS pagava primeiro porque era uma regra de mercado, tinha sido estabelecido que em alguns mercados naquela época existiriam contribuições de 1% para o partido dos trabalhadores e que o gerenciamento disso seria feito pelos tesoureiros do partido, ao longo do tempo a gente percebe que não era só despesas do partido, isso tinha uma amplitude muito maior, era de um projeto político e por isso mesmo que os tesoureiros designavam para que a gente fizesse pagamentos os mais diversos possíveis, então os pagamentos que a OAS fez estavam dentro de uma regra que tinha no mercado, que eu... Juiz Federal:- Outras empresas pagavam também? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Na Petrobras, seguramente. Juiz Federal:- O senhor tinha conhecimento? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Tinha sim, seguramente. Juiz Federal:- Mas o senhor sabia disso naquela época? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Desde que a gente entrou na Petrobras eu já sabia que tinha isso, eu sabia. Juiz Federal:- Essa regra de mercado era agentes da Petrobras e a parte política, ou não? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O pagamento ao PT era feito aos tesoureiros do PT, não ao agente público, que eu tenha conhecimento sempre foi acertado com o João Vaccari. Juiz Federal:- Mas o senhor disse anteriormente que também havia pagamentos a diretores da Petrobras, por exemplo? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sim. Juiz Federal:- E isso entrava na mesma equação, na mesma regra de mercado? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Na mesma regra de mercado, as obras que nós fizemos na Petrobras foram sempre em consórcio, em todas elas tinham outras empresas que já faziam isso e já tinham uma regra estabelecida. Juiz Federal:- Algumas outras mensagens que também foram encontradas no seu celular, que o senhor utiliza a expressão Brahma para se referir, o senhor utiliza essa expressão, essa expressão se refere a alguma pessoa em particular? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Essa expressão se referia ao ex-presidente Lula por causa de uma propaganda que existia, que a Brahma era a número 1. Juiz Federal:- Por que utilizava e não usava o nome dele diretamente, usavam outros nomes? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Para não expor as figuras públicas, nós tínhamos isso como prática. O longo depoimento guarda coerência não apenas com aquilo que se acha imputado na acusação, mas também com as provas existentes no caderno processual, como faturas emitidas em nome da OAS emitidas pelas empresas Tallento, Kitchens e Fast https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 208 de 317 Shop. Muito embora LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA afirme desinteresse posterior pelo imóvel, no que é acompanhado por PAULO OKAMOTTO, por exemplo, a versão é enfraquecida pelas circunstâncias identificadas. Ora, executivos do grupo OAS somente confirmaram a compreensão comum que se tem a respeito das transações de imóveis. Não é crível - além de negado por LÉO PINHEIRO e outros envolvidos - que a construtora canalizasse tantos recursos apenas como forma de tornar o negócio mais atrativo. Os gastos extrapolam inclusive o próprio valor de mercado do bem. Não se cuida, pois, de reforma decorativa, mas sim com características de personalização para um programa de necessidades específico, com intervenções bastante profundas na planta padrão do imóvel. A instalação de um elevador entre os pisos internos, somente implementado na unidade 164-A, é um claro exemplo de modernização que desborda do padrão mercadológico. 3.3.6. Da titularidade (de fato) do triplex 3.3.6.1. Para além daquilo que restou acima exposto, há outros elementos que confirmam as declarações prestadas por corréus, testemunhas e colaboradores. A questão relativa à titularidade do imóvel e à forma como se deu sua aquisição e custeio das reformas deve ser compreendida segundo as provas carreadas aos autos e a linha de desdobramento causal dos fatos. Na lição de Malatesta (A lógica das provas em matéria criminal, Bookseller, p. 171): 'Se o homem só pudesse conhecer pela própria percepção direta, bem pobre seria o campo dos seus conhecimentos: pobre no mundo da ideias, pobre no dos fatos... A grande quantidade de acontecimentos está fora da esfera das nossas observações diretas e são, por isso, bem pouco os fatos que podemos conhecer por visão direta'. E prossegue: 'Entre uma coisa e outra existem fios secretos e invisíveis aos olhos do corpo, mas visíveis aos olhos do espírito; fios tênues que são o meio providencial, pelo qual o espírito chega à conquista do desconhecido; fios tênues que percorrendo o espírito humano, partindo daquilo que conhece diretamente, chegam ao que diretamente não se pode perceber. É por estes caminhos, invisíveis aos olhos do corpo, que o espírito humano, encontrando-se diante dos efeitos, leva a pensar em suas causas'. O conjunto dos elementos probatórios, diretos e indiretos, conduz a um juízo seguro sobre os fatos imputados. No caso, há prova acima de dúvida razoável de que o imóvel era destinado ao ex-Presidente e sua família, bem como as melhorias e compra de equipamentos foram realizadas em seu benefício, por conta e ordem da OAS Empreendimentos. Para além dos depoimentos, há trocas de mensagens eletrônicas (evento 849, anexo 2) entre Lucas Pithon Gordilho, empregado da OAS Empreendimentos, e o Diretor Telmo Tonolli, da mesma empresa, com cópia para o réu ROBERTO MOREIRA https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 209 de 317 FERREIRA, nas quais evidentemente estão tratando das obras de reforma do imóvel, dando coerência e corroborando as provas orais. Tais mensagens confirmam que, em 06/09/2012, a OAS Empreendimentos já tratava de 'atenção especial' com a unidade 164-A do Edifício Salinas (fls. 18-20). A informação é reforçada por outro email do mesmo Lucas Gordilho, desta feita pra Telmo Tonolli, dizendo 'seria bom sabermos qual das coberturas é a que precisamos ter atenção especial' (fl. 20, segunda parte), tendo este respondido, por seu email via iPhone '164'. Ainda relativamente à troca de emails, em 28 de abril de 2014 a questão do triplex volta a ser objeto de mensagens entre executivos da OAS. FÁBIO HORI YONAMINE envia mensagem, tendo por assunto 'Re: Solaris Guarujá', com o seguinte teor (dia 28/04/2014, às 13:14 horas): 'Dr Léo, Fizemos um orçamento para a unidade que visitamos no Guarujá. Está de acordo com o projeto que lhe enviamos e inclui o elevador dentro da unidade. Vai ficar em torno de R$ 370-400 mil. Se estiver de acordo, nossa equipe está pronta para a execução. Abraço, FÁBIO'. Antonio Carlos Mata Pires respondeu a mensagem ('ENC: Solaris Guarujá'), com cópia para o próprio LEO PINHEIRO, às 13:17 horas, com a seguinte confirmação: 'Estou com o Dr. Leo. Pode avancar.' ROBERTO MOREIRA FERREIRA, por sua vez, em email cujo o objeto também era 'ENC: Solaris Guarujá', respondeu, às 18:32 horas: 'toca o pau... vou mandar um e mail pro Joilson te copiando.' Contradizem a versão da defesa, ainda, as diversas vias da proposta de aquisição com referência à unidade 174, posteriormente denominada 164-A (apartamento triplex). Trata-se de formulário de 'Proposta de adesão sujeita à aprovação', assinado por Marisa Letícia Lula da Silva, datado de 12 de abril de 2005 (evento 3 - comp194), onde é evidente a rasura sobre a unidade adquirida. O documento encartado no mesmo evento (evento 3 - comp193) parece ser a primeira via daquele outro documento, igualmente rasurado. Porém, comparando ambos, é possível verificar que o preenchimento daquele é cópia carbono deste outro. Há, ainda, uma terceira via da proposta de adesão firmada por Marisa Letícia (evento 3 - comp195). E também nesta é possível a olho nu verificar que há rasuras. Equivale dizer, os três diferentes documentos foram objeto de alterações posteriores. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 210 de 317 Colhe-se do Laudo Pericial 1576/2016, elaborado por peritos da Polícia Federal, a seguinte conclusão: 'a numeração original aposta no campo APTO/CASA sofreu alteração por acréscimo denominada inserção, sem prévia alteração substrativa, isto é, os lançamentos anteriores não foram suprimidos (...)', sobrepondo-se ao número original da unidade 174 o número 141. Ou seja, originalmente constava o número 174, o que é indicativo como sendo aquele cuja aquisição se destinava. Aliás, o assistente técnico indicado pelo apelante reconhece a sobreposição do número 174 pelo número 141, com mudança da identificação da unidade (laudo do assistente técnico - evento 481 - laudo2). Diz o expert que as rasuras são constatáveis icto oculli e estariam sobrepostas entre si, por ocasião de sua confecção, com todas as sobrecargas produzidas concomitantemente (p. 27). Todavia, apesar de sobrepostas, afirma que 'as propostas não eram aderidas em talonária, mas sempre em folhas soltas separadas, grampeadas junto à borda superior' (p. 28 - negrito constante do original). À igual conclusão chegou o laudo oficial (Laudo nº 1576/2016): 'durante os exames com o comparador espectral de vídeo não foi possível diferenciar as tintas do manuscrito original daquele inserido' e 'que a definição do traçado do lançamento '174' é compatível com, por exemplo, o do lançamento ´195000,00´' (Autos nº 503520461.2016.4.04.7000/PR, evento 2, LAUDO8). É dizer, há indicativos de que os documentos rasurados não espelham a verdade daquilo que ocorreu. Ou estes documentos rasurados, se correta a data ali lançada, já indicavam a possível destinação do apartamento 174 para a família do apelante quando o imóvel ainda estava na planta (2005), ou os documentos relativos à aquisição foram formalizados em data posterior, quando houve a aposição equivocada da unidade 174, posteriormente substituída pela 141, em forma de rasura. Qualquer das hipóteses fragiliza sobremaneira a versão defensiva, uma vez que não se tratava de mera aquisição das cotas da unidade 141, ainda sob a égide do contrato com a BANCOOP, mas de aquisição da unidade 174 (posteriormente renumerada para 164-A, após a assunção do empreendimento pela OAS Empreendimentos S/A). Ademais, há outras provas que conspiram em desfavor da tese defensiva, formando um quadro coerente com aquilo que restou reconhecido na sentença. Ainda mais frágil e indigna de crédito é a tentativa do apelante de desqualificar o documento, insinuando, em dado momento de seu interrogatório, que poderia ter sofrido alterações após a busca e apreensão. 3.3.6.2. Disse o apelante, em seu interrogatório, que a desistência da unidade teria ocorrido durante o ano de 2014. Como sinalado, essa versão não encontra correspondência com a documentação encartada. Louvo-me do exposto na sentença: 363. No processo 5005896-77.2016.4.04.7000, houve, a pedido do MPF, quebra judicial de sigilo fiscal do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (decisão de 23/02/2016, evento 6). Cópias das declarações de rendimento foram juntadas no evento 3, comp227. Ali, verifica-se que Luiz Inácio Lula da Silva apresentava declaração de rendimentos conjunta com Marisa Letícia Lula da Silva. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 211 de 317 Nas declarações de 2010 a 2015, anos calendários 2009 a 2014, consta a declaração da titularidade de direitos sobre a unidade habitacional nº 141, Edifício Navia, Residencial Mar Cantábrico, no valor de R$ 179.298,96, sem qualquer alteração de valor no período. 364. Apenas na declaração de 2016, ano calendário 2015, apresentada em 27/04/2016, portanto, posterior ao início das investigações, consta alteração quanto ao referido bem, sendo informado que teria havido desistência e requerimento de devolução dos valores pagos em novembro de 2015 junto à BANCOOP, sem efetiva devolução (fl. 114 do arquivo comp227, evento3). 365. Então, pelas próprias declarações de rendimentos apresentadas pelo ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem-se que não houve alteração formal da contratação junto à BANCOOP ou à OAS Empreendimentos antes do início das investigações. 367. Apesar disso, cumpre observar que a OAS Empreendimentos vendeu o antigo apartamento 141, Edifício Navia, do Empreendimento Mar Cantábrico, depois alterado para apartamento 131-A, Edifício Salinas, do Condomínio Solaris, em 05/08/2014, para terceiro, de nome Eduardo Bardavira, como se verifica na matrícula correspondente, de n.º 104790, do Registro de Imóveis do Guarujá/SP (evento 3, comp299). Ali se verifica que a aquisição foi proposta em 26/04/2014 pelo preço total de R$ 450.000,00. 368. Por outro lado, há documentos que revelam que o apartamento 174-A, duplex, Edifício Navia do Empreendimento Mar Cantábrico, depois alterado para apartamento 164-A, triplex, Edifício Salinas, do Condomínio Solaris, nunca foi posto à venda pela OAS Empreendimentos desde que ela assumiu o empreendimento imobiliário em 08/10/2009, o que indica que estava reservado. Com efeito, a unidade originalmente contratada pelo apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e sua esposa MARISA LETÍCIA junto à BANCOOP, sucedida pela OAS Empreendimentos, foi vendida (evento 3, comp228) para Eduardo Bardavira e sua esposa, consoante escritura de compra e venda, datada de 05 de agosto de 2014, devidamente averbada no Cartório de Registro de Imóveis do Guarujá (matrícula nº 104790), pelo valor de R$ 420.075,00. Este fato demonstra que, dias antes da celebração do contrato de compromisso de compra e venda com força de escritura pública, a unidade originalmente contratada já estava livre para venda a outrem, o que de fato ocorreu. Assim, por distrato ou porque outra unidade teria sido destinada aos antigos adquirentes, é certo que o apartamento 141-A do Edifício Salinas, Bloco A, do Condomínio Solaris já não pertencia, tampouco estava destinado, ao ex-Presidente, ora apelante. Apesar disso, as negociações atinentes a reformas e mobiliários perduraram, inclusive com manifesta intenção da família LULA DA SILVA de passar as festas de final de ano no novo apartamento, como relatado por LÉO PINHEIRO. Diante disso, torna-se inquestionável que antes de agosto de 2014 o ex-Presidente não mais titularizava a unidade 141 e que lhe seria destinado o triplex. Matéria jornalística, datada 10/03/2010, já indicava que o imóvel destinado ao apelante seria a cobertura do edifício (evento 3 comp230): O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua mulher, Marisa Letícia, são donos de uma cobertura na praia das Astúrias, no Guarujá, mas amargam há cinco anos na fila de cooperados da BANCOOP (Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo) para receber o imóvel. A solução encontrada pelos cerca de 120 futuros proprietários do empreendimento foi deixar de lado a BANCOOP e entregar o Residencial Mar Cantábrico à Construtora OAS que prometeu concluir as obras em dois anos. Procurada, a Presidência confirmou que Lula continua proprietário do imóvel. (...) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 212 de 317 O prédio, no entanto, está no osso: sem nenhum acabamento, nem portas, janelas ou elevadores. É nele que a família Lula da Silva deverá ocupar a cobertura triplex, com vista para o mar. Apesar dos imponentes 19 andares e de um projeto que prevê duas torres, com apartamentos entre 80 e 240 metros quadrados, o Mar Cantábrico é conhecido na vizinhança como o 'prédio abandonado'. (Base governista derruba requerimento para convocação de promotor do caso BANCOOP) (...) Presidente declarou imóvel em 2006 no nome da primeira-dama. Na declaração de bens feita para a candidatura à reeleição, em 2006, o presidente informou sobre o imóvel, afirmando ter participação na cooperativa habitacional para o apartamento em construção. O contrato foi assinado em maio de 2005, em nome da primeira-dama. Segundo a declaração feita por Lula ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), a família já havia pagado R$ 47.695,38. Mas o apartamento mais simples, de três quartos, foi oferecido pela BANCOOP por R$ 192.533,20. O medo de muitos deles é que agora o preço final chegue a triplicar, já que o empreendimento foi incorporado pela OAS, que não cobrará o prometido preço de custo da BANCOOP. Vejo com reservas as notícias jornalísticas como meio de prova. Todavia, não se pode ignorá-las como informações que são. Pela notícia, já se aventava da existência do empreendimento e da destinação da cobertura em favor do ex-Presidente. Se como prova não serve, ao menos tem serventia para conferir coerência com aquilo que foi alegado, porque provas independentes existem nesse sentido. Aqui, uma vez mais, sobressai a notícia jornalística que já indicava a destinação do apartamento ao apelante LUIZ INÁCIO, porque a partir deste momento todos dentro da OAS passaram a ter ciência a quem a unidade 164-A era destinada, bem como sobre as orientações quanto à reforma. Sequer o fato foi negado oportunamente, o que somente aconteceu após a prisão de LÉO PINHEIRO com outros empreiteiros em novembro de 2014. Provas existem apontando para a veracidade da informação jornalística. A matéria foi até objeto de preocupação e de conversa de LÉO PINHEIRO com João Vaccari Neto sobre a regularização do apartamento (evento 809). 3.3.6.3. Como destacado, para além da prova material até aqui referida, há prova oral indicando que o apartamento nº 174, posteriormente modificado para apartamento nº 164-A, do Edifício Salinas, do Condomínio Solaris, estava reservado ao ex-Presidente. E mais, a prova indica que os recursos necessários para o pagamento da diferença entre aquilo que inicialmente foi adimplido pelo apelante e por sua esposa, agregado com os valores da reforma, foram arcados pela empresa OAS. O apartamento 141, que tinha sido objeto de compromisso de compra e venda pelo apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e sua esposa, com parte de seu valor pago, acabou, de fato, sendo trocado pela unidade 164-A (triplex). Também restou declarado pelo interrogado JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, em sintonia com os elementos documentais existentes, que o imóvel seria de titularidade do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, mas que não houve a transferência formal. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 213 de 317 Outro ponto relevante do interrogatório diz respeito às reuniões realizadas com o apelante e sua esposa Marisa Letícia para deliberar sobre modificações e melhorias a serem feitas na unidade habitacional. Adiante, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO esclarece alguns dados relativos a documentos, trocas de mensagens pelo celular e emails que ele trocou com empregados da OAS, indicando que as obras realizadas diziam respeito ao apartamento do ex-Presidente e sua esposa. Em respostas às perguntas feitas pela defesa, o réu JOSÉ ADELMÁRIO reafirmou que a transferência ou entrega das chaves não ocorreu porque foi preso em novembro de 2014: Defesa:- Certo. Em que momento, o senhor disse aqui que esta, enfim, houve assunção, o senhor não sabe dizer, recordar a data em que a OAS Empreendimentos assumiu o Mar Cantábrico, correto? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Em 2010, acredito eu, 2009-2010, eu não sei precisar. Defesa:- Com relação à unidade 164-A, como ficou essa unidade após a assunção pela OAS Empreendimentos? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A 164-A, que você está se referindo, é o triplex que ficou com a família do presidente, é isso? Defesa:- De que forma, como o senhor disse, ficou com a família do presidente, qual foi a forma, o senhor entregou a chave desse imóvel? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não existia chave porque não existia o andar feito, isso foi feito uma, o João Vaccari conversou comigo dizendo que esse apartamento, a família tinha a opção de um apartamento tipo, tinha comprado cotas e tal, mas que esse apartamento que eles tinham comprado estava liberado para eu comercializar, e foi comercializado e foi vendido, e que o triplex eu não fizesse absolutamente nada em termos de comercialização, tanto é que o jornal O Globo, logo em 2010, por isso que a data de 2010 está fresca na minha memória, está lá descrito, porque tinha uma proibição de ser comercializado, e depois disso várias conversas eu tive com o presidente, tive com o João Vaccari, tive com o Paulo Okamotto sobre esse tema, eu relatei boa... Defesa:- Eu quero saber qual foi o momento em que o senhor entregou a chave desse apartamento ao ex-presidente Lula? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Conforme eu lhe disse, a última visita que eu estive no apartamento, estive com a dona Marisa e com o filho do presidente e dona Marisa, o Fábio, em agosto de 2014, onde foi combinado que seria, uma solicitação dela, que a família queria passar as festas de final de ano no apartamento, então nós nos comprometemos a entregar todo antes das festas de final de ano; eu fui preso em novembro, então eu não sei lhe dizer como é que acabou isso. Defesa:- Então o senhor não entregou as chaves desse apartamento para a família do expresidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, eu não entreguei. Defesa:- Alguém disse para o senhor que entregou? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Também eu já estava preso, eu não sei dizer, infelizmente não sei. Defesa:- A OAS Empreendimentos lavrou a escritura desse apartamento em favor da família do ex-presidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não. Tais confirmações sobre as reformas foram repetidas por ROBERTO MOREIRA FERREIRA (evento 869), destacando ter participado de visita ao apartamento triplex juntamente com o ex-Presidente e a ex-Primeira dama, entre outras pessoas. Disse em seu interrogatório: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 214 de 317 Juiz Federal:- Posteriormente o senhor se envolveu de alguma forma na reforma ou alterações dessa unidade triplex? Roberto Moreira Ferreira:- Sim, excelência, eu acompanhei as duas visitas à unidade e fui responsável pela, atendendo a um pedido do meu chefe, do meu líder, fazer a reforma e a colocação de armários e eletrodomésticos na unidade. Juiz Federal:- O senhor pode descrever essas circunstâncias? Roberto Moreira Ferreira:- Logo depois que eu cheguei de férias e assumi a diretoria, por volta do dia 20 de janeiro, no fim do mês, o Fábio, meu líder, meu presidente, me chamou e disse, me pediu para eu acompanhá-lo numa visita à unidade para esclarecer qualquer dúvida técnica relativa à unidade, se podia colocar ar-condicionado, que tipo de chuveiro podia ser colocado, dúvidas relativas ao funcionamento da unidade, e assim eu fiz, no início de fevereiro eu fui ao Guarujá e esperei ele lá para fazer esse acompanhamento. Juiz Federal:- Esperou ele quem? Roberto Moreira Ferreira:- Esperei o Fábio, sabia que o Fábio estava vindo junto com o doutor Léo e que viria o ex-presidente. Juiz Federal:- O Fábio que o senhor se refere é o Fábio Yonamine? Roberto Moreira Ferreira:- Fábio Yonamine, Fábio Yonamine que era o presidente da OAS Empreendimentos, o meu chefe. Juiz Federal:- E depois chegaram, o ex-presidente e outras pessoas? Roberto Moreira Ferreira:- Daí chegaram, eu já estava lá com o Igor, eu fui antes à unidade, fiquei lá esperando, e aí chegaram em dois carros, chegou o ex-presidente, a dona Marisa, doutor Léo e o Fábio Yonamine. Juiz Federal:- O senhor acompanhou essa visita do ex-presidente ao imóvel? Roberto Moreira Ferreira:- Eu subi junto com eles, doutor Léo foi apresentando a unidade, eu fiquei de retaguarda ali esperando ser chamado, eu mal conhecia o doutor Léo, nunca nem quase tinha visto ele, e fiquei esperando que ele pudesse ter alguma dúvida e que eu fosse chamado para isso. Juiz Federal:- E o senhor foi chamado, chegou a ter conversas ali? Roberto Moreira Ferreira:- Não, nenhuma. Juiz Federal:- O senhor chegou a acompanhar as conversas do senhor Léo Pinheiro com o senhor ex-presidente? Roberto Moreira Ferreira:- Não, não acompanhei, fiquei distante. Juiz Federal:- E como foi o desdobramento disso daí? Roberto Moreira Ferreira:- Depois dessa visita eles, foram embora, eu ainda permaneci no Guarujá junto com o Igor, e tempos depois, semanas depois, o Fábio me chamou na sala dele e pediu para fazer algumas adequações, alguma reforma no apartamento, que inicialmente fizesse um projeto, fizesse um orçamento, apresentasse para ele para que fosse feito no apartamento. Juiz Federal:- E o senhor fez esse projeto? Roberto Moreira Ferreira:- Eu diretamente não, mas eu tinha uma equipe de arquitetas que trabalhavam comigo, solicitei para elas que fizessem e que fizessem, além do projeto, um orçamento e junto do orçamento do projeto eu levei para o Fábio para aprovação dele. Juiz Federal:- O que tinha nesses projetos de alteração, vamos dizer assim? Roberto Moreira Ferreira:- Principalmente tinha uma alteração na escada, tinha uma escada que levava do primeiro pavimento para o segundo pavimento que era uma escada redonda, helicoidal, muito ruim, então tinha principalmente que tirar essa escada, fazer uma escada reta, acrescentar um quarto na parte de baixo, colocar piso, o apartamento era entregue no cimento, no contrapiso, então colocar piso em todas as áreas, fazer um reparo na piscina, tinha um problema de infiltração que aliás tem até hoje, um problema de infiltração sério na piscina, na cobertura, no último pavimento, fazer uma adequação no deck lá de cima e colocar uma churrasqueira. Juiz Federal:- E de onde que vieram essas orientações pra fazer essas reformas específicas? Roberto Moreira Ferreira:- Veio para mim através do Fábio, eu creio que foi um pedido do doutor Léo para ele, e ele me repassou. Juiz Federal:- O senhor chegou a entrar em contato com o senhor ex-presidente ou com a senhora Marisa Letícia? Roberto Moreira Ferreira:- Não, nunca tive nenhum contato. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 215 de 317 Juiz Federal:- Com algum subordinado dele ou assessores? Roberto Moreira Ferreira:- Não, nada, meu contato sempre foi o Fábio. Juiz Federal:- E a questão da cozinha, o senhor se envolveu também? Roberto Moreira Ferreira:- Também me envolvi na questão da cozinha, também foi feito nesse pedido de escopo pra colocar armário na cozinha, armários nos quartos... Juiz Federal:- Nessa mesma ocasião? Roberto Moreira Ferreira:- Nesse mesmo pedido que o Fábio me fez. Juiz Federal:- Ah, sim. Roberto Moreira Ferreira:- E colocar também eletrodomésticos. Nesse intervalo houve uma sugestão de Paulo Gordilho para que colocasse um elevador privativo dentro da unidade, para facilitar o acesso entre os três pavimentos. Juiz Federal:- Essas reformas foram feitas todas? Roberto Moreira Ferreira:- Foram. Juiz Federal:- Essa questão, por exemplo, de colocar cozinha, colocar os armários, como é que foi definido 'Vou colocar esse tipo de cozinha, vou colocar esse tipo de armário', como é que foi? Roberto Moreira Ferreira:- Houve uma sugestão das próprias arquitetas que trabalham comigo para a colocação de um tipo específico de armário, tipo normal, e eu acatei. Juiz Federal:- E o senhor submeteu essas sugestões a alguém ou o senhor decidiu sozinho? Roberto Moreira Ferreira:- Não, tudo eu submeti ao Fábio junto da entrega do orçamento da Kitchens e da obra eu mostrei a ele. Juiz Federal:- Era praxe da OAS fazer esse tipo de reforma ou colocação de cozinha, armário, essas coisas? Roberto Moreira Ferreira:- Desse tamanho do jeito que foi feito não era praxe, existia, a gente fez em algumas outras oportunidades, mas colocação de cozinhas comuns, desse tamanho de obra nunca tinha sido feito. Juiz Federal:- E quais eram as justificativas, se é que era passado alguma justificativa ao senhor, para a OAS estar fazendo isso em relação a essa unidade específica? Roberto Moreira Ferreira:- Não era passada nenhuma justificativa, era para que fizesse para entregar para o ex-presidente, não me foi passado nenhuma outra... Juiz Federal:- O senhor se recorda aproximadamente quanto foi gasto nessas reformas e nessas cozinhas, nesses armários? Roberto Moreira Ferreira:- Em torno de 1 milhão e 100. Há fatos relevantes destacados por JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, no interrogatório acima transcrito, sobre as reformas empreendidas no apartamento e no sítio de Atibaia, ambas a pedido dos familiares do ex-Presidente, igualmente corroborados por provas documentais quanto às despesas efetivadas pela OAS na contratação de outra empresa para realizar as reformas, bem como quanto à aquisição de mobiliário. Disse o interrogando (evento 809): JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- É o Paulo Gordilho me explicando, preocupado quem ia fazer esses serviços lá no sítio, no triplex nós contratamos uma empresa que já trabalhava conosco há muito tempo fazendo stand de vendas e ela fez toda a reforma no sítio, no caso da cozinha, como era uma compra direta com o fornecedor, a Kitchens faz direto, não precisa de intermediário nisso. Juiz Federal:- Não sei se eu entendi, mas as cozinhas foram instaladas pela OAS tanto no sítio como no apartamento? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- São dois projetos de cozinha, do triplex e do sítio. Juiz Federal:- Foram contratados ao mesmo tempo? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu acredito que se não foi ao mesmo tempo, negociadas ao mesmo tempo, mas a gente tem uma vantagem de negociação. Juiz Federal:- Quem pagou as cozinhas? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Nós. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 216 de 317 Juiz Federal:- Nós quem? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A OAS Empreendimentos. Juiz Federal:- No evento 3, arquivo comp. 178, tem uma troca de mensagens em 12 de fevereiro de 2014, vou lhe mostrar aqui, isso está nos autos... JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Posso pegar? Juiz Federal:- Sim, sim. Só depois retorne. O senhor reconhece essas mensagens trocadas com o senhor Paulo Gordilho? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sim. Juiz Federal:- Consta ali 'O projeto da cozinha do chefe está pronto, se marcar com a madame pode ser a hora que quiser', ao que ele se referia? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Ele estava se referindo aqui ao projeto da cozinha do sítio, eu aí retorno para ele dizendo 'Vou confirmar se eles poderiam nos atender, seria bom também ver se o do Guarujá está pronto', que era do triplex, para a gente ter a aprovação conjunta dos dois projetos para poder fazer. Juiz Federal:- E daí ele respondeu ali? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- 'Em princípio amanhã às 19 horas', eu tinha marcado para Paulo ir, eu não estive nesse encontro. Juiz Federal:- Mas ele respondeu ali 'Guarujá também está pronto'. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Pronto, e aí ele levou os dois, os das cozinhas. Juiz Federal:- Isso se referia então à cozinha tanto do apartamento do Guarujá, do triplex, como a cozinha do sítio? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Exatamente. Juiz Federal:- Quem é que é madame aqui, que foi referido? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A ex-primeira dama. Juiz Federal:- Na folha 7 desse mesmo documento do evento 3, comp. 178, existem outros extratos aqui de uma conversa em 13 de fevereiro de 2014, eu vou mostrar aqui para o senhor. Consta lá 'Léo, está confirmado, vamos sair de onde e a que horas?'. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Isso, essa deveria ser a visita ao sítio. Juiz Federal:- Ao sítio? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- É. Juiz Federal:- 'O Fábio ligou desmarcando', que Fábio é esse? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não sei se é o filho do presidente. Deve ser o filho do presidente. Juiz Federal:- Nesse mesmo documento tem na folha 11 uma outra troca de mensagens que teria ocorrido em 21 de agosto de 2014, começa assim 'Doutor Léo, a previsão de pouso será por volta das 9:40'. Eu peço para o senhor dar uma olhadinha. O senhor recorda dessa conversa? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Essa conversa tratava-se do encontro que a dona Marisa e o filho estiveram no triplex. Juiz Federal:- Foi por volta dessa época? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Foi. Juiz Federal:- Foi em 21 de agosto? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Foi em agosto, que ela retornou ao triplex para ver a finalização das obras que tinham sido feitas. Juiz Federal:- Consta lá na última mensagem 'Doutor Léo, alterado para as 10:30, falei com Cláudio e agora falei com Fábio (Filho)'. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- É o filho. Juiz Federal:- Filho de quem? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O filho do ex-presidente. Juiz Federal:- Depois, continuando nessa conversa, na folha 12 dessa mesma. Dessa conversa, tem lá 'Doutor Léo, segue o celular do doutor Fábio', aí tem o número aqui, 999739606, esse é o Fábio quem? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Esse é o Fábio, filho do presidente. Juiz Federal:- Depois 'Avisa para o doutor Paulo Gordilho', depois 'Avisado para o doutor Paulo Gordilho', essa é relativa à visita ao... JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Ao triplex, no Guarujá. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 217 de 317 Juiz Federal:- Quando houve essa transferência do empreendimento BANCOOP, e relativamente a esse imóvel que lhe foi informado, segundo o senhor disse, que seria do expresidente, o imóvel dele no contrato era 141, mas foi lhe dito que o imóvel dele era o triplex? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Exatamente, que eu poderia dispor do 141 para comercializar, e foi feito assim. Juiz Federal:- Mas qual foi a explicação que foi dada ao senhor? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A explicação que foi me dada na época é que já estava acordado entre o João Vaccari e o presidente que eles ficariam com o triplex. Juiz Federal:- Mas, e por que foi então feito contrato do 141? Que não era triplex? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu não sei lhe dizer, eu não sei... Juiz Federal:- O senhor não chegou a perguntar? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não cheguei. Juiz Federal:- Por que a OAS pagava esses valores a João Vaccari, ao partido dos trabalhadores ou, no caso aqui, ao ex-presidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Porque tinha... Defesa:- Excelência, me desculpe, (inaudível). Juiz Federal:- A questão dos imóveis, né? Defesa:- (inaudível). Juiz Federal:- Bem, então vamos retificar a pergunta, por que a OAS pagava esses valores, essa conta corrente de créditos ao PT e para o João Vaccari, nos quais, segundo o senhor afirmou, teriam ali compreendidos os valores pagos em benefício do imóvel do expresidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A OAS pagava primeiro porque era uma regra de mercado, tinha sido estabelecido que em alguns mercados naquela época existiriam contribuições de 1% para o partido dos trabalhadores e que o gerenciamento disso seria feito pelos tesoureiros do partido, ao longo do tempo a gente percebe que não era só despesas do partido, isso tinha uma amplitude muito maior, era de um projeto político e por isso mesmo que os tesoureiros designavam para que a gente fizesse pagamentos os mais diversos possíveis, então os pagamentos que a OAS fez estavam dentro de uma regra que tinha no mercado, que eu... Juiz Federal:- Outras empresas pagavam também? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Na Petrobras, seguramente. Juiz Federal:- O senhor tinha conhecimento? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Tinha sim, seguramente. Juiz Federal:- Mas o senhor sabia disso naquela época? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Desde que a gente entrou na Petrobras eu já sabia que tinha isso, eu sabia. Juiz Federal:- Essa regra de mercado era agentes da Petrobras e a parte política, ou não? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O pagamento ao PT era feito aos tesoureiros do PT, não ao agente público, que eu tenha conhecimento sempre foi acertado com o João Vaccari. Juiz Federal:- Mas o senhor disse anteriormente que também havia pagamentos a diretores da Petrobras, por exemplo? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sim. Juiz Federal:- E isso entrava na mesma equação, na mesma regra de mercado? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Na mesma regra de mercado, as obras que nós fizemos na Petrobras foram sempre em consórcio, em todas elas tinham outras empresas que já faziam isso e já tinham uma regra estabelecida. Juiz Federal:- Algumas outras mensagens que também foram encontradas no seu celular, que o senhor utiliza a expressão Brahma para se referir, o senhor utiliza essa expressão, essa expressão se refere a alguma pessoa em particular? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Essa expressão se referia ao ex-presidente Lula por causa de uma propaganda que existia, que a Brahma era a número 1. Juiz Federal:- Por que utilizava e não usava o nome dele diretamente, usavam outros nomes? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Para não expor as figuras públicas, nós tínhamos isso como prática. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 218 de 317 E, pouco adiante, respondendo a questionamentos da defesa, o interrogado ratifica as informações sobre a titularidade do imóvel, eventuais beneficiários da reforma e origem do numerário. Disse ele: Defesa:- Não, da OAS, da OAS, quem estava incumbido de fazer a aquisição desse apartamento pela família do ex-presidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Se eu entendi a sua pergunta, a relação com o ex-presidente era minha, a relação com o Paulo Okamotto era minha, alguma coisa que surgisse disso era através de mim, e eu estive com o Paulo Okamotto, estive com João Vaccari, tratando de como nós íamos formalizar isso, quem estava preocupado era eu, e perguntei várias vezes, desde 2010, não é uma coisa recente, 'Não, vamos esperar, depois vamos ver' e tal, mas a reforma já tinha sido feita e gasta, eu avisei para o João Vaccari 'Eu não posso continuar, é um investimento muito alto', para o senhor ter ideia, só para esclarecer um pouco mais o que eu estou dizendo, mesmo não tendo sido perguntado, o lucro daquele empreendimento praticamente estava indo embora na reforma que estava fazendo num apartamento só, eram cento e tantos, então tinha que ser dada uma solução, e foi dada a solução, a OAS Empreendimentos não teve prejuízo com a reforma porque foi paga através da Rnest, da obra da Petrobras, do encontro de contas dela e de outras obras, isso é muito claro. Defesa:- Vou perguntar objetivamente para o senhor, o senhor entende que o senhor deu a propriedade desse apartamento para o ex-presidente Lula? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O apartamento era do presidente Lula desde o dia que me passaram para estudar os empreendimentos da Bancoop, já foi me dito que era do presidente Lula e de sua família, que eu não comercializasse e tratasse aquilo como uma coisa de propriedade do presidente. Só para eu complementar, eu procurei o João Vaccari algumas vezes e o Paulo Okamotto, de como iríamos operacionalizar para passar do nosso nome, nós tínhamos um elo entre o Instituto Lula, com várias doações feitas que estão aí todas declaradas, e as palestras no exterior, fizemos, se não me falha a memória, 5 palestras, só a OAS pagou de palestra mais de 1 milhão de dólares. Não passa despercebida e é reveladora a intenção da família do ex-Presidente de ocupar o imóvel triplex para as festas de final do ano de 2014, vontade externada pela ex-Primeira Dama quando da segunda visita do apartamento. Isso somente não ocorreu em razão da deflagração da 'Operação Lava-Jato' e prisão de LÉO PINHEIRO. Certamente essa exposição das relações promíscuas entre o público e o privado teve o condão de demover os personagens de seu intento. 3.3.6.4. Há aspectos adicionais que são relevantes no contexto dos autos e que merecem reforço, notadamente porque, para além da influência e interferência na nomeação de agentes da Petrobras encarregados de manter o esquema de propinas e financiamento político, há vantagem indevida de caráter pessoal recebida em razão do cargo, materializada na forma do imóvel do Guarujá/SP e não em espécie. A assunção do empreendimento pela OAS, que mais tarde passou a ser denominado de Edifício Solaris, deu-se no âmbito das negociações comerciais. A BANCOOP enfrentava, de fato, dificuldades financeiras e com obras interrompidas, pelo que João Vaccari Neto transacionou com LÉO PINHEIRO a transferência do empreendimento. Desde o início, havia informação de que uma das unidades estava destinada/reservada ao ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, sem que naquele https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 219 de 317 momento, todavia, tenha sido definido em que circunstâncias eventual transferência se daria ou como seria ela tratada no registro de imóveis. Pois bem. A questão somente começou a ser esclarecida em 2014. Segundo destacado na decisão recorrida, LÉO PINHEIRO afirmou que 'foi orientado, já em 2009, que o apartamento triplex, 164-A, pertenceria à família do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que a OAS não poderia comercializá-lo para terceiro. Foi, porém, autorizado a vender a unidade 141-A, que constava no contrato celebrado entre a BANCOOP e Marisa Letícia Lula da Silva. Em nenhum momento, foi a ele informado que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva pagaria a diferença de preço entre o apartamento simples e o apartamento triplex'. A tentativa de LÉO PINHEIRO de 'acertar' o pagamento foi objeto de outras reuniões, sem que a questão tenha sido solvida nem mesmo após a solicitação de reformas no imóvel destinadas a atender às necessidades da família. LÉO PINHEIRO ainda disse que, em maio ou junho de 2014, encontrou-se novamente com João Vaccari Neto, quando ficou acertado que a diferença de preço entre a unidade simples e o apartamento triplex, assim como os custos da reforma do apartamento e igualmente do Sítio em Atibaia, seriam abatidos da mencionada conta geral de propinas do Grupo OAS. Portanto, relativamente à aquisição do apartamento, reformas e mobiliários, restam demonstradas a materialidade e a autoria com relação ao réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Inevitável a conclusão idêntica em relação a JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, pois se de um lado tem-se o corrupto, de outro, tem-se o corruptor. A douta Procuradoria Regional da República relacionou diversos elementos de prova relativa à materialidade destes fatos, e os respectivos documentos: A 'materialidade' e a 'autoria' do delito restaram evidenciadas por diversos elementos: i) contrato, assinado por ROBERTO MOREIRA, e aditivo celebrados entre a TALLENTO e a OAS EMPREENDIMENTOS para prestação dos serviços208; ii) Notas Fiscais nº 00000423, 00000448 e 00000508, respectivamente nos valores de R$ 400.000,00, R$ 54.000,00 e R$ 323.189,13, emitidas, entre 08/07/2014 e 18/11/2014, pela TALLENTO em face da OAS EMPREENDIMENTOS para a execução de serviços de construção civil no apartamento 164-A do Condomínio Solaris, bem como os comprovantes dos pagamentos209; iii) proposta para fornecimento e instalação de um elevador HL10 residencial encaminhada pela empesa TNG ELEVADORES LTDA. à TALLENTO assinada por ROSIVANE SOARES CANDIDO210, em 27/06/2014; iv) Nota Fiscal nº 000.0008.545, emitida em 16/09/2014, no valor de R$ 47.702,00, pela empresa GMV LATINO AMÉRICA ELEVADORES LTDA., em face da TALLENTO, pela compra de elevador, bem assim Nota Fiscal nº 00000103, emitida em 20/10/2014, no valor de R$ 21.200,00, pela empresa TNG ELEVADORES LTDA., em face da TALLENTO, para instalação e montagem de elevador, além dos respectivos comprovantes de pagamento211; v) propostas de material e mão de obra elaboradas pela TALLENTO e encaminhadas à OAS EMPREENDIMENTOS212; vi) Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) nº 92221220141272463, em que consta ALBERTO RATOLA DE AZEVEDO como contratado e a OAS EMPREENDIMENTOS como contratante, no valor de R$ 4.000,00, para realização de projeto de estrutura metálica de reforço para suporte de 4tf na viga V1 relativo à unidade 164-A do condomínio localizado à Av. Gal. Monteiro de Barros, nº 638, Vila Luis Antônio, Guarujá/SP, e respectivo comprovante de pagamento, em nome de ROSIVANE SOARES CANDIDO, funcionária da TALLENTO213; https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 220 de 317 vii) Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) nº 92221220140922791, em que consta a empresa TALLENTO CONSTRUTORA LTDA. como contratada e a OAS EMPREENDIMENTOS como contratante, no valor de R$ 687.000,00, para execução de reforma de 229,49 m² na unidade 164-A do condomínio localizado à Av. Gal. Monteiro de Barros, Vila Luis Antônio, Guarujá/SP214; viii) Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) nº 92221220141280564, em que consta PETERSON DO COUTO como contratado e a OAS EMPREENDIMENTOS como contratante, no valor de R$ 14.000,00, para fornecimento e instalação de um elevador de acesso exclusivo, privativo e unifamilar, fabricante GMV, Modelo HLPLUS, 03 paradas com percurso de 7 metros, acesso unilateral e pintado, a ser instalado pela empresa TNG ELEVADORES, no endereço Av. Gal. Monteiro de Barros, nº 638, Vila Luis Antônio, Guarujá/SP, acompanhada das plantas da unidade 164 do Condomínio Solaris e do Instrumento Particular de Prestação de Serviços celebrado entre a TALLENTO e a MUDANÇAS E TRANSPORTES SANTIAGO para o transporte e içamento do elevador até o 16º andar daquele edifício, conforme ordem de serviço 7232-14215, além do Termo de Responsabilidade, assinado por ARMANDO DAGRE MAGRI, diretor da TALLENTO, autorizando a empresa MUDANÇAS E TRANSPORTE SANTIAGO LTDA.-ME a adentrar o Condomínio Solaris, situado na Av. Gal. Monteiro de Barros, Vila Luis Antônio, Guarujá/SP, para descarregar o material e efetuar o serviço de transporte vertical até o apartamento 164-A216; ix) Relatório de Análise de Polícia Judiciária nº 329/2016217; x) Laudo nº 1475/2016-SETEC/SR/DPF/PR218; x) Relatório de Análise de Polícia Judiciária nº 32219, assim como Ofício nº 185/2016 encaminhado à OI S.A questionando a titularidade do terminal telefônico 11-999739606 e sua respectiva resposta220; xi) informação prestada pela TALLENTO no sentido de que a empresa não manteve contato com LULA ou sua esposa221; xii) Relatório de Informação nº 036/2017 ASSPA/PRPR e resposta da empresa Sem Parar ao Ofício nº 95/2017-PRPR/FT222; xiii) e-mails em que consta a agenda do ex-Presidente da República, obtidos a partir das medidas cautelar decretadas em sede dos autos nº 5006617-29.2016.4.04.7000 e 5005978-11.2016.4.04.7000223; xiv) controle de acesso de prestadores de serviços ao Condomínio Solaris em que registradas entradas de funcionários da TALLENTO à unidade 164-A224; xv) Relatório de Polícia Judiciária nº 509/2016 e anexos225; xvi) mensagens de e-mail fornecidas por LÉO PINHEIRO226; xvii) agenda de LÉO PINHEIRO227; xviii) provas testemunhais. A documentação foi adequadamente examinada ao longo da sentença, notadamente nos itens 383 a 391. Destaque-se do material acostado pelo Ministério Público Federal no evento 852 da ação penal, as plantas detalhadas da reforma e planta baixa do apartamento após alterações. De tudo, sobressai troca de mensagens do ANEXO65 entre PAULO GORDILHO, Fernando Bittar e Lilian Bittar a respeito do projeto de reforma. Muito embora o texto da mensagem pouco diga, exceto 'segue a planta Atibaia', a relação de anexos traz quatro arquivos relacionados ao triplex do Edifício Solaris - três deles no formato PDF e outro, denominado 'solaris com elevador', no formato DWG, que diz respeito a um ambiente de tecnologia para o software AutoCAD da Autodesk, utilizado para projetos de engenharia e arquitetura. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 221 de 317 A Tallento Construtora apresentou ao MPF os documentos comprobatórios dos serviços (evento 3 - COMP241), como bem examinado na sentença: 385. Ali se encontram a Nota Fiscal 423, no valor de R$ 400.000,00, emitida em 08/07/2014, a Nota Fiscal 448, no valor de R$ 54.000,000, emitida em 18/08/2014, a Nota Fiscal 508, no valor de R$ 323.189,13, emitida em 18/11/2014. Todas elas foram emitidas contra a OAS Empreendimentos e têm por objeto 'execução de obra de construção civil, localizada no endereço Rua General Monteiro de Barros, 638, Vila Luiz Antônio, Guarujá, SP'. Total de cerca de R$ 777.189,00. 386. Também ali encontram-se planta para reforço metálico do térreo do apartamento triplex, cobertura, no Edifício Mar Cantábrico, a Nota Fiscal 8542 emitida, em 15/09/2014, pela GMV Latino America Elevadores contra a Tallento, no valor de R$ 798,00, relativamente à venda de óleo para elevador, a Nota Fiscal 8545, emitida, em 16/09/2014, pela GMV Latino America Elevadores contra a Tallento, no valor de R$ 47.702,00, relativamente à venda de elevador, a Nota Fiscal 103, emitida, em 20/10/2014, pela TNG Elevadores contra a Tallento, no valor de R$ 21.200,00, relativamente a serviços de instalação de elevador, com três paradas, na 'obra solaris, Guarujá'. Esses serviços e obras contratadas pela Tallento foram incluídos nos preços cobrados desta para a OAS Empreendimentos. 387. Também ali presentes propostas encaminhadas pela Tallento Construtora à OAS Empreendimentos para serviços de reforma na 'cobertura', datadas de 28/04/2014, de 18/09/2014 e de 21/10/2014, e que incluem diversas alterações no imóvel consistente no apartamento 164-A, como pinturas, adequações hidráulicas, reforma na churrasqueira, instalação de forro de gesso, instalação de novo deck para piscina, inclusive a instalação do elevador. Observa-se, por oportuno, que a proposta de 18/09/2014, inclui, entre outras medidas, alteração do revestimento da cozinha, instalação de bancada de granito na cozinha e na churrasqueira, instalação de nova escada de acesso ao mezanino, demolição de um dormitório e retirada da sauna, aumento de sala até o elevador. A proposta de 21/10/2014, mais modesta, inclui somente fornecimento e instalação de aquecedor a gás e de tela de proteção para janelas. 388. O contrato entre a OAS Empreendimentos e a Tallento Construtora está datado de 30/06/2014 e está assinado pelo acusado Roberto Moreira Ferreira, então Diretor Regional de Incorporação da OAS Empreendimentos, representando a primeira. Há também um aditivo assinado, desta feita sem identificação do representante da OAS, e sem o apontamento da data respectiva. Ora, as provas diretas e indiretas compõem um conjunto probatório que permite certeza (ou elevado grau de certeza) quanto aos fatos. Sobre a eficácia probatória, anotou com propriedade o Ministro Cezar Peluso, do STF, por ocasião do julgamento do processo do Mensalão (AP nº 470/STF): 'Então, digo que, se por exemplo, está provada nos autos a existência de determinado fato que, segundo a experiência, deva levar à convicção da existência de outro, não se precisa indagar se a acusação produziu, ou não, a prova do fato que se infere à existência do fato provado - cuja prova já está feita. Se há algum fato extraordinário alegado, capaz de ilidir essa relação de constância entre os fatos, sua demonstração compete à defesa que alegue o fato extraordinário. (...) Então, se o fato do recebimento nessas circunstâncias clandestinas, por si ou interposta pessoa, está provado, a acusação não precisa fazer prova da existência de comportamento ilícito, porque isso é o que se infere da experiência e, como tal, é fato provado por indício. Por que são importantes essas observações? Porque, no sistema processual, e não apenas no sistema processual penal, a eficácia retórica dos indícios ou da prova indiciária é a mesma da eficácia das provas diretas ou histórico-representativas. Eu não vou cansar Vossas Excelências, chamando à colação, a respeito, a doutrina, que é corriqueira entre nós, mas gostaria de acentuar, para deixar mais claro, que Espínola https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 222 de 317 Filho, por exemplo, já acentuava que não existe nenhuma hierarquia entre as provas, entre as diretas e os indícios. Mas vou mais longe. Frederico Marques, o grande Frederico Marques, era muito incisivo. E dizia textualmente: 'O valor probante dos indícios e presunções ...' - conceitos que ele equiparava - 'no sistema de livre convencimento que o Código adota, é em tudo igual ao das provas diretas.' Tampouco deixa dúvida a propósito, a doutrina atual. (p. 3/4 do voto do Min. Cezar Peluso, na AP nº 470/STF) As provas diretas e indiciárias são insofismáveis quanto ao recebimento de valores e bens por parte do ex-Presidente, pagos pela empresa OAS EMPREENDIMENTOS por determinação de LÉO PINHEIRO, que, aliás, é confesso quanto aos fatos. A inexistência de prova material da transferência do domínio ou da posse não serve para afastar as conclusões, ao revés, reforça a compreensão de que tudo foi feito com a intenção de ocultar a verdadeira titularidade e o destinatário dos benefícios. 3.3.6.5. O depoimento de LÉO PINHEIRO a respeito da referida reunião para as tratativas de pendências é esclarecedor. Por outro lado, João Vaccari Neto não prestou depoimento como testemunha, mas isso não desqualifica a narrativa. É fato que, se pretendesse, a defesa poderia ter arrolado Vaccari na qualidade de contraprova ou, até mesmo, requerer a sua acareação com LÉO PINHEIRO. Porém, efetivamente, deixou de fazê-lo. Sucede que no sistema processual vigente não há tarifação com relação aos elementos probatórios oferecidos ao juiz e dos quais ele se serve para firmar a sua convicção. Entre vários depoimentos, por exemplo, não se tem um ou outro como mais valioso. As provas da acusação e da defesa equivalem-se e cabe ao juiz, diante do restante do acervo, concluir ou não pela responsabilidade criminal do réu. Assim, ao oferecer denúncia e instruir a causa na linha de suas alegações, o Ministério Público Federal apresenta as provas que, na sua visão, tem por suficientes para a persecução penal. À defesa cabe apresentar e requerer as que possam se contrapor à tese acusatória. Em complemento, ressalte-se que a questão em nenhum momento foi trazida, exceto sob a ótica do cerceamento de defesa em razão do indeferimento de prova pericial, sob a alegação de que houve alteração a posteriori nos papéis apresentados por LÉO PINHEIRO. A afirmação já foi rechaçada em preliminar. Em sede de apelação, a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA igualmente limita-se a questionar a veracidade do depoimento de LÉO PINHEIRO. Diz a peça recursal: Indaga-se: qual fundamento concreto corrobora tal acusação? Como pode a Defesa se produzir a diabólica prova negativa? Como com provar que, nos encontros relatados por Léo Pinheiro (não há data precisa sobre estes), João Vaccari não se reuniu com Léo Pinheiro ou, caso o tenha feito, não tratou de um suposto acerto indevido? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 223 de 317 Pois bem, não cabe ao juízo recursal determinar quais provas teriam aptidão para um juízo condenatório, mas, tão somente, examinar se a sentença bem interpretou aquelas que foram acostadas. Não tem eficácia, portanto, a negativa geral e a tentativa de desacreditar tudo o que foi produzido durante a instrução processual, quando a defesa poderia ter buscado produzir contraprova para descaracterizar o depoimento do corréu. De qualquer maneira, para concentrar a discussão em uma suposta insuficiência de comprovação da referida reunião entre LÉO PINHEIRO e João Vaccari Neto, seria necessário cerrar os olhos para o restante do conjunto probatório, pois não é este fato, isoladamente, fundamento para a condenação, mas, sim, a sua posição lógica com o restante dos elementos documentais e testemunhais. 3.3.7. Síntese das provas com relação ao triplex e reformas Em resumo, há provas suficientes de que a unidade triplex do Condomínio Solaris estava destinada a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA como vantagem, apesar de não formalmente transferida porque sobreveio a 'Operação Lava-Jato' e a prisão de empreiteiros envolvidos, dentre eles, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. De todo o exposto, é possível se concluir: (a) João Vaccari Neto solicitou a LÉO PINHEIRO que a OAS assumisse empreendimentos da BANCOOP, pois a cooperativa estava em graves dificuldades financeiras e com as obras paralisadas; (b) após análise de viabilidade comercial, a OAS decidiu assumir o empreendimento do Guarujá/SP, desde já ciente de que uma das unidades pertenceria ao réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA; (c) foi realizada assembleia de condôminos para ratificação do contrato com a OAS, para a qual foi expedida notificação, nos idos de 2009; (d) a ex-Primeira Dama firmou contrato originalmente com a BANCOOP, mas não o renovou com a OAS, embora também não tenha formulado em tempo adequado o pedido de rescisão do contrato; (e) em 2010 foi publicada reportagem, em veículo de comunicação de grande circulação nacional, noticiando que a unidade triplex, já àquele tempo, pertenceria ao exPresidente; (f) visitas foram realizadas pessoalmente pelo ex-Presidente e sua esposa (fevereiro de 2014), bem como por esta e seu filho Fábio (agosto de 2014), no apartamento no Guarujá/SP. Na primeira ocasião foram discutidas as reformas que a unidade deveria sofrer, sendo que na segunda oportunidade estas foram vistoriadas; (g) o apartamento triplex foi objeto das reformas previstas, em consonância com projetos apresentados e aprovados pelo apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e sua esposa, e elas foram efetivamente custeadas pela OAS Empreendimentos, sendo este fato absolutamente fora dos procedimentos usuais da empresa; https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 224 de 317 (h) das visitas à unidade participaram dirigentes da empresa OAS, empregados desta, empregados de empresas subcontratadas, além dos réus. Tais pessoas, de modo unânime, confirmaram não apenas a ocorrência das visitas, mas a forma como foram agendadas, datas e detalhes da reforma; (i) o responsável pela Construtora Tallento, encarregada da reforma, confirmou os fatos, embora não soubesse precisar detalhes sobre a titularidade do bem; (j) ainda que algumas das testemunhas não soubessem certificar a 'propriedade ou titularidade' do triplex, tinham conhecimento por terceiros de que o mesmo pertenceria ao ex-Presidente. A ausência de conhecimento pessoal deve ser entendida como decorrente da própria natureza dos fatos, porque não se pretendia dar publicidade. Todavia, testemunhas diretamente envolvidas nos fatos e corréus foram assertivos quanto ao real destinatário do imóvel; (k) os altos dirigentes da empresa OAS não apenas tinham ciência dos fatos, como os confirmaram em juízo, destacadamente JOSÉ ADELMÁRIO, AGENOR, PAULO GORDILHO e ROBERTO MOREIRA; (l) os interrogatórios desses réus, corroborados por diversas provas, são uníssonos sobre a reserva do apartamento, a realização das reformas e a customização conforme projeto apresentado e aprovado pelo ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e sua esposa (Marisa Letícia) por ocasião de apresentação pessoal que JOSÉ ADELMÁRIO e PAULO GORDILHO fizeram na residência do casal em São Bernardo do Campo; (m) as reformas da unidade se concretizaram de modo excepcional e customizado, o que pressupõe que não estavam sendo feitas para o público em geral, mas para pessoa determinada. Isto é, com natureza bastante diferente daqueles chamados apartamentos decorados; (n) a OAS administrava uma 'conta de propina', cujos recursos eram destinados ao Partido dos Trabalhadores, nos moldes do que foi praticado por outras empreiteiras no conhecido 'clube', fato este provado nestes autos (evento 847), bem como nas mais de duas dezenas de outros processos cujo mérito já foi julgado por esta 8ª Turma; (o) há prova material relativa à troca de informações, email e mensagens de celular, corroborando as palavras dos diversos réus, em especial de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO; (p) não foi produzida contraprova que infirme as alegações do réu JOSÉ ADELMÁRIO ou que levem à rejeição da premissa de existência de prova acima de dúvida razoável; (q) o contexto dos fatos, as provas, as regras de experiência e a lógica não permitem chegar a outra conclusão, salvo a de que o apartamento pertencia ao exPresidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, ora apelante, cuja titularidade e posse somente não foram transferidas a tempo e modo por força da própria 'Operação Lava- https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 225 de 317 Jato' (que se iniciou publicamente em março de 2014) e da prisão de diversos empreiteiros em novembro de 2014, dentre eles, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO; (r) João Vaccari Neto orientou LÉO PINHEIRO sobre o abatimento da conta geral de propinas dos valores da diferença de preço entre a unidade simples e o triplex, o custeio da reforma, a compra de mobiliários e utensílios somente em um segundo encontro. Também seriam abatidos outros custos de empreendimentos do BANCOOP, passivos ocultos que, segundo ele, foram assumidos pela OAS. (s) o réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, em razão do cargo, atuou diretamente para a manutenção de agentes públicos que tinham por missão manter o esquema de financiamento político com propinas decorrentes de contratos firmados pela Petrobras com grandes empreiteiras; (t) o réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, também em razão do cargo, teve para si destinado o imóvel triplex do Guarujá/SP, como pagamento de corrupção, correspondente à diferença de preço entre a unidade originalmente compromissada (apartamento 141) e a unidade final, somado aos custos de personalização (reforma e mobiliário); (u) dentro desse contexto, deve ainda ser considerado que boa parte dos fatos (diga-se, os mais essenciais, como reformas, compra de utensílios e mobiliário) ocorreu no ano de 2014, no decorrer da 'Operação Lava-Jato'. Assim, verifica-se das provas carreadas aos autos que o apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA tinha ciência de que, apesar da aquisição inicial da unidade 141, tinha reservada para si a unidade triplex (164-A, do Edifício Salinas, Condomínio Solaris), sem que tivesse vertido recursos para tal aquisição. O réu e familiares estiveram nesta unidade solicitando modificações estruturais, adaptações (inclusive a instalação de um elevador), edificações, aparelhamento com móveis e utensílios, reformas estas que não apenas foram feitas, mas foram posteriormente vistoriadas. Ainda a revelar a intenção do agente, há prova quanto à apresentação dos projetos de reformas ocorridas no imóvel residencial do apelante, com a aquiescência sobre os projetos, que levaram a efeito as modificações, como confirmaram LÉO PINHEIRO e PAULO GORDILHO em seus depoimentos. Inquestionável, ainda, que a empreitada foi realizada às expensas da empresa OAS EMPREENDIMENTOS, sem que tenha havido qualquer pagamento pelo apelante. Ao revés, houve a autorização de lançamento destas despesas, pelo Diretor Financeiro do partido político, na conta corrente de recursos ilícitos originários da Petrobras. Este singelo resumo de alguns dos fatos, complementado por tudo aquilo que restou acima dito sobre as provas materiais e testemunhais, permite chegar a uma conclusão segura, acima de dúvida razoável, de que o ex-Presidente agiu dolosamente ao receber vantagem indevida. 3.3.8. Argumentos do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 226 de 317 A defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA alega que: (i) não foi comprovado que o valor oriundo do caixa de propinas foi utilizado para a construção, reforma e mobília do apartamento 164-A do Edifício Solaris; (ii) não restou demonstrado o dolo específico de receber ou aceitar vantagem indevida; (iii) a falecida esposa do apelante, Dona Marisa Letícia, adquiriu uma unidade autônoma do Edifício Mar Cantábrico, no Guarujá, da empresa BANCOOP e essa, em razão de dificuldades financeiras, transferiu o empreendimento à OAS, o que teve participação e aval do Ministério Público do Estado de São Paulo, além de homologação judicial; (iv) a Dona Marisa Letícia ficou com um crédito perante a empresa OAS, podendo optar por utilizá-lo na compra de qualquer apartamento da OAS Empreendimentos, razão pela qual visitou a unidade 164-A do prédio Solaris, objeto da denúncia, contudo o imóvel não atendia às necessidades da família, razão pela qual desistiu da compra e solicitou a devolução do valor investido por meio de ação judicial em face do BANCOOP e da OAS; (v) não recebeu, de fato ou de direito, o apartamento triplex, sendo que foi condenado pelo fato de o apartamento ter sido a ele destinado; (vi) a OAS constituiu hipoteca sobre a unidade 164-A, triplex, do Condomínio Solaris, tendo cedido fiduciariamente ao FGTS os créditos decorrentes da venda da futura unidade em questão e somente poderia haver a alienação a terceiros, caso depositado o valor correspondente na conta vinculada ao empreendimento na CEF; (vii) nos relatórios de recuperação judicial da OAS Empreendimentos S/A a empresa elencou a unidade 164-A como de sua propriedade; (viii) a aquisição de propriedade somente pode ocorrer por meio da transcrição do título translativo em Cartório de Registro de Imóveis; (ix) o apelante foi condenado pela ocultação do real proprietário do apartamento triplex, contudo não há prova da prática do crime antecedente e, se existente, a ocultação do real proprietário do apartamento constitui exaurimento do delito de corrupção. Muitos destes argumentos já foram objeto de exame nos itens anteriores. Todavia, para que se evitem omissões, teço algumas considerações adicionais. 3.3.8.1. É desnecessário estabelecer relação direta entre o valor investido no imóvel e a propina paga pela OAS a agentes do Partido dos Trabalhadores, parcialmente materializada e transferida ao apelante a título pessoal. A denúncia não se baseia em suposta relação direta entre os valores utilizados para o pagamento de propina e os contratos da Petrobras com a OAS, especificamente Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, mas, sim, em razão deles. São coisas diversas. Um é o motivo pelo qual houve o acerto de corrupção; outra é irrelevância da origem dos recursos utilizados para tal mister, pois, como se disse, além de o dinheiro ser bem fungível, o pagamento de corrupção não pressupõe necessariamente que sua origem seja ilícita. Melhor dizendo, a corrupção poderia ser paga inclusive com recursos pessoais de LÉO PINHEIRO. É inegável a ocorrência dos crimes de cartel e fraude a licitações pelas empresas do chamado 'clube' das empreiteiras em desfavor da Petrobras. Com mais detalhes, é pertinente a contextualização dada na sentença: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 227 de 317 9. Estima o MPF que o total pago em propinas pelo Grupo OAS decorrente das contratações dele pela Petrobrás, especificamente no Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, alcance R$ 87.624.971,26, correspondente a 3% sobre a parte correspondente da Construtora OAS nos empreendimentos referidos. 10. Parte desses valores, cerca de 1%, teriam sido destinados especificamente a agentes políticos do Partido dos Trabalhadores e teriam integrado uma espécie de conta corrente geral de propinas entre o Grupo OAS e agentes do Partido dos Trabalhadores. 11. Destes valores, R$ 3.738.738,00 teriam sido destinados especificamente ao exPresidente Luiz Inácio Lula da Silva. 12. Os valores teriam sido corporificados na disponibilização ao ex-Presidente do apartamento 164-A, triplex, do Condomínio Solaris, de matrícula 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP, sem que houvesse pagamento do preço correspondente. Para ser mais exato, o ex-Presidente, quando o empreendimento imobiliário estava com a BANCOOP - Cooperativa Habitacional dos Bancários, teria pago por um apartamento simples, nº 141-A, cerca de R$ 209.119,73, mas o Grupo OAS disponibilizou a ele, ainda em 2009, o apartamento 164-A, triplex, sem que fosse cobrada a diferença de preço. Posteriormente, em 2014, o apartamento teria sofrido reformas e benfeitorias a cargo do Grupo OAS para atender ao ex-Presidente, sem que houvesse igualmente pagamento de preço. Estima o MPF os valores da vantagem indevida em cerca de R$ 2.424.991,00, assim discriminada, R$ 1.147.770,00 correspondente à diferença entre o valor pago e o preço do apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em reformas e na aquisição de bens para o apartamento. 13. Na mesma linha, alega que o Grupo OAS teria concedido ao ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada no pagamento das despesas, de R$ 1.313.747,00, havidas no armazenamento entre 2011 e 2016 de bens de sua propriedade ou recebidos como presentes durante o mandato presidencial. 14. Em ambos os casos, teriam sido adotados estratagemas subreptícios para ocultar as transações. 15. O repasse do apartamento e as reformas, assim como o pagamento das despesas de armazenamento, representariam vantagem indevida em um acerto de corrupção e os estratagemas subreptícios utilizados para esse repasse e pagamento constituiriam crime de lavagem de dinheiro. Ora, o liame pretendido pela defesa inexiste e seria até mesmo irrelevante, pois não se perquire a respeito da origem dos recursos para fazer frente ao apartamento e aos respectivos gastos de personalização. Havia um caixa único e dele eram pagos os agentes públicos e políticos. Crimes dessa espécie não passam recibo e, em regra, os valores de propina passam ao largo da contabilidade oficial. Além disso, a corrupção não ocorre somente com recursos ilícitos. De todo o modo, é necessário, aqui, fazer um esclarecimento com relação à expressão 'caixa único' utilizada. Embora sirva para ilustrar a forma como a OAS organizava os valores espúrios subtraídos da Petrobras por licitações fraudulentas, o termo não deve ser entendido como uma conta regular em instituição bancária. No âmbito da 'Operação Lava-Jato' verificou-se que cada construtora - em consórcio ou isoladamente - tinha uma forma diferenciada de administrar tais valores, destacadamente com a finalidade precípua de esconder sua origem. Algumas com contas no exterior em nome de offshore, outras com contabilidade paralela, de maneira que não é https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 228 de 317 razoável exigir-se, como quer a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, que os valores de propinas fossem lançados na contabilidade oficial. Havia, sim, a aparência de correção nos pagamentos de contratos das obras assumidas pela OAS, mas sua destinação utilizava-se de subterfúgios. Dentre as técnicas identificadas, por exemplo, é possível referir a subcontratação de outras empresas com capacidade técnica duvidosa ou, muitas vezes, sem corpo de empregados compatível ou com objeto contratual inexistente. O exemplo acima não exaure todas as condutas e técnicas. Mas o importante é firmar que havia uma 'conta corrente' extraoficial, na qual eram lançados créditos e débitos sem que, porém, recebesse ativos. Ou seja, quando se fala em 'conta corrente' ou 'caixa único', quer-se dizer que o acerto era meramente informal; simplesmente um encontro de contas, sem que se identifiquem depósitos ou saques em instituição oficial. Desse acerto de contas com relação aos R$ 16 milhões destinados ao PT, adveio a diferença de preço para o apartamento triplex - acrescido das benfeitorias e do mobiliário. Nessa medida, não se há de falar em 'espécies de dinheiro'. Há corrupção mesmo que o corruptor utilize 'dinheiro limpo'. Sendo ele fungível, mostra-se impossível 'carimbá-lo' ou 'classificá-lo' pela sua origem. Tanto é assim que, no caso em tela, sequer houve desembolso direto ao ex-Presidente, mas a entrega do bem e, em ação paralela e com identidade de desígnios, o custeio da diferença de preços e das reformas contratadas junto a empresas terceirizadas (Tallento, Kitchens e Fast Shop). Tal ambiente, diga-se, não modifica as elementares do tipo penal, pois não se pune exclusivamente a vantagem pecuniária. O objeto é a vantagem, seja ela de cunho patrimonial ou não, desde que ilícita ou indevida, solicitada ou recebida em razão da função pública do agente. 3.3.8.2. Em petição juntada ao evento 50, traz a defesa decisão proferida pelo Juízo de Direito da Segunda Vara de Execução de Títulos Extrajudiciais de Brasília/DF, pela qual foi determinada a penhora do apartamento triplex do Guarujá/SP, ainda averbado do Registro de Imóveis em nome da OAS Empreendimentos. Ao sentir da defesa, isso reforçaria 'que o ex-Presidente Lula Jamais foi proprietário do indigitado imóvel, nunca tendo exercido quaisquer dos atributos do instituto da propriedade, razão pela qual não há que se falar em recebimento do triplex como vantagem indevida, convicção que tem fundamentado toda a sua condenação e sem a qual não há outra saída que não a sua absolvição'. Não prospera a tese. Aliás, a transferência da propriedade em favor do agente é antagônica ao branqueamento e, por isso, tal ausência não desnatura o crime de lavagem de dinheiro, como já explicado em passagens anteriores. Todavia, para reforçar, vale repetir que a Lei nº 9.613/98 não tipifica a propriedade formal, mas sim a sua ocultação ou dissimulação, além da 'natureza, origem, localização, disposição, movimentação'. E sob tal aspecto, os https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 229 de 317 acréscimos da defesa não têm o condão de modificar as conclusões jurídicas a respeito da tipicidade. Ademais, a decisão proferida pelo juízo de execução extrajudicial não interfere nas conclusões a que se chegou, pois vige em nosso ordenamento a independência e autonomia do juízo criminal perante os demais (civil, administrativo e tributário). Não bastasse isso, a decisão acostada aos autos foi proferida cautelarmente em execução proposta em face da OAS Empreendimentos, cujo bem foi arrolado pela própria exequente. Da decisão, lê-se: Nº 2016.01.1.087371-5 - Execução de Titulo Extrajudicial - A: MACIFE SA MATERIAIS DE CONSTRUCAO. Adv(s).: DF018597 - Eric Furtado Ferreira Borges. R: SIA 01 EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA. Adv(s).: (.). R: OAS EMPREENDIMENTOS SA. Adv(s).: (.). R: FIGUEIREDO AVILA ENGENHARIA LTDA FAENGE LTDA. Adv(s).: DF013973 - Rodrigo de Castro Gomes. Defiro o pedido do exeqüente, de penhora dos imóveis, cujas certidões das matrículas se encontram às fls. 106/117. Proceda-se na forma do artigo 845, §1º do Código de Processo Civil, lavrandose o correspondente termo de penhora. Após, proceda-se a avaliação do bem, expendidose as diligências necessárias. Fica a executada constituída fiel depositária do bem, nos termos da lei. Para a presunção absoluta de conhecimento por terceiros, deverá o exeqüente providenciar a averbação mencionada no art. 844 do CPC, comprovando-a nos autos, no prazo de 30 dias. Intime-se o credor hipotecário, se for o caso. Após, intimem-se os executados da penhora, por meio de seus advogados ou, se não houverem constituído advogado, pessoalmente, por via postal. Intime-se, ainda, o cônjuge, se o caso. Brasília DF, segunda-feira, 04/12/2017 às 15h09. Luciana Corrêa Tôrres de Oliveira, Juíza de Direito. Ora, sem avançar em questões periféricas, como a existência de confisco precedente determinado pelo Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR e anotado na matrícula do imóvel em 27/07/2017, a decisão não emite qualquer juízo de valor a respeito da titularidade do apartamento triplex. E, pela sua natureza precária e considerado o ambiente processual das ações execuções de título extrajudicial, nem poderia a tanto chegar. Em petição juntada ao evento 68, na data de 23/01/2018, às 19:29 horas a defesa juntou aos autos entrevista dada pela testemunha José Afonso Pinheiro, antigo zelador do Condomínio Solaris, ao portal Estadão, alegando que resta caracterizada a sua ausência de isenção e atuação política antagônica. Igualmente não tem relevância a informação. Lendo atentamente a matéria, percebe-se que José Afonso Pinheiro apenas repete o que já afirmou em audiência. A tese de interesse político dos personagens processuais já foi amplamente afastada, não havendo nenhum fato novo que possa modificar tal compreensão. Ademais, é imperioso considerar que o depoimento da testemunha não é a única prova produzida neste feito, havendo um arcabouço probatório bastante sedimentado, seja pelos depoimentos de diretores da OAS Empreendimentos, seja pelas provas documentais, como trocas de mensagens, projetos, contratações de terceiros para reforma, de maneira que a exclusão do depoimento da testemunha - e não é esse o caso sequer traria alguma consequência prática para a solução do caso. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 230 de 317 Centra-se a defesa, novamente, na tese de antagonismo político, o que sequer parece razoável, haja vista a incomparável trajetória pública do apelante com relação à testemunha compromissada. 3.3.8.3. É oportuno esclarecer, ainda, que a corrupção passiva e o tráfico de influência são crimes diversos. Vejamos a definição do art. 332 do Código Penal: Art. 332 - Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único - A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário. Talvez a semelhança em alguns pontos possa levar à equivocada confusão entre os tipos penais, mas ela não transpassa a aparência. No caso, a posição do réu não se amolda ao crime de tráfico de influência. Isso porque, como já visto em inúmeras passagens, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA ocupava o mais elevado cargo na República e, na ocasião, atuou diretamente na nomeação e manutenção de agentes públicos na Petrobras com a finalidade específica de obter vantagens pecuniárias em benefício de agremiações políticas. Sobre o tipo penal em referência e suas elementares, é pertinente a posição de Victor Gabriel Rodrigues: O delito que anteriormente se denominava 'exploração de prestígio' é hoje o chamado tráfico de influência. Ele se caracteriza pela ação daquele que, em busca de vantagem (que não se deve entender como apenas econômica), vende a sua capacidade de influir no funcionário público, no exercício de sua função. Característica mais relevante para se compreender o tipo do art. 332 é o fato de ele ser subsidiário em relação à corrupção do funcionário: será utilizado, portanto, quando o funcionário público desconhece a venda da influência. Do contrário, estar-se-á a cuidar de uma corrupção na modalidade ativa (pelo particular) e passiva (pelo funcionário), ou outros delitos assemelhados como a prevaricação e a concussão, a depender do caso. É por isso que a doutrina sempre descreve o tipo do art. 332 como uma figura próxima ao estelionato: nele sempre haverá uma venda injusta, uma venda de prestígio que ocorre 'iludindo o comprador, mas desacreditando a administração (NORONHA, 2004, p. 332). O particular 'vende' o funcionário público que desconhece a ocorrência dessa ação; do contrário, o delito assume bilateralidade que descaracteriza o viés fraudulento que o tipo do tráfico de influência, à sua subsidiariedade, exige. (in Código Penal Comentado, coord. Reale Júnior, Miguel. São Paulo : Saraiva, 2017, pp. 975-6) . No caso, a ciência dos agentes públicos que praticaram atos concretos, em consonância com o contexto de envolvimento de altas autoridades do país, é fundamental e atrai a incidência do crime de corrupção passiva, pois, conforme diz o art. 29 do Código Penal, 'quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade'. José Paulo Baltazar Júnior, na mesma linha de raciocínio, explica: 'no crime de tráfico de influência, o traço marcante é a expressão a pretexto de, que denota o fato de que o agente não detém, efetivamente, a possibilidade de influenciar o funcionário, fazendo uma verdadeira 'venda de fumaça', agindo de forma fraudulenta'. E prossegue: 'no crime em questão, o funcionário que estaria sofrendo a suposta influência não sabe https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 231 de 317 que a pessoa que lhe pede alguma coisa em nome de terceiro está cobrando alguma vantagem deste para influir, ou nem sequer há qualquer pedido ou ação junto ao funcionário' (in Crimes Federais, 11ª ed., Porto Alegre : Livraria do Advogado, 2017, p. 344-5). 3.3.8.4. Houve, na verdade, o concerto de agentes para a mesma finalidade, tendo eles plena consciência da ilicitude de seus atos. Com especial destaque, ao exPresidente atribui-se não só a determinação de nomeação para o preenchimento de cargos chaves, mas, também, a crítica pela ausência de ação e de ânimo para estancar o desígnio criminoso. Ao contrário de fazer cessar a atividade criminosa, deu-lhe sustentação. A nomeação de dirigentes da estatal petrolífera repousava em sua esfera de poder político. É certo que diretores da estatal, como Paulo Roberto Costa, Renato de Souza Duque, Nestor Cerveró e Jorge Luiz Zelada, exerciam desenvolto papel no intuito de manter a engrenagem criminosa em funcionamento. A responsabilização criminal daquele que não atua nos atos finais de corrupção, como no caso ora analisado, com razão é muito debatida da doutrina e na jurisprudência. Por todos os julgados, pertine fazer referência ao paradigmático julgamento da Ação Penal nº 470/STF (caso 'Mensalão'). Daquele precedente, faço uso das considerações lançadas pela e. Ministra Rosa Weber: Quando há vários concorrentes, tem-se de esclarecer qual a carga de aporte de cada um deles para a cadeia causal do crime imputado. Caso contrário, será impossível aplicar a teoria monista contida no artigo 29 do Código Penal. Entretanto, diversa a situação quando se apontam comportamentos típicos praticados por uma pessoa jurídica. Aí, necessário apenas verificar pelo contrato social ou, na falta deste, pela realidade factual, quem detinha o poder de mando no sentido de direcionar as atividades da empresa. Mal comparando, nos crimes de guerra punem-se, em geral, os generais estrategistas que, desde seus gabinetes, planejam os ataques, e não os simples soldados que os executam, sempre dominados pela subserviência da inerente subordinação. Do mesmo modo nos crimes empresariais a imputação, em regra, deve recair sobre os dirigentes, o órgão de controle, que traça os limites e a qualidade da ação que há de ser desenvolvida pelos demais. Ensina Raul Cervini: 'Por consiguiente, para la imputación es decisivo el dominio por organización del hombre de atrás. Su autoria mediata termina solo em aquel punto en el que 'faltan los presupuestos precisamente en esse dominio por organización'' (El Derecho Penal de La Empresa Desde Una Visión Garantista, Ed. Bdef, Montevideo, 2005, p. 145). Em verdade, a teoria do domínio do fato constitui uma decorrência da teoria finalista de Hans Welzel. O propósito da conduta criminosa é de quem exerce o controle, de quem tem poder sobre o resultado. Desse modo, no crime com utilização da empresa, autor é o dirigente ou dirigentes que podem evitar que o resultado ocorra. Domina o fato quem detém o poder de desistir e mudar a rota da ação criminosa. Uma ordem do responsável seria o suficiente para não existir o comportamento típico. Nisso está a ação final. Assim, o que se há de verificar, no caso concreto, é quem detinha o poder de controle da organização para o efeito de decidir pela consumação do delito. Se a resposta for negativa haverá de concluir-se pela inexistência da autoria. Volta-se ao magistério do uruguaio Raul Cervini: 'En ese caso, el ejecutor es un mero instrumento ciego Del hombre de atrás y, entonces parece posible imputar la autoria mediata a éste.' (ob. cit. p. 146) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 232 de 317 Importante salientar que, nesse estreito âmbito da autoria nos crimes empresariais, é possível afirmar que se opera uma presunção relativa de autoria dos dirigentes. Disso resultam duas consequências: a) é viável ao acusado comprovar que inexistia o poder de decisão; b) os subordinados ou auxiliares que aderiram à cadeia causal não sofrem esse juízo que pressupõe uma presunção juris tantum de autoria. Tais considerações são feitas em função da suscitada - e rechaçada - nulidade da denúncia por não individualizar as condutas dos delitos imputados aos dirigentes à testa da empresa, especialmente do Banco Rural. Ora, se a vontade do homem de trás, sobre quem recai a presunção de autoria do crime, constitui a própria ação final da ação delituosa da empresa, o que se há de descrever na denúncia é como referida empresa desenvolveu suas ações. Basta isso. A autoria presumida do ato é de seus dirigentes. Isso, como se viu, não se aplica aos auxiliares cujo comportamento em nível de colaboração tem de ser esclarecido na peça inicial do acusador. Na hipótese sub judice, é de clareza meridiana o que a denúncia atribui ao Banco Rural, especificando todo o roteiro das atuações no sentido de desacatar as regras exigíveis no tráfico regular das operações bancárias, de modo a tipificar o crime de gestão fraudulenta. Presumidamente, aos detentores do controle das atividades do Banco Rural, conforme dispõe o ato institucional da pessoa jurídica, há de se imputar a decisão (ação final) do crime. Nessa ação coletiva dos dirigentes é interessante a lição de CLAUS ROXIN sobre a configuração do domínio do fato: 'Bajo la influencia de su maestro, JAKOBS, han discutido DERKSEN y LESCH la necesidad de resolución comun del hecho de la coautoría. A su juicio, 'basta una resolución de ajustarse, por médio de la cual el interveninente que no executa directamente, pero colabora configurando, enlaza su aportación con el obrar del executor'. En la acción conjunta de varias partes del hecho, estos autores llevan a cabo una imputación objetiva en la que no há de atenderse a elementos subjetivos como el de la resolución comun del hecho. No cabe compartir este planteamiento, puesto que la 'comisión conjunta' requerida por la ley (§ 25.2) presupone un dominio del hecho conjunto y, por tanto, una división del trabajo consciente por ambas partes.' (Autoria y Domínio Del Hecho en Derecho Penal, Ed. Marcial Pons, 2000, Barcelona, p. 733) Essa resolução consciente e conjunta partiu, na espécie, da direção do Banco Rural, como atesta a prova colhida. Não subsiste, pois, o argumento de que omissa a denúncia, a prejudicar a defesa. Aliás, pelos termos em que vazadas as alegações finais, denunciado algum deixou de saber com exatidão do que estava sendo acusado. A denúncia é clara quanto ao conjunto de fatos dos autores individuais e a responsabilidade pelas ações delituosas empresariais, o que se mostra suficiente ao exercício da ampla defesa. Havia, nessa esteira, inequívoca ciência do réu com relação aos malfeitos havidos na estatal. Ademais disso, dele dependia a continuidade e eficácia do esquema milionário de financiamento de campanhas eleitorais, de maneira que a sua capacidade de decisão e conhecimento dos efeitos e da abrangência do esquema espúrio, mostrou-se fundamental. Não se cuida, pois, de mero intermediário dos atos de corrupção, mas, sim, do próprio avalista e comandante do 'sistema', a quem se atribuía capacidade política para determinar a nomeação de agentes públicos que levassem adiante o projeto criminoso. No ponto, é digna de registro passagem da sentença: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 233 de 317 834. Examinadas todas as provas materiais, os depoimentos das testemunhas e os interrogatórios dos acusados é possível exarar conclusões. 835. Foi provado o esquema criminoso que vitimou a Petrobrás e que envolvia ajustes fraudulentos de licitação e o pagamento de vantagem indevida a agentes da Petrobrás, a agentes políticos e a partidos políticos. 836. Tratava-se de um esquema criminal complexo e que envolvia a repartição de vantagem indevida entre agentes da Petrobrás, agentes políticos e partidos políticos. 837. Executivos chaves dentro da Petrobrás, como no caso Paulo Roberto Costa e Renato de Souza Duque, eram mantidos na estatal como Diretores com a obrigação de, além de desempenhar suas funções normais, arrecadar recursos para agentes políticos e partidos políticos, que, por sua vez, os garantiam nos cargos. No processo, também arrecadaram recursos em benefício próprio. 838. O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha um papel relevante no esquema criminoso, pois cabia a ele indicar os nomes dos Diretores ao Conselho de Administração da Petrobrás e a palavra do Governo Federal era atendida. Ele, aliás, admitiu, em seu interrogatório, que era o responsável por dar a última palavra sobre as indicações, ainda que elas não fossem necessariamemte sua escolha pessoal e ainda que elas passassem por mecanismos de controle: 'Juiz Federal:- Certo. Parece que o senhor já respondeu, mas para ficar claro então, era a presidência da república que enviava e indicava o nome do presidente e dos diretores da Petrobras para o conselho de administração da empresa? Luiz Inácio Lula da Silva:- O presidente da república, depois de ouvir os partidos, as bancadas e os ministros, indicava o conselho da Petrobras, indicava as pessoas. Juiz Federal:- A palavra final era da presidência da república? Luiz Inácio Lula da Silva:- A palavra final não, a indicação final era do conselho da Petrobras. Juiz Federal:- A indicação para o conselho da Petrobras, a palavra final dessa indicação era da Presidência da República? Luiz Inácio Lula da Silva:- Era, porque senão não precisava ter presidente. Juiz Federal:- Perfeito. Isso envolvia não só os presidentes da Petrobras, mas também os diretores? Luiz Inácio Lula da Silva:- Toda a diretoria da Petrobras.' Quando se fala em competência para indicação de conselheiros e diretores da Petrobras, por certo não se está a fazer menção à competência formal, aquela de quem efetivamente expede o ato, até porque, em casos como este, o ato de ofício reside na esfera política de atuação do agente. Contudo, pelo que já foi apurado e inclusive admitido pelos servidores nomeados - alguns em acordo de colaboração premiada -, tinham eles total conhecimento das entranhas do esquema montado e nele exerciam papel fundamental. Aliás, justamente em face da predisposição em aderir às práticas ilícitas é que foram nomeados. 3.3.8.5. Para não passar in albis, refira-se que a defesa arrolou inúmeras testemunhas ouvidas em juízo. Porém, as declarações em nada colaboram para a elucidação dos fatos, limitando-se a afirmar que o apelante seria uma pessoa proba e responsável, inclusive, pela implantação de sistemas de proteção e combate à corrupção durante seus dois mandatos. Todavia, apesar da envergadura de algumas das testemunhas de defesa, seus depoimentos não desmerecem o acervo probatório, porque sequer revelam mediatamente https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 234 de 317 conhecerem os fatos do processo, nada mais servindo como abonatórias. Sobre isso, aliás, manifestou-se o magistrado de primeiro grau: 789. Foram ouvidas ainda várias testemunhas arroladas pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, basicamente agentes políticos ou públicos, que não tinham conhecimento específico dos fatos que constituem objeto da denúncia, especialmente sobre o apartamento 164-A, triplex, ou sobre corrupção da Petrobras. 790. São praticamente testemunhas abonatórias que afirmaram em síntese que o exPresidente seria uma pessoa proba, que os sistemas de prevenção e repressão à corrupção teriam sido incrementados durante o mandato do ex-Presidente, que os sistemas de prevenção e repressão à corrupção não identificaram crimes de corrupção na Petrobrás durante o mandato do ex-Presidente, ou que não teriam conhecimento de utilização de mecanismos de propinas na Petrobrás para a formação da base política de sustentação do Governo Federal. 791. Entre elas, os depoimentos de Alexandre Rocha Santos Padilha, ex-Ministro de Relações Institucionais e ex-Ministro da Saúde (evento 606), Jaques Wagner, exGovernador e ex-Ministro das Relações Institucionais, (evento 607), Tarso Fernando Herz Genro, ex-Ministro da Justiça e ex-Governador(evento 622), Cláudio Lemos Fonteles, exProcurador Geral da República (evento 690), Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, ex-Procurador Geral da República (evento 691), Jorge Hage Sobrinho, ex-Ministro da Controladoria Geral da União (evento 698), Luiz Fernando Furlan, ex-Ministro do Desenvolvimento da Indústria e Comércio Exterior (evento 702), José Múcio Monteiro Filho, ex-Ministro das Relações Institucionais (evento 714), Paulo Fernando da Costa Lacerda, ex-Diretor Geral da Polícia Federal (evento 714), Luiz Fernando Correa, exDiretor Geral da Polícia Federal (evento 714), e Walfrido Silvino dos Mares Guia Neto, ex-Ministro das Relações Institucionais (evento 714), e até mesmo Henrique de Campos Meirelles, ex-Presidente do Banco Central e atualmente Ministro da Fazenda (evento 702). Desse modo, há um conjunto de elementos de prova - testemunhais e documentais - apontando para um desfecho de forma predominante em relação a outros ventilados pela defesa, não servindo tais testemunhos para desconstruir a conclusão da sentença. 3.3.9. Argumentos do apelante AGENOR MEDEIROS Sustenta a defesa de AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS que: (a) não teve nenhuma participação nos acertos de propina do PT, que ficavam a cargo de LÉO PINHEIRO, pessoa que tinha relacionamento próximo com o corréu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA; (b) o pagamento das vantagens indevidas foi controlado integralmente pela Odebrecht e pela UTC e não teve qualquer contato com agentes políticos ou funcionários da Petrobras; (c) foi condenado somente por ter concordado com o pagamento de valores de liderança para a Odebrecht, ciente de que tal quantia seria destinada ao pagamento de vantagens indevidas, contudo sua conduta se limitou a isso; (d) não teve qualquer envolvimento com os fatos relacionados à aquisição do apartamento triplex 164-A, do condomínio Solaris, no Guarujá/SP, pois todas as tratativas envolvendo o imóvel foram feitas diretamente por LÉO PINHEIRO. Pois bem. Em seu interrogatório (evento 869), disse AGENOR: Juiz Federal:- Esse processo fala aqui sobre esse apartamento no Guarujá, o triplex, nesses assuntos o senhor se envolveu de alguma forma? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Jamais, eu não tive conhecimento porque se tratava de outra empresa, a OAS Empreendimentos, eu atuava, só pra ver onde eu me situo na empresa, a empresa tem o braço de engenharia e o braço de investimentos, a OAS https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 235 de 317 Empreendimentos e outras empresas ficavam na OAS Investimentos, o braço que eu atuava era o braço da engenharia, esse braço da engenharia tinha inúmeras empresas, tinha a Construtora OAS, tinha a COESA, tinha a OAS Energia, tinha a OAS Comércio Exterior e Logística, tinha a OAS Defesa e tinha a Construtora OAS, eu atuava na Construtora OAS como uma das oito diretorias e superintendências que existiam, então a minha linha de atuação, a minha competência de atuação era limitada à diretoria que eu ocupava. Juiz Federal:- O senhor Léo Pinheiro também tratava desses assuntos envolvendo vantagem indevida com algumas dessas pessoas envolvidas? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Olha, eu diria que no momento em que vantagens, no momento em que ele conversou, por exemplo, com o João Vaccari sobre esses 16 milhões na Rnest, também eu não sei, desconheço que Léo tenha tratado com agentes da Petrobras, isso aí eu desconheço, quem tratou com agentes da Petrobras em outros contratos fui eu. Juiz Federal:- Perfeito. O senhor conhece pessoalmente o ex-presidente Luiz Inácio? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Não, nunca tive relacionamento com o expresidente, o conheço de evento públicos, inauguração de obras, só, não conheço ninguém da família, nunca estive, tem mais de 20 anos que eu não vou ao Guarujá, não sei onde fica o Instituto Lula, não conheço o Paulo Okamotto, eu desconheço totalmente a... Juiz Federal:- Certo. Embora já esteja implícito na sua resposta, mas eu vou perguntar mesmo assim, o senhor nunca tratou desses assuntos de vantagem indevida ou propina com o ex-presidente? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Jamais, não tinha relação, nunca tive relação com ele. (...) Juiz Federal:- E para a diretoria de serviços, o senhor tem conhecimento se teve pagamento? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Aí é onde está, 13 milhões e meio mais 6 milhões e meio totalizam 20, para os 36 sobraram 16 milhões para o PT, e assim foi feito, Léo esteve em contato com João Vaccari e ficou decidido que 16 milhões de reais, por conta da nossa parte na Rnest, seriam para o PT. (...) Juiz Federal:- O senhor chegou a ter contato também direto com o senhor João Vaccari? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Tive, tive vários contatos com o senhor João Vaccari para tratar desses assuntos e outros, que eu posso... Não faz parte do processo, mas tive. Juiz Federal:- Do João Vaccari, o senhor teve contatos com ele envolvendo repasses de vantagem indevida? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Também. Porque no caso da Rnest o senhor João Vaccari, como foi estabelecido um valor fixo e eles queriam sempre percentuais em cima do valor do contrato, uma loucura isso porque era um contrato de 6 bi aproximadamente. (...) Defesa:- Muito bem, aí o senhor falou de 16 milhões de vantagens indevidas para o PT. Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Para o PT. Defesa:- Quem cuidou disso? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Ao PT era dado um tratamento diferenciado, por quê? Justamente por ser um partido que tinha, eu digo, maiores valores envolvidos, esses partidos que foram citados aí eu tenho pouco conhecimento de que eles tenham tido muitos valores envolvidos, o PSB e PP, agora o PT tinha, tinha porque era sabido por todos que alguns outros contratos tinham valores, eu não sei exatamente quais, não posso afirmar. Defesa:- Quem cuidou do pagamento desses 16 milhões, quem controlou isso? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Quem controlava era Léo. Defesa:- Léo? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- O caixa único do PT era controlado por Léo. Defesa:- Certo, e quem operacionalizou, o senhor tem conhecimento? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Quem operacionalizava era essa área de controladoria.' https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 236 de 317 Suas palavras encontram eco nas declarações de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, que não apenas assumiu a responsabilidade pelos pagamentos, como nada referiu acerca do corréu AGENOR. Aqui, porém, a imputação tem outro contorno. Na Apelação Criminal nº 5083376-05.2014.4.04.7000/PR, ficou apurado que AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS tinha participação nos negócios ilícitos perpetrados por meio da OAS, na condição de Superintendente responsável pelo Setor de Óleo e Gás, inclusive no tocante às obras das Refinarias acima referidas (RNEST e REPAR). Por estes fatos foi condenado. Pois bem, muito embora o pagamento de propinas tenha como origem o mesmo e grandioso esquema de corrupção, especificamente com relação aos contratos das refinarias Abreu e Lima e Presidente Getúlio Vargas, trata-se aqui de propina direcionada exclusivamente a agentes do Partido dos Trabalhadores e, em certa medida, ao próprio exPresidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Com relação aos demais, já houve condenação na Ação Penal nº 5083376-05.2014.4.04.7000/PR. Desnecessária aqui nova sindicância sobre aqueles fatos, até mesmo porque tanto LÉO PINHEIRO quanto AGENOR MEDEIROS 'reconheceram a existência do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, os ajustes fraudulentos de licitação e o pagamento de vantagem indevida em contratos com a Petrobrás para agentes da Petrobrás, agentes políticos e partidos políticos' (item 771 da sentença). Deve-se verificar a existência de prova acima de dúvida razoável que ateste a responsabilidade criminal do apelante. A imputação é mais ampla do que o simples pagamento de propinas ao ex-Presidente. 'Destaque-se ainda a conexão estreita da presente ação penal com os crimes que foram objeto da ação penal 508337605.2014.404.7000 na qual foram condenados por corrupção e lavagem de dinheiro os dirigentes da OAS JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e Agenor Franklin Magalhães Medeiros pelo pagamento de vantagem indevida e ocultação e dissimulação dela ao Diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa em contratos do Consórcio CONPAR e do Consócio RNEST/CONEST (cópia da sentença no evento 847). Segundo a denúncia, essa mesma contratação e os mesmos acertos de propina teriam gerado créditos que teriam beneficiado o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sendo, portanto, a conexão ainda mais estreita do que a verificada em relação aos demais casos abrangidos na denominada Operação Lavajato' (item 167 da sentença). Nessa perspectiva, embora AGENOR afirme que nunca teria tratado de propinas com LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, isso não afasta o restante da imputação por pagamentos a representantes do Partido dos Trabalhadores, como sobejamente demonstrado. AGENOR relatou que ouviu, em 2014, LÉO PINHEIRO tecer comentários sobre os prejuízos que a OAS teve com obras da BANCOOP e que as reformas no apartamento triplex e no sítio de Atibaia seriam debitados dos créditos do Partido dos Trabalhadores, decorrentes daqueles contratos com a Petrobras. Transcreve-se: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 237 de 317 Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Eu me lembro numa viagem internacional a trabalho que eu tive com o Léo, em meados de 2014, eu já era da área internacional, e numa dessas viagens ele me relatou que tinha tido um acerto com João Vaccari no sentido de compensar prejuízos que a empresa estava tendo, a OAS estava tendo, com alguns eventos, 4 eventos, ele me relacionou na época, que foram eventos da, os prejuízos tido com as obras do Bancoop que a OAS Empreendimentos, não me falou que prejuízos eram esses, me falou da reserva de um apartamento triplex no Guarujá para o ex-presidente Lula, me falou de reformas que estava executando nesse apartamento triplex, me falou também de reformas que estava fazendo no sítio de Atibaia que também seria do presidente Lula, e que isso tinha causado prejuízos milionários e como ele, Léo, administrava uma conta do PT como um todo, não só obras da Petrobras, mas como outras obras, aí não me vem ao caso, ele tinha feito uma compensação com relação a esses prejuízos causados nesses 4 eventos, como eu já estava fora, em 14 de fevereiro eu assumi a área internacional, isso já tinha mais de 6 meses, então eu ouvi aquilo e não entrei no mérito, até porque fugia a... Juiz Federal:- Mas quem lhe deu essa informação foi o senhor Léo Pinheiro? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Não, isso foi na viagem que nós fizemos internacional e ele me reportou isso aí, que tinha feito essa compensação, os prejuízos eram milionários que houve o acerto, se fossem valores menores não teriam feito. Juiz Federal:- E tinha mais alguém quando teve essa conversa? Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Não, nós estávamos viajando, uma viagem, viajava muito na área internacional, África, Caribe...' Registre-se, por oportuno, que AGENOR deu detalhes de como funcionava o esquema de corrupção, indicando inclusive os percentuais tratados pelas empreiteiras para rateio da propina entre as agremiações políticas. Da sentença, extrai-se: 774. Agenor Franklin Magalhães Medeiros, encarregado especificamente dos contratos da Construtora OAS com a Petrobrás, confirmou que JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO interferiu junto ao Governo Federal para que a OAS passasse, ao final de 2006, a ser convidada para grandes obras na estatal. Também declarou que os contratos envolviam pagamento de propinas de 2% a agentes públicos e agentes políticos e que os contratos na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST) foram obtidos mediante ajuste fraudulento de licitação. 775. Declarou que no contrato da CONPAR, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), a vantagem indevida aos agentes públicos e políticos ficou a cargo da Odebrecht e da UTC Engenharia, desconhecendo o depoente os detalhes de como isso foi feito. 776. No caso dos contratos da CONEST/RNEST, na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), confirmou que houve ajuste de 2% de propinas sobre o valor dos dois contratos, que elas se destinavam aos agentes da Petrobrás e aos agentes políticos e que parte dos valores foram pagos pela Odebrecht e parte pela OAS. 777. Do total das propinas, dezesseis milhões de reais foram destinados ao Partido dos Trabalhadores, através de João Vaccari ('Aí é onde está, 13 milhões e meio mais 6 milhões e meio totalizam 20, para os 36 sobraram 16 milhões para o PT, e assim foi feito, Léo esteve em contato com João Vaccari e ficou decidido que 16 milhões de reais, por conta da nossa parte na Rnest, seriam para o PT'). 778. Há que se reconhecer como provado, acima de qualquer dúvida razóavel, considerando cumulativamente a prova material e a quantidade de depoimentos, incluindo dos pagadores de propinas e dos beneficiários, que os contratos discriminados na denúncia, entre a Petrobrás e os Consórcios CONPAR e CONEST/RNEST, integrados pela Construtora OAS, seguiram as regras do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, ou seja, foram obtidos com ajuste fraudulento de licitações e envolveram o pagamento de vantagem indevida de cerca de 2% sobre o seu valor e que foram destinados aos agentes https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 238 de 317 da Petrobras, mas especificamente à Diretoria de Abastecimento e à Diretoria de Serviços e igualmente a agentes políticos e a partidos políticos. 779. Dos valores, da parte cujo pagamento ficou sob a responsabilidade da OAS, cerca de dezesseis milhões de reais foram destinados exclusivamente à conta corrente geral de propinas mantida entre o Grupo OAS e agentes políticos do Partido dos Trabalhadores. Diante disso, tenho como comprovado acima de dúvida razoável a participação de AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS nos crimes de corrupção, envolvendo o pagamento de propinas ao Partido dos Trabalhadores - PT, na pessoa de seus dirigentes. 3.3.10. Do recurso ministerial quanto à quantidade de crimes A inicial acusatória narra e imputa a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA 7 (sete) crimes de corrupção, representados: (a) pelo pagamento ao Partido dos Trabalhadores decorrentes dos três contratos firmados pela OAS (em consórcio) com a Petrobras; (b) pelo custeio, a título pessoal, da diferença de preço entre o apartamento-tipo e o triplex no Condomínio Solaris; (c) pelo pagamento, a título pessoal, das despesas de reforma da referida unidade, contratada junto à empresa Tallento; (d) pelo pagamento, a título pessoal, das despesas com aquisição de mobiliário, junto às empresas Kitchens e Fast Shop; (e) pelo pagamento, a título pessoal, das despesas de armazenamento do acervo presidencial junto à empresa Granero. O decreto condenatório considerou caracterizado crime único de corrupção passiva com relação ao réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Postula o Ministério Público Federal que seja readequada a sentença no que diz respeito à quantidade de condutas praticadas pelo réu - independentes entre si, segundo entende -, para que seja considerado o contrato da OAS com a Petrobras, que não foi abarcado na condenação. Refere especificamente os contratos do Consórcio RNEST/CONEST junto à Petrobras para a implantação das UHDT's e UGH's da RNEST (Contrato 01), e para a implantação das UDA's da RNEST (Contrato 02), assim como do contrato obtido pelo Consórcio CONPAR com a Petrobras para a execução das obras de 'ISBL da Carteira de Gasolina e UGHE HDT de instáveis da Carteira de Coque' da REPAR (Contrato 03). Analisando a sentença e o recurso Ministerial, verifica-se que houve a condenação dos réus LUIZ INÁCIO, JOSÉ ADELMÁRIO e AGENOR em apenas um ato de corrupção e um de lavagem de dinheiro. De outra banda, o recurso do MPF busca a condenação em três atos de corrupção, representados pelos três contratos que a empresa OAS firmou com a Petrobras (dois deles relativos à RNEST e o terceiro à REPAR). Relativamente ao apartamento, entendeu a sentença que o imóvel (equivale dizer, a diferença de preço, as reformas e mobiliários) representava a vantagem indevida recebida pela manutenção do sistema de fraude à Petrobras e corrupção no seio da empresa, in verbis: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 239 de 317 646. Não sendo a titularidade de um imóvel, ainda que sem registro formal, um fato, por si ilícito, o esforço por parte do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ocultá-la é mais uma prova que corrobora a tese da acusação, de que a diferença entre o preço pago pelo apartamento 141, simples, e o custo das reformas, não seriam pagas pelo ex-Presidente e por sua esposa à OAS Empreendimentos, mas consumidas como vantagem indevida em um acerto de corrupção, como, aliás, afirmado por José Adelmário Pinheiro Filho e Agenor Franklin Magalhães Medeiros. 647. Antes de extrair as consequências de tais conclusões, necessário examinar a afirmada causa da vantagem indevida, os contratos da Petrobrás discriminados na denúncia. (...) 854. O Grupo OAS, dirigido por José Adelmário Pinheiro Filho, mantinha uma conta corrente geral de propinas com agentes do Partido dos Trabalhadores e que era alimentada por créditos provenientes de contratos celebrados pelo Grupo OAS com o Governo Federal. 855. Alguns desses créditos foram provenientes dos aludidos contratos da Construtora OAS, no âmbito do Consórcio CONEST/RNEST, no montante de dezesseis milhões de reais, como parte de vantagem indevida acertada no total de cerca de 2 ou 3% sobre o valor do contrato. 856. O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi beneficiado materialmente por débitos da conta geral de propinas, com a atribuição a ele e a sua esposa, sem o pagamento do preço correspondente, de um apartamento triplex, e com a realização de custosas reformas no apartamento, às expensas do Grupo OAS. 857. Como foi provado o crime de corrupção, inclusive que o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi direta e materialmente beneficiado, a discussão a respeito da suficiência ou não da prova oral para determinar se ele tinha ou não conhecimento do papel específico dos Diretores da Petrobrás na arrecadação de propinas passou a ser redundante. 858. Não importa que a conta geral de propinas tenha sido formada por créditos de acertos de corrupção em outros contratos do Governo Federal. É suficiente para estabelecer o nexo causal que o contrato da Petrobrás com a Construtora OAS, no âmbito do Consórcio CONEST/RNEST, tenha também originado crédito na conta geral. 859. Os créditos de propina e a conta corrente geral de propinas visavam estabelecer uma relação vantajosa do Grupo OAS com o Governo Federal, com parte deles tendo origem em contrapartidas específicas. O recurso do MPF, todavia, expressamente busca a reforma da sentença para que sejam estes réus condenados pelos três contratos firmados pela empresa OAS com a Petrobras. Colho do pedido recursal (evento 1011): 4. condenar LULA, como incurso, por 3 vezes, em concurso material (artigo 69 do Código Penal), nas sanções do artigo 317, caput e §1º, do Código Penal, nos termos do item '3.4' da presente peça; 5. condenar LÉO PINHEIRO e AGENOR MEDEIROS, como incursos, por 9 vezes, em concurso material (artigo 69 do Código Penal), nas sanções do artigo 333, caput e parágrafo único, do Código Penal, nos termos do item '3.4' da presente peça; No item referido (3.4.) a pretensão de condenação pela prática dos três crimes de corrupção refere-se exclusivamente aos contratos firmados com a Petrobras (subitens 3.4.1., 3.4.2. e 3.4.3.), não tratando a unidade habitacional como nova conduta ilícita de corrupção. Assim, nem a sentença, nem a pretensão recursal do Ministério Público trataram o imóvel como corrupção autônoma. Esta é a matéria devolvida a esta Corte e neste limite deve ser analisada. Registro, apenas, minha convicção pessoal de que o triplex e suas reformas constituem ato https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 240 de 317 de corrupção adicional e autônomo, divorciado dos contratos de corrupção decorrentes de pagamentos (ou reserva contábil) em favor do Partido dos Trabalhadores. Ainda, como explicitado antes, entendo não ser cabível a condenação pelo contrato da REPAR, cuja liderança do consórcio cabia à empresa Odebrecht, vez que não é possível extrair, acima de dúvida razoável, provas suficientes sobre os elementos do tipo penal em relação a este contrato. Um juízo condenatório dependeria de elementos sobre o crime de corrupção, e não apenas o contingenciamento havido nos créditos da empresa integrante do consórcio CONPAR, liderado pela empresa Odebrecht, bem como a participação de cada um dos réus quanto ao pagamento das propinas. A questão se limita, portanto, a reconhecer se os dois contratos obtidos fraudulentamente pela construtora OAS junto à RNEST devem ser havidos como crime único e dentro de um complexo de condutas, como o fez o juiz singular, ou se seria o caso de concurso de crimes. Pois bem. Em primeiro lugar, esclareça-se que a questão envolvendo o armazenamento junto à Granero será tratada adiante, juntamente com o branqueamento de capitais referente às mensalidades, pois tem-se que as condutas, apesar de diversos os desígnios, foram direcionadas de forma complexa e, em alguma parcela, em atos que se fundem. Da mesma maneira, pontos afetos à situação jurídica do imóvel, porque comuns ao exame da corrupção passiva e da lavagem de dinheiro, serão oportunamente tratados em título próprio deste último delito. Em segundo, não há, como anotado pelo juízo de primeiro grau, pagamentos realizados pela OAS Empreendimentos decorrentes do contrato da Repar. Como esclarecido por AGENOR MEDEIROS, a OAS tinha 'posições minoritárias no caso da Repar e posição igualitária no caso da Rnest, mas nós não éramos o líder do contrato da Rnest, mas tínhamos pleno conhecimento do que ocorria, fomos informados, e tinha uma metodologia de pagamento disso'. O consórcio tinha como líder o Grupo Odebrecht e não houve pagamento direto pela OAS para o Partido dos Trabalhadores ou qualquer outro agente público, mas mero contingenciamento em favor da empresa que administrava o grupo de empresas para que esta fizesse os devidos repasses: 'O fato é que naquela oportunidade nos foi dito, tanto por Márcio Faria quanto por Ricardo Pessoa, que nós teríamos que contingenciar na proposta 2% para atender a compromissos políticos, entendemos que ali teria agentes públicos e agentes políticos, não sabíamos quem porque estávamos ainda iniciando nesse processo, e que as propostas de cobertura para essa concorrência já estariam organizadas'. Sobre a metodologia empregada no caso específico, consignou o juízo de primeiro grau (itens 774-779 de sentença, acima transcritos), que em relação ao consórcio CONPAR a OAS não era a responsável principal pelos pagamentos, sendo que o encargo de líder era da empresa ODERBRECHT. Por isso, houve condenação apenas em relação ao contrato RNEST, onde há certeza quanto à responsabilidade pelos pagamentos: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 241 de 317 885. Reputa-se configurado um crime de corrupção apenas atinente aos contratos celebrados concomitantemente pelo Consórcio CONEST/RNEST com a Petrobrás, já que, pelos depoimentos prestados por José Adelmário Pinheiro Filho e Agenor Franklin Magalhães Medeiros, somente eles geraram parcela de propina destinada pela OAS a agentes do Partido dos Trabalhadores e à conta geral de propinas, uma vez que no Consórcio CONPAR a parte destinada aos agentes políticos teria ficado a cargo das demais consorciadas. Embora sejam dois contratos no Consórcio CONEST/RNEST, foram eles celebrados concomitantemente e envolveram acerto único de corrupção, motivo pelo qual justifica-se considerar o crime de corrupção como único. De resto, a ocorrência de crime único, a configuração da continuidade delitiva entre as condutas ou a existência de concurso material de crimes é questão a ser analisada caso a caso, a depender dos contornos da atividade criminosa, do modus operandi empregado, do tempo transcorrido entre os atos, enfim, das particularidades de cada conduta e seus desdobramentos no contexto da empreitada delitiva em seu todo. Não há como se definir, a priori, uma solução aplicável a todo e qualquer processo. Em outras ações penais relacionadas à 'Operação Lava-Jato' já julgadas por esta Turma, reconheceu-se o concurso material entre os crimes de corrupção, porquanto a cada novo contrato firmado por uma empreiteira com a Petrobras, relativo a novo objeto, caracterizam-se condutas autônomas com desígnios independentes, praticadas em datas diversas. Com efeito, as corrupções envolvendo agentes políticos ganham contornos próprios e a solução deve ser buscada caso a caso, tomando-se como norte o contexto da atividade criminosa, o modus operandi empregado, a capacidade de influência do agente e os desdobramentos da empreitada delitiva considerada em seu todo. Não há como se definir, portanto, uma fórmula de ouro aplicável a todo e qualquer processo, pois a atividade política transborda muitas vezes os estritos limites do cargo ocupado, podendo interferir nos mais variados órgãos da administração pública direta ou indireta. 3.3.10.1. No caso, a atuação do ex-Presidente difere do padrão dos processos já julgados relacionados à 'Operação Lava-Jato'. Não se exige a demonstração de participação ativa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA em cada um dos contratos. O réu, como já referido, era o garantidor de um esquema maior, assegurando nomeações e manutenções de agentes públicos em cargos chaves para a empreitada criminosa. Acertada a acusação ao atribuir a responsabilidade criminal no réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA em um patamar mais elevado em termos de hierarquia administrativa e constitucional. Alguns elementos de prova, como o depoimento prestado por Delcídio do Amaral perante a Procuradoria da República em São Paulo vem ao encontro dessa conclusão. O termo foi juntado à denúncia (evento 3 - COMP65). Declarou ele: QUE LULA se reunia com diretores da PETROBRAS também; QUE não sabe ao certo a assiduidade, mas tem certeza que LULA se reunia com tais diretores, com o objetivo de convencer os diretores de quais eram os projetos de relevo para o Governo; QUE isto era importante para que não houvesse discordância e LULA fazia este processo de convencimento dos Diretores, o que era essencial para que os projetos fossem aprovados; QUE LULA teve contato direto com os diretores, por exemplo, no caso da RNEST; QUE se https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 242 de 317 recorda que houve uma reunião específica de LULA com alguns diretores e com o presidente da PETROBRAS sobre a RNEST; (...) QUE LULA participava diretamente das grandes discussões da companhia e dos grandes projetos; QUE mais do que outros presidentes, LULA tinha noção clara dos projetos que eram mais estratégicos e que eram políticas de governo; QUE LULA participou da definição dos projetos das grandes refinarias, como Abreu e Lima; QUE a decisão de Abreu e Lima foi uma decisão e um projeto de governo; QUE LULA usou a PETROBRAS como um instrumento e uma política de governo clara; (...) Esses contornos da atuação do ex-Presidente foram detalhadamente identificados na sentença. Algumas passagens da decisão recorrida são por demais pertinentes, pelo que me permito realizar novas reproduções. Confira-se 729. Delcídio do Amaral Gomez, Senador da República, ao tempo dos fatos, celebrou acordo de colaboração que foi homologado pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal. Em Juízo (evento 388), declarou, em síntese, que havia uma distribuição de cargos pelo Governo Federal no âmbito da Administração Pública Federal direta ou indireta. Tal distribuição abrangia a Petrobrás. Segundo a testemunha, os indicados aos cargos na Petrobrás tinham uma obrigação de arrecadar propina para os partidos políticos, o que era do conhecimento, embora não em detalhes, do então Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. Apesar das afirmações do ex-Senador, ele também declarou que não chegou a tratar diretamente deste assunto com o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva pois 'não tinha essa relação próxima com o presidente para ter esse tipo de diálogo com ele'. (...) 741. Em seu depoimento, ele descreveu o processo de nomeação de Paulo Roberto Costa para a Diretoria de Abastecimento da Petrobrás. Declarou que ele foi indicado pelo Partido Progressista ao cargo e que houve muita resistência do Conselho de Administração da Petrobrás, o que teria sido vencido somente mediante a intervenção pessoal do então Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e após o Partido Progressista, com aliados, ter concordado em desobstruir a pauta da Câmara. De passagem, destaque-se que o Ministério Público Federal juntou diversas matérias de jornais sobre a obstrução da pauta de votação do Congresso na época da nomeação de Paulo Roberto Costa (evento 724, anexo12 e anexo13). 742. Ainda admitiu que o objeto do Partido Progressista com a nomeação era o de arrecadar recursos para ele. Confirmou a repartição de recursos entre os agentes da Petrobrás e agentes políticos do Partido Progressista. Declarou que, em uma oportunidade, na campanha de 2006, teria ouvido do então Presidente da República afirmação no sentido de que Paulo Roberto Costa estaria atendendo às necessidades financeiras do partido. Pedro Correa, ouvido em juízo, traz informação bastante elucidativa e que segue no mesmo sentido: Pedro Correa:- No princípio de 2004, final de 2003, princípio de 2004, o Paulo Roberto foi nomeado em maio de 2004. Então, José Dirceu disse que não tinha como resolver isso e que tinha que ser uma conversa com o presidente Lula, no gabinete dele, e que seria necessária a presença do presidente da Petrobras, doutor José Eduardo Dutra, e foi então quando houve um diálogo, que já foi transmitido diversas vezes, em que o presidente Lula perguntou ao José Eduardo Dutra, que era o presidente da Petrobras, por que o Paulo Roberto não estava sendo nomeado, não tinha sido nomeado, e ele disse que não era ele que nomeava, era o conselho de administração, então Lula perguntou 'E o conselho de administração, por que não nomeia ele?' ele disse 'Porque o conselho de administração é independente', ele disse 'Quem nomeou esse conselho?', ele disse 'A maioria desse conselho foi você, presidente', ele chamava 'você' até porque não tinha essa liturgia do cargo, 'Você Lula que nomeou', ele disse 'Eu posso demitir?', 'Pode', 'Pois diga a eles que https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 243 de 317 se eles não admitirem o Paulo Roberto Costa, não fizerem a nomeação, eu vou demitir o conselho', e aí o José Eduardo Dutra, que tinha uma ligação com o Rogério Manso, disse 'Olha, Lula, não é da tradição da Petrobras estar se trocando diretor', e aí ele disse 'Olha, Dutra, se fosse da tradição nem você era presidente da Petrobras, nem eu o presidente do Brasil, então eu vou dar um prazo de uma semana, se ele não for nomeado nós vamos trocar o conselho e vamos nomear o doutor Paulo Roberto', e ele foi nomeado, 15 dias depois Paulo Roberto era o diretor de abastecimento. Ministério Público Federal:- Nessa reunião, doutor Pedro, com o presidente Lula estava presente o senhor... Pedro Correa:- O ministro José Dirceu, o ministro Aldo Rebelo, o doutor José Eduardo Dutra, eu, o deputado José Janene e o deputado Pedro Henry, e o presidente Lula. Ministério Público Federal:- Certo. De fato ocorreu a nomeação do Paulo Roberto Costa? Pedro Correa:- Ocorreu a nomeação 15 dias depois, nós saímos de lá, já desobstruimos a pauta e as coisas começaram a tramitar, e isso é muito claro, só é pegar o período do... Isso tem registro, tem registro dessa conversa no gabinete do presidente da república como também tem o registro das obstruções que nós fizemos durante 3 meses na comissão, quando 17 medidas provisórias ficaram obstruindo a pauta, não se votava nada, nem fazia nada na câmara enquanto não se desobstruísse a pauta. Não por outra razão a sentença condenou o ex-Presidente por um único ato de corrupção, porquanto, a ele cabia dar suporte à continuidade do esquema de corrupção havido na Petrobras orientado a financiar partidos políticos e um projeto de poder, com capacidade inclusive de interferir na higidez do sistema eleitoral. A estrutura criminosa e o modus operandi pressupõem - e há prova disso - a participação de outros agentes políticos em condição semelhante, apesar de não denunciados neste feito. De todos os envolvidos, contudo, não há dúvida de que o réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA era o mantenedor do gigantesco esquema de corrupção. Há efetivas nomeações para cargos para a Petrobras, como Paulo Roberto Costa e expressa anuência para a nomeação Nestor Cerveró para a BR Distribuidora como compensação por 'serviços prestados'. A farta prova testemunhal não pode ser desmerecida, sobretudo porque no âmbito dos grupos que se dedicam à atividade criminosa não se registram estatutos. O chamado 'clube' das empreiteiras, com regras cifradas, talvez seja exceção, mas, ressaltese que, tal ambiente de delinquência somente foi possível de se identificar em razão da extrema importância que trouxe o instituto da colaboração premiada no combate ao crime organizado. É imperioso apontar que a influência política desborda da constância do agente em determinado cargo. Não são poucos os exemplos no próprio âmbito da 'Operação Lava-Jato' de denunciados que, mesmo após deixarem seus cargos, mas sempre em razão deles, permaneceram participando, usufruindo e influenciando o esquema de corrupção Há exemplos significativos disso, como nos casos de responsabilização criminal de Eduardo Cunha, Jorge Afonso Argello e André Vargas, dentre outros. Nestes e em outros casos investigados, foram identificados atos de agentes que não possuíam competência formal associada diretamente aos fatos praticados, mas atuavam nos bastidores para a produção do resultado ilícito de seus interesses, como a compra de poço de petróleo no Benin, a não convocação de empreiteiros para deporem na Comissão https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 244 de 317 Parlamentar de Inquérito da Petrobras e a assinatura de contratos de publicidade fraudados na Caixa Econômica Federal. É inimaginável que houvesse prova material da influência política do exPresidente no esquema para nomeação de agentes da Petrobras. Isso não desqualifica, porém, os testemunhos - alguns ricos em detalhes - colhidos junto a participantes diretos ou indiretos dos fatos, alguns colaboradores, outros não. Perícias não se contrapõem ao restante da prova, pelo que carece de correspondência a alegação de que auditorias internas e relatórios da KPMG Auditores e a Pricewaterhouse Coopers (evento 937, anexo6 e anexo7) não apontaram atos do exPresidente que pudessem ser assinalados como direcionados à manutenção do esquema de corrupção. Remeto, com relação ao tema, ao já consignado ao final do item 2.5, no sentido de que auditorias são limitadas e, por anos, comissões internas da Petrobras curiosamente passaram ao largo das fraudes existentes, posição que somente veio a se modificar após a deflagração da 'Operação Lava-Jato'. Atualmente, a situação é bastante diversa, com a companhia estatal inclusive buscando a reparação de danos causados pelo esquema de corrupção que nela sentou raízes. Ademais, a jurisprudência é pacífica e direciona-se para a 'autonomia e independência das esferas civil, penal e administrativa, razão porque eventual improcedência de demanda ajuizada na esfera civil ou de procedimento administrativo instaurado não vincula ação penal instaurada em desfavor do agente', de maneira que as conclusões no âmbito cível ou administrativo não desmerecem as conclusões do juízo criminal (HC 201402666794, RIBEIRO DANTAS, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA: 18/10/2017). Grosso modo, tem-se um incontestável conjunto de relatos surgidos em momentos, processos e perante juízos distintos, o que afasta ou ao menos minimiza em muito a possibilidade de concerto para deliberadamente incriminar um ou outro personagem. E há também os resultados narrados, materializados em nomeações e procedimentos licitatórios viciados que renderam benefícios milionários, em prejuízo da estatal petrolífera. 3.3.10.2. A destinação do triplex tem contorno um pouco diverso, apesar de o custeio do apartamento (diferença de preço), benfeitoria e móveis tenham como nascedouro a mesma origem espúria - qual seja: a relação contratual entre a OAS e a Petrobras. Há diferença no que diz respeito ao destinatário, pois, na essência, a propina teria como alcance os partidos políticos representados por seus dirigentes. No presente caso, está a denúncia a tratar de valores pagos em benefício dos Partidos dos Trabalhadores. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 245 de 317 Isso não afastou, como já assentado em inúmeras oportunidades, o recebimento de vantagens pessoais, pecuniárias ou não, por agentes públicos. A gênese é a mesma, ressalvando alguns pontos de distanciamento, como a agremiação política, os funcionários ou os agentes políticos contemplados. 3.3.11. Do concurso de crimes 3.3.11.1. Pelo contexto narrado, não tem lugar a tese proposta pelo Ministério Público Federal em sua apelação de ampliação da condenação para todos e cada um dos contratos individualmente. Como já abordado, o ato maculoso, mais do que concreto, é político e qualificado pela condição de mais alto mandatário da República. A propósito, a apelação ministerial sequer teria utilidade, exceto se expressamente para buscar a aplicação do concurso material entre todos os crimes de corrupção, mas desde que eventualmente computados todos os três contratos acrescidos do apartamento triplex. Todavia, a essa dimensão dos crimes de corrupção praticados pelo corréu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA não é possível se chegar, em virtude da sua peculiar função de garantidor do esquema ilícito e que tinha por finalidade precípua o financiamento de um projeto de poder. Nessa linha de argumentação e em consonância com o posicionamento que venho defendendo até então e a despeito de entendimentos antagônicos, ao corréu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA seriam imputáveis dois atos distintos e autônomos de corrupção. O primeiro deles relativamente ao conjunto de contratos de onde resultou o pagamento de propina ao Partido dos Trabalhadores - PT e, o segundo, relativamente à vantagem indevida recebida e materializada no apartamento triplex do Guarujá/SP. A eles, aplicar-se-ia a regra do concurso material, com somatório das penas individualizadas. Em complemento, não se pode desconsiderar o quanto decidido na Ação Penal nº 5083376-05.2014.4.04.7000/PR, que tinha por objeto os mesmos contratos imputados no presente processo. Naquele feito, inclusive já julgado pela 8ª Turma, foi reconhecida a responsabilidade criminal dos réus e, no tocante aos referidos contratos da RNEST, foi anotada a ocorrência de crime único, porque firmados na mesma data. No ponto, sucintamente, ponderou o magistrado: 387. Houve dois crimes de corrupção, um acerto nos contratos da RNEST e outro acerto no contrato da REPAR, muito embora tenha havido o pagamento em doze repasses. DESTAQUEI Não houve recurso ministerial e o entendimento registrado naquela sentença ficou mantido integralmente. Muito embora se reconheça a validade do desmembramento e independência das ações penais, sendo incontestável a comunhão de fatos, mostra-se inadequado chegarse a soluções jurídicas diversas. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 246 de 317 Há, ainda, detalhe adicional com relação ao contrato da REPAR, que é, como já afirmado, o fato de não ter sido objeto de pagamento pela OAS Empreendimentos, mas sim de mero contingenciamento em favor do Grupo Odebrecht, a quem caberia distribuir a propina. 3.3.11.2. Prosseguindo, as razões recursais do Ministério Público Federal não possuem aptidão para modificar as conclusões a que chegou o juízo de primeiro grau, no presente caso, pois há incompatibilidade lógica entre o pedido e a situação dos autos. Ausente pedido expresso, senão no que pertine especificamente ao Consórcio CONPAR junto a Petrobras, cuja absolvição é mantida por insuficiência de vínculo da OAS com o pagamento de propinas, permanece hígida a premissa adotada na sentença quanto ao reconhecimento de crime único. É dizer, considerados como crime único o pagamento de propina em relação aos contratos da RNEST e os pagamentos relativos ao apartamento triplex (diferença entre o apartamento-tipo e benfeitorias), a apelação acusatória não tem alcance suficiente para desfazer a lógica da sentença, pelo que não merece provimento o recurso no ponto. 3.3.12. Do recurso quanto à absolvição pelo crime de corrupção dos funcionários Renato Duque e Pedro Barusco Postula o Ministério Público Federal a condenação de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e de AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS por crimes de corrupção ativa com relação aos funcionários da Petrobras Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho. Não merece ser provido o recurso. Recorro, para tanto, ao parecer ministerial de segundo grau (evento 19): Ao contrário da compreensão da sentença, que entendeu que 'quanto aos pagamentos de vantagem indevida nos contratos dos Consórcios CONPAR e RNEST/CONTEST na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST) para a Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobras, não houve ainda denúncia contra os dirigentes da OAS.', o item 112 da denúncia explicitamente descreve tal prática delitiva: '112. Ainda neste mesmo período, entre 11/10/2006 e 23/01/2012, LÉO PINHEIRO e AGENOR MEDEIROS, executivos do Grupo OAS, em unidade de desígnios e de modo consciente e voluntário, ofereceram e prometeram vantagens indevidas a LULA, RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, para determiná-los a, infringindo deveres legais, praticar e omitir os atos de ofício no interesse do CONSÓRCIO CONPAR, contratado pela PETROBRAS para a execução das contras de 'ISBL da Carteira de Gasolina e UGHE HDT de instáveis da Carteira de Coque' da Refinaria Getúlio Vargas - REPAR (FATOS 04, 05 e 06); e do CONSÓRCIO RNEST/CONTEST, contratado pela PETROBRAS para a implantação das UHDT's e UGH's da Refinaria Abreu e lima - RNEST (FATOS 07, 08 e 09), e para a implantação das UDA's da Refinaria Abreu e Lima - RNEST (FATOS 10, 11 e 12). Tais vantagens indevidas consistiram em recursos públicos desviados no valor de, pelo menos, R$ 87.624.971,26, oferecidos e prometidos para LULA e que seriam usados não só para enriquecimento ilícito dos envolvidos, mas especificamente para alcançar governabilidade e financiar com recursos públicos desviados a https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 247 de 317 permanência no poder, parte dos quais (R$ 58.416.647,51) foi oferecida e prometida também para RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, que integravam com o primeiro o polo da corrupção passiva. Em razão de tais vantagens indevidas, mencionados agentes públicos, de fato, praticaram e omitiram atos de ofício. Assim, LÉO PINHEIRO e AGENOR MEDEIROS incorreram na prática, por 9 vezes (FATOS 04 a 12), em concurso material, do delito de corrupção ativa, em sua forma majorada, previsto no art. 333, caput e parágrafo único, do Código Penal' (fls. 5051 da denúncia). Ocorre que LÉO PINHEIRO e AGENOR MEDEIROS já foram condenados nos autos do processo nº 5083376-05.2014.404.7000 por corrupção ativa, por duas vezes, relativamente aos contratos da RNEST e REPAR pelo pagamento de vantagem indevida a Paulo Roberto Costa, em razão de seu cargo na Petrobrás. Assim, não merece acolhida o recurso ministerial nesse ponto. Com efeito, há, de fato, condenação já confirmada pelo Tribunal em julgamentos da 8ª Turma e da 4ª Seção com relação aos contratos da RNEST e REPAR nos autos da Ação Penal nº 5083376-05.2014.404.7000/PR. Naquele processo, houve clara imputação de pagamento de propinas em razão dos referidos contratos a agentes da Petrobras, como Renato de Souza Duque, Paulo Roberto Costa e Pedro José Barusco, estes dois últimos colaboradores da Justiça. Houve, é certo, dada a sua grandiosidade, desmembramento da investigação em várias ações penais, em geral, organizadas por critérios que passam pela identificação do núcleo de operadores, grupo de contratos ou de personagens envolvidos. E, quanto a isso, já decidiu a 8ª Turma que 'não há ofensa ao princípio da indivisibilidade da ação penal, só aplicável às ações penais privadas. A ação penal pública é divisível. Precedentes do STF'. (STF, RTJ 91/477, 94/137, 95/1389 e RT 593/459 - STJ, 7a T., DJ de 06/09/2006, p. 1022, Relator Ministro Nefi Cordeiro). Cabe ressaltar que o quanto decidido nas Exceções de Litispendência nºs 5050532-31.2016.4.04.7000/PR e 5051184-48.2016.4.04.7000/PR (eventos 725 e 726), propostas por JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS, não obsta tal entendimento, haja vista que naqueles incidentes discutia-se se existia comunhão de objetos entre a corrupção que beneficiou agentes da Petrobras e o ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Em ambas, anotou o magistrado de primeiro grau que, 'entretanto, são condutas diferentes o pagamento de propinas a Diretor da Petrobrás e o suposto pagamento de vantagem indevida ao ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, ainda que eventualmente a origem dos acertos sejam os mesmos contratos na Petrobrás'. Ante o exposto, na linha do parecer de segundo grau, deve ser negado provimento ao recurso do Ministério Público Federal no ponto. 3.4. DAS IMPUTAÇÕES DE LAVAGEM DE DINHEIRO A inicial é assim separada: (a) lavagem de dinheiro relativa ao apartamento triplex, representado pelos custos do imóvel, realização de benfeitorias e aquisição de https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 248 de 317 mobiliário; e (b) custeio do armazenamento do acervo do ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, representado pela contratação da empresa Granero diretamente pela OAS, com indicação incorreta do objeto contratado (bens armazenados armazenado). 3.4.1. Tipicidade - Lei nº 9.613/98 3.4.1.1. A Lei de Crimes de Lavagem de Bens, Direitos e Valores (nº 9.613/98) definia em seu art. 1º o crime em questão, antes das alterações trazidas pela Lei nº 12.683/2012: Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime: I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; II - de terrorismo e seu financiamento; III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção; IV - de extorsão mediante seqüestro; V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos; VI - contra o sistema financeiro nacional; VII - praticado por organização criminosa. VIII - praticado por particular contra a administração pública estrangeira (arts. 337-B, 337-C e 337-D do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal). Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa. Após a Lei nº 12.683/2012, a redação do artigo passou a ser a seguinte: Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012) (...) Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012) A lavagem de ativos é delito autônomo em relação ao crime antecedente (não é meramente acessório a crimes anteriores), já que possui estrutura típica independente (preceito primário e secundário), pena específica, conteúdo de culpabilidade própria e não constitui forma de participação post-delictum. Nessa perspectiva, até mesmo eventual prescrição do crime antecedente não teria qualquer consequência para a apuração da lavagem de dinheiro, como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça: 21. O reconhecimento da extinção da punibilidade pela superveniência da prescrição da pretensão punitiva do Estado, relativamente ao crime funcional antecedente, não implica atipia ao delito de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei n. 9.613/98), que, como delito autônomo, independe de persecução criminal ou condenação pelo crime antecedente.(...) (STJ, REsp 1170545/RJ, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 02/12/2014, DJe 16/03/2015). Incide, no caso, a Lei nº 9.613/98, com redação dada pela Lei nº 12.683/2012, porque, como já referido no tocante ao crime de corrupção, os recursos https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 249 de 317 ilícitos originários da Petrobras foram vertidos em forma de pagamento de diferença de preço entre as unidades, reformas, aquisição de mobiliário e utensílios no ano de 2014. Ainda que antes disso a unidade residencial estivesse 'reservada' ao ex-Presidente, ora réu, o efetivo desembolso somente ocorreu por ocasião do acertamento de contas em meados de 2014. De acordo com a doutrina de José Paulo BALTAZAR Júnior, 'a criação desse tipo penal parte da ideia de que o agente que busca proveito econômico na prática criminosa precisa disfarçar a origem dos valores, ou seja, desvincular o dinheiro da sua procedência delituosa e conferir-lhe uma aparência lícita, a fim de poder aproveitar os ganhos ilícitos, considerado que o móvel de tais crimes é justamente a acumulação material. Essa tentativa de disfarçar a origem ilegal sempre acompanhou a prática criminosa, tendo apenas se tornado, contemporaneamente, mais sofisticada' (in Crimes Federais, 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2014, p. 1104). Para a configuração do crime de lavagem de dinheiro, pois, é necessária a realização de um dos verbos nucleares do tipo, consistentes em ocultar - esconder, simular, encobrir - ou dissimular - disfarçar ou alterar a verdade. 3.4.1.2. Os ciclos da lavagem de dinheiro se decompõem em três fases, consoante a explicação do Grupo de Ação Financeira (GAFI): (a) ocultação ou colocação (placement stage); (b) escurecimento ou dissimulação (layering stage); (c) reintegração (integration stage). A par da clássica divisão, é sabido que os fatos não necessariamente se encaixam com perfeição ao modelo, dado o 'complicado polimorfismo' das condutas, na expressão de Rodrigo Sanchez Rios (Advocacia e Lavagem de Dinheiro, Série GVLaw, ed. Saraiva, 2010). É assente na doutrina e na jurisprudência, todavia, que o tipo penal, para a sua consumação, não exige a ocorrência das três fases. É dizer, a mera ocultação primeira fase do ciclo da lavagem - já caracteriza o crime, sendo desnecessárias as etapas de dissimular e reinserir os ativos na economia formal. O Desembargador Federal Leandro Paulsen (voto revisão proferido nos autos da Apelação Criminal nº 5023162-14.2015.4.04.7000/PR) com muita propriedade explicou a estrutura da lavagem de dinheiro: Sua estrutura normativa abre margem para discussões envolvendo o número de delitos cometidos por agente que se utilize de vários estratagemas voltados a outorgar aparência de licitude aos mesmos recursos originados de crimes antecedentes ou que o faça em diversas fases, destacadas em precedente do STF: '[...] 4) O delito de lavagem de dinheiro consoante assente na doutrina norteamericana (money laundering), caracteriza-se em três fases. A saber: a primeira é a da 'colocação' (placement) dos recursos derivados de uma atividade ilegal em um mecanismo de dissimulação da sua origem, que pode ser realizado por instituições financeiras, casas de câmbio, leilões de obras de arte, dentre outros negócios aparentemente lícitos. Após, inicia-se a segunda fase, de 'encobrimento', 'circulação' ou 'transformação' (layering), cujo objetivo é tornar mais difícil a detecção da https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 250 de 317 manobra dissimuladora e o descobrimento da lavagem. Por fim, dá-se a 'integração' (integration) dos recursos a uma economia onde pareçam legítimos.' Saliente-se que para a configuração do crime não é exigível o exaurimento dessas fases. Aliás, nem mesmo de uma única fase. Basta a prática de quaisquer das condutas descritas no tipo. Todavia, quando presente uma pluralidade de ações que reflitam com maior ou menor precisão as etapas descritas pelo Supremo Tribunal Federal, a distinção entre a consumação de crime único ou de uma plêiade de delitos exige maior esforço interpretativo. Pois bem, os verbos nucleares do tipo penal em questão são ocultar ou dissimular. Ocultar é esconder, agir para que não seja notado, visto ou descoberto. Dissimular também implica ocultação, encobrimento, mas através de uma conduta que faz parecer outra coisa. Valho-me da análise feita por RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA quando distingue dissimulação de simulação: 'Em outros dizeres, 'dissimulação' e 'simulação' são sinônimos até o ponto em que ambas representam falsidades da realidade, mas têm aplicações distintas e significados próprios. Realmente, veja-se com exemplos. Simula-se felicidade quando não se está feliz, o que é um sentimento falso mas não esconde necessariamente um outro sentimento real, nem mesmo a infelicidade, pois o sujeito pode não estar feliz e também não estar infeliz. Ele simplesmente está num estado neutro ou intermediário de não felicidade e não infelicidade, mas, não estando feliz, seu gesto apenas simula algo no mundo exterior, isto é, uma felicidade que não existe no seu mundo interior. Por outro lado, dissimula-se a infelicidade (que existe) através de um gesto de aparente felicidade, seja um outro gesto de mera ocultação da infelicidade que existe. Portanto, simular significa aparentar algo que não existe, e dissimular significa esconder algo que existe. Simular tem um componente positivo no ato externo, de pura e simplesmente criar a aparência, ao passo que dissimular tem um componente negativo no ato externo de esconder o interior real. (...) Com efeito, o termo 'dissimular', empregado na sua acepção certa segundo a linguagem comum, e no seu sentido técnico segundo o direito privado, revela que o dispositivo trata de levantar o véu do disfarce para descobrir a verdade, ou, mais especificamente, de desconsiderar o ato dissimulatório para encontrar o verdadeiro fato gerador, tal como previsto na respectiva descrição legal. (...)' (OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Reinterpretando a norma de antievasão do parágrafo único do art. 116 do Código Tributário Nacional. RDDT nº 76, Janeiro/02, p. 81/101) Quando se descobre a ocultação e a dissimulação, se encontra o produto do crime anterior, se levanta o véu que encobria a prática criminosa, tornando-a desnuda, aparente, acessível. A ocultação ou dissimulação, no tipo penal em questão, diz respeito à natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores. Ou seja, implica esconder o que é, de onde proveio, onde está, sua disponibilidade, mudança ou transferência de lugar, titularidade. Ou dissimular isso tudo, dando a impressão de que é outra coisa, de que tem outra fonte, de que está em outro lugar, de que não se tem a disponibilidade, de que não se moveu ou de que não se é proprietário ou titular. Basta, assim, que o agente, ciente da origem ilícita dos recursos, oculte ou dissimule sua procedência e titularidade mediante operações, como a aquisição e manutenção de bens em nome de terceiros ou a obtenção de benefícios outros de natureza econômica ou patrimonial. Os crimes previstos na Lei nº 9.613/98 não se submetem à apuração cabal da existência do crime antecedente. Tampouco 'o processo e julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 251 de 317 crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade e processo e julgamento' (TRF4, Apelação Criminal nº 5083376-05.2014.404.7000, 8ª Turma, minha relatoria, por maioria, juntado aos autos em 29/11/2016). Gustavo Badaró (in Ônus da Prova no Processo Penal, Ed. RT, 2003, p. 306/307) diz que 'Na investigação do elemento subjetivo, o juiz baseia-se em fatos objetivos, dados exteriores do delito que indicam a intenção do agente. São os fatos e, principalmente, a forma pela qual o autor cometeu o delito que indicam o elemento subjetivo do agente. O elemento subjetivo do delito é inferido dos fatos materiais, dos dados fáticos relacionados ao delito'. E isto é assim porque o dolo 'situa-se no mundo psíquico ou interno do agente'. 3.4.2. Materialidade e autoria - apartamento triplex no Guarujá/SP 3.4.2.1. É inquestionável a origem ilícita dos recursos empregados no custeio da diferença entre a unidade originalmente adquirida - e parcialmente paga - e a unidade final destinada ao apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Mais induvidosa ainda é a utilização da mesma fonte de recursos espúrios para o pagamento das reformas, melhorias, mobiliário e aparelhamento do apartamento 164-A. Diz a defesa que LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA foi condenado pela ocultação do real proprietário do apartamento triplex, mas que não há prova da prática do crime antecedente e, se existente, a ocultação do real proprietário do apartamento constitui exaurimento do delito de corrupção. Sem razão, como se verá. Neste e em diversos dos outros processos já julgados no primeiro grau e nesta Corte, restou demonstrada a existência de um complexo, prolongado e articulado esquema de desvio de recursos públicos no seio da Petrobras, com desvios bilionários (e não são poucos). Basta relembrar que apenas na contratação de um navio sonda, cujo negócio era indicado como desnecessário pela área técnica da instituição, o montante já ultrapassava a casa do bilhão. No caso específico, trata-se de recursos oriundos da empresa OAS, como confessadamente apontou o corréu JOSÉ ADELMÁRIO, que mantinha um espécie de 'conta corrente' do Partido dos Trabalhadores, da qual foram debitados os custos acima referidos. Colho, de seu depoimento, trechos importantes sobre o ponto, a confirmar aquilo que se afirmou acima: JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Esse dinheiro, existia uma metodologia de quando em quando, de vez em quando nós estávamos devendo para pagar e ele determinava de que forma seria feito esse pagamento, várias vezes via doações oficiais tanto ao diretório nacional do partido dos trabalhadores como a outros diretórios, ou, em alguns casos, para alguns políticos. Juiz Federal:- Não sei se eu entendi, havia uma espécie de conta corrente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sim. Juiz Federal:- Conta corrente não bancária, uma conta corrente... JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não, informal, de débitos e créditos. Juiz Federal:- E o que gerava créditos nessa conta corrente? https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 252 de 317 JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Os créditos eram a cada faturamento recebido, a cada fatura recebida, se aplicava o percentual de 1% e isso era contabilizado informalmente, e de quando em quando era feito um acerto com o senhor João Vaccari e ele nos dizia, nos orientava a forma que devíamos pagar. Juiz Federal:- Somente essas obras da Petrobras, Conpar e do Rnest, geraram esses créditos ou outras também? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, outras também. Da Petrobras? Juiz Federal:- É. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Outras também. Juiz Federal:- Fora da Petrobras também? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Fora da Petrobras também. (...) Juiz Federal:- Qual era a explicação que o senhor dava para o pessoal da OAS Empreendimentos de porque não fazer a transferência desse imóvel, porque fazer essas reformas todas? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Ainda existia nesse empreendimento em 2014 mais de 20 e poucas unidades que não tinham ainda sido comercializadas, mas era claro que ficava evidente porque tinha uma determinação de não comercializar essa unidade, e é norma, é padrão numa incorporadora ela não ficar com unidades depois de entregue, inclusive é por isso que tem essas feiras, essas coisas de imóveis, que ninguém, isso é um transtorno dentro do negócio como um todo. Juiz Federal:- Mas qual era a explicação então que o senhor dava para os executivos da OAS Empreendimentos? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Que depois ia ser encontrada uma forma de transferência para alguém que o presidente determinasse ou para a família dele mesmo. Juiz Federal:- Eles sabiam que o imóvel era do ex-presidente, que estava destinado ao expresidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sabiam, em 2010 isso ficou muito claro e público pelo jornal. Juiz Federal:- Certo. Mas eles não sabiam da parte, que o senhor mencionou depois, que isso foi abatido num acerto com o senhor João Vaccari? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, não sabiam. Juiz Federal:- Quem sabia dentro da OAS Empreendimentos, por exemplo, aqui dos acusados, o senhor Fábio Yonamine, o senhor Paulo Roberto Gordilho, o senhor Roberto Moreira Ferreira. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Como eu disse ao senhor, dentro da OAS Empreendimentos a gente evitou muito, eu evitei muito tratar desse tema, dentro da construtora não porque quando fomos autorizados a fazer o encontro de contas eu tive que informar a cada diretor superintendente que não fizesse pagamentos na conta da propina do PT, porque isso seria um encontro de contas feito e que não era para fazer o pagamento, não entrei em detalhes com eles que os pagamentos não foram feitos, eu falava em torno de um entendimento do Bancoop como um todo. (...) Juiz Federal:- Bem, então vamos retificar a pergunta, por que a OAS pagava esses valores, essa conta corrente de créditos ao PT e para o João Vaccari, nos quais, segundo o senhor afirmou, teriam ali compreendidos os valores pagos em benefício do imóvel do expresidente? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- A OAS pagava primeiro porque era uma regra de mercado, tinha sido estabelecido que em alguns mercados naquela época existiriam contribuições de 1% para o partido dos trabalhadores e que o gerenciamento disso seria feito pelos tesoureiros do partido, ao longo do tempo a gente percebe que não era só despesas do partido, isso tinha uma amplitude muito maior, era de um projeto político e por isso mesmo que os tesoureiros designavam para que a gente fizesse pagamentos os mais diversos possíveis, então os pagamentos que a OAS fez estavam dentro de uma regra que tinha no mercado, que eu... https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 253 de 317 Tais esclarecimentos, agregados a depoimentos de testemunhas e colaboradores, bem como às demais provas materiais existentes nos autos, como mensagens de celulares e emails, conferem certeza quanto aos fatos. Por essa razão, concluiu-se antes pela ocorrência do crime de corrupção e pela responsabilidade do réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA quanto aos fatos. Vale esclarecer, todavia, que a configuração do crime de lavagem de dinheiro prescinde da existência de prova cabal ou a responsabilização criminal pelo crime antecedente. Para a configuração do crime de lavagem de dinheiro, pois, é necessária a realização de um dos verbos nucleares do tipo, consistentes em ocultar/esconder, simular, encobrir/dissimular, disfarçar/alterar a verdade. Disse o magistrado na sentença recorrida: 893. A atribuição a ele de um imóvel, sem o pagamento do preço correspondente e com fraudes documentais nos documentos de aquisição, configuram condutas de ocultação e dissimulação aptas a caracterizar crimes de lavagem de dinheiro. 894. A manutenção do imóvel em nome da OAS Empreendimentos, entre 2009 até pelo menos o final de 2014, ocultando o proprietário de fato, também configura conduta de ocultação apta a caracterizar o crime de lavagem de dinheiro. 895. A agregação de valor ao apartamento, mediante a realização de reformas dispendiosas, mantendo-se o mesmo tempo oculta a titularidade de fato do imóvel e o beneficiário das reformas, configura igualmente conduta de ocultação apta a caracterizar o crime de lavagem de dinheiro. 896. Embora sejam condutas de ocultação e dissimulação talvez singelas, a sofisticação não constitui elemento necessário à caracterização do crime de lavagem de dinheiro (a complexidade não é inerente ao crime de lavagem, conforme precedente do RHC 80.816/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma do STF, un., j. 10/04/2001). 897. Não vislumbro concomitância ou confusão entre os crimes de corrupção e de lavagem. 898. O imóvel foi atribuído de fato ao ex-Presidente desde a transferência do empreendimento imobiliário da BANCOOP para a OAS Empreendimentos em 08/10/2009, com ratificação em 27/10/2009. Repetindo o que disse JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, 'o apartamento era do Presidente Lula desde o dia que me passaram para estudar os empreendimentos da BANCOOP, já foi me dito que era do Presidente Lula e de sua família, que eu não comercializasse e tratasse aquilo como uma coisa de propriedade do Presidente'. A partir de então,através de condutas de dissimulação e ocultação, a real titularidade do imóvel foi mantida oculta até pelo menos o final de 2014 ou mais propriamente até a presente data. 899. De forma semelhante, os acertos de corrupção remontam a 2009, durante a contratação pela Petrobrás do Consórcio CONEST/RNEST, ainda que a definição final da utilização de parte dos créditos em benefício do ex-Presidente tenha ocorrido posteriormente, em meados de 2014. 900. Mesmo considerando a definição final do acerto de corrupção em junho de 2014, prosseguiram as condutas de ocultação e dissimulação, inclusive com as reformas até o final de 2014, pelo menos, ou mais propriamente até a presente data. 901. Também tendo presente esses fatos, as condutas de ocultação foram posteriores ou se estenderam temporalmente mesmo após a consumação dos últimos atos relativos ao do crime de corrupção. 902. Não há, portanto, confusão entre corrupção e lavagem, tendo esta por antecedente o crime de corrupção. 3.4.2.2. Há uma profusão de elementos comuns entre os crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro, razão pela qual se faz necessária a retomada de alguns pontos já debatidos no capítulo anterior. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 254 de 317 Pedindo vênia pela imprescindível repetição do quanto sintetizado no item 3.3.7, há prova acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade triplex do Condomínio Solaris estava destinada a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA como vantagem, apesar de não formalmente transferida porque sobreveio a 'Operação Lava-Jato' e, com ela, a prisão de empreiteiros envolvidos, dentre eles, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. Sirvo-me das conclusões anteriormente lançadas: (a) João Vaccari Neto solicitou a LÉO PINHEIRO que a OAS assumisse empreendimentos da BANCOOP, pois a cooperativa estava em graves dificuldades financeiras e com as obras paralisadas; (b) após análise de viabilidade comercial, a OAS decide assumir o empreendimento do Guarujá/SP, desde já ciente de que uma das unidades pertenceria ao corréu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA; (c) foi realizada assembleia de condôminos para ratificação do contrato com a OAS, para qual foi expedida notificação, nos idos de 2009; (d) a ex-Primeira Dama firmou contrato originalmente com a BANCOOP, mas não o renovou com a OAS, embora também não formulado em tempo adequado o pedido de rescisão do contrato; (e) em 2010 foi publicada reportagem, em veículo de comunicação de grande circulação nacional, noticiando que a unidade triplex, já àquele tempo, pertenceria ao exPresidente; (f) visitas foram realizadas pessoalmente pelo ex-Presidente e sua esposa (fevereiro de 2014), bem como por esta e seu filho Fábio (agosto de 2014), no apartamento no Guarujá/SP. Na primeira ocasião que foram discutidas as reformas que a unidade deveria sofrer, sendo que na segunda oportunidade estas foram vistoriadas; (g) o apartamento triplex foi objeto das reformas previstas, em consonância com projetos apresentados e aprovados pelo apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e sua esposa, e elas foram efetivamente custeadas pela OAS Empreendimentos, sendo este fato absolutamente fora dos procedimentos usuais da empresa; (h) das visitas à unidade participaram dirigentes da empresa OAS, empregados desta, empregados de empresas subcontratadas, além dos réus. Tais pessoas, de modo unânime, confirmaram não apenas a ocorrência das visitas, mas a forma como foram agendadas, datas e detalhes da reforma; (i) o responsável pela Construtora Tallento, encarregada da reforma, confirmou os fatos, embora não soubesse precisar detalhes sobre a titularidade do bem; (j) ainda que algumas das testemunhas não soubessem certificar a 'propriedade ou titularidade' do triplex, tinham conhecimento por terceiros que o mesmo pertenceria ao ex-Presidente. A ausência de conhecimento pessoal deve ser entendida https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 255 de 317 como decorrente da própria natureza dos fatos, porque não se pretendia dar publicidade. Todavia, testemunhas diretamente envolvidas nos fatos e corréus foram assertivos quanto ao real destinatário do imóvel; (k) os altos dirigentes da empresa OAS não apenas tinham ciência dos fatos, como os confirmaram em juízo, destacadamente JOSÉ ADELMÁRIO, AGENOR, PAULO GORDILHO e ROBERTO MOREIRA; (l) os interrogatórios desses corréus, corroborados por diversas provas, são uníssonos sobre a reserva do apartamento e a realização das reformas e a customização conforme projeto apresentado e aprovado pelo ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e sua esposa (Marisa Letícia) por ocasião de apresentação pessoal que JOSÉ ADELMÁRIO e PAULO GORDILHO fizeram na residência do casal em São Bernardo do Campo; (m) as reformas da unidade se concretizaram de modo excepcional e customizado, o que pressupõe que não estavam sendo feitas para o público em geral, mas para pessoa determinada. Isto é, com natureza bastante diferente daqueles chamados apartamentos decorados; (n) a OAS administrava uma 'conta de propina', cujos recursos eram destinados ao Partido dos Trabalhadores, aos moldes do que foi praticado por outras empreiteiras no conhecido 'clube', fato este provado nestes autos (evento 847), bem como nas mais de duas dezenas de outros processos cujo mérito já foram julgados por esta 8ª Turma; (o) há prova material relativa à troca de informações, email e mensagens de celular, corroborando as palavras dos diversos réus, em especial de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO; (p) não foi produzida contraprova que infirme as alegações do réu JOSÉ ADELMÁRIO ou que levem à rejeição da premissa de existência de prova acima de dúvida razoável; (q) o contexto dos fatos, as provas, as regras de experiência e a lógica não permitem chegar a outra conclusão, salvo a de que o apartamento pertencia ao exPresidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, ora apelante, cuja titularidade e posse somente não foram transferidas a tempo e modo por força da própria 'Operação LavaJato' (que se iniciou publicamente em março de 2014) e da prisão de diversos empreiteiros em novembro de 2014, dentre eles, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO; (r) João Vaccari Neto orientou LÉO PINHEIRO sobre o abatimento da conta geral de propinas dos valores da diferença de preço entre a unidade simples e o triplex, o custeio da reforma, a compra de mobiliários e utensílios somente em um segundo encontro. Também seriam abatidos outros custos de empreendimentos do BANCOOP, passivos ocultos que, segundo ele, foram assumidos pela OAS. (s) o réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, em razão do cargo, atuou diretamente para a manutenção de agentes públicos que tinham por missão manter o https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 256 de 317 esquema de financiamento político com propinas decorrentes de contratos firmados pela Petrobras com grandes empreiteiras; (t) o réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, também em razão do cargo, teve para si destinado o imóvel triplex do Guarujá/SP, como pagamento de corrupção, correspondente à diferença de preço entre a unidade originalmente compromissada (apartamento 141) e a unidade final, somado aos custos de personalização (reforma e mobiliário); (u) dentro desse contexto, deve ainda ser considerado que boa parte dos fatos (diga-se, os mais essenciais, como reformas, compra de utensílios e mobiliário) ocorreu no ano de 2014, no decorrer da 'Operação Lava-Jato'. O magistrado singular entendeu que houve propositada intenção de ocultar o patrimônio que pertencia de fato ao ex-Presidente pelo menos até junho de 2014, e, por isso, caracterizado o crime de lavagem de capitais. 3.4.2.3. Tem-se por correta a conclusão, dado o prolongado período de ocultação do verdadeiro destinatário dos recursos, bem como incrementos no imóvel, cientes, beneficiário e pagador, de que esses recursos tinham origem ilícita e o patrimônio não estava formalmente vinculado ao beneficiário. O interrogatório do réu JOSÉ ADELMÁRIO, ausente qualquer evidência de que esteja mentindo, e principalmente estando em sintonia com os fatos provados, como prova séria deve ser valorado. O art. 32 da Lei nº 4.591/64 estabelece, dentre outras, as providências a serem realizadas ao final de uma incorporação imobiliária. O art. 44 da mesma lei prevê que, após a concessão do 'habite-se', deverá o incorporador requerer a averbação da construção de modo individualizado e discriminado das unidades. Vencida esta etapa é possível a transferência da posse ou propriedade, o que não ocorreu no caso concreto. Isso fica claro no seguinte trecho do depoimento de LÉO PINHEIRO, cuja repetição se faz necessária: JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O Vaccari me pediu que não fizesse, me liberou para venda da unidade que teria sido escolhida, a unidade tipo, e que a unidade que pertenceria à família do presidente ficaria em nosso nome, eu teria uma orientação; em 2010 eu o procurei, tinha problema de campanha política, esperou-se, por causa da matéria do... Juiz Federal:- Ele falou isso ao senhor? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- O João Vaccari falou comigo e o Paulo Okamotto. Juiz Federal:- Que não era para fazer a transferência? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Que não era para fazer transferência, e assim ficou até o final, como nós íamos resolver eu lhe confesso que a partir de novembro eu não... Juiz Federal:- Qual era a explicação que o senhor dava para o pessoal da OAS Empreendimentos de porque não fazer a transferência desse imóvel, porque fazer essas reformas todas? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Ainda existia nesse empreendimento em 2014 mais de 20 e poucas unidades que não tinham ainda sido comercializadas, mas era claro que ficava evidente porque tinha uma determinação de não comercializar essa unidade, e é norma, é padrão numa incorporadora ela não ficar com unidades depois de entregue, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 257 de 317 inclusive é por isso que tem essas feiras, essas coisas de imóveis, que ninguém, isso é um transtorno dentro do negócio como um todo. Juiz Federal:- Mas qual era a explicação então que o senhor dava para os executivos da OAS Empreendimentos? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Que depois ia ser encontrada uma forma de transferência para alguém que o presidente determinasse ou para a família dele mesmo. 3.4.2.4. Sustenta a defesa a inexistência de título translativo da propriedade, o que afastaria o branqueamento. Apesar de tentadora, a tese não encontra amparo na disciplina dos crimes de lavagem de dinheiro. Lembre-se que o tipo penal abarca o propósito de ocultar ou dissimular a localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores. Assim, a transferência anterior da unidade para o ex-Presidente ou para a exPrimeira Dama não é essencial para a caracterização da lavagem de dinheiro, justamente porque o contexto mostra-se compatível com o propósito de ocultar ou dissimular a titularidade ou a origem do bem. Trata-se de empreendimento imobiliário assumido pela OAS, transformado em incorporação e cuja titularidade poderia ser repassada somente ao término da obra, após a expedição de alvarás, habite-se e demais desonerações burocráticas. Vale dizer, não há incompatibilidade entre o crime de lavagem de dinheiro e a inexistência de título translativo, ao revés, esta acaba por revelá-lo. A efetiva titularidade de bem - móvel ou imóvel - não é essencial à conduta de lavagem de dinheiro, não se podendo tratá-la como inerente à norma incriminadora. A propósito, tivesse havido efetivamente a transferência de propriedade do Grupo OAS para o réu, certamente não se estaria a falar em ocultação ou dissimulação, mas sim em mero proveito do crime antecedente de corrupção passiva. Ao contrário disso, a leitura - mesmo apressada - do disposto no caput do art. 1º da Lei nº 9.613/98 já revela a inadequação da tese defensiva, pois a norma tem como premissa incriminadora a ocultação ou dissimulação da propriedade, bem como da natureza, da origem, da localização, da disposição ou da movimentação de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. Nenhuma pertinência reside, portanto, na tentativa de se associar o crime de lavagem de ativos à comprovação de transferência de titularidade, pois o bem jurídico tutela exatamente a sua ocultação ou dissimulação. Há, na tese, clara incompatibilidade lógica com pluralidade de condutas e objetos da norma incriminadora. O art. 1º da Lei nº 9.613/98 tem por objeto, além da ocultação ou dissimulação da propriedade, também da natureza, da origem, da localização, da disposição ou da movimentação de bens provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal, de maneira que em qualquer dessas figuras estaria configurado o branqueamento. Aliás, houvesse efetivamente o título translativo ou, no mínimo, não tivesse o compromisso de compra e venda perdido a validade, certamente não se estaria cogitando da incidência do tipo penal estampado no art. 1º da Lei nº 9.613798, mas mero proveito do https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 258 de 317 crime de corrupção passiva. Apenas para pontuar, em outro caso relacionado à 'Operação Lava-Jato', a 8ª Turma deste Tribunal concedeu de ofício a ordem de habeas corpus para absolver o réu-colaborador Paulo Roberto Costa, em razão da aquisição de um veículo Land Rover Evoque, registrado em nome próprio. Naquela Apelação Criminal nº 5026212-82.2014.4.04.7000/PR, consignei, no ponto: (...) Ocorre que o art. 1º da Lei nº 9.613/98 tipifica como lavagem de dinheiro a conduta de ocultar ou dissimular, verbos nucleares que não foram praticados pelos acusados na hipótese em apreço. Com efeito, o automóvel foi comprado para PAULO ROBERTO COSTA, constando sua identificação já na nota fiscal, a demonstrar que a propriedade do bem desde o princípio não foi encoberta. O pagamento do veículo foi feito com recursos disponibilizados por ALBERTO YOUSSEF, consistindo essa conduta, ao que tudo indica e consoante se depreende dos depoimentos dos acusados, no exaurimento de crimes de corrupção, os quais não são objeto desta ação penal. Em que pese a opção pela compra do automóvel em detrimento da simples entrega de numerário em espécie ou transferência bancária, está-se diante de pagamento de propina efetuado às claras. Como já mencionado, ALBERTO YOUSSEF tratou da aquisição pessoalmente, trocando e-mail com funcionário da concessionária, enquanto a nota fiscal foi emitida em nome de PAULO ROBERTO. Também não está configurada, no caso, a prática do tipo descrito no § 1º do art. 1º da Lei de Lavagem. Em tal modalidade, para caracterizar o delito de lavagem é exigido o especial fim de agir direcionado à ocultação ou dissimulação do produto da infração penal. Sobre a questão, colaciono a doutrina de Carla Veríssimo DE CARLI: O tipo do inciso II prevê uma série de condutas que, em sua maioria, representam a circulação dos bens e valores na economia legal, afetando diretamente o bem jurídico protegido pela norma (a ordem socioeconômica, em nossa opinião). Entretanto, face ao elemento subjetivo especial previsto no §1º, para que se justifique a punição por lavagem de dinheiro é preciso que o agente pratique essas condutas sobre o objeto material com ânimo diferente de o mero possuir, usufruir, gastar, guardar. O delito só estará configurado se essas ações forem praticadas com o objetivo de ocultar ou dissimular a utilização dos bens, direitos ou valores provenientes dos crimes antecedentes (in Lavagem de Dinheiro: Prevenção e Controle Penal, 2ª Ed., Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2013, p. 252) Na hipótese, o elemento ocultar ou dissimular não restou minimamente evidenciado. Enfim, as circunstâncias demonstram não estar caracterizada a prática deliberada de atos de ocultação ou dissimulação de recursos ilícitos. A conduta dos réus, embora ilícita e denotativa da prática de crimes contra a Administração Pública, não se enquadra no tipo penal da lavagem de dinheiro. Diante do exposto, de ofício, concedo habeas corpus para absolver ALBERTO YOUSSEF e PAULO ROBERTO COSTA relativamente à imputação desse específico crime de lavagem, em razão da atipicidade da conduta, nos termos do art. 386, III, do Código de Processo Penal. Ou seja, ainda que a aquisição do bem, naquela hipótese, tenha como origem crimes antecedentes, não se identificou claramente o dolo consistente na vontade consciente de ocultar ou dissimular a sua origem. Isso porque nenhum ato subsequente foi praticado pelo agente nesta direção. Esse caso é diverso. Não é demais recordar que a questão a respeito da titularidade do imóvel somente começou a ser esclarecida em 2014. LÉO PINHEIRO https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 259 de 317 afirmou que, inicialmente, 'foi orientado, já em 2009, que o apartamento triplex, 164-A, pertenceria à família do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que a OAS não poderia comercializá-lo para terceiro. Foi, porém, autorizado a vender a unidade 141-A, que constava no contrato celebrado entre a BANCOOP e Marisa Letícia Lula da Silva. Em nenhum momento, foi a ele informado que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva pagaria a diferença de preço entre o apartamento simples e o apartamento triplex'. A tentativa de LÉO PINHEIRO de 'acertar' o pagamento foi objeto de outras reuniões, sem que a questão tenha sido solvida nem mesmo após a solicitação de reformas no imóvel destinadas a atender às necessidades da família. LÉO PINHEIRO esclareceu que, em maio ou junho de 2014, encontrou-se novamente com João Vaccari Neto, quando ficou acertado que a diferença de preço entre a unidade simples e o apartamento triplex, assim como os custos da reforma do apartamento e igualmente do Sítio em Atibaia, seriam abatidos da mencionada conta geral de propinas do Grupo OAS. Nada obstante, João Vaccari Neto solicitou que a regularização do imóvel fosse postergada. Disse LÉO: 'O Vaccari me pediu que não fizesse, me liberou para venda da unidade que teria sido escolhida, a unidade tipo, e que a unidade que pertenceria à família do presidente ficaria em nosso nome, eu teria uma orientação; em 2010 eu o procurei, tinha problema de campanha política, esperou-se, por causa da matéria do...'. Pois bem, o pedido de João Vaccari Neto, alto dirigente do Partido dos Trabalhadores - PT e pessoa da confiança do ex-Presidente, surge como, no mínimo, estranho. Relevados todos os contornos da negociação do triplex, fosse de fato um negócio lícito, a solução seria bastante óbvia: o apartamento deveria ser colocado em nome do réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA ou de sua esposa. Não haveria porque aguardar-se ou imaginar-se outra alternativa mais adequada. É o que se exigiria e esperaria de qualquer cidadão comum, a fim de que não pairassem dúvidas a respeito da higidez da transação. Isso não ocorreu, contudo. Atendendo à solicitação de João Vaccari Neto, LÉO PINHEIRO, muito embora os percalços burocráticos, manteve o imóvel em nome da OAS sem indicação ou tentativa de vendê-lo a terceiro. E assim permanece até a hoje, incidindo, agora, o gravame do confisco determinado pelo Juízo de Primeiro Grau. 3.4.2.5. Há outros fatores que contribuem para a tipificação da conduta. O valor final do imóvel, após as reformas e equipagem, extrapola em muito a avaliação de mercado. O simples acobertamento da valorização do bem já configura, em tese, o crime autônomo de branqueamento de capitais, mesmo que nominalmente transferido para o apelante. Isso porque, como já explicado, em nenhum momento houve iniciativa do apelante no sentido de, no mínimo, fazer o ajuste da nova opção pelo triplex em sua declaração de imposto de renda anual. Somente na declaração do ano-calendário 2015 houve a exclusão do referido compromisso de compra e venda da declaração. Apesar disso e de efetivamente terem sido vertidas contribuições referentes ao apartamento tipo, o subfaturamento da transação permite que à parcela dos recursos https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 260 de 317 direcionados - aqueles de origem ilícita - seja dada aparência de legalidade. Há, então, no mínimo mescla de capitais lícitos e ilícitos. É certo que em 2016 houve a propositura de ação de rescisão contratual. Porém, o seu ajuizamento não decorreu do interesse em reaver valores, mas, tudo indica, apenas para prevenir responsabilidades ou para dissimular o acerto de contas entabulado com LÉO PINHEIRO, porque somente foi proposta depois de notória divulgação da investigação relacionada ao apartamento 'triplex', bem como após a condução coercitiva do ex-Presidente em 29/02/2016 (evento 3 do processo nº 500740106.2016.4.04.7000/PR). Dessa forma, o que a defesa entende ser um de seus maiores trunfos, a rescisão extemporânea do compromisso de compra e venda e a exclusão da declaração de ajuste de imposto de renda não possuem, ao meu sentir, aptidão para exculpar o apelante. Ao revés disso, a atuação tardia dos envolvidos em tentar mascarar a verdade dos fatos, justamente após a notoriedade da 'Operação Lava-Jato' e a prisão de LÉO PINHEIRO, nada mais fez do que documentar o que já seria possível inferir do restante do caderno probatório. Haveria outras condutas hábeis para afastar a imputação de lavagem de dinheiro, como, ao contrário do feito, a confirmação do negócio jurídico pela apresentação de um termo de entrega ou um protocolo de exigência do imóvel perante a OAS. Talvez restassem dúvidas acerca da regularidade do negócio jurídico no que diz respeito à forma, mas é provável que não se estivesse a falar em lavagem de dinheiro. Mas, diga-se, nenhuma conduta foi adotada em tal direção. E, muito embora LÉO PINHEIRO não fosse um mero corretor de imóveis, é razoável que o empresário, inegavelmente das relações do ex-Presidente, se dedicasse direta e pessoalmente às tratativas, inclusive acompanhando a família LULA DA SILVA em visita ao apartamento triplex. Esse mesmo estreito relacionamento, a propósito, contribuiu para que o bem nunca fosse registrado em nome do real destinatário e mantido em nome da OAS. Esclareça-se aqui, que se fala em destinatário porque não houve a correspondente prestação financeira por parte de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, tendo sua origem crime antecedente de corrupção passiva, materializando-se o apartamento triplex na própria vantagem indevida. Ademais, é irrelevante a condição de proprietário ou não do objeto de branqueamento, porque inexigível a configuração de todas as etapas, como a reintegração, por exemplo. 3.4.2.6. Tudo isso revela um quadro para ocultar ou dissimular não só a propriedade, principal ponto de sustentação da defesa, mas também 'a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal' (art. 1º, caput, Lei nº 9.613/98). Tem-se presente, como já dito, que o crime de branqueamento de ativos não exige: (a) a exaustão de todas as etapas (ocultação ou colocação - placement stage; escurecimento ou dissimulação - layering stage; reintegração - integration stage), https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 261 de 317 bastando a identificação de uma delas para caracterizar o crime; (b) sofisticação, de modo que a mais pueril conduta, desde que violadora do bem jurídico tutelado, caracteriza o delito (STF, RHC 80.816/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, unânime, julgado em 10/04/2001). Sustenta a defesa, em tese alternativa, que à corrupção e à lavagem de dinheiro deve-se aplicar o entendimento segundo o qual esta é mero exaurimento daquela. A legislação brasileira não incorporou ou fez qualquer referência à segmentação, motivo pelo qual para a tipificação não tem ela maior importância. A realização de qualquer das condutas atinentes a qualquer fase é apta a configurar a prática do crime. O objetivo da criminalização da lavagem foi o de impedir que os criminosos pudessem fruir do produto de sua atividade. Na feliz expressão de Kai Ambos, o criminoso 'deve, no verdadeiro sentido da palavra, permanecer sentado em seu capital sujo'' (AMBOS, Kai. Lavagem de dinheiro e Direito Penal. Porto Alegre: Sergio Fabris, 2007, p. 63). Assim, pela essência da norma, qualquer movimentação do dinheiro sujo sob disfarce de valores lícitos, como aconteceu no caso presente, caracteriza crime de lavagem. A norma possui objeto muito claro, não apenas o de criar mais um tipo penal, mas, também, o de estabelecer a natureza autônoma do crime de lavagem de dinheiro com relação ao seu antecedente, no caso, já exaurido pela disponibilização de créditos em favor de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA em 2014. Nos crimes de corrupção, cabe recordar, o efetivo pagamento sequer é essencial ao tipo penal. Nessa conjugação de balizas, é impensável admitir-se, como regra geral, que o ato - posterior, autônomo e sem necessária relação com o antecedente tendente a ocultar ou dissimular a origem ilícita de dinheiro já incorporado ao patrimônio do agente seja mero exaurimento da corrupção. Caso contrário, equiparar-se-ia aquele que recebe dinheiro da corrupção e nada mais faz, com aquele que busca - com nova conduta - incorporar o proveito do crime dando-lhe a aparência de legalidade. Neste caso, diferentemente daquele citado no item 3.4.2.4 (Land Rover Evoque de Paulo Roberto Costa), há condutas que extrapolam a tipificação do crime antecedente, de modo que não se pode tratá-las como seu mero desdobramento. Demais disso, constatou-se a ocorrência de operações de compensação entre contas de diferentes empresas do Grupo OAS (OAS EMPREENDIMENTOS S.A. e CONSTRUTORA OAS LTDA.), como forma de repassar as vantagens indevidas e dificultar o rastreamento dos valores ilícitos. Isso, por si só, caracteriza a técnica de lavagem por mera movimentação, intitulada de mescla, como destacado em razões finais do órgão de acusação. Embora seja singela a técnica utilizada, pelo menos com relação aos últimos atos, a manutenção de bem em nome de terceiro - em particular com o encobrimento da https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 262 de 317 verdade pela própria incorporação do empreendimento habitacional - caracteriza ato de lavagem de dinheiro. Não fosse o farto conjunto probatório e os atos posteriores na tentativa de fazer desaparecer qualquer vínculo jurídico com o imóvel (denúncia do contrato e exclusão do imposto de renda) o álibi seria satisfatório, porque não se poderia, em uma situação normal, suspeitar da razão de permanência do imóvel em nome da construtora até a destinação final. Contudo, reforce-se, o triplex nunca foi comercializado ou oferecido a terceiros, sem contar o elevado e incomum investimento em melhorias do imóvel. Nesse sentido, anotou o Ministério Público Federal que 'consistiu na ocultação do beneficiário dos valores decorrentes da prática criminosa. Tanto o triplex permaneceu em nome da OAS, quanto as obras e o mobiliário foram contratados em nome da empresa, tendo sido contra ela emitidas as respectivas notas fiscais. E isto basta à configuração do crime de lavagem. Importante também trazer dados do processo que demonstram a perfeita ciência do ilícito e a preocupação de Luiz Inácio em não se vincular nem ao apartamento nem às reformas que foram feitas'. Para não passar in albis, não se confunde o presente caso com o que fora tratado pelo Supremo Tribunal Federal no bojo da Ação Penal nº 470 ('Mensalão'). Naquele conhecido feito discutia-se se o simples proveito do crime, particularmente o saque de valores diretamente em conta bancária, poderia ser classificado como ato autônomo a caracterizar o crime de branqueamento de ativos. Nesse sentido, por elucidativo, faço referência ao parecer do Ministério Público Federal em segundo grau (fls. 62-63): Por fim, importante refutar a ideia do recurso defensivo que aponta a atipicidade do crime de lavagem pelo qual Luiz Inácio foi condenado a partir de uma interpretação equivocada da 3ª etapa da lavagem, a integração. Embora reconheça que 'não é necessário que o valor proveniente da atividade ilícita seja integrado à economia, bastando a consumação da primeira etapa para que se caracterize a materialidade delitiva, incidindo sobre a conduta a mesma pena aplicável à dissimulação e reintegração', contraditoriamente alarga o elemento subjetivo do tipo para nele incluir 'a vontade de reinseri-lo (o produto do crime) na economia com aparência de licitude'. Ora, a integração nada mais é do que a possibilidade de fruição dos valores branqueados. Quando a ocultação já envolve um bem da vida que pode ser tido como o objetivo do criminoso, não há sentido em se exigir essa reinserção na economia. Grandes criminosos, especialmente os de colarinho branco, utilizam-se com muita frequência desse expediente, dificilmente registrando algum bem de seu patrimônio, auferido de forma ilícita, em nome próprio. Distingue-se a lavagem do exaurimento da corrupção exatamente porque mesmo a fruição se dá de forma dissimulada, através de interpostas pessoas, que servem a mascarar o real proprietário do bem adquirido com valores oriundos da corrupção. No caso dos autos, Luiz Inácio pôde desde sempre dispor de seu imóvel e a partir do segundo semestre de 2014, tendo sido encerradas as reformas e mobiliado o apartamento, poderia dele usufruir livremente como proprietário. Isso ficou muito claro a partir da análise da prova dos autos. Estivesse em seu nome o apartamento, ou, ainda, tivessem sido feitas as compras e reformas em seu nome, não seria possível cogitar do crime de lavagem. No entanto, sempre houve o objetivo de ocultar a real propriedade do imóvel, justamente para dificultar eventual vínculo entre a corrupção na Petrobrás e o ex-Presidente da República. Por isso, absolutamente inapropriada a utilização do precedente trazido no recurso defensivo, em que os Ministros do Supremo Tribunal Federal discutem, ainda no bojo da Ação Penal 470, se o recebimento de valores, em espécie, pela esposa do corrupto configuraria crime autônomo de lavagem, situação totalmente diversa da presente. Trata- https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 263 de 317 se do caso em que o ex-deputado federal João Paulo Cunha recebeu cinquenta mil reais de propina por intermédio de sua esposa. De se salientar que o julgamento que o absolveu do crime de lavagem se deu por maioria de 6 votos a 4, vencido o relator, Ministro Luiz Fux, que entendeu que 'o modo como dinheiro chegou ao ex-parlamentar mostrou a clara intenção de dissimular a sua origem, o que já tipificaria o crime'. Ora, o quanto decidido pela Corte Constitucional em nada se distingue do que já foi examinado em julgamentos precedentes neste Tribunal, como a citada Apelação Criminal nº 5026212-82.2014.4.04.7000/PR. Certamente a regra não é absoluta, sendo impositiva, diante da complexidade e do polimorfismo do crime, a análise da(s) conduta(s) em consonância com todo o contexto, e não isoladamente. E, nesse aspecto, não pode ser desprezado que o imóvel permaneceu indefinidamente em nome da OAS Empreendimentos, sem que tenha sido colocado à venda e, durante longo período, tratado como se fosse efetivamente destinado ao apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Por tais fundamentos, não deve prevalecer a tese da defesa de que o crime de lavagem configura mero exaurimento do delito de corrupção. 3.4.2.7. Igualmente não socorre ao apelante a tese de que o imóvel está arrolado em nome da OAS Empreendimentos e que isso, por si só, já comprovaria que a propriedade nunca foi transferida ao apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Também improcedente a argumentação no sentido de que a hipoteca em favor do agente financeiro impediria qualquer transferência de domínio. Ora, como já explicado em diversas passagens, o âmago da lavagem não é exclusivamente a propriedade (mas também 'a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal', conforme art. 1º da Lei nº 9.613/98), o que já impediria o acolhimento incondicional da tese defensiva. Novamente há equívoco conceitual na argumentação. Isso porque direito real de propriedade e direito real de garantia não se confundem, sobretudo no que diz respeito às incorporações imobiliárias, de modo que a transferência de domínio é irrelevante. A sistemática do crime de branqueamento de capitais não se afeiçoa às regras do Direito Civil. Em empreendimentos imobiliários com aporte de recursos por instituição financeira é comum o gravame sobre a incorporação, sem que tal restrição afete, porém, direito de compromissários adquirentes no tocante às condições do compromisso. Isto é, quitado o preço, sequer poderia a incorporadora negar a averbação em nome do comprador. Tanto é assim que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que 'as regras gerais sobre a hipoteca não se aplicam no caso de edificações financiadas por agentes imobiliários integrantes do sistema financeiro da habitação, porquanto estes sabem que as unidades a serem construídas serão alienadas a terceiros, que responderão apenas pela dívida que assumiram com o seu negócio, e não pela eventual inadimplência da construtora' (REsp no 205.607-SP, 4a Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. em 115-1999, DJ de 1-7-1999). https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 264 de 317 A questão foi pacificada em 2005 com a edição da Súmula nº 308 por aquela Corte Superior. Diz o enunciado: 'A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel'. De toda maneira, a questão não diz respeito ao direito civil e nem mesmo a aferição da posse seria pertinente. Assim, no ponto, a tese defensiva não modifica a tipicidade penal e o contexto probatório, porque (a) o crime inserto no art. 1º da Lei nº 9.613/98 traz uma pluralidade de objetos, para além da propriedade, capazes de, isoladamente ou em conjunto, resultar no crime de ocultação ou dissimulação (não é demais repetir, 'natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal'); (b) regras do direito civil não interferem em tal premissa, notadamente porque o gravame sobre a incorporação não obstaculiza a disposição sobre as unidades habitacionais; (c) aos atos destinados ao branqueamento de capitais são praticados justamente ao largo do ordenamento jurídico. Também não interfere nas conclusões o fato de o imóvel ter sido incluído no rol bens da OAS Empreendimentos no processo de recuperação judicial, que tramita perante a 1ª Vara de Falência e Recuperações Judiciais da Justiça Estadual de São Paulo. Novamente nada de impeditivo existe, porque, por todos os motivos já indicados, a propriedade em nome de terceiro - no caso, a própria incorporadora - não teria aptidão de impossibilitar a sua disposição. Curioso, ao contrário disso, seria a OAS investir quantia que, somada, ultrapassa o valor do próprio imóvel apenas para torná-lo mais atrativo. Curioso, igualmente, é que até 2015 o apartamento triplex sequer tenha sido negociado. De resto, 'estando o imóvel formalmente em nome da OAS Empreendimentos era de se esperar que fosse arrolado no processo de recuperação judicial da empresa, já que esta é obrigada a indicar todos os seus bens. Isso era ainda mais esperado, considerando que a recuperação judicial foi iniciada em 2015' (item 811 da sentença). Incompatível com a simples intenção de apenas valorizar o apartamento, há comprovado e excessivo investimento lançado na contabilidade da empresa para criar a correspondência com os documentos fiscais emitidos pela Construtora Tallento, pela Kitchens e pela Fast Shop. Tais despesas foram verdadeiramente compensadas no 'caixa informal' de propina. 3.4.2.8. Há, portanto, um forte conjunto de indícios, todos eles convergindo para a responsabilidade criminal de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. É dizer, reprisando a lição de Knijnik, os diversos indícios que envolvem o fato probando devem ser analisados em duas etapas, primeiro em relação a cada indício; depois o conjunto deles. No mesmo caminho, Patrícia Silva Pereira diz que 'esta imposição de que os indícios se conjuguem entre si, 'de maneira a produzir um todo coerente e natural' é aplicável não apenas a cada um dos factos indiciários mas, também, às inferências deles resultantes. É elementar que se os factos base convergem num mesmo sentido não poderão permitir conclusões diversas, ou em melhores termos, não se poderá chegar ao conhecimento de factos presumidos incompatíveis entre si. À semelhança do que sucede https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 265 de 317 no caso italiano, a concordância entre os indícios vale como critério valorativo' (in Prova Indiciária no âmbito do Processo Penal, Coimbra: Editora Almedina, 2017, p. 139). Ademais, existem provas suficientes do funcionamento do esquema de corrupção sistêmica que assolou a Petrobras, reveladas pelo forte conjunto de indícios, todos eles apontando para a mesma direção. E isso ultrapassa as alegações de que as testemunhas apenas ouviram dizer e que não tinham vínculo direto com os apelantes. Como explica Ana Lara Camargo de Castro, as provas não possuem valor tarifado, ou seja, não têm peso preestabelecido. Não há hierarquia entre as elas, sendo possível a admissão, desde que lícitos, de quaisquer meios, ainda que não expressamente previstos na legislação processual penal. Diz mais a autora: 'nesse sistema de liberdade probatória, a prova testemunhal é admitida sempre que a pessoa souber algo que interesse à decisão da causa e as razões da sua ciência permitam a avaliação de sua credibilidade' (Hearsey tropicalizado - a dita prova por ouvir dizer. Revista da Escola da Magistratura do TRF da 4ª Região. n. 6 (abr. 2017). Porto Alegre : Tribunal Regional Federal da 4ª Região, p. 243). Por óbvio que não se pode apressadamente importar o instituto norte-americano, sem a observação das necessárias salvaguardas. Com efeito, compete ao magistrado fazer a necessária ponderação sobre a afirmação, buscando extrair-lhe a credibilidade necessária para que possa ser utilizada como prova no processo penal. Contudo, como regra, a declaração da testemunha - no caso específico, de vários colaboradores - pode ser usada para fundamentar um juízo condenatório se dela se puder retirar boa dose de credibilidade. Para além da palavra dos colaboradores, há testemunhas que não se beneficiaram de ajuste formal, cujos depoimentos são convergentes. Essa é a essência, a propósito, do art. 203 do Código de Processo Penal, pelo qual deve a testemunha relatar o que souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade. Traçando apenas um paralelo com o hearsey estadunidense, mas ressaltando os perigos da importação não criteriosa do instituto, Ana Lara Camargo de Castro diz: 'ao fim, se nos Estados Unidos a regra pode ser flexibilizada por noções de justiça, relevância e confiabilidade, no Brasil a lei determina que poderá ser testemunha toda pessoa cujo depoimento interesse à decisão da causa e cuja credibilidade se extraia das circunstâncias ou das razões de sua ciência' (op. cit., p. 256). Em via oposta, inexistem contra-indícios suficientes e aptos para desmerecer o restante da prova. Segundo Patrícia Silva Pereira, a inexistência de contra-indícios é, igualmente, indicada como um dos requisitos da prova indiciária. 'A inferência é afastada se a regra de experiência não pode ser aplicada em face de outros factos. Se existem indícios que afastem a aplicação de tal regra, o facto presumido não terá qualquer valor probatório' (op. cit., pp. 147/148). No caso, os contra-indícios são por demais etéreos e incapazes de fragilizar as conclusões a que chegou o magistrado de origem com base no somatório de proeminentes indícios e na boa prova material, devendo, portanto, ser mantida a https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 266 de 317 condenação de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO no tocante ao crime de lavagem de ativos. 3.4.2.9. Com relação ao apartamento triplex do Guarujá/SP, a denúncia imputa a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, PAULO ROBERTO VALENTE GORDILHO, FÁBIO HORI YONAMIME e ROBERTO MOREIRA FERREIRA, a prática, por 3 vezes em concurso material, no período compreendido entre 08/10/2009 e a presente data, do delito de lavagem de capitais, previsto no art. 1º c/c o art. 1º § 4º, da Lei nº 9.613/98. Na sentença, o Juízo de origem entendeu pela aplicação de crime único para todos os atos narrados na denúncia, porque praticados no mesmo contexto e desdobramento. Apela o Ministério Público Federal postulando sejam computados 3 atos, assim compreendidas a aquisição, a reforma e a decoração do triplex 164-A, porquanto, segundo entende, seriam condutas autônomas e não meramente complementares. Não merece acolhida a pretensão ministerial. A decisão de primeiro grau bem examinou a questão: 892. Do montante da propina acertada no acerto de corrupção, cerca de R$ 2.252.472,00, consubstanciado na diferença entre o pago e o preço do apartamento triplex (R$ 1.147.770,00) e no custo das reformas (R$ 1.104.702,00), foram destinados como vantagem indevida ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 893. A atribuição a ele de um imóvel, sem o pagamento do preço correspondente e com fraudes documentais nos documentos de aquisição, configuram condutas de ocultação e dissimulação aptas a caracterizar crimes de lavagem de dinheiro. 894. A manutenção do imóvel em nome da OAS Empreendimentos, entre 2009 até pelo menos o final de 2014, ocultando o proprietário de fato, também configura conduta de ocultação apta a caracterizar o crime de lavagem de dinheiro. 895. A agregação de valor ao apartamento, mediante a realização de reformas dispendiosas, mantendo-se o mesmo tempo oculta a titularidade de fato do imóvel e o beneficiário das reformas, configura igualmente conduta de ocultação apta a caracterizar o crime de lavagem de dinheiro. 896. Embora sejam condutas de ocultação e dissimulação talvez singelas, a sofisticação não constitui elemento necessário à caracterização do crime de lavagem de dinheiro (a complexidade não é inerente ao crime de lavagem, conforme precedente do RHC 80.816/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma do STF, un., j. 10/04/2001). (...) 903. O crime de lavagem deve ser considerado como único já que abrange condutas que se prolongaram no tempo e que se complementam, como as fraudes documentais nos documentos de aquisição do imóvel, a manutenção do imóvel em nome da OAS Empreendimentos, a agregação de valores ao imóvel através da reformas com ocultação do real beneficiário pela manutenção do imóvel em nome da OAS Empreendimentos. Com efeito, muito embora a lavagem envolva várias práticas que, em si, pareçam distintas e autônomas, assiste razão ao magistrado de origem em considerá-las como ato único, porque efetivamente inserem-se no mesmo contexto de ocultação e dissimulação, notadamente pela compreensão de que se escancara a inconsistência entre a diferença entre o preço pago pela família do ex-Presidente e o valor final do apartamento, nele incluídas as adaptações, benfeitorias e mobiliário. Ainda que de execução parcelada, não vejo desígnios autônomos em cada um desses estágios da empreitada criminosa, pois todos eles levaram, em síntese, ao https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 267 de 317 incremento do valor do imóvel. Nessa perspectiva, a mescla de valores lícitos (pagamento do apartamento tipo) com ilícitos (diferença de preço do triplex e incrementos mediante reforma e fornecimento de mobiliário) constituem crime de lavagem de dinheiro, porque orientados à ocultação ou à dissimulação. Como demonstrou o conjunto probatório, houve a intenção deliberada de 'ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal', compreendido todo o imóvel, como revelam todas as tratativas. É nítido, como desvendado, que o produto da corrupção constitui-se na totalidade dos gastos despendidos pela OAS. E esse, por consequência, é o fruto do crime antecedente entregue, e, igualmente e na sua totalidade, o objeto do branqueamento. Nesse sentido, a propósito, segue o parecer ministerial em segundo grau: 'não se está a negar que a aquisição, a reforma e a decoração ocorreram em momentos distintos, contudo não se pode conceber que sejam três atos de lavagem, pois, como já dito, estão inseridos dentro de um mesmo contexto criminoso' (fl. 31). 3.4.2.10. Com relação aos acusados PAULO ROBERTO VALENTE GORDILHO, FÁBIO HORI YONAMINE e ROBERTO MOREIRA FERREIRA, foram eles absolvidos do crime de lavagem de dinheiro envolvendo a ocultação e dissimulação da titularidade do apartamento 164-A, triplex, e do beneficiário das reformas realizadas, por falta de prova suficiente do agir doloso (art. 386, VII, do CPP). Postula o Ministério Público Federal a reforma da sentença para que sejam condenados pela imputação, fixando-se a pena em patamar acima do mínimo legal, considerando a elevada negativação das circunstâncias do art. 59 do Código Penal. Não vejo razões para modificar as conclusões do juízo de primeiro grau. Não há prova acima de dúvida razoável de que os mesmos soubessem que recursos advindos de outra infração penal estavam sendo utilizados para o custeio das reformas. Neste ponto específico, tenho que decidiu acertadamente o magistrado singular, em decisão lançada nas seguintes tintas (evento 948): 914. Sem que haja melhor prova de que os executivos tinham ciência de que a manutenção do imóvel indevidamente em nome da OAS Empreendimentos e de que a realização das reformas com ocultação do real beneficiário tinham origem em um acerto de corrupção, não podem eles responder por crimes de lavagem. 915. Não reputo aqui pertinente as construções em torno da doutrina da cegueira deliberada no crime de lavagem dinheiro e da responsabilização por dolo eventual, pois elas também exigem a presença de um contexto que torne pelo menos de elevada probabilidade o conhecimento da origem criminosa dos recursos utilizados em uma transação de lavagem. Considerando as peculiaridades do caso, com o repasse da vantagem indevida através de negócios imobiliários, é possível que tenham cogitado outras hipóteses razoáveis para justificar as ordens recebidas de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, até mesmo de que se tratava de um presente do Grupo OAS para o exPresidente. 916. Essa conclusão não se altera pelo fato dos depoimentos em Juízo não aparentarem ter sido totalmente verdadeiros, especialmente no caso de Fábio Hori Yonamine, já que podem ter sido motivados apenas por um receio equivocado de autoincriminação. 917. Portanto, por falta de prova do dolo, devem ser absolvidos Paulo Roberto Valente Gordilho, Roberto Moreira Ferreira e Fábio Hori Yonamine. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 268 de 317 Para a caracterização do crime de lavagem de dinheiro não basta que o agente tenha ciência da origem ilícita do objeto ocultado. É imprescindível a percepção de que a sua atuação decorra da intenção dolosa de praticar um dos verbos nucleares do tipo penal e que tal ação seja praticada com o objetivo de ocultar ou dissimular a utilização dos bens, direitos ou valores provenientes dos crimes antecedentes. Nessa perspectiva, não há prova acima de dúvida razoável de que PAULO ROBERTO VALENTE GORDILHO, FÁBIO HORI YONAMINE e ROBERTO MOREIRA FERREIRA participaram do crime antecedente ou de que tinham ciência da origem ilícita dos recursos e da forma como o negócio jurídico seria finalizado. A circunstância de se tratarem de executivos do grupo não tem aptidão para, por si só, resultar na suas responsabilizações criminais. Pelo caderno probatório, concluise que as tratativas para assunção da obra pela BANCOOP foram capitaneadas por LÉO PINHEIRO e as reformas de adaptação do imóvel realizadas por sua conta e ordem. Os apelados eram meros subordinados na empreitada. Como bem apontado no parecer ministerial em segundo grau, 'de fato, o contexto probatório não se mostrou suficiente a demonstrar que Paulo Gordilho, Fábio Yonamine e Roberto Moreira tinham ciência de que o apartamento seria parte do pagamento de propina oriunda de contratos da Petrobrás, razão pela qual não merece acolhida o recurso ministerial nesse ponto'. Por essas razões, no ponto, não merece ser provido o recurso ministerial, mantendo-se a absolvição de PAULO ROBERTO VALENTE GORDILHO, FÁBIO HORI YONAMINE e ROBERTO MOREIRA FERREIRA. 3.5. DO PRESIDENCIAL CUSTEIO DO ARMAZENAMENTO DO ACERVO Narra a denúncia que LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, PAULO TARCISO OKAMOTTO e JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, em comunhão de esforços, praticaram os crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro. Diz o Ministério Público Federal que os acusados são responsáveis por 61 (sessenta e uma) condutas correspondentes ao pagamento da locação de espaço na empresa Granero Transportes para armazenamento do acervo do ex-Presidente entre os anos de 2011 e 2016. Refere a inicial acusatória o pagamento de vantagem indevida ao réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA pela Construtora OAS no total de R$ 1.313.747,00, por determinação de LÉO PINHEIRO, como decorrência dos crimes antecedentes praticados contra a Administração Pública. A empreitada teria contado com a participação de PAULO OKAMOTTO. A prova carreada aos autos não conduz ao juízo condenatório. A proposta comercial da Granero foi encaminhada a PAULO OKAMOTTO - assim como outros documentos -, indicando a sua participação nos eventos e sua atuação https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 269 de 317 como representante do Instituto Lula (evento 3, COMP268, COMP273 e COMP274). Sequer há controvérsia com relação a isso. O contrato foi firmado diretamente entre a Construtora OAS e a Granero (evento 3, COMP269). Não se questiona a relação jurídica entre as contratantes, bem como não há dúvida de que o material armazenado pertence ao ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. A controvérsia reside na existência ou não dos crimes de lavagem de dinheiro, na forma imputada na inicial acusatória. Pois bem. A sentença analisou com precisão as provas acostadas aos autos e as respectivas consequências jurídicas. Para evitar tautologia, reporto-me ao consignado pelo juízo de primeiro grau: 920. Com efeito, foram colhidas provas documentais de que parte dos bens do acervo presidencial do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando de sua retirada do Palácio do Planalto, foi armazenada em depósito da empresa Granero Transportes Ltda. e de que os custos deste armazenamento, de R$ 1.313.747,24, foram arcados pelo Grupo OAS. 921. Consta que, em 22/10/2010, a empresa Granero emitiu orçamento a pedido do acusado Paulo Tarciso Okamoto para armazenagem dos bens pertencentes a Luiz Inácio Lula da Silva, tendo ele sido aceito em 27/12/2010. (evento 3, comp268, comp273 e comp274) 922. Apesar disso, o contrato de armazenagem, com valor mensal de R$ 21.536,84, foi celebrado, em 01/01/2011, entre a Construtora OAS e a Granero (evento 3, comp269). 923. Segundo o MPF, o real propósito do contrato foi ocultado, pois nele constou que o objeto seria a 'armazenagem de materiais de escritório e mobiliário corporativa de propriedade da Construtora OAS Ltda.'. 924. Até a rescisão do contrato, em 15/04/2016, o custo do serviço teria sido de R$ 1.313.747,24 e teria sido arcado pela OAS, como se verifica nas notas fiscais (evento 3, comp270 a comp272). 925. Após a rescisão, a Granero teria feito a entrega dos bens para pessoas indicadas por Paulo Tarciso Okamoto, estando eles no momento na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC em São Bernardo do Campo (evento 3, comp285). 926. Não há muita controvérsia sobre os fatos, mas somente sobre a interpretação deles. 927. Não há nenhuma dúvida quanto à importância cultural e histórica da preservação do acervo presidencial. A oitiva de várias testemunhas nesse sentido, arroladas pela Defesa de Paulo Tarciso Okamotto, foi desnecessária. 928. A situação é, portanto, um pouco diferente da que envolve o apartamento 164-A, triplex, já que ali os recursos do Grupo OAS foram destinados especificamente ao enriquecimento sem causa e pessoal do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 929. Inegável, porém, que houve irregularidades no armazenamento do acervo presidencial. 930. O procedimento mais apropriado seria que a OAS formalizasse o apoio dado à conservação do acervo presidencial em um contrato escrito ou que disponibilizasse os recursos financeiros ao Instituto Lula, por doação, para que este celebrasse o contrato com a Granero e efetuasse os pagamentos. 931. De todo modo, não há provas suficientes de que essas irregularidades tenham sido praticadas com intenção criminosa ou que fizeram parte de um acerto de corrupção. 932. Emerson Granero, da Granero Transportes, foi ouvido como testemunha (evento 604) e descreveu todo o processo de contratação, confirmando que a Construtora OAS contratou a Granero para armazenagem do acervo presidencial. 933. No que se refere ao contrato celebrado, alegou que era uma minuta padrão e que decorreu de um equívoco a descrição dos bens como pertencentes à OAS e não constituindo o acervo presidencial: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 270 de 317 'Ministério Público Federal:- Exato, porque os senhores fizeram um contrato de armazenagem e depois de receber o material da transportadora 5 Estrelas, que veio, como os senhores mesmos afirmaram, acompanhado de conhecimento de transporte e inventário, então eu pergunto para o senhor, o senhor tinha conhecimento quando o contrato foi feito de armazenagem que era um contrato de armazenagem de bens do acervo do ex-presidente? Emerson Granero:- Sim. Ministério Público Federal:- Certo. Então por que no contrato de armazenagem dessa parte seca constou material de escritório da Construtora OAS? Emerson Granero:- Foi uma desatenção nossa, uma falta de cuidado nossa, exclusivamente nossa, porque não nos atentamos que isso significaria aí uma, quanto ao objeto, realmente foi uma desatenção nossa. Ministério Público Federal:- Certo. Nesse contrato com valor de 21 mil reais por mês, pagos ao longo de mais de 5 anos, não se notou esse erro quanto ao objeto, quanto ao serviço que estava sendo prestado, ao que era guardado? Emerson Granero:- Nós sempre esperávamos que esse contrato fosse rescindido aí em poucos meses, e depois, quando ele foi ficando, realmente ninguém internamente percebeu que ali haveria um possível equívoco, que seria um problema para a nossa empresa, realmente ninguém se atentou a isso internamente. Ministério Público Federal:- Certo. O senhor disse que antes de elaborar esse segundo contrato, perdão, que se dividiu em contrato de armazenagem para a parte climatizada e para a parte seca, foi feito um primeiro contrato que englobava as duas partes de armazenagem, correto? Emerson Granero:- O primeiro contrato a que me referi era justamente a proposta assinada, que para nós tem um peso de contrato, talvez eu tenha me expressado mal, era uma proposta assinada pelo senhor Paulo Okamotto que para nós já tinha força de contrato firmado, foi isso que eu quis me referir. Ministério Público Federal:- Perfeito. E nessa proposta, que para o senhor tem valor de contrato, estava escrito que era material da OAS ou estava escrito que era acervo do ex-presidente? Emerson Granero:- Estava escrito que eram bens ou acervo, não me recordo em detalhe, mas sim, fazia menção ao ex-presidente Lula. Ministério Público Federal:- E por que não se usou o contrato padrão, como o senhor disse, que foi usado na segunda vez? Emerson Granero:- Não, da primeira vez não foi um contrato, foi um orçamento comercial, que assinado tem força de contrato, na segunda vez nós utilizamos um contrato padrão de sistema, são duas folhas, é um contrato padrão de armazenagem, nós tínhamos isso para diversos clientes, é um contrato padrão, que só muda quando é pessoa física e quando é pessoa jurídica, eu entendo a questão do equívoco, mas não tem nada além disso.' 934. Por outro lado, o próprio acusado JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, Presidente do Grupo OAS, que confessou a prática do crime de corrupção e lavagem em relação ao apartamento 164-A, triplex, do Condomínio Solaris, negou, em Juízo, que os pagamentos pelo Grupo OAS da armazenagem do acervo presidencial estivessem envolvidos em algum acerto de corrupção. Transcreve-se: 'Juiz Federal:- Vamos à segunda parte da denúncia, relativamente aqui, segundo o Ministério Público, que a empresa OAS teria arcado com o transporte e armazenagem de bens pertencentes ao ex-presidente junto à empresa Granero Transportes Ltda., o senhor se envolveu nesse episódio? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Sim. O Paulo Okamotto me chamou no Instituto Lula em dezembro, novembro de 2010, no último ano de mandato do presidente, e me disse que havia uma intenção do presidente de construir, de viabilizar um museu, na época ele me falou que chamaria 'Museu da Democracia', contando toda a história da democracia brasileira após a ditadura militar, e que o presidente tinha recebido ao longo do período dele no cargo diversas condecorações, diversas coisas que não seriam de uso pessoal, mas que fariam https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 271 de 317 parte do acervo desse museu, se eu poderia arcar com esse armazenamento e fazer os pagamentos, e eu autorizei, a empresa fez um contrato com a Granero e nós pagamos isso durante alguns 2 ou 3 anos, aproximadamente. Juiz Federal:- Certo. E isso tem algo a ver, uma relação com aquela conta geral com o Vaccari? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, isso foi uma deliberação minha por não se tratar de uma coisa pessoal, por se tratar de uma coisa que ia para um museu, eu não achei conveniente misturar essas coisas. Juiz Federal:- Então para esses pagamentos o senhor não entende que havia alguma espécie de ilicitude ou vantagem indevida envolvida? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Eu achei que não, e continuo achando que não. Juiz Federal:- Certo. Foi solicitada alguma contrapartida, algum benefício à empresa por conta desse pagamento da Granero? JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Não, diretamente não, é claro que nós tínhamos uma intenção porque eu já tinha conhecimento do que o presidente pretendia fazer quando saísse da presidência e assumisse o instituto, e nós tínhamos muito interesse em estreitar mais ainda essas relações sobretudo por causa do mercado internacional.' 935. As declarações do acusado, de que não vislumbrou ilicitude ou que não houve débito da conta geral de propinas, afastam o crime de corrupção. A parte final, com a menção de que o pagamento tinha por propósito o estreitamento de laços, não basta para caracterizar corrupção, uma vez que não envolveu pagamento em decorrência do cargo presidencial ou de acertos envolvendo contratos públicos. 936. As declarações de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO soam críveis. Considerando sua manifesta intenção de colaborar, não se vislumbra por qual motivo admitiria a prática de um crime de corrupção e negaria o outro. Caso sua intenção fosse mentir em Juízo em favor próprio e do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, negaria ambos os crimes. Caso a intenção fosse mentir em Juízo somente para obter benefícios legais, afirmaria os dois crimes. Considerando que a sua narrativa envolvendo o apartamento triplex encontra apoio e corroboração em ampla prova documental, é o caso de igualmente dar-lhe crédito em seu relato sobre o armazenamento do acervo presidencial. 937. Assim, apesar das irregularidades no custeio do armazenamento do acervo presidencial, não há prova de que ele envolveu um crime de corrupção ou de lavagem, motivo pelo qual devem ser absolvidos desta imputação o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Paulo Tarciso Okamoto e JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. Ao final, os denunciados foram absolvidos das imputações, por 'falta de prova suficiente da materialidade (art. 386, VII, do CPP)' (itens 939 e 940). 3.5.1. Do recurso ministerial quanto ao acervo presidencial Postula o Ministério Público Federal as condenações de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e de PAULO OKAMOTTO. As respectivas defesas pleiteiam a modificação do fundamento legal da absolvição, para que passe a constar que o fato não constitui crime. O cotejo entre os documentos e os depoimentos de LÉO PINHEIRO e do representante da Empresa Granero Ltda. não traz prova acima de dúvida razoável para um juízo condenatório. Emerson Granero, ouvido em juízo, afirmou que a incorreção no objeto do contrato decorreu de falha da própria empresa, que fez uso de um modelo de instrumento no qual constava 'material de escritório'. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 272 de 317 A documentação inicial encaminhada pela armazenadora atesta a veracidade das afirmações. A proposta traz expressa referência ao lote 2, destinado a 'Mídias de áudio compõem o acervo político, cultural e pessoal' (fl. 14). Some-se a isso o inventário assinado por PAULO OKAMOTTO, no qual há referência a bens outros, que não material de escritório (evento 3, COMP268). O próprio LÉO PINHEIRO, representante da Construtora OAS e responsável por autorizar a negociação e os pagamentos do armazenamento, afirmou que nenhuma contrapartida foi exigida e que a decisão de custear o projeto para o futuro despertou seu interesse. Disse, ainda, que os valores pagos não tiveram como origem o caixa de propinas alimentado pelos contratos firmados com a Petrobras. Tal declaração afasta inclusive a tese de que o custeio do armazenamento decorra do mesmo caixa único da OAS, alimentado para pagamento de agentes públicos e financiamento de partidos políticos. Como bem ponderou o magistrado de origem, a palavra de LÉO PINHEIRO deve ser interpretada tanto para fortalecer outros elementos que indiquem a condenação, quanto para atestar a ausência de responsabilidade criminal dos réus. De fato, inexiste vinculação do armazenamento presidencial com os demais fatos apurados na presente ação penal. Quando muito, poder-se-ia falar em irregularidade de natureza civil ou administrativa, o que desborda dos limites da responsabilização criminal. Muito embora se pudesse dizer que a dissimulação seja inerente aos crimes de branqueamento de capitais, em especial envolvendo contratos com aparência de legalidade, tal premissa não é capaz de modificar a compreensão de que crime de lavagem não se trata. Assim, não merece provimento o recurso interposto pelo Ministério Público Federal, sendo impositiva a manutenção da absolvição dos denunciados JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e PAULO TARCISO OKAMOTTO dos crimes de corrupção ativa e passiva e de lavagem de dinheiro pelo armazenamento do acervo presidencial. 3.5.2. Dos recursos dos réus para modificação do fundamento da absolvição 3.5.2.1. As defesas de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e de PAULO OKAMOTTO requerem a reforma da sentença para que se faça constar que os fatos relacionados ao acervo presidencial não constituem crime (art. 386, III, Código de Processo Penal), haja vista a possibilidade de a iniciativa privada custear o armazenamento de bens havidos por ex-Presidentes da República. Em cognição sumária, o tema foi apreciado pela 8ª Turma no HC nº 5042023-62.2016.4.04.0000/PR, impetrado pela defesa de PAULO OKAMOTTO, que https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 273 de 317 pretendia o trancamento da ação penal. A ordem foi por maioria denegada e o acórdão lavrado nos seguintes dizeres: PENAL. PROCESSO PENAL. 'OPERAÇÃO LAVA-JATO'. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXCEPCIONALIDADE. LAVAGEM DE DINHEIRO. ATIPICIDADE POR AUSÊNCIA DE DOLO. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO. IN DUBIO PRO SOCIETATE. DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. O trancamento do inquérito policial ou do processo penal, por meio da impetração de habeas corpus, é medida excepcional, restrita a situações que se reportem a conduta nãoconstitutiva de crime em tese, ou quando já estiver extinta a punibilidade, ou, ainda, se inocorrentes indícios mínimos da autoria (HC 87.293, rel. Ministro Eros Grau; HC 85.740, rel. Ministro Ricardo Lewandowski; HC 85.134, rel. Ministro Marco Aurélio; e HC 87.310, HC 91.005 e RHC 88.139, rel. Carlos Aires Britto). 2. Não evidenciada de plano e de forma inequívoca a atipicidade da conduta narrada na inicial e imputada ao paciente, porquanto dependente de instrução, mostra-se inviável o trancamento da ação penal pela via excepcional do habeas corpus. 3. Quando da realização do juízo de admissibilidade da denúncia, tem lugar o princípio in dubio pro societate, sendo desnecessária a obtenção de juízo de certeza acerca da autoria delitiva e do dolo do agente, questões que serão solucionadas no decorrer do processo. 4. Ordem de habeas corpus denegada. (TRF4, HABEAS CORPUS Nº 5042023-62.2016.404.0000, 8ª Turma, minha relatoria, por maioria, juntado aos autos em 24/11/2016). Nada obstante a chancela ao prosseguimento da ação penal, nenhuma incoerência se constata em comparação ao superveniente juízo absolutório. Vale lembrar que os estágios são bastante diversos e que não há como, na 'fase incipiente da ação penal, incursionar em aspectos que prescindem de instrução, como, por exemplo, a natureza do contrato de armazenamento e a ciência do paciente com relação à eventual procedência ilícita (dolo) dos valores pagos pela Construtora OAS Ltda' (item 4. do voto do referido habeas corpus). Tal clareza a respeito dos fatos somente se modificou justamente em razão da instrução do feito, como no caso do depoimento de Emerson Granero perante a autoridade judicial e do aprofundamento sobre as provas. Quando do recebimento da denúncia, porém, o prosseguimento da persecução penal era compatível com os elementos inerentes àquela fase. Nessa linha de conta, não se pode desmerecer uma ou outra decisão; nem a de recebimento de denúncia, nem a que absolveu os denunciados. Nesse exato sentido, aliás, se posicionou o Superior Tribunal de Justiça ao julgar o RHC nº 80.087, interposto por PAULO TARCISO OKAMOTTO ao registrar que 'havendo elementos mínimos de materialidade e autoria, é necessário prosseguir na instrução da ação penal para se concluir, ao final, pela atipicidade ou não da conduta, sendo inviável o trancamento do processo criminal pela via excepcional do Habeas Corpus'. 3.5.2.2. Ultrapassada essa breve contextualização, tenho que não merecem ser conhecidos os recursos defensivos quanto ao ponto. Explico. O art. 577, parágrafo único, do Código de Processo Penal sujeita o conhecimento do recurso à existência de interesse na reforma ou modificação da decisão: Art. 577. O recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público, ou pelo querelante, ou pelo réu, seu procurador ou seu defensor. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 274 de 317 Parágrafo único. Não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver interesse na reforma ou modificação da decisão. A respeito do tema, Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal comentado - 10ª edição - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 988) leciona: 22. Interesse recursal: trata-se de um dos pressupostos subjetivos (ver nota 26 ao art. 578, § 3º, CPP) para a admissibilidade dos recursos. É natural que a parte somente poderá provocar o reexame da matéria já decidida por determinado órgão, remetendo o feito à instância superior, quando eventual modificação da decisão lhe trouxer algum tipo de benefício. Recorrer por recorrer é algo inútil, constitutivo de obstáculo à economia processual, além do que o Judiciário é voltado à solução de conflitos e não simplesmente a proferir consultas ou esclarecer questões puramente acadêmicas. 23. Interesse na modificação da fundamentação da sentença: como regra, não se reconhece interesse para a parte que deseje, apenas, alterar os fundamentos tomados pelo julgador para proferir determinada decisão. Nesse caso, seria completamente inútil reavaliar-se a questão, se o dispositivo da sentença permanecer inalterado. Entretanto, caso a fundamentação produza efeito conseqüencial concreto no direito da parte, é possível o recurso. Vale citar, ainda, o escólio de Júlio Fabbrini Mirabete (Código Penal Interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 1412): 'Pressuposto lógico do recurso é a existência de uma decisão, objetivando sua reforma. Assim, em princípio, o exercício do direito de recorrer está subordinado à existência de um interesse direto na reforma ou modificação do despacho ou sentença. Tem interesse apenas aquele que teve seu direito lesado pela decisão, mas é facultativo e denominado recurso voluntário. É um ônus processual que, desatendido, pode acarretar conseqüências desfavoráveis. É do interesse do recurso que nasce a sucumbência, que se caracteriza como a desconformidade entre o que a parte pediu e o que ficou decidido. Esse prejuízo deve ser resultante da parte dispositiva da decisão, da conclusão da sentença impugnada e não de seus motivos ou fundamentos. Também não há interesse quando a decisão impugnada não é suscetível de ocasionar prejuízo ao acusado, isto é, quando não tiver interesse na reforma ou modificação da decisão (art. 577, parágrafo único). O art. 66 do Código de Processo Penal traz orientação fundamental para o deslinde da questão. Confira-se: Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato. Em outra medida, dispõe o art. 935 do Código Civil que a decisão no juízo criminal sobre a existência do fato ou sobre quem seja seu autor é inquestionável no juízo cível. Assim: Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. Em conclusão, apenas haverá interesse recursal na alteração do fundamento absolutório com o objetivo de salvaguardar os denunciados de eventuais repercussões na esfera cível, o que somente é possível nos casos de reconhecimento de inexistência do fato ou de negativa de autoria (art. 386, incisos I e IV). https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 275 de 317 Nas demais hipóteses, por conseguinte, a decisão criminal não evitará repercussões extrapenais, motivo pelo qual carece o réu de interesse para apelar. Em reforço, colaciono os seguintes precedentes deste Tribunal Regional Federal: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 3º, II, DA LEI Nº 8.137/90. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SOLICITAR OU RECEBER VANTAGEM PARA DEIXAR DE LANÇAR OU COBRAR TRIBUTO. IN DUBIO PRO REO. ABSOLVIÇÃO. MODIFICAÇÃO DO FUNDAMENTO LEGAL DA SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. 1. (...). 3. Não há interesse recursal na modificação do fundamento legal da sentença absolutória, sobretudo quando a pretensão é formulada independentemente de qualquer consideração acerca da utilidade prática de tal providência ou de eventual prejuízo decorrente da manutenção da decisão tal como proferida. (...). (TRF4, APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001817-94.2008.404.7009, 8ª Turma, Des. Federal Leandro Paulsen, por unanimidade, D.E. 17/07/2015, publicação em 20/07/2015). PENAL E PROCESSO PENAL. INTERESSE RECURSAL. REDUÇÃO À CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO (ARTIGO 149 DO CÓDIGO PENAL). PROVA. DOSIMETRIA. 1. Não se conhece do recurso de apelação quando não há interesse do réu em alterar o fundamento da absolvição, ou quando a punibilidade foi extinta pela prescrição da pretensão punitiva. 2. (...). (TRF4, APELAÇÃO CRIMINAL E RECURSO CRIMINAL EM SENTIDO ESTRITO Nº 0006203-97.2008.404.7000/PR, 7ª Turma, Des. Federal Márcio Antônio Rocha, por unanimidade, d.e. 05/10/2017, publicação em 06/10/2017). 3.5.2.3. Ora, as razões para alteração do fundamento jurídico, não possuem aptidão para impactar o conteúdo declaratório da absolvição. Exceto por aspectos psicológicos elevados ao desejo de justiça, mas, nessa medida, estranhos ao ofício criminal e ao interesse jurídico recursal, não há utilidade decorrente de eventual modificação do fundamento legal da absolvição ou sobre hipotéticos prejuízos resultantes da manutenção da sentença absolutória como proferida. Por esses motivos, não tenho como evidenciado o interesse recursal na modificação do fundamento legal para a absolvição, pelo que não se conhece dos recursos interpostos por LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e PAULO TARCISO OKAMOTTO que objetivam a modificação do fundamento da absolvição. 3.5.2.4. Igualmente não merece ser conhecido o recurso de PAULO TARCISO OKAMOTTO no que busca a devolução de todo o material apreendido e 'a exclusão da sentença dos termos ofensivos aos advogados'. Com relação ao primeiro pedido, diga-se que a questão é estranha ao juízo recursal, devendo ser formulada junto ao juízo de primeiro grau, a quem cabe avaliar a necessidade ou não dos materiais apreendidos para outras investigações, sendo que, somente após, inaugura-se a competência desta Corte para exame da matéria. Quanto ao segundo, é bom que se diga que foi lançado isoladamente ao final da peça recursal, dissociado, porém, de fundamentação. De toda a maneira, para não passar in albis, reproduzo da sentença o seguinte excerto: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 276 de 317 149. Apesar do disposto nos tópicos anteriores quanto às medidas processuais questionáveis tomadas pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva contra o ora julgador e ainda quanto ao comportamento processual inadequado dela e ainda da Defesa de Paulo Tarciso Okamotto, cumpre ressalvar que estes fatos não afetam a imparcialidade deste Juízo. 150. Cabe decidir a responsabilidade dos acusados somente com base na lei e nas provas, sendo irrelevante o comportamento processual de seus defensores. 151. Ilustrativamente, o juízo é absolutório em relação a Paulo Tarciso Okamotto e isso apesar do comportamento inadequado do defensor. 152. Em qualquer caso, em relação a essas medidas processuais questionáveis e ao comportamento processual inadequado, vale a regra prevista no art. 256 do CPP ('a suspeição não poderá ser declarada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo para criá-la'). Não passa despercebido que a controvérsia diz respeito à eventual suspeição do julgador. Nesse aspecto, o requerimento é silente, pois deixa de contextualizar o fato. De qualquer maneira, posteriormente à publicação da sentença, não houve qualquer insurgência ou pedido de esclarecimento pela via dos embargos de declaração perante a própria autoridade competente, pelo que inviável o seu enfrentamento em sede recursal. 4. DA DOSIMETRIA DA PENA A legislação pátria adotou o critério trifásico para fixação da pena, a teor do disposto no art. 68 do Código Penal. A pena-base atrai o exame da culpabilidade do agente (decomposta no art. 59 do Código Penal nas circunstâncias do crime) e em critérios de prevenção. Não há, porém, fórmula matemática ou critérios objetivos, 'pois a dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena' (HC 107.409/PE, 1.ª Turma do STF, Rel. Min. Rosa Weber, un., j. 10.4.2012, DJe-091, 09.5.2012). É no juízo subjetivo de reprovação que reside a censurabilidade que recai sobre a conduta. Nesse sentido lecionam ZAFFARONI e PIERANGELI que 'a medida da pena-base indica o grau de culpabilidade, e que as considerações preventivas permitem fixá-las abaixo desse máximo (...). A culpabilidade abarcará tanto os motivos (é inquestionável que a motivação é problema da culpabilidade), como as circunstâncias e conseqüências do delito (que podem compor também o grau do injusto que, necessariamente, reflete-se no grau de culpabilidade). (...) A personalidade do agente cumpre uma dupla função: com relação à culpabilidade, serve para indicar - como elemento indispensável - o âmbito de autodeterminação do agente. Insistimos aqui ser inaceitável a culpabilidade de autor. A maior ou menor 'adequação' da conduta ao autor, ou 'correspondência' com a personalidade deste, em nenhum caso pode fundamentar uma maior culpabilidade, e, no máximo, deve servir para baixar a pena do máximo que a culpabilidade de ato permite, que é algo diferente' (ZAFFARONI, Eugenio Raúl; e PIERANGELI, José Henrique. in Manual de Direito Penal Brasileiro, Parte Geral. RT, p. 832/833). Na lição de NIVALDO BRUNONI: '... a pena quando da sua determinação tem a exclusiva função de retribuição da culpabilidade, pois ela, em essência, reflete uma reprovação'. Arremata o autor: 'a pena deve corresponder a magnitude da culpabilidade revelada no caso concreto, cuja aferição será realizada com base nas condições pessoais https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 277 de 317 do autor e nas circunstâncias concomitantes, dentre as quais os motivos, as conseqüências e o comportamento da vítima'. (in Princípio da culpabilidade. Curitiba: Juruá, 2008, p. 325). Ademais, entendo que não cabe à instância recursal rever a pena quando fixada em parâmetros legais, razoáveis e adequados pelo primeiro grau de jurisdição, substituindo a discricionariedade do juiz pela do Tribunal. Cabe, portanto, à Corte de Apelação não a tarefa de rever a integralidade das penas, mas somente a legalidade dos critérios e corrigir excessos ou insuficiências manifestas. É importante reforçar, também, que a pena traduz a medida da culpabilidade do agente. É por ela que o julgador verifica seu comportamento e estabelece a dose de reprovação estatal. A pena deve ser entendida como um todo, sendo as balizadoras do art. 59 do Código Penal apontes gerais para a apreciação judicial. Nessa perspectiva, o juízo recursal não está restrito à análise individualizada procedida em sentença a respeito de cada um dos vetores do art. 59 do Código Penal, cabendo a ele, por exemplo, rever e readequar de forma fundamentada a valoração da pena-base. Tal proceder, mesmo que inexista recurso ministerial e desde que não acarrete o aumento global da reprimenda, não representa reformatio in pejus. Nesse sentido, os precedentes da 4ª Seção que seguem: REVISÃO CRIMINAL. MOEDA FALSA. DOSIMETRIA. SÚMULA 444 DO STJ. REAPRECIAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. READEQUAÇÃO. REFORMATIO IN PEJUS. INEXISTÊNCIA. (...). 3. Descrito e fundamentado pelo Magistrado singular o porquê de exasperar a pena-base, pode, a Segunda Instância readequar as vetoriais, sem que isso acarrete reformatio in pejus. (TRF4, REVISÃO CRIMINAL Nº 0002708-83.2014.404.0000, 4ª SEÇÃO, Juíza Federal Salise Monteiro Sanchotene, por unanimidade, D.E. 08/08/2014, publicação em 12/08/2014). PENAL. PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CORRUPÇÃO PASSIVA MAJORADA. COMPETÊNCIA. TIPICIDADE. REFORMATIO IN PEJUS. INOCORRÊNCIA. RECURSO DE APELAÇÃO. EXTENSÃO. CONTRADIÇÃO E ERRO MATERIAL. CORREÇÃO. (...). 4. Em se tratando de fatos que são considerados conjuntamente para a aplicação da pena definitiva, seja pelo concurso formal, seja pelo agravamento de um deles com a absorção do outro, a aferição da non reformatio in pejus deve considerar a pena final aplicada, e não aquelas individualmente fixadas em fases anteriores da dosimetria (AgREsp 1267357, Sebastião Reis, 6ª T., j. 4.6.13; HC 181014, Sebastião Reis, 6ª T., j. 7.5.13; HC 180585, Laurita Vaz, 5ª T., j. 19.2.13; HC 189018, Og Fernandes, 6ª T., j. 18.12.12). (...). (TRF4, Embargos De Declaração em ENUL Nº 0005009-82.2006.404.7016, 4ª Seção, Juiz Federal José Paulo Baltazar Junior, por unanimidade, D.E. 05/02/2014, publicação em 06/02/2014). Devolvida a matéria ao órgão recursal, é possível, por exemplo, a alteração para menor - ou mesmo a supressão no caso de ilegalidade - de uma ou de outra vetorial e o acréscimo da parcela subtraída equivalente a outra circunstância judicial do art. 59 do CP, desde que, repita-se, não seja extrapolada a pena fixada em primeiro grau. Das razões https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 278 de 317 de decidir do AgREsp 1.267.357 (Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis), extrai-se idêntica conclusão: Da mesma forma, não ocorreu a reformatio in pejus, unicamente porque a situação do agravante não foi alterada para pior, ou seja, a pena fixada na origem foi mantida, apesar da alteração do fundamento promovida pelo decisum agravado (fls. 471/479). No caso, a reformatio in pejus deve considerar o total da pena aplicada, não se vinculando o novo juízo à pena-base adotada anteriormente, ficando este impedido apenas de agravar a situação do réu (HC n. 181.014/DF, da minha relatoria, Sexta Turma, DJe 16/5/2013). Em linhas gerais, o principal vetor é a culpabilidade. Ou, nas palavras de Aníbal Bruno, é natural que a grandeza da culpabilidade venha a ser um dos dados mais influentes da mensuração da pena (Direito Penal, t. III, Forense, 1984, p. 156), e isto não se modificou com a adoção da teoria finalista da ação. É lição antiga que 'não é somente de interesse comum que não se comentam crimes, mas que sejam mais raros na proporção do mal que fazem à sociedade. Assim, os obstáculos, que separam os homens dos crimes, devem ser mais fortes quando os crimes se mostrem mais prejudiciais para o bem público e na proporção dos estímulos que, para eles, impelem os homens. Deve existir, por isso, uma proporção entre os crimes e as penas' (BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Trad. Vicente Sabino Júnior. São Paulo : CD, 2002, p. 87). Como explica Luciano Anderson de Souza: A culpabilidade, consoante Reale Júnior (2009, p. 406), é o critério básico e principal na fixação da pena. Ela é, no geral, entendida pela doutrina em termos de culpabilidade normativa, isto é, importando tanto o exame de reprovabilidade do ato como o de seu autor. Cuida-se de um elemento de determinação ou medição de pena, mensurado a partir da censurabilidade pessoal da conduta injusta. Assim, não é a culpabilidade enquanto elemento do crime, mas esse conceito se liga, pois se atrela à sua medição para aferir quão reprovável foi a conduta criminosa. Imputabilidade, consciência potencial da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa por certo têm de estar presentes mas, neste momento de fixação da pena, o julgador verifica os detalhes concretos de tais pressupostos, isto é, considerações como maturidade do agente, consciência efetiva da ilicitude e possibilidades efetivas de ações diversas no momento do crime, tudo para fins de fixação do quantum da pena acima do mínimo (in Código Penal Comentado, coord. Reale Júnior, Miguel. São Paulo : Saraiva, 2017, pp. 195-6) . Firmados esses pressupostos, passo à individualização das penas. 4.1. Da pena do réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA 4.1.1. O réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA foi condenado pela prática de (a) um crime de corrupção passiva do art. 317 do CP, com a causa de aumento na forma do §1º do mesmo artigo, pelo recebimento de vantagem indevida do Grupo OAS em decorrência de contratos do Consórcio CONEST/RNEST com a Petrobras; e (b) por um crime de lavagem de dinheiro do art. 1º, caput, inciso V, da Lei n.º 9.613/1998, envolvendo a ocultação e dissimulação da titularidade do apartamento 164-A, triplex, incluídas as reformas realizadas, com a pena aplicada com os seguintes fundamentos (evento 948): 948. Luiz Inácio Lula da Silva https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 279 de 317 Para o crime de corrupção ativa: Luiz Inácio Lula da Silva responde a outras ações penais, inclusive perante este Juízo, mas sem ainda julgamento, motivo pelo qual deve ser considerado como sem antecedentes negativos. Conduta social, motivos, comportamento da vítima são elementos neutros. Circunstâncias devem ser valoradas negativamente. A prática do crime corrupção envolveu a destinação de dezesseis milhões de reais a agentes políticos do Partido dos Trabalhadores, um valor muito expressivo. Além disso, o crime foi praticado em um esquema criminoso mais amplo no qual o pagamento de propinas havia se tornado rotina. Consequências também devem ser valoradas negativamente, pois o custo da propina foi repassado à Petrobrás, através da cobrança de preço superior à estimativa, aliás propiciado pela corrupção, com o que a estatal ainda arcou com o prejuízo no valor equivalente. A culpabilidade é elevada. O condenado recebeu vantagem indevida em decorrência do cargo de Presidente da República, ou seja, de mandatário maior. A responsabilidade de um Presidente da República é enorme e, por conseguinte, também a sua culpabilidade quando pratica crimes. Isso sem olvidar que o crime se insere em um contexto mais amplo, de um esquema de corrupção sistêmica na Petrobras e de uma relação espúria entre ele o Grupo OAS. Agiu, portanto, com culpabilidade extremada, o que também deve ser valorado negativamente. Tal vetorial também poderia ser enquadrada como negativa a título de personalidade. Considerando três vetoriais negativas, de especial reprovação, fixo, para o crime de corrupção passiva, pena de cinco anos de reclusão. Reduzo a pena em seis meses pela atenuante do art. 65, I, do CP. Não cabe a agravante pretendida pelo MPF do art. 62, II, 'a', uma vez que seria bis in idem com a causa de aumento do §1º do art. 317 do CP. Tendo havido a prática de atos de ofício com infração do dever funcional, itens 886-891, aplico a causa de aumento do §1º do art. 317 do CP, elevando-a para seis anos de reclusão. Fixo multa proporcional para a corrupção em cento e cinquenta dias multa. Considerando a dimensão dos crimes e especialmente renda declarada de Luiz Inácio Lula da Silva (evento 3, comp227, cerca de R$ 952.814,00 em lucros e dividendos recebidos da LILS Palestras só no ano de 2016), fixo o dia multa em cinco salários mínimos vigentes ao tempo do último ato criminoso que fixo em 06/2014. Para o crime de lavagem: Luiz Inácio Lula da Silva responde a outras ações penais, inclusive perante este Juízo, mas sem ainda julgamento, motivo pelo qual deve ser considerado como sem antecedentes negativos. Conduta social, motivos, comportamento da vítima são elementos neutros. Circunstâncias devem ser consideradas neutras, uma vez que a lavagem consistente na ocultação do real titular do imóvel e do real beneficiário das reformas não se revestiu de especial complexidade. A culpabilidade é elevada. O condenado ocultou e dissimulou vantagem indevida recebida em decorrência do cargo de Presidente da República, ou seja, de mandatário maior. A responsabilidade de um Presidente da República é enorme e, por conseguinte, também a sua culpabilidade quando pratica crimes. Isso sem olvidar que o crime se insere em um contexto mais amplo, de um esquema de corrupção sistêmica na Petrobras e de uma relação espúria entre ele o Grupo OAS. Agiu, portanto, com culpabilidade extremada, o que também deve ser valorado negativamente. Considerando uma vetorial negativa, de especial reprovação, fixo, para o crime de lavagem, pena de quatro anos de reclusão. Reduzo a pena em seis meses pela atenuante do art. 65, I, do CP. Não há causas de aumento ou de diminuição. Não se aplica a causa de aumento do § 4º do art. 1º da Lei n.º 9.613/1998, pois se trata de um único crime de lavagem, sem prática reiterada. Quanto à prática da lavagem por intermédio de organização criminosa, os atos de lavagem ocorreram no âmbito da OAS Empreendimentos e não no âmbito do grupo criminoso organizado para lesar a Petrobrás. Fixo multa proporcional para a lavagem em trinta e cinco dias multa. Considerando a dimensão dos crimes e especialmente renda declarada de Luiz Inácio Lula da Silva (evento 3, comp227, cerca de R$ 952.814,00 em lucros e dividendos recebidos da LILS Palestras só no ano de 2016), fixo o dia multa em cinco salários mínimos vigentes ao tempo do último ato criminoso que fixo em 12/2014. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 280 de 317 Entre os crimes de corrupção e de lavagem, há concurso material, motivo pelo qual as penas somadas chegam a nove anos e seis meses de reclusão, que reputo definitivas para o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Quanto às multas deverão ser convertidas em valor e somadas. Considerando as regras do art. 33 do Código Penal, fixo o regime fechado para o início de cumprimento da pena. A progressão de regime fica, em princípio, condicionada à reparação do dano nos termos do art. 33, §4º, do CP. Insurge-se o Ministério Público Federal, em relação à dosimetria, quanto (i) às sanções-base fixadas, argumentando que devem ser majoradas em razão da negativação de vetoriais do art. 59 do CP, como personalidade, conduta social, motivos, circunstâncias e consequências do crime, bem como a culpabilidade deve ser mais severamente agravada na vetorial; (ii) a não aplicação da agravante do art. 61, II, 'b', do Código Penal. A defesa, por sua vez, recorre alegando que (i) a pena-base do delito deve ser fixada no mínimo legal, uma vez que sua culpabilidade não excede àquela já prevista para o crime de corrupção passiva e é inviável majorar a sanção pelo mero cargo que ocupava; (ii) é primário de bons antecedentes, sendo exemplar sua conduta social; (iii) não há circunstâncias judiciais concretas a majorar a pena-base do delito de lavagem de dinheiro; (iv) as reprimendas deveriam ser aumentadas em, no máximo, 1/6 por circunstância judicial; (v) a atenuante reconhecida na sentença, art. 65, I, do Código Penal, deve operar redução na segunda fase em 1/6, podendo conduzir a pena abaixo do mínimo legal; (vi) deve ser excluída a causa de aumento do § 1º do art. 317 do Código Penal, pois não há ato de ofício decorrente de suposta vantagem ou promessa; (vii) a pena de multa deve ser fixada no mínimo legal assim como reduzido o valor do dia-multa; (viii) deve ser fixado o regime inicial aberto para início de cumprimento de pena. 4.1.2. Para o crime de corrupção passiva, o Código Penal estabelece pena que varia entre 2 (dois) e 12 (doze) anos de reclusão e multa. Regra geral, a culpabilidade é quem deve guiar a dosimetria da pena, decomposta na legislação brasileira por algumas vetoriais previstas no art. 59 do Código Penal, em nome de circunstâncias. A negativação ou não de algumas delas deve influir no quantum a ser fixado, sem olvidar que a culpabilidade em si mesmo, como difundido doutrinariamente (Brunoni e Zaffaroni), é quem melhor guia o aplicar da pena. Postula o Ministério Público Federal a majoração da pena para que sejam exacerbadas as seguintes vetoriais: (a) personalidade, porque, sinteticamente, 'inexistente a consciência social, assim como irrefutável a má índole daquele que, de maneira recorrente e significativa, desvia dinheiro público'; (b) conduta social, porque o sujeito que se vale de relevante posição social e/ou profissional para cometer delitos, com motivações torpes e egoísticas, deve tê-la valorada negativamente, não se podendo considerá-la neutra; (c) motivos, haja vista que, para além do lucro fácil, 'os crimes de corrupção e lavagem de capitais possuíam a motivação, também, de manutenção de funcionamento do esquema delituoso, tanto no que tange à atuação do cartel, no âmbito da PETROBRAS, quanto em relação à governabilidade e perpetuação no poder do partido governista, possibilitada por meio da distribuição de cargos entre partidos políticos objetivando a formação da base aliada e a arrecadação de fundos para campanhas políticas. Funcionamento este não só em favor dos acusados, mas também em detrimento da Estatal'; (d) circunstâncias, em razão da sofisticação e duração do esquema https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 281 de 317 de corrupção, além do elevado valor que resultou desviado da Petrobras; e (e) consequências, diante da elevada danosidade para a sociedade e prejuízos significativos à credibilidade das instituições públicas. Tenho que o recurso ministerial merece provimento parcial. No caso em exame, trata-se de ex-Presidente da República que recebeu valores em decorrência da função que exercia e do esquema de corrupção que se instaurou durante o exercício do mandato, com o qual se tornara tolerante e beneficiário. É de lembrar que a eleição de um mandatário, em particular o Presidente da República, traz consigo a esperança de uma população em um melhor projeto de vida. Críticas merecem, portanto, todos aqueles que praticam atos destinados a trair os ideais republicanos, sem descuidar, por óbvio, que a corrupção aqui tratada está inserida em um contexto muito mais amplo e, assim, de efeitos perversos e difusos. A culpabilidade, de fato, é elevada. Apesar de o lucro fácil ser inerente aos crimes de patrimônio, não se pode ignorar, com o que se colheu neste processo e nas mais de duas dezenas de conexos já julgados por esta Corte, o sofisticado esquema de fraude a licitações da Petrobras, perpetrados por empresas que agiam de modo cartelizado, escolhendo obras em detrimento do processo licitatório, na forma de 'clube', com o pagamento de propinas a vários diretores e gerentes da estatal petrolífera, além de recursos carreados a partidos políticos e agentes políticos. Tais fatos não se deram ao arrepio da vontade do governante maior, mas, com maior gravosidade, pela nomeação do Conselho de Administração e demais dirigentes da Petrobras, como se deu no episódio da indicação de Paulo Roberto Costa. Este mecanismo - de similaridade com o chamado caso do Mensalão acabou por fragilizar não apenas o funcionamento hígido da Petrobras, mas todo o processo político brasileiro. E aqui, a motivação do crime extrapola os reflexos pessoais. A par de vantagens em benefício próprio, censuráveis e graves não somente os bilhões de reais desviados, mas também a colocação em xeque da própria estabilidade democrática em razão de um sistema eleitoral severamente comprometido. Tais aspectos não podem ser ignorados. Infelizmente, e reafirme-se, infelizmente, está sendo condenado um exPresidente da República, mas que praticou crime e pactuou, direta ou indiretamente, com a concretização de tantos outros, o que indica a necessidade de uma censura acima daquela que ordinariamente se firmaria na dosagem da reprimenda. Sustenta o parquet acertadamente: Assim, neste caso, em que se julga um dos maiores esquemas de corrupção já descobertos no País, com o envolvimento de um ex-Presidente da República, a desconsideração de qualquer uma de suas particularidades, que contribuem exatamente para conferir aos crimes a sua magnitude deletéria, representa deixar desprotegida a sociedade que nos cabe escudar. Passemos, então, à análise das circunstâncias, em que o Ministério Público apresenta uma irresignação geral. Não foram reconhecidas circunstâncias negativas e, mesmo as reconhecidas, implicaram um pequeno aumento de pena, especialmente quando se https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 282 de 317 considera que a faixa de variação de pena da corrupção vai de 2 a 12 anos, isto é, é de 10 anos. A quantidade que cada circunstância negativa deve aumentar a pena deve guardar proporcionalidade com essa faixa de 10 anos de variação de pena, e não somente com o montante da pena mínima, sob pena de se derrogar, na prática, a pena máxima e seu significado. Se, até o presente julgamento, para praticamente nenhum dos condenados a pena foi fixada sequer em seu grau médio (no caso, 7 anos), tenho que no presente caso esse limite deve ser no mínimo atingido (o que, aliás, ainda é uma aplicação bastante tímida das vetoriais do art. 59 do CP). Certamente a maior reprovabilidade da conduta sobressai da alta posição que o réu ocupava no sistema republicano. Ademais, a sofisticação do esquema criminoso, o longo e articulado iter criminis, os diversos mecanismos utilizados para alcance dos seus desideratos, o engenhoso procedimento para que os recursos fossem desviados rumo aos cofres de partidos políticos e de diversos agentes que davam sustentação ao esquema, estão a justificar um incremento na pena-base. A consciência da ilicitude de sua conduta, sua condição pessoal de, então, Presidente da República, afora o elevado domínio sobre toda a cadeia delitiva, optando em dela fazer parte no lugar de atuar para debelá-la, como lhe exigia o cargo, são condições que importam em especial e elevadíssima reprovabilidade. As consequências dos delitos também devem ser negativas, uma vez que boa parte dos valores foram utilizados para deturpar o processo político eleitoral e, nessa perspectiva, vulnerar o próprio estado democrático de direito, pois milhões de reais foram objeto de doações eleitorais ilícitas, fragilizando o equilíbrio na disputa eleitoral. Corroboram esta assertiva, portanto, a negativação da vetorial culpabilidade, somada à negativação da vetorial consequências do delito, dado o elevado valor milionário recebido para aquisição de unidade residencial em balneário do litoral, com os seus implementos de reformas, instalação de elevador, mobiliário e utensílios, bem como do gigantesco prejuízo causado pelo esquema de corrupção sistêmica instaurado na Petrobras. As circunstâncias, como destacado na sentença e nas afirmativas anteriores, igualmente merecem ser negativadas. Por essas razões, devem ser computadas como negativas a culpabilidade, as circunstâncias, os motivos e as consequências do crime, majorando-se a pena-base para 7 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão. Ressalte-se que não há, neste momento inicial da dosimetria, como quer a defesa, tarifação com relação a cada uma das circunstâncias negativas, com anotado introdutoriamente, de maneira que improcedente a consideração de apenas 1/6 para cada vetorial. Incide em favor do réu a atenuante prevista no art. 65, I, do Código Penal, em face de ter atingido idade superior a 70 anos ao tempo da sentença, motivo pelo qual reduzo a pena em um sexto, quedando-se em 6 (seis) anos e 3 (três) meses de reclusão. Não merece trânsito a pretensão ministerial de incidência de agravante do art. 61, II, b, do Código Penal. Internamente, o crime de corrupção teve por objetivo assegurar e facilitar a execução do ajuste fraudulento de licitação. O dinheiro servia para https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 283 de 317 comprar a lealdade dos diversos agentes que atuavam nesse complexo sistema. Na verdade, o objetivo criminoso, para além do enriquecimento pessoal, teve por finalidade a manutenção de um sistema político de cooptação de aliados e partidos políticos, com o desvio de recursos da Petrobras para diferentes destinatários. Todavia, não vejo como aplicar tal agravante, na medida em que ela se confunde com a causa especial de aumento de pena, como reconheceu o magistrado singular. Incide a causa especial de aumento de pena prevista no art. 317, § 1º, do Código Penal, vez que o crime fora cometido com infração a dever funcional, na medida em que o réu dava suporte ao esquema de corrupção com a indicação e nomeação de agentes públicos, devendo a pena deve ser exasperada em um terço, elevando-a para 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. Por todos esses fundamentos e pela elevada culpabilidade decomposta no art. 59 do Código Penal, não prospera a redução da pena abaixo do mínimo legal. Da mesma forma não tem amparo a interpretação que permitiria a redução da pena, na segunda fase, abaixo do mínimo legal. No tocante à pena de multa, resultando a pena corporal em grau acima do médio, deve a sanção pecuniária, proporcionalmente, ficar em patamar superior à metade da previsão do art. 44 do CP (185 dias-multa), motivo pelo qual arbitro em 230 diasmulta, ao valor unitário de cinco salários mínimos, vigentes ao tempo do último ato criminoso (06/2014), como o fez o magistrado singular, atendendo ao disposto no art. 60 do Código Penal. Quanto às condições econômicas do réu, a declaração de imposto de renda do apenado (evento 3, comp227) revela ter recebido cerca de R$ 952.814,00 em lucros e dividendos recebidos da LILS Palestras apenas no ano de 2016). 4.1.3. Para o crime de lavagem de dinheiro, a Lei nº 9.613/98 estabelece pena que varia entre 3 (três) e 10 (dez) anos de reclusão e multa. Reporto-me aqui, no que coincidente, aos fundamentos para a majoração da pena-base para o crime de corrupção. Postula o Ministério Público Federal a majoração da pena-base pela negativação das circunstâncias e consequências. Dentre as razões, porque os envolvidos se utilizaram de vários estratagemas para branqueamento, em um esquema de lavagem que perdurou por anos. O juízo de primeiro grau já considerou a elevada culpabilidade do réu, no que não merece reparos a sentença pelos fundamentos lá expressos. De fato, trata-se, o réu, de ex-Presidente da República que recebeu valores em decorrência da função que exercia e do esquema de corrupção que se instaurou durante o exercício do mandato, com o qual se tornara tolerante e beneficiário. É de lembrar que a eleição de um mandatário, em particular o Presidente da República, traz consigo a esperança de uma população em um melhor projeto de vida. Portanto, merece provimento o recurso ministerial para considerar como negativas, além da culpabilidade, as circunstâncias e as consequências do delito, majorando a pena-base para 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 284 de 317 No restante, a pena deve ser reduzida em 1/6 pela atenuante do art. 65, I, do CP. Não há causas de aumento ou de diminuição. Não se aplica a causa de aumento do § 4º do art. 1º da Lei n.º 9.613/1998, pois se trata de um único crime de lavagem, sem prática reiterada. Quanto à prática da lavagem por intermédio de organização criminosa, os atos de lavagem ocorreram no âmbito da OAS Empreendimentos e não no âmbito do grupo criminoso organizado para lesar a Petrobras. Desse modo, a pena final para o crime de lavagem de dinheiro resulta em 3 (três) anos e 9 (nove) meses de reclusão. A multa é proporcional à pena corporal, ficando estabelecida em 50 (cinquenta) dias-multa. Considerando a dimensão dos crimes e especialmente a renda declarada de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA (evento 3, comp227, cerca de R$ 952.814,00 em lucros e dividendos recebidos da LILS Palestras só no ano de 2016), fixo o dia multa em cinco salários mínimos vigentes ao tempo do último ato criminoso que fixo em 12/2014. 4.1.4. Diante do concurso material entre as condutas, as sanções resultam em 12 (doze) anos e 01 (um) mês de reclusão e 280 (duzentos e oitenta) dias-multa. 4.1.5. O regime inicial de cumprimento de pena é o fechado, na forma do art. 33 do Código Penal, combinado com seu parágrafo segundo, alínea a, do mesmo diploma. A progressão fica condicionada à reparação dos danos, por força de determinação legal, prevista no § 4º do referido artigo. 4.2. Da pena do réu JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO 4.2.1. Restou, neste processo, o réu JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO condenado pelos crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro. Na sentença a dosimetria da pena foi assim estabelecida: 946. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO Para o crime de corrupção ativa: JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO já foi condenado criminalmente por este Juízo em mais de uma ação penal, mas sem trânsito em julgado, motivo pelo qual os antecedentes negativos não serão aqui considerados. Conduta social, motivos, comportamento da vítima são elementos neutros. Circunstâncias devem ser valoradas negativamente. A prática do crime de corrupção envolveu a destinação de dezesseis milhões de reais a agentes políticos do Partido dos Trabalhadores, um valor muito expressivo. Além disso, o crime foi praticado em um esquema criminoso mais amplo no qual o pagamento de propinas havia se tornado rotina. Consequências também devem ser valoradas negativamente, pois o custo da propina foi repassado à Petrobrás, através da cobrança de preço superior à estimativa, aliás propiciado pela corrupção, com o que a estatal ainda arcou com o prejuízo no valor equivalente. Personalidade ou culpabilidade devem ser valorados negativamente, pois não é possível ignorar que parte da propina foi destinada ao então Presidente da República, o que é revelador de ousadia criminosa. Considerando três vetoriais negativas, de especial reprovação, fixo, para o crime de corrupção ativa, pena de cinco anos de reclusão. Reputo compensada a atenuante da confissão com a agravante do art. 62, I, do CP. Não cabe a agravante pretendida pelo MPF do art. 62, II, 'a', uma vez que seria bis in idem com a causa de aumento do §1º do art. 317 do CP. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 285 de 317 Tendo havido a prática de atos de ofício com infração do dever funcional, itens 886-891, aplico a causa de aumento do parágrafo do art. 333 do CP, elevando-a para seis anos e oito meses de reclusão. Fixo multa proporcional para a corrupção em cento e cinquenta dias-multa. Considerando a dimensão dos crimes e especialmente a capacidade econômica de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, ex-Presidente do Grupo OAS, fixo o dia multa em cinco salários mínimos vigentes ao tempo do último ato criminoso que fixo em 06/2014. Para o crime de lavagem: José Adelmário Pinheiro Filho já foi condenado criminalmente por este Juízo em mais de uma ação penal, mas sem trânsito em julgado, motivo pelo qual os antecedentes negativos não serão aqui considerados. Conduta social, motivos, comportamento da vítima são elementos neutros. Circunstâncias devem ser consideradas neutras, uma vez que a lavagem consistente na ocultação do real titular do imóvel e do real beneficiário das reformas não se revestiu de especial complexidade. Personalidade ou culpabilidade devem ser valorados negativamente, pois não é possível ignorar que a lavagem envolveu a ocultação de produto de corrupção destinada ao então Presidente da República, o que é revelador de ousadia criminosa. Considerando uma vetorial negativa, de especial reprovação, fixo, para o crime de lavagem, pena de quatro anos de reclusão. Reputo compensada a atenuante da confissão com a agravante do art. 62, I, do CP. Não há causas de aumento ou de diminuição. Não se aplica a causa de aumento do §4º do art. 1º da Lei n.º 9.613/1998, pois se trata de um único crime de lavagem, sem prática reiterada. Quanto à prática da lavagem por intermédio de organização criminosa, os atos de lavagem ocorreram no âmbito da OAS Empreendimentos e não no âmbito do grupo criminoso organizado para lesar a Petrobrás. Fixo multa proporcional para a lavagem em sessenta dias multa. Considerando a dimensão dos crimes e especialmente a capacidade econômica de José Adelmário Pinheiro Filho, ex-Presidente do Grupo OAS, fixo o dia multa em cinco salários mínimos vigentes ao tempo do último ato criminoso que fixo em 12/2014. Entre os crimes de corrupção e de lavagem, há concurso material, motivo pelo qual as penas somadas chegam a dez anos e oito meses de reclusão, que reputo definitivas para José Adelmário Pinheiro Filho. Quanto às multas deverão ser convertidas em valor e somadas. Considerando as regras do art. 33 do Código Penal, fixo o regime fechado para o início de cumprimento da pena. Insurge-se o Ministério Público Federal, em relação à dosimetria da pena, quanto (i) às sanções-base fixadas, argumentando que devem ser majoradas em razão da negativação de vetoriais do art. 59 do CP, como personalidade, conduta social, motivos, circunstâncias e consequências do crime; e (ii) a não aplicação da agravante do art. 61, II, 'b', do Código Penal. Aduz a defesa que JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO prestou efetiva colaboração para a apuração dos crimes narrados na denúncia, postulando (i) a manutenção, por tal razão, dos benefícios excepcionais concedidos pelo magistrado de primeiro grau com base no art. 1º, § 5º da Lei nº 9.613/98; (ii) a redução das penas para os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro ao mínimo legal; e (iii) o afastamento da obrigação de reparação do dano, porque descaracterizado prejuízo à Petrobras ou, alternativamente, a exclusão da correção monetária e juros (evento 11). Entendo, todavia, que as penas estabelecidas em sentença estão adequadas e proporcionais aos delitos praticados, razão pela qual devem ser preservadas. Assim, para o crime de corrupção ativa, mantenho as penas em 06 (seis) anos e 08 (oito) meses e 150 (cento e cinquenta) dias-multa. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 286 de 317 Quanto ao crime de lavagem de dinheiro, preservo as sanções em 04 (quatro) anos de reclusão e 60 (sessenta) dias-multa. Diante do concurso material entre as condutas, as sanções resultam em 10 (dez) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 210 (duzentos e dez) dias-multa. 4.3. MEDEIROS Da pena do réu AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES O apelante AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS foi condenado pela prática do crime previsto no art. 333 do Código Penal, combinado com seu parágrafo único, com a dosimetria firmada na sentença da seguinte forma: Para o crime de corrupção ativa: Agenor Franklin Magalhães Medeiros já foi condenado criminalmente por este Juízo em uma ação penal, mas sem trânsito em julgado, motivo pelo qual os antecedentes negativos não serão aqui considerados. Conduta social, motivos, comportamento da vítima são elementos neutros. Circunstâncias devem ser valoradas negativamente. A prática do crime de corrupção envolveu a destinação de dezesseis milhões de reais a agentes políticos do Partido dos Trabalhadores, um valor muito expressivo. Além disso, o crime foi praticado em um esquema criminoso mais amplo no qual o pagamento de propinas havia se tornado rotina. Consequências também devem ser valoradas negativamente, pois o custo da propina foi repassado à Petrobrás, através da cobrança de preço superior à estimativa, aliás propiciado pela corrupção, com o que a estatal ainda arcou com o prejuízo no valor equivalente. Personalidade ou culpabilidade devem ser valorados negativamente, pois não é possível ignorar que parte da propina foi destinada ao então Presidente da República, com o conhecimento do condenado, o que é revelador de ousadia criminosa. Considerando três vetoriais negativas, de especial reprovação, fixo, para o crime de corrupção ativa, pena de cinco anos de reclusão. Reconheço a atenuante da confissão e reduzo a pena para quatro anos e seis meses de reclusão. Não cabe a agravante pretendida pelo MPF do art. 62, II, 'a', uma vez que seria bis in idem com a causa de aumento do §1º do art. 317 do CP. Tendo havido a prática de atos de ofício com infração do dever funcional, itens 886-891, aplico a causa de aumento do parágrafo único do art. 333 do CP, elevando-a para seis anos de reclusão. Fixo multa proporcional para a corrupção em cento e cinquenta dias multa. Considerando a dimensão dos crimes e especialmente a capacidade econômica de Agenor Franklin Magalhães Medeiros, ex-Diretor do Grupo OAS, fixo o dia multa em cinco salários mínimos vigentes ao tempo do último ato criminoso que fixo em 06/2014. Tendo em vista que as vetoriais do art. 59 do Código Penal não são favoráveis ao condenado, ao contrário são de especial reprovabilidade, com três vetoriais negativas de especial reprovação, fixo, com base no art. 33, §3º, do Código Penal, o regime inicial fechado para o cumprimento da pena. Sobre o tema, precedente do Supremo Tribunal Federal: 'A fixação do regime inicial de cumprimento da pena não está condicionada somente ao quantum da reprimenda, mas também ao exame das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, conforme remissão do art. 33, § 3º, do mesmo diploma legal.' (HC 114.580/MS - Rel. Min. Rosa Weber - 1ª Turma do STF - por maioria - j. 23/04/2013) Insurge-se o Ministério Público Federal, em relação à dosimetria da pena, quanto (i) às sanções-base fixadas, argumentando que devem ser majoradas em razão da negativação de vetoriais do art. 59 do CP, como personalidade, conduta social, motivos, https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 287 de 317 circunstâncias e consequências do crime; (ii) a não aplicação da agravante do art. 61, II, 'b', do Código Penal. A defesa, por sua vez, sustenta que devem ser mantidos os benefícios que lhe foram concedidos na sentença, pois sua colaboração foi efetiva, contudo, em razão de já ter passado um bom tempo em regime fechado em decorrência de sua prisão preventiva, o mais justo seria iniciar o cumprimento de sua pena em regime semiaberto, o qual ficaria limitado a dois anos, com progressão para o aberto, independentemente do total das penas unificadas e da reparação do dano. Entendo, todavia, que a pena-base estabelecida em sentença está adequada e proporcional ao delito praticado, razão pela qual deve ser preservada. Aplico, no entanto, a redução pela atenuante da confissão no patamar de 1/6, nos moldes em que procedi quanto ao corréu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, o que faço de ofício. Assim, a sanção provisória resulta em 04 (quatro) anos e 02 (dois) meses. Incidente a causa de aumento do parágrafo único do art. 333 do CP, a pena é elevada para 05 (cinco) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 130 (cento e trinta) dias-multa. 4.4. Do benefício concedido em favor dos réus JOSÉ ADELMÁRIO e AGENOR MEDEIROS 4.4.1. As penas antes referidas seriam definitivas. Todavia, concedeu-se aos condenados JOSÉ ADELMÁRIO e AGENOR MEDEIROS benefícios decorrentes da colaboração que realizaram nestes autos, cujo teor é semelhante para ambos os réus, in verbis: Pretende a Defesa de (...) o reconhecimento da colaboração do condenado com a Justiça e, por conseguinte, a redução da pena em 2/3 e a modulação da pena para regime mais favorável. O MPF, em alegações finais, concordou que houve colaboração, requerendo redução da pena pela metade. Observo que, considerando os processos no âmbito da assim denominada Operação Lavajato, a colaboração de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO foi tardia, quando o esquema criminoso já havia sido revelado por outros. Foi somente após a condenação na ação penal 5083376-05.2014.4.04.7000 que, aparentemente, o condenado decidiu mudar sua postura processual. O problema maior em reconhecer a colaboração é a falta de acordo de colaboração com o MPF. A celebração de um acordo de colaboração envolve um aspecto discricionário que compete ao MPF, pois não serve à persecução realizar acordos com todos os envolvidos no crime, o que seria sinônimo de impunidade. Cabe também ao MPF avaliar se os ganhos obtidos com a colaboração, como a qualidade da prova providenciada pelo colaborador, justificam o benefício concedido ao criminoso. Por envolver elemento discricionário, salvo casos extremos, não cabe, princípio, ao Judiciário reconhecer benefício decorrente de colaboração se não for ela precedida de acordo com o MPF na forma da Lei nº 12.850/2013. No caso, porém, o próprio MPF concordou com a concessão de benefícios, com o que o óbice foi minorado. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 288 de 317 Ainda que tardia e sem o acordo de colaboração, é forçoso reconhecer que o condenado JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO contribuiu, nesta ação penal, para o esclarecimento da verdade, prestando depoimento e fornecendo documentos. Envolvendo o caso crimes praticados pelo mais alto mandatário da República, não é possível ignorar a relevância do depoimento de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. Sendo seu depoimento consistente com o restante do quadro probatório, especialmente com as provas documentais produzidas e tendo ele, o depoimento, relevância probatória para o julgamento, justifica-se a concessão a ele de benefícios legais. Observa-se ainda que a colaboração ainda que tardia também foi realizada em outros processos, como na ação penal 5022179-78.2016.4.04.7000. A concessão de benefícios, porém, esbarra em questões práticas. JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO já foi condenado criminalmente em duas outras ações penais, especificamente nas aludidas ações penais 5083376-05.2014.4.04.7000 e 5022179-78.2016.4.04.7000 e ainda responde a outras ações penais perante este Juízo. De nada adianta conceder o benefício isolado, reduzindo ou mesmo perdoando a pena neste feito, quanto ele já está condenado a penas elevadas em outros processos. Questões novas demandam soluções novas e é muito mais apropriado que o Juízo das ações penais resolva essas questões do que o Juízo da Execução, a quem caberia a unificação das penas, visto que ele, apesar de sua qualidade profissional, não acompanhou os casos penais e não conhece com profundidade a culpabilidade ou a relevância da colaboração para os casos julgados. Assim e considerando, cumulativamente, a elevada culpabilidade do condenado, o papel relevante dele no esquema criminoso, a colaboração tardia, a consistência do depoimento com as provas documentais dos autos, a relevância do depoimento para o julgamento deste feito, é o caso de não impor ao condenado, como condição para progressão de regime, a completa reparação dos danos decorrentes do crime, e admitir a progressão de regime de cumprimento de pena depois do cumprimento de dois anos e seis meses de reclusão no regime fechado, isso independentemente do total de pena somada, o que exigiria mais tempo de cumprimento de pena. O período de pena cumprido em prisão cautelar deverá ser considerado para detração. Esclareça-se que se tem aqui por parâmetros as penas previstas no acordo de colaboração de Marcelo Bahia Odebrecht, Presidente da Odebrecht, e que praticou crimes em condições materiais e pessoais similares a JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. Observa-se que os dispositivos do § 5º, art. 1º, da Lei n.º 9.613/1998, e o art. 13 da Lei n.º 9.807/1999, permitem a concessão de amplos benefícios, como perdão judicial, redução de pena ou modulação de regime de cumprimento da pena, a réus colaboradores. O benefício deverá ser estendido, pelo Juízo de Execução, às penas unificadas nos demais processos julgados por este Juízo. Como as condenações e penas das ações penais 5083376-05.2014.4.04.7000 e 502217978.2016.4.04.7000 já foram submetidas ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, a efetiva concessão do benefício acima mencionado fica condicionado à sua confirmação expressa por aquela Corte de Apelação, o que deve ser a ela pleiteado pela Defesa. A confirmação expressa do benefício pela Corte de Apelações é uma questão relativamente óbvia, já que os atos deste Juízo estão sempre sujeitos à revisão por ela, mas deixo isso expresso para que não se afirme que se está a invadir competência alheia. A concessão do benefício fica ainda condicionada à continuidade da colaboração, apenas com a verdade dos fatos em todos os outros casos criminais em que o condenado for chamado a depor. Caso constatado, supervenientemente, falta de colaboração ou que o condenado tenha faltado com a verdade, o benefício deverá ser cassado. Caso supervenientemente seja celebrado eventual acordo de colaboração entre o Ministério Público Federal e o condenado, as penas poderão ser revistas. Apela o Ministério Público Federal no ponto, argumentando que: (a) tais benefícios não podem ser ampliados a processos cuja jurisdição de primeiro grau já se encerrou; (b) somente são aplicáveis ao crime de lavagem de dinheiro; (c) o mais https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 289 de 317 adequado é tão somente a redução da pena pela metade (1/2); e (d) em relação ao regime inicial de cumprimento, o mais correto é a aplicação do previsto no art. 33 do Código Penal. As defesas pugnam pela manutenção dos benefícios na integralidade, como concedido na sentença. Pois bem. 4.4.2. Inicialmente, tenho que não assiste razão ao Ministério Público Federal no ponto em que sustenta a incidência do permissivo legal do §5º do art. 1º da Lei nº 9.613/98, com redação dada pela Lei nº 12.683/2012, apenas ao crime de lavagem de dinheiro. A questão é relevante na medida em que ao réu AGENOR foi imputado somente o crime de corrupção ativa. Não se pode ignorar, porém, que a sua conduta está diretamente relacionada ao conjunto de práticas delitivas que incluem a lavagem de dinheiro, realizada pelo corréu LÉO PINHEIRO. Afora o contido na lei especial de branqueamento de capitais, posteriormente à Lei nº 9.613/98, sobreveio a Lei nº 9.807/99 que, em seu arts. 13 e 14, dispõe: Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I - a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada; III - a recuperação total ou parcial do produto do crime. Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso. Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um a dois terço Trata-se de benefício genérico, mas de matiz semelhante àquele previsto na lei de lavagem de dinheiro, diferenciando-se pela inexigência de que o colaborador tenha participado dos crimes de branqueamento, motivo pelo qual, por fundamento na lei posterior, deve-se reconhecer também o benefício em favor do réu AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS. Ainda que não equiparáveis as situações de JOSÉ ADELMÁRIO e AGENOR MEDEIROS com a de Marcelo Bahia Odebrecht, este último réu colaborador em ajuste homologado pelo E. Supremo Tribunal Federal, a previsão contida no art. 1º, § 5º da Lei nº 9.613/98 não pode virar letra morta, já que o legislador ordinário tratou de benefício diverso da colaboração premiada e que com ela não se confunde. Não cabe ao intérprete, nessa perspectiva, limitar a salutar criação de incentivo à colaboração com a Justiça. Até mesmo por essa razão, a benesse deve https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 290 de 317 repercutir nos demais crimes praticados pelo agente quando apurados no mesmo contexto criminoso e, em especial, no tocante aos crimes antecedentes aos de lavagem de dinheiro. Como anotado pelo Superior Tribunal de Justiça, 'o art. 1º, § 5º, da Lei n. 9.613/1998, contempla hipótese de colaboração premiada que independe de negócio jurídico prévio entre o réu e o órgão acusatório (colaboração premiada unilateral) e que, desde que efetiva, deverá ser reconhecida pelo magistrado, de forma a gerar benefícios em favor do réu colaborador' (RESP 201402100978, SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, STJ SEXTA TURMA, DJE DATA:09/10/2017). A par disso, certamente o acordo de colaboração premiada tem maior abrangência, em particular quando homologado por Órgão Jurisdicional Superior. O benefício previsto na Lei de Lavagem de Dinheiro é mais contido que aquele estampado na Lei das Organizações Criminosas e com essa orientação deve ser concedido. Assim, tendo LÉO PINHEIRO e AGENOR efetivamente colaborado a conclusão jurídica a respeito dos fatos é atribuição exclusiva do juízo. A condenação por crimes diversos da lavagem de dinheiro não obstaculiza a concessão do benefício. 4.4.3. Por outro lado, tenho que os benefícios, nos termos em que aplicados em sentença, extrapolam a previsão legal. O artigo em questão assim prevê: § 5º A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime. (destaquei) O magistrado de origem concedeu aos réus o afastamento da necessidade de completa reparação dos danos decorrentes do crime e admitiu a progressão de regime após o cumprimento de 2 anos (para AGENOR) e de 2 anos e 6 meses (para LÉO PINHEIRO) de reclusão em regime fechado, independentemente do total de pena somada em relação a condenação deste e dos demais feitos mencionados. A questão apresentada nestes autos é nova e complexa, na medida em que a Lei nº 9.613/98 não traz solução específica para a hipótese de multiplicidade de processos a que responde um único réu, em diversas jurisdições. Porém, parece-me claro que não pode o benefício concedido nestes autos aplicar-se para feitos outros, alguns inclusive já julgados em segundo grau. Devem as partes, em acordo de colaboração formal, requerer a concessão do benefício em cada um dos processos a que respondem, segundo as diferentes jurisdições onde se acham. É certo que esta solução importa em complexidades, porque o condenado-colaborador estará sujeito a diferentes juízos e diferentes representantes do Ministério Público. Todavia, este é um ônus que se sujeita aquele que cometeu múltiplos crimes em múltiplos lugares. Por isso, com razão o Ministério Público Federal ao recorrer pela necessidade de submissão da pretensão do benefício em cada um dos processos individualmente, não sendo possível a emissão de orientação geral aos juízos dos outros https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 291 de 317 processos, nem mesmo ao da execução das penas, sobre benefícios exclusivamente endoprocessuais. 4.4.4. Considerando a relevante contribuição de LÉO PINHEIRO e de AGENOR MEDEIROS, nesta ação penal, para o esclarecimento da verdade, entendo cabível, com fundamento no artigo 1º, §5º, da Lei nº 9.613/98, a redução das penas a eles impostas, no patamar de 2/3. A adoção da máxima fração de redução se justifica pela relevância das declarações prestadas, que foram utilizadas para fundamentar o decreto condenatório, tanto na sentença como no presente voto. Ainda que robusto o acervo probatório, as informações e os documentos trazidos por tais réus reforçaram o juízo de convicção acerca dos fatos delituosos. Assim, deve ser parcialmente provido o recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para determinar a redução das respectivas penas em 2/3, limitando o benefício, porém, ao presente feito, sem reflexão para Ações Penais nº 5083376-05.2014.4.04.7000 e nº 5022179-78.2016.4.04.7000 anteriormente julgadas por este Tribunal. A unificação das penas e a verificação do adimplemento das condições para eventual progressão de regime caberá ao juízo da execução, ficando esta condicionada à integral reparação dos danos, como se fundamentará a seguir (item 4.5.). Com a redução concedida, as penas finais dos acusados restam fixadas no presente feito em: JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO: 3 (três) anos, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 70 (setenta) dias-multa, na razão unitária estabelecida em sentença. AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS: 1 (um) ano, 10 (dez) meses e 07 (sete) dias de reclusão e 43 (quarenta e três) dias-multa, na razão unitária estabelecida em sentença. Determino o regime inicial semiaberto em relação a LÉO PINHEIRO e o regime inicial aberto em relação a AGENOR para o cumprimento da pena, com fundamento nos artigos 33, §3º, e 59, caput e inciso III, ambos, do Código Penal. Saliento que, ainda que a pena de LÉO PINHEIRO seja inferior a 04 anos, as circunstâncias em que praticados os delitos recomendam a adoção de regime inicial mais gravoso, especialmente se considerada a culpabilidade diferenciada do réu em face de sua atividade mais próxima e intensa. Ademais, mesmo que estabelecida sanção reclusiva inferior a quatro anos para ambos os acusados, a complexidade do delito torna a sua substituição por penas restritivas de direitos não autorizada. 4.5. Da interdição prevista na Lei nº 9.613/98 https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 292 de 317 No ponto, assim ficou consignado na sentença recorrida: 'Em decorrência da condenação pelo crime de lavagem, decreto, com base no art. 7º, II, da Lei nº 9.613/1998, a interdição de José Adelmário Pinheiro Filho e Luiz Inácio Lula da Silva, para o exercício de cargo ou função pública ou de diretor, membro de conselho ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da mesma lei pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade'. Não merece reparos a decisão de primeiro grau, haja vista que a interdição surge como efeito da condenação pelo crime de lavagem de dinheiro, sendo, pois, de observância cogente e mantida tal como fixado. 4.6. Da reparação do dano como condição à progressão de regime Com relação a tema comum a todos os réus condenados por corrupção ativa ou passiva, não há inconstitucionalidade ou ilegalidade em determinar-se que 'a progressão de regime fica, em princípio, condicionada à reparação do dano nos termos do art. 33, §4º, do CP', tendo em vista que inseridos no rol de crimes contra a Administração Pública. Tal previsão já na sentença condenatória é mera referência à regra cogente e não afasta o exame pelo juízo da execução de questões específicas de seu mister. O tema foi recentemente apreciado pela 4ª Seção desta Casa, em julgamento assim ementado: PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. OPERAÇÃO LAVA-JATO. CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA. ATO DE OFÍCIO. CAUSA DE AUMENTO. CORRUPÇÃO EXAURIDA. DOSIMETRIA DAS PENAS. MANUTENÇÃO. REPARAÇÃO DO DANO. 1(...). 5. Mantida a determinação, pela sentença, de obediência ao art. 33, § 4º, do CP, não havendo invasão da competência do Juízo das Execuções Penais. (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 5023121-47.2015.404.7000, 4ª Seção, Des. Federal CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, POR MAIORIA, JUNTADO AOS AUTOS EM 04/12/2017) A constitucionalidade do art. 33, § 4º do Código Penal foi afirmada pelo Supremo Tribunal Federal na Execução Penal nº 22, em face de João Paulo Cunha, condenado na AP nº 470/STF. Trata-se de exigência especial imposta ao condenado por crime contra a administração pública, cuja progressão de regime fica condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. A rigor, a exigência legal de reparação do dano para fins de progressão de regime independe de determinação expressa na sentença condenatória. Contudo, nenhuma ilegalidade há na sua expressa determinação. Tampouco se estará diante de subtração da competência do juízo da execução, porque impositivo o comando normativo e, sobretudo, diante da reconhecida constitucionalidade pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal. Isso não impede, alertese, que outras matérias relacionadas à reparação do dano sejam examinadas em fase de execução. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 293 de 317 Assim, por exemplo, competirá ao juízo da execução aferir a satisfação indenizatória como condição à progressão, podendo ele verificar, inclusive, se o sentenciado possui efetiva capacidade patrimonial de ressarcir o erário público. Igualmente caberá à fase de execução de sentença o exame de outras matérias que lhe são íntimas, como o parcelamento, a substituição por garantias reais ou fidejussórias, a exemplo do que já ocorre nas prestações pecuniárias substitutivas. 5. DA DATA DOS FATOS E DA ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO 5.1. Alega a defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA que ocorreu a prescrição dos delitos de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, pois (a) a suposta vantagem indevida ocorreu em 2009, sendo que a disponibilização dos benefícios em 2014 constituiria mero exaurimento do crime de corrupção passiva; (b) após 2009 não estava mais no cargo de Presidente da República, assim como Renato Duque e Paulo Roberto Costa teriam deixado a diretoria da Petrobras em 2012, de modo que não há como se cogitar do crime de corrupção passiva até 2014; (c) em 2009 o crime de lavagem de dinheiro já estaria consumado. Requer o Ministério Público Federal, por sua vez, a alteração da data indicada na sentença como sendo para a interrupção do crime de lavagem de ativos, para 'considerar a cessação da prática do último ato referente à ocultação da aquisição do triplex 164-A do Condomínio Solaris, pelo menos, até a data de propositura da denúncia da presente ação penal'. Pois bem. A solução da questão passa, inevitavelmente, pela identificação da data correta dos crimes a que foi condenado o apelante. 5.2. Especificamente em relação aos contratos viciados da OAS com a Petrobras, como exaustivamente anotado, mas não é demais repetir, a atuação do apelante difere do padrão dos processos já julgados e relacionados à 'Operação Lava-Jato'. Ora, não se exige a demonstração de sua participação ativa em cada um dos procedimentos de contratação, seja elaborando editais de licitação, seja aprovando propostas ou assinando instrumentos. Isso porque, como garantidor de um esquema maior, a sua participação desborda da competência formal dos cargos diretamente envolvidos em tais tarefas. Acertada a acusação, assim, ao atribuir a responsabilidade criminal ao réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA em um patamar mais elevado em termos de hierarquia administrativa e constitucional. Apesar disso, a consequência jurídica não passa pela condenação por cada contrato, em concurso material. É de se ponderar que a denúncia parte de premissa diversa daquela utilizada para com os executivos da OAS Empreendimentos - empresa que participou do certame licitatório viciado em três contratações - e para com agentes públicos da Petrobras. Vale frisar, nessa perspectiva, que é desnecessária - e não há - a estreita apuração da atuação do apelante com cada um dos ajustes da Petrobras com empreiteiras, pois agia ele de modo a dar suporte a todo o esquema de corrupção sistêmica. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 294 de 317 Por essa razão, não se computa a prescrição tomando como marco a data de assinatura de cada um dos contratos, como pretende a defesa, mas sim do momento em que o réu teria perdido a capacidade de nomear ou manter agentes públicos que tinham como encargo cumprir os objetivos do grupo criminoso. A sentença é bastante didática neste sentido: 890. Mesmo na perspectiva do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a indicação por ele dos Diretores da Petrobrás que se envolveram nos crimes de corrupção, como Paulo Roberto Costa e Renato de Souza Duque e a sua manutenção no cargo, mesmo ciente de seu envolvimento na arrecadação de propinas, o que é conclusão natural por ser também um dos beneficiários dos acertos de corrupção, representa a prática de atos de ofícios em infração da lei. É certo que, provavelmente, o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tinha conhecimento de detalhes e nem se envolvia diretamente nos acertos e arrecadação de valores, pois tinha subordinados para tanto, mas tendo sido beneficiado materialmente de parte de propina decorrentes de acerto de corrupção em contratos da Petrobrás, ainda que através de uma conta geral de propinas, não tem como negar conhecimento do esquema criminoso. 891. Não se deve olvidar que o esquema criminoso era complexo, com vários participantes e, embora coubesse aos Diretores da Petrobrás ou aos operadores realizar os acertos de corrupção, a sua permanência no cargo dependia de sua capacidade em arrecadar recursos aqueles que os sustentavam politicamente, entre eles o então Presidente. 892. Do montante da propina acertada no acerto de corrupção, cerca de R$ 2.252.472,00, consubstanciado na diferença entre o pago e o preço do apartamento triplex (R$ 1.147.770,00) e no custo das reformas (R$ 1.104.702,00), foram destinados como vantagem indevida ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 893. A atribuição a ele de um imóvel, sem o pagamento do preço correspondente e com fraudes documentais nos documentos de aquisição, configuram condutas de ocultação e dissimulação aptas a caracterizar crimes de lavagem de dinheiro. 894. A manutenção do imóvel em nome da OAS Empreendimentos, entre 2009 até pelo menos o final de 2014, ocultando o proprietário de fato, também configura conduta de ocultação apta a caracterizar o crime de lavagem de dinheiro. 895. A agregação de valor ao apartamento, mediante a realização de reformas dispendiosas, mantendo-se o mesmo tempo oculta a titularidade de fato do imóvel e o beneficiário das reformas, configura igualmente conduta de ocultação apta a caracterizar o crime de lavagem de dinheiro. 896. Embora sejam condutas de ocultação e dissimulação talvez singelas, a sofisticação não constitui elemento necessário à caracterização do crime de lavagem de dinheiro (a complexidade não é inerente ao crime de lavagem, conforme precedente do RHC 80.816/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma do STF, un., j. 10/04/2001). 897. Não vislumbro concomitância ou confusão entre os crimes de corrupção e e de lavagem. 898. O imóvel foi atribuído de fato ao ex-Presidente desde a transferência do empreendimento imobiliário da BANCOOP para a OAS Empreendimentos em 08/10/2009, com ratificação em 27/10/2009. Repetindo o que disse JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, 'o apartamento era do Presidente Lula desde o dia que me passaram para estudar os empreendimentos da BANCOOP, já foi me dito que era do Presidente Lula e de sua família, que eu não comercializasse e tratasse aquilo como uma coisa de propriedade do Presidente'. A partir de então, através de condutas de dissimulação e ocultação, a real titularidade do imóvel foi mantida oculta até pelo menos o final de 2014 ou mais propriamente até a presente data. 899. De forma semelhante, os acertos de corrupção remontam a 2009, durante a contratação pela Petrobrás do Consórcio CONEST/RNEST, ainda que a definição final da utilização de parte dos créditos em benefício do ex-Presidente tenha ocorrido posteriormente, em meados de 2014. 900. Mesmo considerando a definição final do acerto de corrupção em junho de 2014, prosseguiram as condutas de ocultação e dissimulação, inclusive com as reformas até o final de 2014, pelo menos, ou mais propriamente até a presente data. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 295 de 317 901. Também tendo presente esses fatos, as condutas de ocultação foram posteriores ou se estenderam temporalmente mesmo após a consumação dos últimos atos relativos ao do crime de corrupção. 902. Não há, portanto, confusão entre corrupção e lavagem, tendo esta por antecedente o crime de corrupção. 903. O crime de lavagem deve ser considerado como único já que abrange condutas que se prolongaram no tempo e que se complementam, como as fraudes documentais nos documentos de aquisição do imóvel, a manutenção do imóvel em nome da OAS Empreendimentos, a agregação de valores ao imóvel através da reformas com ocultação do real beneficiário pela manutenção do imóvel em nome da OAS Empreendimentos. É preciso ter presente, nessa linha, que a capacidade do ex-Presidente perdurou, no mínimo, até o final de 2014, momento coincidente com a finalização das reformas do apartamento triplex que resultou no recebimento de corrupção. Os fatos estão interligados e, sob tal ótica, o conjunto deve ser examinado em todas as suas consequências jurídicas. Há episódio que confirma tal assertiva, como salientado pelo juízo de origem: 805. Outro elemento probatório a ser destacado é o inusitado encontro havido entre o exPresidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-Diretor da Petrobrás Renato de Souza Duque no ano de 2014. Renato de Souza Duque já foi condenado por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro em várias ações penais, entre elas a já referida ação penal 501233104.2015.4.04.7000 (cópia da sentença no evento 847). Em outra ação penal, de nº 5054932-88.2016.4.04.7000, Renato de Souza Duque, a pretexto de colaborar com a Justiça, revelou, em audiência de 05/05/2017, um encontro com o ex-Presidente e que até então havia sido mantido em segredo. Embora se trate de prova produzida em outro processo, foi o próprio ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva que, em seu interrogatório judicial de 10/05/2017, trouxe o fato a tona, ao confirmar a realização do encontro, em um aeroporto, com Renato de Souza Duque (evento 885). Segundo o ex-Presidente, o encontro teria sido intermediado por João Vaccari, com quem Renato de Souza Duque teria, segundo o ex-Presidente, relação de amizade. Chama a atenção que minutos antes, no mesmo depoimento, o ex-Presidente havia afirmado desconhecer qualquer relação entre eles. Também chama a atenção o afirmado motivo para o encontro às escondidas, de que o ex-Presidente, segundo o por ele afirmado, queria saber se Renato de Souza Duque teria contas no exterior porque a imprensa assim estaria divulgando. Ocorre que pela época do encontro, em meados de 2014, não havia notícias das contas de Renato de Souza Duque no exterior, o que só surgiu após a sua prisão cautelar em 14/11/2014. 806. De todo modo, não é necessário no momento decidir se o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi ou não o artífice principal do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás. É compreensível, por evidente, que o MPF assim tenha afirmado na denúncia, já que é um argumento destinado ao convencimento do Juízo. É de lembrar que a 'Operação Lava-Jato' foi deflagrada no início de 2014, mas a integralidade e profundidade da corrupção somente passou a ser efetivamente identificadas a partir de depoimentos de colaboradores, dentre eles, Paulo Roberto Costa, ex-Diretor da Petrobras. Em novembro de 2014 houve a prisão de LÉO PINHEIRO, juntamente com outros empresários do setor de construção e integrantes do chamado 'clube'. O esquema permaneceu funcionando com bastante fôlego mesmo depois da sucessão presidencial. Para exemplificar, os Contratos nºs 0800.0055148.09.2 e 08500.0000057.09.2, ambos assinados em 10/12/2009, foram aditivados. Como apontado na decisão de primeiro grau: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 296 de 317 356. Conforme apontado nos itens 224-226, retro, o contrato da RNEST para implantação das UHDT e UGH teve o preço de R$ 3.190.646.501,15, com aditivo em 12/01/2012 de R$ 38.562.031,42, totalizando R$ 3.229.208.532,57. A propina seria, portanto de cerca de R$ 32.292.085,00. O MPF, entretanto, considerando que a OAS tinha 50% de participação no Consórcio RNEST/CONEST, calculou a propina de sua responsabilidade para esse contrato em R$ 16.146.042,00. 357. Conforme apontado nos itens 236-238, retro, o contrato da RNEST para implantação das UDAs teve o preço de R$ 1.485.103.583,21, com aditivo em 28/12/2011 de R$ 8.032.340,38, totalizando R$ 1.493.135.923,59. A propina seria, portanto de cerca de R$ 14.931.359,00. O MPF, entretanto, considerando que a OAS tinha 50% de participação no Consórcio RNEST/CONEST, calculou a propina de sua responsabilidade para esse contrato em R$ 7.465.679,50. 358. Conforme apontado nos itens 247-249, retro, o contrato da REPAR teve o preço de R$ 1.821.012.130,93, com aditivos entre 06/2008 a 01/2012, que majoraram o seu valor em R$ 517.421.286,84, totalizando R$ 2.338.433.417,77. A propina seria, portanto de cerca R$ 23.384.334,17. O MPF, entretanto, considerando que a OAS tinha 24% de participação no Consórcio CONPAR, calculou a propina de sua responsabilidade para esse contrato em R$ 5.612.240,00. 359. O total de propina pago para as três obras pela OAS à Diretoria de Abastecimento da Petrobrás, comandada por Paulo Roberto Costa, foi, portanto, de R$ 29.223.961,00. DESTAQUEI O aditamento de contratos até o ano de 2012, com ampliação do valor contratado, segue em consonância com o esquema que funcionou inclusive após a saída do réu da Presidência da República, pelo que não se pode, no caso específico de ato político, remontar o fato à data de assinatura dos contratos. Há casos de responsabilização criminal elucidativas, como a do ex-Senador Gim Argello durante os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instaurada no Senado Federal e também da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) instaurada no Congresso Nacional, ambas com o objetivo de apurar irregularidades no âmbito da Petrobras S/A, isso no ano de 2014, após a deflagração da 'Operação Lava-Jato'. Jorge Afonso Argello já foi condenado na Ação Penal nº 502217978.2016.4.04.7000/PR pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, pertinência à organização criminosa e obstrução de investigação. Esta última imputação refere-se à solicitação de propina para não convocação de empreiteiros para a deporem nas referidas Comissões Parlamentares. Tal ambiente de contaminação política não é restrito àqueles que ocupam cargos de livre nomeação e exoneração ou políticos. Fazendo uma breve retrospectiva, Gim Argello aproximou-se do governo LULA enquanto a ex-Presidente Dilma Vana Roussef ainda era Ministra Chefe da Casa Civil, sendo possível dizer que a obstrução aos trabalhos parlamentares de 'investigação' em 2014 decorreu de desdobramento exatamente dessa influência política. Além disso, deve-se lembrar ainda a indicação de manutenção de Nestor Cuñat Cerveró como diretor da BR Distribuidora entre os anos de 2008 e 2014, cuja nomeação se deu em contrapartida a serviços prestados em renegociação de uma dívida de campanha de 2006 do Partido dos Trabalhadores - PT, envolvendo a contratação do Navio Sonda Victoria 10.000 pelo Grupo Schahin. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 297 de 317 5.3. Com relação à corrupção e lavagem de dinheiro nos fatos relacionados ao triplex do Guarujá/SP, a questão é mais singela. Muito embora a OAS tenha se comprometido a assumir o empreendimento da BANCOOP em 2009, com transferência e ratificação em 08/10/2009 e 27/10/2009, respectivamente, e já houvesse informação de que a unidade habitacional seria destinada ao ex-Presidente, recorde-se que a solução jurídica para o pagamento da diferença de preço somente começou a tomar forma em 2013 e em meados de 2014, quando João Vaccari Neto autorizou a compensação. Retomo o esclarecedor depoimento de LÉO PINHEIRO: JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO:- Em maio ou Junho de 2014, com os custos já de todos os empreendimentos Bancoop já bem aferidos e também toda a especificação, tudo que ia ser feito tanto no sítio como no triplex, eu procurei o João Vaccari e disse a ele 'Olhe, estou com os elementos todos em mãos e queria discutir', ele marcou, ele disse 'Olhe, o clima entre a sua empresa e o Bancoop não está bom, eu vou sugerir a gente fazer um jantar, eu vou chamar a diretoria do Bancoop, você chama o pessoal seu, e vamos sentar antes, então ele marcou comigo no mesmo local, no restaurante, um encontro com ele, onde eu levei esses créditos e esses débitos, eu levei para ele o que nós, OAS, estava devendo por conta desses pagamentos de vantagens indevidas ao PT naquele momento, o que já estava atrasado e o que ainda ia acontecer, e os custos dos empreendimentos que nós estávamos fazendo, desses passivos, que eu estou chamando de passivos ocultos, o termo usado de coisas que nós não tínhamos conhecimento, e mais os custos do triplex e do sítio, o João Vaccari disse 'Olhe, está tudo ok, está dentro de um princípio que nós sempre adotamos, porque sempre, de quando em quando, que abria um encontro de contas com ele tinha 'Não, você paga isso ao diretório tal, paga isso ao político tal', isso era feito e era uma coisa já corriqueira, então 'Não vamos mudar a metodologia, vamos continuar com a metodologia, agora como tem coisas aqui de cunho pessoal, que trata do presidente, eu vou conversar com ele sobre isso e lhe retorno. Agora nesse encontro que nós vamos ter com a diretoria do Bancoop e com o seu pessoal eu gostaria que você não tratasse desse encontro de contas, eu queria que a empresa desse uma tranquilizada na diretoria do Bancoop que os empreendimentos iam prosseguir, que não haveria nenhuma solução de continuidade', e assim foi feito, houve isso. Passaram alguns dias, talvez uma semana ou duas no máximo, o Vaccari me retornou dizendo que estava tudo ok, que poderíamos adotar o sistema de encontro de contas entre créditos e débitos que nós tínhamos com ele. NEGRITEI Por conseguinte, o crime de corrupção passiva tem como marco o recebimento da vantagem indevida. Ainda que não definida expressamente, em virtude da própria natureza das operações extra-oficiais de 'encontro de contas', deve-se considerar o momento em que o valor da diferença de preço entre o apartamento simples e o triplex, as reformas e mobiliários foram efetivamente debitados do crédito ilícito que o Partido dos Trabalhadores tinha com a OAS Empreendimentos. E a compensação entre valores subtraídos da Petrobras e de propinas ocorreu em meados de 2014, quase que concomitantemente, por derivação, com a ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade do bem, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. Talvez até se pudesse considerar data posterior, coincidente com a finalização da reforma. Porém, para fins prescricionais, tais definições são suficientes e mesmo sob uma premissa conservadora, resta inatingível a pretensão punitiva estatal. 5.4. Sobre os prazos prescricionais, dispõe o art. 109 do Código Penal: https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 298 de 317 Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (Redação dada pela Lei nº 12.234, de 2010). I - em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze; II - em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze; III - em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito; IV - em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro; V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois; VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano Pelo contexto, não se aplica a prescrição retroativa prevista no art. 110, §1º, do Código Penal (antes de recebida a denúncia), pois os fatos são posteriores à entrada em vigor da alteração proporcionada pela Lei nº 12.234/2010. Para o crime de corrupção passiva, foi aplicada pena de 08 anos e 04 meses de reclusão, o que remete ao patamar prescritivo de 16 anos, que deve ser computado pela metade (08 anos), com base no artigo 115 do Código Penal. Para o delito de lavagem de dinheiro, foi aplicada pena de 03 anos e 09 meses, o que remete ao patamar prescritivo de 08 anos, que deve ser computado pela metade (04 anos), com base no artigo 115 do Código Penal. Nota-se que não houve o transcurso dos prazos prescricionais mencionados entre a data do recebimento da denúncia (20/09/2016) e a data da publicação da sentença (12/07/2017), tampouco entre esta e o presente momento. Diante disso, deve ser negado provimento ao recurso defensivo no ponto. 6. DA REPARAÇÃO DO DANO, DO CONFISCO DE BENS E DAS CUSTAS PROCESSUAIS 6.1. Ao final da sentença condenatória, o magistrado de origem estabeleceu os parâmetros para a reparação do dano. Confira-se: 949. Em decorrência da condenação pelo crime de lavagem, decreto, com base no art. 7º, II, da Lei nº 9.613/1998, a interdição de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e Luiz Inácio Lula da Silva, para o exercício de cargo ou função pública ou de diretor, membro de conselho ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da mesma lei pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade. 950. Considerando que o apartamento 164-A, triplex, Edifício Salina, Condomínio Solaris, no Guarujá, matrícula 104801 do Registro de Imóveis do Guarujá, é produto de crime de corrupção e de lavagem de dinheiro, decreto o confisco, com base no art. 91, II, 'b', do CP. 951. A fim de assegurar o confisco, decreto o sequestro sobre o referido bem. Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se precatória para lavratura do termo de sequestro e para registrar o confisco junto ao Registro de Imóveis. Desnecessária no momento avaliação do bem. 952. Independentemente do trânsito em julgado, oficie-se ao Juízo no processo de recuperação judicial que tramita perante a 1ª Vara de Falência e Recuperações Judiciais da Justiça Estadual de São Paulo (processo 0018687-94.2015.8.26.01000), informando o sequestro e confisco do bem como produto de crime e que, portanto, ele não pode mais ser considerado como garantia em processos cíveis. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 299 de 317 953. Necessário estimar o valor mínimo para reparação dos danos decorrentes do crime, nos termos do art. 387, IV, do CPP. O MPF calculou o valor com base no total da vantagem indevida acertada nos contratos do Consórcio CONPAR e RNEST/CONEST, em cerca de 3% sobre o valor deles. Reputa-se, mais apropriado, como valor mínimo limitá-lo ao montante destinado à conta corrente geral de propinas do Grupo OAS com agentes do Partido dos Trabalhadores, ou seja, em dezesseis milhões de reais, a ser corrigido monetariamente e agregado de 0,5% de juros simples ao mês a partir de 10/12/2009. Evidentemente, no cálculo da indenização, deverão ser descontados os valores confiscados relativamente ao apartamento. 954. Independentemente do trânsito em julgado, levanto a apreensão autorizada no processo 5006617-29.2016.4.04.7000 sobre o acervo presidencial que se encontra atualmente depositado e lacrado junto ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, não havendo mais motivo para mantê-lo. 955. Deverão os condenados também arcar com as custas processuais. Apela o Ministério Público Federal postulando a modificação da sentença no tocante ao valor fixado a título de reparação do dano (art. 387, caput e IV, CPP), para que sejam considerados para tal finalidade; (a) com relação ao réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, o valor de R$ 87.264.971,26, correspondentes a 3% do valor total de contratos relacionados às obras da REPAR (Consórcio CONPAR), e da RNEST (Consórcio RNEST-CONEST); (b) com relação aos réus JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e AGENOR FRANKLIN DE MEDEIROS, o valor R$ 58.401.010,26, correspondentes a vantagens pagas a agentes públicos e políticos ligados à Diretoria de Serviços, tendo em vista que o pagamento das vantagens indevidas à Diretoria de Abastecimento da Petrobras em razão da contratação dos Consórcios CONPAR e RNEST/CONEST, foi anteriormente julgado pela Ação Penal nº 5083376-05.2014.4.04.7000/PR. As defesas de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, de AGENOR FRANKLIN DE MAGALHÃES MEDEIROS e de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO sustentam que deve ser afastado ou reduzido o valor fixado a título de reparação do dano, seja porque não comprovado o efetivo prejuízo da Petrobras, seja porque o montante fixado desborda do contexto dos autos. LÉO PINHEIRO argumenta, ainda, que devem ser afastados a correção monetária e os juros legais. A PETROBRAS, como assistente de acusação, aderiu ao recurso ministerial. 6.2. No tocante ao valor a título de reparação do dano, deve ser mantida a sentença na íntegra. Como já minudentemente examinado em outras passagens, na divisão de propinas foi destinado R$ 16 milhões ao Partido dos Trabalhadores. Como salientado por AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS, 'Léo esteve em contato com João Vaccari e ficou decidido que 16 milhões de reais, por conta da nossa parte na Rnest, seriam para o PT'. O pagamento neste patamar foi admitido pelo próprio LÉO PINHEIRO. Sobre a questão, transcrevo excerto da sentença: 770. Milton Pascowitch também prestou depoimento em Juízo (evento 417). Antes, celebrou acordo de colaboração com o MPF e que foi homologado pelo Juízo. Em seu depoimento, declarou que intermediava o pagamento de vantagem indevida entre fornecedoras da Petrobras e agentes da Área de Serviços e Engenharia da Petrobrás, Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho, bem como para agentes do Partido dos Trabalhadores, entre eles o ex-Ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu de Oliveira e https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 300 de 317 Silva. As propinas eram calculadas em 1% sobre o valor do contrato e divididas entre os agentes da Petrobrás e os agentes políticos. Milton Pascowitch, assim como José Dirceu de Oliveira e Silva, foram condenados por crimes de corrupção e lavagem na ação penal 5045241-84.2015.4.04.7000, com cópia da sentença no evento 847. Afirmou não ter conhecimento da participação do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 771. Também, como já adiantado nos itens 516-537 e 568-578, José Adelmário Pinheiro Filho, Presidente da OAS, e Agenor Franklin Magalhães Medeiros, reconheceram a existência do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, os ajustes fraudulentos de licitação e o pagamento de vantagem indevida em contratos com a Petrobrás para agentes da Petrobrás, agentes políticos e partidos políticos. 772. Também reconheceram especificamente o pagamento de vantagem indevida nos contratos da Petrobrás com o Consórcio CONPAR e no Consórcio RNEST/CONEST nas obras da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST). 773. Para ser mais preciso, José Adelmário Pinheiro Filho declarou não se recordar especificamente dos acertos na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), mas que, quanto ao contrato na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), foi procurado diretamente por João Vaccari Neto para o pagamento de 1% sobre o valor do contrato ao Partido dos Trabalhadores ('Eu fui procurado pelo senhor João Vaccari e ele me falou que tinha um pagamento de 1% para o PT, isso foi diretamente comigo'). Concordou com a solicitação e o valor foi incorporado na aludida conta corrente geral de propinas, depois debitada para, entre outros propósitos, abater a diferença do preço do apartamento 164-A, triplex, do Condomínio Solaris, e o custo da reforma do aludido apartamento. Declarou que o pagamento foi inicialmente motivado para que a Construtora OAS passasse a ser convidada pela Petrobrás para participar de grandes obras, o que viabilizou o seu ingresso no grupo das empreiteiras que ajustavam fraudulentamente as licitações. 774. Agenor Franklin Magalhães Medeiros, encarregado especificamente dos contratos da Construtora OAS com a Petrobrás, confirmou que José Adelmário Pinheiro Filho interferiu junto ao Goveno Federal para que a OAS passasse, ao final de 2006, a ser convidada para grandes obras na estatal. Também declarou que os contratos envolviam pagamento de propinas de 2% a agentes públicos e agentes políticos e que os contratos na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST) foram obtidos mediante ajuste fraudulento de licitação. 775. Declarou que no contrato da CONPAR, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), a vantagem indevida aos agentes públicos e políticos ficou a cargo da Odebrecht e da UTC Engenharia, desconhecendo o depoente os detalhes de como isso foi feito. 776. No caso dos contratos da CONEST/RNEST, na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), confirmou que houve ajuste de 2% de propinas sobre o valor dos dois contratos, que elas se destinavam aos agentes da Petrobrás e aos agentes políticos e que parte dos valores foram pagos pela Odebrecht e parte pela OAS. 777. Do total das propinas, dezesseis milhões de reais foram destinados ao Partido dos Trabalhadores, através de João Vaccari Neto ('Aí é onde está, 13 milhões e meio mais 6 milhões e meio totalizam 20, para os 36 sobraram 16 milhões para o PT, e assim foi feito, Léo esteve em contato com João Vaccari e ficou decidido que 16 milhões de reais, por conta da nossa parte na Rnest, seriam para o PT'). 778. Há que se reconhecer como provado, acima de qualquer dúvida razóavel, considerando cumulativamente a prova material e a quantidade de depoimentos, incluindo dos pagadores de propinas e dos beneficiários, que os contratos discriminados na denúncia, entre a Petrobrás e os Consórcios CONPAR e CONEST/RNEST, integrados pela Construtora OAS, seguiram as regras do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, ou seja, foram obtidos com ajuste fraudulento de licitações e envolveram o pagamento de vantagem indevida de cerca de 2% sobre o seu valor e que foram destinados aos agentes da Petrobras, mas especificamente à Diretoria de Abastecimento e à Diretoria de Serviços e igualmente a agentes políticos e a partidos políticos. 779. Dos valores, da parte cujo pagamento ficou sob a responsabilidade da OAS, cerca de dezesseis milhões de reais foram destinados exclusivamente à conta corrente geral de propinas mantida entre o Grupo OAS e agentes políticos do Partido dos Trabalhadores. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 301 de 317 A importância definida está, de maneira lógica, associada à parcela a que fez jus o Partido dos Trabalhadores e administrado pela OAS em conta informal de créditos e débitos. Salienta-se que os crimes relativos à lei de licitações não foram imputados nesta ação penal em desfavor dos denunciados, não podendo este fundamento justificar o valor de reparação mínima dos danos. Aliás, se isto fosse possível, tratando-se de fraude à licitação desde sua origem, a nulidade ocorreria em todo o contrato e o valor mínimo de reparação corresponderia à integralidade do contrato ilícito, na esteira dos ensinamentos de Mário Sérgio de Albuquerque Schirmer (Dano indireto para fins do artigo 10 da Lei nº 8429/92, in Aspectos Controvertidos da Lei de Improbidade Administrativa. Org. Claudio Smime Diniz, Mauro Sérgio Rocha e Renato de Lima Castro. Del Rey editora: Belo Horizonte, 2016, pgs. 169/194). Todavia, os danos não decorreram exclusivamente das fraudes nos processos licitatórios, mas, sobremaneira, da prática dos crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro. Assim, a par do pedido ministerial de majoração, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, 'reputa-se, mais apropriado, como valor mínimo limitá-lo ao montante destinado à conta corrente geral de propinas do Grupo OAS com agentes do Partido dos Trabalhadores, ou seja, em dezesseis milhões de reais, a ser corrigido monetariamente e agregado de 0,5% de juros simples ao mês a partir de 10/12/2009. Evidentemente, no cálculo da indenização, deverão ser descontados os valores confiscados relativamente ao apartamento', como consignado na sentença recorrida. 6.3. No tocante à incidência de correção monetária e de juros moratórios, o art. 387, IV do CPP, determina que a sentença condenatória, em sendo o caso, arbitre desde logo um valor mínimo a título de reparação de danos, considerando os prejuízos causados ao ofendido. Poder-se-ia argumentar que, tratando-se de valor mínimo, seria desnecessária e indevida a fixação de encargos na sentença penal. Todavia, esta não é a melhor compreensão da novidade introduzida pela Lei nº 11.719/2008 ao art. 387 do CPP. Ao tratar de valor mínimo, buscou o legislador salvaguardar o direito de a vítima buscar eventuais outros prejuízos, diretos ou indiretos, que não foram objeto do processo penal. Mas isto não impede que se valore, desde logo, os prejuízos causados à vítima, determinando a recomposição de seu patrimônio da melhor forma possível. E nesta recomposição, como determina nossa legislação civil, computa-se não apenas a atualização monetária, mas, também, a incidência de juros. Aliás, se fosse necessário à vítima socorrer-se sempre das vias judiciais apropriadas para recompor seu patrimônio, este seria reconstituído com a incidência dos juros. Na verdade, a alteração proporcionada pela Lei nº 11.719/2008 é salutar, pois, via de regra, a última preocupação da jurisdição criminal é a vítima, justamente https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 302 de 317 aquele que sofre os danosos efeitos patrimoniais do crime. Nessa exata linha de conta, deve-se, dentro do possível e independente de discussões no juízo cível por reparações mais robustas, fixar a reparação do dano o mais próximo possível do efetivo prejuízo. Sobre o tema, precedente da 4ª Seção desta Casa: PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. 'OPERAÇÃO LAVA JATO'. NOVO INTERROGATÓRIO. ARTIGO 616 DO CPP. PONTO PRELIMINAR REJEITADO. DOSIMETRIA DA PENA. VALORAÇÃO NEGATIVA DA CULPABILIDADE DO AGENTE. LAVAGEM DE DINHEIRO. QUANTIDADE DE CRIMES. AUMENTO PELA CONTINUIDADE DELITIVA NO PATAMAR MÁXIMO. REPARAÇÃO DOS DANOS. JUROS DE MORA. CABIMENTO. 1. (...) 8. Ainda que a lei trate de valor mínimo, a recomposição dos prejuízos causados visa a adequada reparação dos danos sofridos pela vítima dos crimes, devendo, para tanto, ser composta não apenas de atualização monetária, mas, também, da incidência de juros, nos termos da legislação civil. (TRF4, ENUL 5083376-05.2014.404.7000, QUARTA SEÇÃO, Relator para Acórdão João Pedro Gebran Neto, juntado aos autos em 16/06/2017). Por isso, não merece ser provido o recurso de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, devendo, de fato, incidir juros moratórios a partir de cada evento danoso (Súmula 54 do STJ), na proporção da taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, nos termos do art. 398 c/c art. 406 do Código Civil, a partir dos pagamentos feitos pela vítima em favor das contratadas. Considera-se, para este fim, a data do evento danoso o dia que a vítima promoveu cada pagamento em favor do consórcio ou da empreiteira OAS, em cada um dos contratos em que esta figurava (como contratada ou integrante do consórcio), em relação às obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST). 6.4. Justificado e mantido, por conseguinte, o confisco determinado pelo juízo de primeiro grau, nos termos da fundamentação e do art. 91, II, 'b' do Código Penal, assim como a condenação nas custas judiciais. 7. DA EXECUÇÃO DAS PENAS O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus nº 126.292/SP, reviu posicionamento antes fixado no julgamento do HC nº 84.078, firmando orientação no sentido da possibilidade de execução das penas tão logo exaurido o duplo grau de jurisdição. O entendimento foi pela Suprema Corte no julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade nº 43 e nº 44, pelo que ficou expresso que o art. 283 do Código de Processo Penal não impede o início da execução da pena depois de esgotadas as instâncias ordinárias. A questão foi novamente examinada nos autos do ARE nº 964.246/STF, quando, 'por maioria, o Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou jurisprudência no sentido de que é possível a execução provisória do acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, mesmo que estejam pendentes recursos aos tribunais superiores. A decisão foi tomada na análise do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 964246, que teve repercussão geral reconhecida. Assim, a tese firmada pelo Tribunal deve ser aplicada nos processos em curso nas demais instâncias'. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 303 de 317 Idêntica orientação vem da Súmula nº 122 deste Tribunal que diz: 'Encerrada a jurisdição criminal de segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual interposição de recurso especial ou extraordinário'. Desse modo, tão logo decorridos os prazos para interposição de recursos dotados de efeito suspensivo ou julgados estes, poderá ter início a execução da pena, inclusive no tocante às restritivas de direito (TRF4, Agravo de Execução Penal nº 5000985-25.2017.404.7117, 8ª Turma, Juiz Federal NIVALDO BRUNONI, por unanimidade, juntado em 28/04/2017), pelo que deverá ser oficiado ao juízo de primeiro grau para as providências que entender cabíveis. Não se está aqui a tratar de prisão cautelar, cujos requisitos são próprios e não coincidentes com o atual estágio do processo, mas sim de execução de pena em razão de título judicial condenatório, sobre o qual não mais se estabelecerá efeito suspensivo diante da eventual interposição de recursos aos Tribunais Superiores. Assim, a condenação em segundo grau, por si só, é fundamento idôneo para que se permita o cumprimento imediato da pena. Neste caso, diferente da prisão cautelar, tem-se por premissa que 'a presunção de inocência não é absoluta e perde força no decorrer do processo, pelo menos após condenação, ainda que de primeira instância' (HC 114.688, LUIZ FUX, STF). Tal perda de força é mais intensa com a condenação em segundo grau. A presunção de inocência ganha outros contornos no direito alienígena. Nos Estados Unidos, por exemplo, berço da presunção de inocência e do due process of law, regra geral, não há óbice à prisão após uma sentença condenatória, ainda que pendente de recursos. Igual exemplo se retira do Direito francês, onde a Corte de Cassação já decidiu pela compatibilidade entre a restrição de liberdade e a presunção de inocência, mesmo após condenação ainda recorrível. Em caso análogo ficou decidido que 'o STF não fez distinção, a qualquer modo e tempo, sobre as penas privativas de liberdade daquelas restritivas de direitos, tratando do tema de cumprimento das penas em caráter geral, lato sensu. Nesse curso, há pleno cabimento a construção da Suprema corte inclusive para o art. 147 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210, de 11.7.1984), no que se refere ao comando sentencial que condena em penas restritivas de direitos'. (TRF4, AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL Nº 5035477-40.2016.404.7000, 7ª Turma, Des. Federal Cláudia Cristina Cristofani, por unanimidade, juntado aos autos em 30/11/2016) É sabido que o Superior Tribunal de Justiça uniformizou divergência entre suas Turmas a respeito da matéria. A Quinta Turma daquela Corte Superior vinha entendendo pela impossibilidade de execução provisória das penas restritivas de direito baseando-se em julgados antigos do STF afirmando que 'a Suprema Corte, ao tempo em que vigorava o entendimento de ser possível a execução provisória da pena, como agora, não a autorizava para as penas restritivas de direito' (v.g. HC 386.872/RS, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 17/03/2017). A Sexta Turma, por sua vez, autorizava a execução provisória independentemente da espécie de pena, apontando que 'muito embora o Supremo Tribunal Federal, em outra época, quando também admitia a execução provisória, ressalvasse o entendimento de que as penas restritivas de direitos só poderiam começar a ser cumpridas após o trânsito em julgado da condenação, a atual https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 304 de 317 jurisprudência do pretório excelso não faz, ao menos expressamente, essa ressalva' (v.g. HC 380.104/AM, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 22/02/2017), posição essa a que me alinho. Entretanto, em julgamento publicado em 24/08/2017, a 3ª Seção decidiu, por maioria, pela impossibilidade da execução provisória das penas restritivas de direitos. Ocorre que, tal julgamento não tem efeito vinculante e vai de encontro a recentes julgados do STF no sentido de que a execução provisória das penas restritivas não viola o princípio da presunção de inocência. A exemplo: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ARTIGO 1º, I E II, DA LEI 8.137/90. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. INADMISSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA JULGAR HABEAS CORPUS: CRFB/88, ART. 102, I, D E I. HIPÓTESE QUE NÃO SE AMOLDA AO ROL TAXATIVO DE COMPETÊNCIA DESTA SUPREMA CORTE. EXECUÇÃO PROVISÓRIA SUPERVENIENTE À CONDENAÇÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA E ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DO PROCESSO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE TERATOLOGIA, ABUSO DE PODER OU FLAGRANTE ILEGALIDADE. APLICABILIDADE DO ENTENDIMENTO FIRMADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 925. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A execução provisória de pena restritiva de direitos imposta em condenação de segunda instância, ainda que pendente o efetivo trânsito em julgado do processo, não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência, conforme decidido por esta Corte Suprema no julgamento das liminares nas ADC nºs 43 e 44, no HC nº 126.292/SP e no ARE nº 964.246, este com repercussão geral reconhecida - Tema nº 925. Precedentes: HC 135.347-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 17/11/2016, e ARE 737.305-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 10/8/2016. 2. In casu, o recorrente foi condenado, em sede de apelação, à pena de 3 (três) anos, 7 (sete) meses e 16 (dezesseis) dias de reclusão, em regime aberto, substituída por restritivas de direitos, bem como ao pagamento de 16 (dezesseis) diasmulta pela prática do crime previsto no artigo 1º, I e II, da Lei n. 8.137/1990. 3. A competência originária do Supremo Tribunal Federal para conhecer e julgar habeas corpus está definida, exaustivamente, no artigo 102, inciso I, alíneas d e i, da Constituição da República, sendo certo que o paciente não está arrolado em qualquer das hipóteses sujeitas à jurisdição desta Corte. 4. Agravo regimental desprovido. (HC 141978 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 23/06/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-168 DIVULG 31-07-2017 PUBLIC 01-08-2017). GRIFEI Não vejo porque adotar entendimento diverso daquele seguido por este Tribunal em todas as ações penais, o que levou, além do mais, à edição da já referida Súmula nº 122. Adotar, assim, outro entendimento neste caso específico, significaria emprestar ao presente processo seletividade incompatível com o exercício da jurisdição, já que o cumprimento da pena nada mais é do que o corolário do resultado do processo, aplicável aos condenados em primeiro e em segundo graus. Como já apontei em inúmeros habeas corpus, o fato de se tratarem de crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro, i.e., comumente qualificados como 'crimes de colarinho branco', não exclui a gravidade das condutas. Crimes de colarinho branco podem ser tão ou mais danosos à sociedade ou a terceiros que crimes praticados nas ruas, com violência. O raciocínio vem corroborado pelo sociólogo Edwin Sutherland (White-Collar Criminality/1939): https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 305 de 317 O custo financeiro do crime de colarinho-branco é provavelmente muitas vezes superior ao do custo financeiro de todos os crimes que são costumeiramente considerados como constituindo 'o problema criminal'. Um empregado de uma rede de armazéns apropriou-se em um ano de USD 600.000,00, que foi seis vezes superior das perdas anuais decorrentes de quinhentos furtos e roubos sofridos pela mesma rede. Inimigos públicos, de um a seis dos mais importantes, obtiveram USD 130.000,00 através de furtos e roubos em 1938, enquanto a soma furtada por Krueger [um criminoso de colarinho branco norteamericano] é estimada em USD 250.000,00 ou aproximadamente duas vezes mais. (...) A perda financeira decorrente do crime de colarinho-branco, mesmo tão elevada, é menos importante do que os danos provocados às relações sociais. Crimes de colarinho-branco violam a confiança e, portanto, criam desconfiança, que diminui a moral social e produz desorganização social em larga escala. Outros crimes produzem relativamente menores efeitos nas instituições sociais ou nas organizações sociais. (SUTHERLAND, Edwin H. White-Collar Criminality. In: GEIS, Gilbert; MEIER, Robert F.; SALINGER, Lawrence M. (ed.) White-Collar Crime: classic and contemporary views. 3. ed. New York: The Free Press, 1995, p. 32.) A advertência de Sutherland é apropriada. É necessário que se ultrapasse aquela compreensão individualista e siga-se para uma inteligência consentânea com a segurança jurídica e com a ordem pública, de modo a preponderar com eficácia a resposta estatal aos nefastos efeitos, pretéritos, presentes e futuros, que a corrupção encerra. Por evidente que quase a imensa maioria dos investigados ou réus da 'Operação Lava-Jato' não colocará em risco a segurança individual de quem quer que seja. É pouco provável que cometam pessoalmente qualquer crime violento ou os chamados crimes de sangue; talvez nunca portem uma arma de fogo, ou subtraiam diretamente recursos de outra pessoa física. Talvez nos crimes de corrupção os efeitos deletérios não sejam tão visíveis, mas isso não os torna menos gravosos. Enquanto alguns poucos se apropriam da coisa pública como se privada fosse, sistemas básicos de saúde e ensino agonizam e sangram. Um sangue invisível e capaz de provocar os maiores males ao Estado e seus administrados. Enfim, os delitos financeiros e contra a Administração Pública trazem reflexos amplos e atingem toda a coletividade. Os efeitos são de tal monta que, passado longo tempo, ainda não é possível dimensionar o alcance da corrupção que envolve conhecidos empresários, agentes públicos e partidos políticos que se serviram da maior empresa estatal. O desrespeito ao Estado de Direito demanda medida severa, e, havendo fundada razão diante das circunstâncias concretas, mostra-se inevitável a adoção de medidas amargas como resposta ao desprezo para com as instituições públicas, certamente motivados pela certeza da impunidade. Para não passar in albis, convém esclarecer que a determinação de cumprimento de pena após o julgamento em segunda instância, em nada se confunde com as prisões temporárias ou preventivas. Muito se fala a respeito dos excessos das prisões https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 306 de 317 preventivas decretadas no âmbito da 'Operação Lava-Jato', mas, no mais das vezes, sem qualquer demonstração efetiva de pertinência na afirmação. Feitas tais considerações, é medida salutar e de efetividade da jurisdição criminal que se inicie o cumprimento de penas, tão logo esgotada a jurisdição de segundo grau. 8. CONSIDERAÇÕES COMPLEMENTARES Indispensável que se acrescentem algumas considerações adicionais ao presente voto. Durante toda a tramitação deste processo foram realizadas críticas e ampla divulgação midiática, que merecem alguma abordagem neste momento. 8.1. Dos alegados excessos com relação às prisões preventivas Há longas teses a respeito da utilização das prisões processuais como forma de 'obrigar' o investigado a colaborar. Pois bem, dentro do contexto conhecido por este Tribunal, o chamado excesso ou vulgarização corresponde a um percentual em torno de 20% de colaborações firmadas com investigados presos. O tema, a propósito, foi objeto de habeas corpus preventivo impetrado pela defesa do réu PAULO TARCISO OKAMOTTO, tombado sob o nº 501230095.2016.4.04.0000/PR, cuja a ordem foi denegada por unanimidade pela 8ª Turma. Na ocasião, consignei: 3. Uso excessivo e ilegal das prisões cautelares 3.1. Não procede a alegação de que o magistrado venha usando exageradamente as prisões provisórias no âmbito da 'Operação Lava-Jato'. Há investigados presos preventivamente e outros soltos mediante a fixação de condições. Muitos, ainda, foram conduzidos para prestar depoimento, sem que tivessem sua prisão decretada. O simples fato de o paciente ser investigado não resultará necessariamente na sua prisão processual. Até mesmo em face do retrospecto da 'Operação Lava-Jato', as prisões determinadas vinham guarnecidas por fortes elementos probatórios. Nesse contexto, somente o habeas corpus liberatório teria eficácia impugnatória sobre a decisão judicial. Sairíamos da esfera da hipótese para a realidade concreta. O salvo conduto, no presente caso, não revela qualquer utilidade. Isso porque, se por um lado inexiste prisão decretada, por outro, um eventual decreto prisional deverá ser examinado à luz dos fundamentos então utilizados da decisão. Não é demais anotar que a medidas cautelares, ao contrário do que alega a defesa, vem sendo usadas exclusivamente para desarticulação do grupo organizado responsável pela prática dos delitos investigados. Em grupo criminoso complexo e de grandes dimensões, a prisão cautelar deve ser reservada aos investigados que, pelos indícios colhidos, possuem o domínio do fato, como os representantes das empresas envolvidas no esquema de cartelização, ou que exercem papel importante na engrenagem criminosa. (TRF4, HC nº 5027988-97.2016.404.0000, 8ª Turma, minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 28/07/2016). Embora ganhe eco a tese de que as medidas cautelares restritivas de liberdade vem sendo utilizadas de modo exagerado, ela não se sustenta à luz da realidade processual. 3.2. Numa investigação sobre fatos complexos, onde se apurou a prática de delitos entranhada no seio da maior empresa Estatal nacional, o número de prisões determinadas até o momento é reflexo do próprio quadro de corrupção sistêmica identificado. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 307 de 317 As Cortes Recursais, ressalvados alguns casos pontuais, tem confirmado as decisões proferidas pelo juízo de primeiro grau. Mesmo os casos de reformas parciais - com a fixação de medidas cautelares diversas da prisão -, não mais são do que a revelação do funcionamento do sistema que preserva os meios recursais inerentes à defesa dos investigados. Ou seja, a simples modificação de uma decisão por órgão recursal, seja do juízo de primeiro grau, seja deste Tribunal, não permite que se conclua ter havido sistemático abuso de poder por parte do julgador de primeiro grau. Não é possível atribuir-se à autoridade coatora infindáveis ilegalidades na condução dos processos, desconsiderando completamente que a Oitava Turma deste Tribunal, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça e a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, regra geral, têm denegado habeas corpus impetrados por dezenas de investigados. No total, seja para manter as prisões decretadas, seja para revogá-las ou substituí-las por medidas outras, o sistema constitucional submete as decisões do Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR ao crivo de outros treze julgadores, distribuídos em três Tribunais. É impensável e caro ao próprio estado democrático de direito imaginar que a simples reforma de uma decisão por Tribunal pudesse resultar na criminalização da atuação judicial. Por essas razões, não prosperam as alegações da defesa no sentido de que as prisões decretadas pelo juízo de primeiro grau estão, regra geral, maculadas por flagrantes ilegalidades. Não se há de falar em excesso nas prisões cautelares e que o instrumento cautelar vem sendo utilizado sem fundamento legal e apenas para forçar os investigados a firmarem acordos de colaboração premiada. O tema, em que pese tenha ganhado bastante espaço nos meios de comunicação - ambiente fértil para repercussão das insatisfações dos réus -, foi debatido na mesma impetração acima referida. Tem se mostrado comum classificar aquele que resolve colaborar com a Justiça pelo pejorativo nome de delator. Há grande equívoco na utilização dessa tendenciosa nomenclatura, somente compreensível pela lógica e ética internas das organizações criminosas, ou daqueles que são objeto de relatos. Sobre o tema, bem pontuou Frederico Valdez Pereira: A designação do instituto por alguns termos equívocos, como delação premiada ou arrependidos, não auxilia a tarefa de definir os contornos precisos do instrumento da colaboração processual. O nome delação passa a idéia de que, tendo sido flagrado cometendo um delito, bastaria ao agente entregar crime cometido por outrem, trazendo uma carga negativa de ordem ideológica e ética ao instituto, marcando posição de cunho pernicioso, além de não servir para identificar corretamente o conteúdo do instrumento; tampouco se enquadra na sua natureza e razão de ser, que abrange condutas cooperativas destinadas ao esclarecimento de delitos, à individualização dos seus autores ou à forma de atuação da organização criminosa, e ainda à recuperação total ou parcial do produto do crime, sem que haja a imputação de fatos a terceiros em duas dessas situações. (in Delação premiada. Legitimidade e procedimento. Curitiba : Juruá, 2013, PP.27-8). Ainda recente em nosso ordenamento, mas já consolidada na legislação estrangeira, a colaboração é meio legal de obtenção de prova (Lei nº 12.850/2013). Discordâncias centradas na suposta ilegitimidade de uma prova produzida com o auxílio de um dos investigados e na inexistente 'tendência judicial' de utilização das prisões preventivas para obtenção de confissões e colaborações, não maculam os acordos. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 308 de 317 Como tenho intensamente defendido, se de um lado a colaboração premiada revela-se moderno instrumento de investigação e apuração de ilícitos, sobretudo do crime organizado, de outro, pela ótica daquele que colabora, é valoroso meio de defesa. Pretensas tentativas, portanto, de limitar o acesso à colaboração premiada prevista na Lei nº 12.850/2013 exclusivamente aos réus soltos, contrapõem-se diretamente ao direito constitucional da ampla defesa. Isso equivaleria, em outra dimensão, a impedir que o réu preso possa admitir seus crimes ou mesmo que usufrua dos benefícios previstos no art. 1º, §5º da Lei nº 9.613/98, no art. 14 da Lei nº 9.807/99, ou, ainda, da simples atenuação da pena pela confissão espontânea (art. 65, III, 'd', CP). Ou seja, proibir que investigados presos confessem, negociem colaboração premiada (confissão qualificada) ou que prestem esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime, é de duvidosa constitucionalidade. É importante gizar que o juiz não participa das tratativas do acordo. A colaboração não é firmada entre o acusado/investigado e o Estado-juiz, mas entre aquele e os órgãos de persecução penal (art. 4º, § 2º, da Lei nº 12.850/13). Ao magistrado cabe apenas homologá-lo, extrair-lhe a eficácia e aplicá-lo no momento processual adequado (art. 4º, §6º, da Lei referida). Isto, por si só, faz cair por terra diversos argumentos de suspeição ou impedimento contra o julgador de primeiro grau, os quais já foram rechaçados em diversos julgados por este Tribunal. De relevo, ainda, é anotar que o colaborador não está em nenhum momento desassistido. A Lei nº 12.850/2013 assegura a participação do seu defensor em toda a negociação. E assim vem ocorrendo, seja naquelas colaborações homologadas pelo juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR, seja nas demais homologadas pelo Superior Tribunal de Justiça ou pelo Supremo Tribunal Federal. Não há se falar, portanto, em coação ou em revisita a métodos medievais não afeiçoados ao Estado de Direito. Em um sistema legitimado pela Constituição Federal - ao contrário do que geralmente ocorre nos períodos de exceção -, as prisões somente são decretadas por um juiz investido de jurisdição; os presos são encarcerados em estabelecimentos conhecidos e com direito à assistência jurídica; e as decisões judiciais estão sujeitas ao duplo grau de jurisdição. Ilustrativo é o caso de Ricardo Pessoa, dirigente da UTC e destacado como o chefe do denominado 'Clube' de empreiteiras destinado a burlar os procedimentos licitatórios da Petrobras. O então investigado obteve liberdade provisória no julgamento do HC/STF nº 127.186, vindo a tratar de colaboração somente após sua soltura. Mais ilustrativa ainda é a suposta crítica atribuída ao saudoso Ministro Teori Zavascki às prisões preventivas para extração de delações. A conclusão surgiu em virtude de trecho da decisão do HC/STF nº 127.186, no qual ficou consignado: 'subterfúgio dessa https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 309 de 317 natureza, além de atentatório aos mais fundamentais direitos consagrados na Constituição, constituiria medida medievalesca que cobriria de vergonha qualquer sociedade civilizada'. Mais uma vez, aponte-se, a interpretação seguimentada prejudica o contexto. Por lealdade intelectual à memória do e. Ministro da mais alta Corte, é imprescindível transcrever a íntegra do trecho em que examina a situação fática enfrentada no habeas corpus. Confira-se: É certo que não consta ter o paciente se disposto a realizar colaboração premiada, como ocorreu em relação aos outros. Todavia, essa circunstância é aqui absolutamente irrelevante, até porque seria extrema arbitrariedade - que certamente passou longe da cogitação do juiz de primeiro grau e dos Tribunais que examinaram o presente caso, o TRF da 4ª Região e o Superior Tribunal de Justiça - manter a prisão preventiva como mecanismo para extrair do preso uma colaboração premiada, que, segundo a Lei, deve ser voluntária (Lei 12.850/13, art. 4º, caput e § 6º). Subterfúgio dessa natureza, além de atentatório aos mais fundamentais direitos consagrados na Constituição, constituiria medida medievalesca que cobriria de vergonha qualquer sociedade civilizada. DESTAQUEI COMPARATIVAMENTE De qualquer maneira, note-se que a ordem foi concedida naquele writ em razão do 'longo tempo decorrido desde o decreto de prisão e a significativa mudança do estado do processo e das circunstâncias de fato (...) a indicar que a prisão preventiva, por mais justificada que tenha sido à época de sua decretação, atualmente pode (e, portanto, deve) ser substituída'. Ou seja, em nenhum momento há indicação de se estar diante de prisão decretada para obtenção de colaboração. Na essência, o fato de o colaborador estar submetido à privação de sua liberdade não é fundamental para que adira à proposta. Em regra, o que se tem visto é a adesão à colaboração como meio legítimo de que dispõe o réu para minimizar os efeitos de uma futura condenação, sendo a grande maioria deles entabulados com investigados em liberdade, o que reforça a compreensão a respeito da natureza constitucional do direito de defesa. A colaboração tem lugar quando o proveito do crime se mostrar menos compensador do que a pena a que estará submetido o agente em uma futura condenação. Ainda que muitas vezes a liberdade provisória seja um benefício imediato, o colaborador busca espontaneamente um proveito futuro, exemplificativamente: redução da pena corporal; fixação de um regime de cumprimento de pena mais brando; ou, ainda, a mitigação de medidas para assegurar a sua subsistência e de seus familiares. Logo, inexiste relação direta entre a intenção do agente de colaborar e o fato de estar preso preventivamente. Poder-se-ia até mesmo afirmar que é libertado porque colabora, mas não colabora somente porque está preso. O art. 312 do Código de Processo Penal indica claramente os pressupostos e fundamentos para a prisão preventiva e com tais balizas são decretadas. Nessa linha, a colaboração prevista na Lei nº 12.850/2013 funda-se em premissas de confiança e reciprocidade entre as partes, de maneira que o compromisso do investigado de auxiliar de forma efetiva na apuração dos fatos apenas minimiza os fundamentos para a prisão preventiva e autoriza, em caráter excepcional, a sua substituição por outras cautelas. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 310 de 317 Resumindo, não há como apontar vícios na manifestação da vontade dos colaboradores porque: (a) nos termos de homologação há cláusula expressa reafirmando a voluntariedade do pactuado; (b) os colaboradores estão inteiramente assistidos por seus advogados; e (c) nenhuma impugnação expressa houve pelos colaboradores pelo viés do comprometimento da espontaneidade. Há mostras da higidez das colaborações. Fazendo uma breve retrospectiva da 'Operação Lava-Jato', desde o conhecido Posto da Torre de propriedade Carlos Habib Chater, muitos investigados optaram por firmar acordo. Os primeiros foram Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, que anteviram a possibilidade de mitigar penas e respectivos regimes de cumprimento a que seriam condenados, bem como a perda patrimonial. Familiares de investigados das fases iniciais também colaboraram, sem que nenhum deles tivesse sido privado de sua liberdade um dia sequer. As investigações prosseguiram. Gerson de Mello Almada, por exemplo, dirigente da Engevix, ainda que sem acordo de colaboração, processado confessou os fatos a ele imputados e detalhou a existência do referido 'Clube' de empreiteiras. Dalton dos Santos Avancini, representante da Camargo Côrrea, confirmou a existência do esquema de corrupção e a participação de grandes empreiteiras. Em números gerais, as investigações foram impulsionadas por aproximadamente seis dezenas de colaborações, sendo que não mais de 20% delas foi tratada com investigados presos. Retomando o histórico, a maioria dos colaboradores aderiu ao estatuído na Lei nº 12.850/2013 em liberdade. Dentre eles, Augusto Mendonça (Setal), Júlio Camargo (lobista), Pedro Barusco (ex-diretor da Petrobras), Shinko Nakandakari (operador da Galvão Engenharia), Carlos Alberto Pereira da Costa (ex-funcionário de Alberto Youssef), Eduardo Musa (ex-diretor da Petrobras), João Ferraz (Sete Brasil) e Salim Schahin (banqueiro). Mais adiante, noticiou-se a homologação das Colaborações de Otávio Marques de Azevedo e Flávio David Barra, ambos executivos do grupo Andrade Gutierrez e relacionados a irregularidades nos contratos da Usina de Angra 3, em processo desmembrado da 'Operação Lava-Jato' e que tramita na Subseção Judiciária do Rio de Janeiro/RJ. No que importa, o acordo de Flávio David Barra foi homologado somente em 2016, igualmente após o colaborador ter a prisão preventiva substituída por outras medidas cautelares no final de 2015 pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Otávio Marques de Azevedo e Flávio David Barra foram condenados e farão jus aos benefícios conquistados no acordo de colaboração. Há acusados que somente acenaram com a possibilidade de firmar acordo de colaboração premiada após condenados em primeiro grau, independente de terem respondido o processo em liberdade ou encarcerados provisoriamente. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 311 de 317 Por fim, é fundamental esclarecer que somente foram homologados em primeiro grau as colaborações em que não havia implicação de agentes públicos detentores de foro por prerrogativa de função. Em que pese a Lei nº 12.850/2013 não fixar expressamente, a competência para homologação dos acordos de colaboração dá-se pelo que dispõe a Constituição Federal. Vários acordos foram submetidos à sindicância do saudoso Ministro Teori Zavascki, inclusive de investigados presos preventivamente, como Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef, Rafael Angulo Lopez e ex-senador Delcídio do Amaral. Hamylton Pinheiro Padilha Júnior e Eduardo Costa Vaz Musa encontravam-se soltos quando firmaram seus acordos (Ação Penal nº 5039475-50.2015.4.04.7000/PR). Em todos os casos, houve expressa reiteração de voluntariedade por parte do colaborador. Por tudo isso, repita-se, não é correto afirmar que as prisões preventivas são utilizadas como ferramentas para forçar o paciente a delatar outros envolvidos no esquema, pelo que afastada a alegação de expressa ilegalidade, pressuposto essencial à ordem preventiva. 8.2. Da imparcialidade do órgão julgador Embora já tenha sido analisada a questão em forma de preliminar, importa consignar que nenhum magistrado se compraz com a condenação de um ser humano. Este é um mister inerente à carreira da magistratura, como expressa exteriorização de um dos Poderes do Estado e do império da lei. Do ponto de vista humanístico, sempre há que se compadecer com as pessoas que figuram no polo passivo da relação jurídica processual penal, sejam elas inocentes ou culpadas. Paralelamente, é dever do julgador tentar compreender os fatos e as circunstâncias em que estes ocorreram. Sobre o ponto, relembro passagem do Ministro Cesar Peluso, por ocasião do julgamento da AP nº 470: Senhor Presidente, antes de encerrar meu voto, e encerrando-o, quero dizer o seguinte: este não é apenas o último voto que profiro nesta Casa que tive a grande honra de servir por mais de nove anos, mas também na magistratura, porque sou hoje, segundo me disseram, para não muito gáudio meu, o juiz de carreira mais antigo em atividade no Brasil, com quase quarenta e cinco anos de serviço. E, como tal, aproveito para dizer, Senhor Presidente, que nenhum juiz verdadeiramente digno da sua vocação condena ninguém por ódio. Nada mais confrange um magistrado do que ter de condenar alguém, em matéria penal. E agora me recordei de velha lição de Santo Agostinho, o qual advertia que, ao lado de uma 'crueldade que perdoa' (crudelitas parcens), há 'uma misericórdia que pune' (misericordia puniens). Na verdade, como consequência da inafastável distinção entre o lícito e o ilícito, as condenações são uma imposição da consciência do magistrado, não apenas do ponto de vista funcional, mas também do ponto de vista social e ético, porque condena, Senhor Presidente, em primeiro lugar, por uma exigência de justiça; em segundo, porque reverencia a lei, que é a salvaguarda e a garantia da própria sociedade em que todos vivemos. E, ainda, Senhor Presidente, por amor e respeito aos próprios réus, porque toda condenação é, do ângulo metajurídico, um chamado para que, cumprida a pena, os condenados se reconciliem com a sociedade. E é com sentimento amargo, Senhor Presidente, que cumpro esse intransponível dever de, segundo a minha convicção pessoal, estabelecer as condenações. (p. 22/23 do voto do Min. Cezar Peluso, na AP nº 470/STF) https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 312 de 317 Este feito, de um modo especial, traz uma reflexão ainda mais ampla. No 'banco dos réus' está um ex-Presidente da República que, por dois mandatos, comandou o país, e isso torna a tarefa do julgador mais sensível e dramática. Mais perturbador do que isso é constatar a fragilidade do processo eleitoral. Recursos foram desviados em favor de partidos políticos e de pessoas, comprometendo o equilíbrio do processo sucessório e fazendo-nos questionar qual o real sentido da democracia representativa que temos. Nada disso, todavia, pode abalar a isenção de ânimo ou a imparcialidade do julgador. Como já apontado em sede de preliminar, não julgamos o nome, ou um personagem ou, ainda, um reconhecido estadista. Julgamos sim fatos concretos, os quais foram examinados e julgados dentro da mais perfeita moldura de constitucionalidade e de legalidade. Não apenas este julgamento demonstra isso, mas também os muitos incidentes processuais apreciados monocrática e colegiadamente por este Relator e por esta 8ª Turma, respectivamente, por vezes acolhendo argumentos da defesa. Por isso, qualquer exploração com relação à suposta ausência de imparcialidade deve ser rechaçada, porque se julgam pessoas e os fatos que lhe são atribuídos, segundo o direito e as provas. 8.3. Da alegação de utilização da ação penal como objeto de intervenção no processo eleitoral Muito tem sido propalado a respeito de uma suposta conotação política do processo e que a 'Operação Lava-Jato' tem por objeto atingir ao ex-Presidente e ao Partido dos Trabalhadores. Imperioso que a afirmação seja desacreditada com redobrada ênfase. Nestas mais de duas dezenas de processos de mérito julgados por esta Corte (sem falar nos mais de 800 incidentes processuais aqui apreciados), foram condenados membros de diferentes partidos políticos, não tendo sido o Partido dos Trabalhadores e seus representantes sequer os primeiros investigados. Também não houve apenas propositura de ação e julgamento de ocupantes de cargos eletivos. Há servidores públicos, empreiteiros, empresários, publicitários, engenheiros, empregados públicos e privados e, vale lembrar, até mesmo traficantes e lavadores de dinheiro. Enfim, pessoas de várias classes sociais foram objeto de imputações. Não há nestes autos, porém, aqueles menos favorecidos, inclusive invocados perante o Supremo Tribunal Federal para fundamentar a injustiça da execução provisória das penas. Não estamos tratando de pobres, miseráveis ou dos descamisados, que usualmente são os destinatários das ações penais no Brasil. A par das críticas, a 'Operação Lava-Jato' trouxe eficácia à jurisdição penal e deu contornos claros ao primado constitucional da razoável duração do processo, de modo a minimizar a sensação de impunidade daqueles que se utilizavam do tempo como meio de se esquivarem dos riscos da condenação, apesar de desenvolverem ampla, reiterada e conhecida atividade criminosa. Apesar de muito se falar das consequências políticas do julgamento, não deve o Poder Judiciário guiar-se por elas, porque decorrem do comportamento das pessoas https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 313 de 317 e da legislação eleitoral. Mas, como demonstrado nos autos, o que atinge a democracia não é o processo penal e nem julgamento daqueles que tiveram ou pretendem ter atuação política. É o uso de recursos ilícitos que a atinge, como ferramenta de subversão do processo democrático e de fragilização da participação igualitária no pleito eleitoral, pois contaminado por candidatos e agremiações financiados pelo dinheiro da corrupção. Fala-se de paridade de armas. Verifica-se, porém, que a corrupção sistêmica ocorrida por mais de uma década no seio da Petrobras acabou por fulminar completamente a paridade de armas no processo eleitoral. Não há como pretender-se a igualdade entre o cidadão comum, honesto e bem intencionado, que pretende concorrer, com outrem que recebe vultosas quantias de dinheiro, em forma de caixa 1 ou caixa 2, de modo a interferir da forma mais danosa possível na liberdade do eleitor. Aliás, com muita propriedade, recentemente o Ministro Luiz Roberto Barroso, em julgamento de processo conexo à 'Operação Lava-Jato', ocorrido no Plenário da Excelsa Corte, em 19 de dezembro de 2017, assinalou que: 'Vivemos uma tragédia brasileira, a tragédia da corrupção que se espalhou de alto a baixo sem cerimônia. Um país em que o modo de fazer política e negócios funciona assim: o agente político relevante escolhe o diretor da estatal ou ministro com cotas de arrecadação. E o diretor da estatal contrata em licitação fraudada a empresa que vai superfaturar a obra ou o contrato público para depois distribuir dinheiros. Aí não faz diferença se foi para o bolso ou se foi para a campanha, porque o problema não é para onde vai [o dinheiro], mas de onde vem' (...) 'a cultura de desonestidade que se cria de alto a baixo com maus exemplos em que todo mundo quer levar vantagem, todo mundo quer passar os outros para trás, todo mundo quer conseguir o seu, sem mencionar as propinas para financiamento, tudo documentado'. Pouco adiante, arrematou Sua Excelência: (...) Há um país que se perdeu pelo caminho, naturalizou as coisas erradas, e temos o dever de enfrentar isso e de fazer um novo país, de ensinar as novas gerações de que vale a pena fazer honesto, sem punitivismo, sem vingadores mascarados, mas também sem achar que ricos criminosos têm imunidade. Porque não têm. Tem que tratar o menino pego com cem gramas de maconha da mesma forma que se trata quem desvia milhões de reais. Não há, portanto, qualquer objetivo político ou perseguição, muito menos desejo de influenciar em processo político eleitoral que se avizinha. Há, sim, a indevida utilização do ambiente por alguns agentes para a prática de crimes. Contudo, registre-se que tal premissa não se aplica a todos os personagens do cenário nacional, pelo que é inadequado se falar em criminalização generalizada da política. Os casos são pontuais e como tal devem e são tratados. É certo que a investigação, a persecução penal e a condenação podem, por via oblíqua, impactar o processo eleitoral, pois do julgamento podem surgir efeitos políticos. Contudo, isto não está no espectro de atuação do juiz criminal, que aplica a lei no caso concreto, porque as consequências extrapenais refogem ao controle desta jurisdição. Eventuais reflexos políticos devem e certamente serão solvidos perante a Justiça Eleitoral, não sendo, portanto, invocáveis nesta esfera penal. 8.4. Celeridade processual https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 314 de 317 É desarrazoado atribuir-se ao Poder Judiciário ou a este Relator a pecha de imprimir maior velocidade no julgamento um processo, especialmente quando a maior crítica que este Poder geralmente recebe é de morosidade. Todavia, por mais estranho que possa parecer, buscou-se dizer que houve excepcional rapidez na tramitação do presente recurso perante esta Corte. As informações prestadas pelo Excelentíssimo Presidente Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, em procedimento instaurado a pedido da defesa do apelante LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA com base na Lei de Acesso à Informação (PETIÇÃO (PRESIDÊNCIA) nº 5069216-18.2017.4.04.0000/RS), deixam claro que esta Casa de Julgamentos, inclusive e em especial a jurisdição penal, tem primado pela celeridade dos processos. Tratando-se de imputação de crime de corrupção, atua-se em atendimento ao comando da Meta 4 do E. Conselho Nacional de Justiça, que estabelece: Priorizar o julgamento dos processos relativos à corrupção e à improbidade administrativa. Não fosse o suficiente, os esclarecimentos da Presidência são cristalinos e demonstram que nada refoge à normalidade, sendo digno de nota que, na medida do possível e embora inexista regra cogente sobre isso, os recursos da 'Operação Lava-Jato' vêm sendo analisados segundo a ordem cronológica que retornam da douta Procuradoria Regional da República com parecer. Não apenas nos processos da 'Operação Lava-Jato', mas em todos os demais distribuídos a este Relator, tem sido buscada célere tramitação, o que somente é possível graças à dedicação, capacidade intelectual e comprometimento de todos os envolvidos. No relatório da douta Corregedoria-Geral do Conselho Nacional de Justiça, da lavra do então Corregedor-Geral Min. Mauro Campbell consignou-se, in verbis: 'Observa-se que tanto os processos antigos quanto os mais recentes estão sendo devida e diligentemente julgados. A comparação dos acervos de processos conclusos em abril/2016 e abril/2017 evidencia o esforço e muito bom trabalho da unidade, pressionada pelo volume de processos de 2016 e 2017'. (http://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justicafederal/corregedoria-geral-da-justica-federal/inspecoes) Isto não é diferente nos outros gabinetes desta 8ª Turma ou da 4ª Seção, tampouco dos demais deste Tribunal, ainda que alguns deles com elevadíssima distribuição de processos. Basta ver o quantitativo de processos já julgados pela 8ª Turma e pela 4ª Seção, o que, registre-se, igualmente deve-se ao comprometimento de todos os desembargadores com a jurisdição e com a causa pública. 9. CONCLUSÕES Por todo o exposto, conclui-se: 9.1. É competente o Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR para o processamento e julgamento desta e das demais ações penais relacionadas à 'Operação Lava-Jato'. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 315 de 317 9.2. Não restou caracterizada qualquer das hipóteses de suspeição do magistrado, elencadas no art. 254 do Código de Processo Penal. 9.3. Afastada alegação de suspeição dos Procuradores da Força-Tarefa da 'Operação Lava Jato'. 9.4. Ausente cerceamento de defesa. 9.5. Não verificada a apontada violação ao princípio da autodefesa. 9.6. Afastada a tese defensiva de ausência de correlação entre a peça acusatória e a sentença. 9.7. Não há nulidade a ser declarada por alegada ausência de fundamentação. 9.8. Rejeitadas integralmente todas as preliminares sustentadas pelas defesas. 9.9. O tema das provas é de fundamental importância, em especial porque os delitos imputados aos acusados são complexos e de difícil apuração, muitas vezes dependente de um conjunto de indícios para a sua comprovação. Esta prova indireta deverá ser 'acima de qualquer dúvida razoável', excluindo-se a possibilidade dos fatos terem ocorrido de modo diverso daquele alegado pela acusação. 9.10. Mantidas as condenações de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS pelo delito de corrupção. Há provas acima de dúvida razoável de que a unidade triplex foi destinada a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e de que foram arcados pela empresa OAS, como vantagem indevida, os recursos necessários para o custeio da diferença entre aquilo que foi inicialmente pago pelo apelante para aquisição do apartamento originalmente contratado, somados com as despesas de personalização (reforma, mobiliário e utensílios). 9.11. Preservada a condenação de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA por único ato de corrupção passiva. 9.12. Mantida a absolvição de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e de AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS quanto às imputações de delitos de corrupção ativa com relação aos funcionários da Petrobras Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho. 9.13. Preservada a condenação de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO por crime único de lavagem de dinheiro pela ocultação e dissimulação da titularidade do apartamento 164-A, triplex. 9.14. Mantida a absolvição de PAULO ROBERTO VALENTE GORDILHO, FÁBIO HORI YONAMINE e ROBERTO MOREIRA FERREIRA pelo delito de lavagem de capitais envolvendo a ocultação e dissimulação da titularidade do imóvel. https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 316 de 317 9.15. Preservada a absolvição de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, PAULO TARCISO OKAMOTTO e LÉO PINHEIRO dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro quanto ao armazenamento do acervo presidencial. 9.16. Não conhecimento das apelações de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e de PAULO OKAMOTTO, no ponto em que postulam a reforma da sentença para que se faça constar que os fatos relacionados ao acervo presidencial não constituem crime, por falta de interesse jurídico recursal. 9.17. Reformadas as sanções aplicadas, restando os réus definitivamente condenados a: (a) LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA: 12 (doze) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime inicialmente fechado, e 280 (duzentos e oitenta) dias-multa, à razão unitária de 05 (cinco) salários mínimos vigentes ao tempo do último fato criminoso; (b) JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO: 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 70 (setenta) diasmulta, à razão unitária de 05 (cinco) salários mínimos vigentes ao tempo do último fato criminoso; (c) AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS: 01 (um) ano, 10 (dez) meses e 07 (sete) dias de reclusão, em regime aberto, e 43 (quarenta e três) diasmulta, à razão unitária de 05 (cinco) salários mínimos vigentes ao tempo do último fato criminoso. 9.18. Provido parcialmente o apelo da defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA tão somente para aplicar a atenuante do artigo 65, I, do Código Penal no patamar de 1/6 (um sexto). Tal redução é aplicada de ofício em relação ao corréu AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS. 9.19. Hígida a pretensão punitiva, pois não decorridos os prazos prescricionais entre os marcos interruptivos. 9.20. Preservada a sentença no tocante ao valor definido a título de reparação do dano. 9.21. Mantidas, forte no art. 7º, II, da Lei nº 9.613/1998, as interdições de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, para o exercício de cargo ou função pública ou de diretor, membro de conselho ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da mesma lei pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade. 9.22. Determinada a execução das penas após esgotada a jurisdição de segundo grau ordinária. 10. Dispositivo https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018 Página 317 de 317 Ante o exposto, voto por rejeitar na integralidade as preliminares e, no mérito, dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para readequar as penas impostas e os benefícios concedidos aos réus JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS em virtude da colaboração; negar provimento às apelações dos réus JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO e AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS; conceder, de ofício, ordem de habeas corpus para reduzir as penas aplicadas a AGENOR FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS; conhecer em parte da apelação do réu LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e, nessa extensão, dar-lhe parcial provimento; e conhecer em parte da apelação do réu PAULO TARCISO OKAMOTTO e, nessa extensão, negar-lhe provimento. É o voto. Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, , na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9292733v50 e, se solicitado, do código CRC C917D488. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): João Pedro Gebran Neto Data e Hora: 30/01/2018 15:55 https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_implem... 30/01/2018